REVISTA ÉPOCA Vale a pena tomar vacina contra HPV? Jovens vacinados contra o papilomavírus humano começam a vida sexual livres dessa ameaça. Em que situações é melhor pagar (caro) pela proteção Cristiane Segatto PROTEGIDOS Os irmãos Carolina, de 16 anos, e Guilherme, de 18, filhos do Dr. Guidi, urologista, foram vacinados antes do início da vida sexual. O HPV deixou de ser um fantasma. Guilherme, de 18 anos, é um garoto como tantos outros, mas tem um “diferencial competitivo” que nenhum de seus amigos possui: pode dizer às parceiras que começou a vida sexual protegido contra os principais tipos de papilomavírus humano, mais conhecido como HPV. O HPV é adquirido durante o sexo (oral, vaginal ou anal) e responde por mais de 99% dos casos de câncer do colo do útero, o segundo tipo de tumor mais frequente entre as brasileiras – atrás apenas do câncer de mama. Nos homens, ele pode provocar câncer de pênis. Em ambos, pode provocar um tipo raro de câncer de garganta. Além de câncer, o HPV pode provocar verrugas genitais em ambos os sexos. Até recentemente, a vacina era assunto apenas entre as garotas. Nos últimos meses, porém, ela começou a ser aplicada também em meninos – embora ainda não tenha sido aprovada oficialmente no país para o público masculino. Enquanto a vacina não for liberada pelo FDA e pela Anvisa, ela não deveria ser usada por meninos. Na prática, porém, alguns médicos já estão recomendando a vacinação. “Minha geração tem muito medo do HIV porque cresceu ouvindo alertas na MTV, mas ninguém fala sobre o HPV”, diz Guilherme. Ele afirma nunca ter dispensado a camisinha, apesar de se sentir mais protegido depois da vacinação. “Fui educado, em casa e na escola, a jamais abrir mão da camisinha”. Carolina diz que pouquíssimas amigas foram imunizadas. Ela não questionou a recomendação do pai. Ém vários países se discute se o benefício da vacina compensa o custo. Na maioria das vezes, a infecção pelo HPV não é o fim do mundo. Acompanhe os seguintes números: 75% das pessoas sexualmente ativas adquirem o HPV em algum momento da vida. Ele é eliminado naturalmente pelo organismo de 60% delas. O cidadão nem fica sabendo que teve contato com o vírus. Apenas 1% dos infectados terá verrugas genitais. Elas são desagradáveis e muitas vezes difíceis de controlar. Câncer, então, é um evento ainda mais raro. Somente 0,5% das mulheres infectadas pelo HPV desenvolve tumores do colo do útero. Exames anuais de papanicolau podem detectar lesões pré-cancerosas e evitar o pior. O câncer de pênis ocorre em apenas 0,05% dos homens que tiveram contato com o vírus. Se os rapazes tivessem o costume de ir ao urologista preventivamente, pequenas lesões poderiam ser tratadas antes de virar câncer. Tudo isso posto, vale a pena gastar mais de R$ 1.000 (o preço médio das três doses necessárias) para imunizar meninas e meninos? “Seria uma leviandade criar pânico na população por causa do HPV, mas, se a família tem condições de vacinar os filhos, acho que o investimento é válido”, diz Guidi. Em outras palavras: se para pagar as doses você precisar economizar na educação ou na alimentação das crianças, esqueça a vacina. Mas se a família gasta esse valor todo mês no shopping ou em restaurantes, talvez seja melhor investir em saúde. A população pobre, que mais se beneficiaria pela vacina contra o HPV, não terá acesso a ela tão cedo. Um estudo internacional realizado no Brasil, México e Estados Unidos com 4.200 homens entre 18 e 70 anos revelou que 72% dos brasileiros têm o vírus. “Se eu tivesse um filho, o imunizaria depois que a vacina fosse aprovada para meninos no Brasil”, diz Luisa Lina Villa, diretora do Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer e coordenadora do trabalho. Mesmo que os rapazes não sofram problemas decorrentes do HPV, a vacinação deles é justificável porque interromperia a cadeia de transmissão do vírus. Um estudo realizado no Rio de Janeiro pela Fiocruz com 403 garotas revelou que, um ano após o início da vida sexual, 24% delas já apresentam lesões causadas pelo HPV – em geral lesões de baixa gravidade. Nem os casais que usam camisinha estão completamente protegidos. O HPV pode se alojar em regiões que o preservativo não cobre (como o escroto e o ânus) e ser transmitido facilmente. É por isso que vacinar meninos e meninas seria a estratégia de saúde pública mais interessante.