SECAL – FACULDADES SANTA AMÉLIA CURSO DE DIREITO DISCIPLINA: HISTÓRIA DO DIREITO II (DIREITO ROMANO) 2º SEMESTRE A Profª: Fernanda Matos de Oliveira REVISÃO 01.Povos Ágrafos Características do direito: - abstratos: como são direitos não escritos as regras devem ser decoradas e passadas de pessoa para pessoa através dos provérbios e adágios (ditados populares); - numerosos: cada comunidade tem seu próprio costume e vive isolada no espaço e, muitas vezes, no tempo. Os raros contatos entre grupos vizinhos têm como objetivo a guerra; - os direitos dos povos sem escrita são relativamente diversificados: esta distância (no tempo e no espaço) faz com que cada comunidade produza mais dissemelhanças do que semelhanças em seus direitos; - impregnados de religiosidade: como a maior parte dos fenômenos são explicados através da religião, a regra jurídica não foge a este contexto. A distinção entre regra religiosa e regra jurídica é aqui muitas vezes difícil, porque o homem vive no temor constante dos poderes sobrenaturais. Estes tipos de sociedades são caracterizados pelo que se chama de “indiferenciação”, ou seja, as diversas funções sociais que nós distinguimos nas sociedades evoluídas – religião, moral, direito - estão ainda aí confundidas. Basta lembrar a concepção teocrática do poder, em que o rei era o representante de Deus na terra, ou o papel do Direito Canônico no domínio do casamento e do divórcio. - direitos em nascimento: a diferença entre o que é jurídico e o que não, é muito difícil. Esta distinção só se torna possível quando o direito passa do comportamento inconsciente (derivado de puro reflexo) ao comportamento consciente, fruto de reflexão. Marx e Engels consideram, sob a influência do pensamento de Hegel, que o direito está ligado ao Estado e afirmam que não há direito nos grupos sociais que não atingiram o estágio de organização estatal. Mas hoje já se admite, com base no direito consuetudinário, que os povos ágrafos tem um meio de coerção para assegurar o respeito das regras de comportamento. Admite-se assim que não existe uma noção universal e eterna de justiça, podendo esta noção variar com o tempo e com o espaço. Nos sistemas arcaicos de direito é justo tudo aquilo que interessa para a manutenção da coesão do grupo social, e não o que tende para o respeito dos direitos individuais. A função de julgar não consiste em resolver um litígio segundo regras pré-estabelecidas, mas em tentar obter o acordo das partes por concessões recíprocas. 02. Direito na antiguidade oriental - Mesopotâmia Os primeiros “Códigos” surgem entre 2140 e 2004 a.C. na região da Suméria; foi na cidade de Ur. 1 SECAL – FACULDADES SANTA AMÉLIA CURSO DE DIREITO DISCIPLINA: HISTÓRIA DO DIREITO II (DIREITO ROMANO) 2º SEMESTRE A Profª: Fernanda Matos de Oliveira Nesse momento na Suméria, inicia-se a chamada III dinastia de Ur e é o rei UrNammu que promulga o 1 “Código” de Ur-Nammu. É um meio termo entre o direito arcaico (pensado e manifestado exclusivamente para o caso concreto) e o direito moderno (formas abstratas e gerais). Na cidade de Esnunna, próxima ao rio Tigre, na Acádia, foi descoberto um “código” editado numa data próxima a 1930 a.C. Na cidade de Isin, na Suméria, foi encontrado o “Código” de Lipit-Ishtar1, redigido possivelmente em 1934-1924 a.C. O “Código”de Esnunna, mais extenso e completo (possui sessenta artigos), traz uma simbiose entre matérias civil e penal que caracterizará o Código de Hammurabi. O documento de Esnunna já contempla institutos conexos à responsabilidade civil, ao direito de família e à responsabilidade de donos de animais por lesões corporais seguidas de morte. O Código de Hammurabi e os numerosos atos da prática do mesmo período nos mostra que tratava-se de um sistema jurídico muito desenvolvido, sobretudo no domínio do direito privado, principalmente, os contratos. Os Mesopotâmicos praticaram a venda (mesmo a venda a crédito), o arrendamento (arrendamentos de instalações agrícolas, de casas, arrendamentos de serviços), o depósito, o empréstimo a juros, o título de crédito à ordem (com a cláusula de reembolso ao portador), o contrato social. Eles faziam operações bancárias e financeiras em grande escala e tinham já comandita de comerciantes. Graças ao desenvolvimento da economia de troca e das relações comerciais, o direito da época de Hammurabi criou a técnica dos contratos mais tarde sistematizadas pelos Romanos. Consagrando a pena de Talião, (olho por olho, dente por dente), o código reunia os seus 282 preceitos em um conjunto assistemático e que abrangia uma diversidade de assuntos: crimes, matéria patrimonial, família, sucessões, obrigações, salários, normas especiais sobre os direitos e deveres de algumas classes profissionais, posse de escravos,... Podemos, então, observar que o código quase não foge aos problemas jurídicos, aos quais regulamenta com estritos detalhes. Ao corpo de leis de Hamurábi faltam traços de técnica que só com os romanos se tornaram definitivas. -Egito Os egípcios não nos deixaram quase nada escrito. Critério divino de justiça. Princípio do “Mâat” – “Verdade e Ordem” e “A verdadeira Justiça”. O ideal é fazer com que as duas partes saiam satisfeitas do tribunal. 1 Lipt-Ishtar ou Lipt-Eshtar foi o 5⁰ rei da 1 ͣ dinastia de Isin e reinou cerca de 1934 à 1924 a.C. Ele é conhecido principalmente devido a língua suméria – hinos – ser escrita em sua homenagem, bem como pelo código de leis escrito em seu nome (precedendo, em cerca de 200 anos o famoso Código de Hammurabi). 2 SECAL – FACULDADES SANTA AMÉLIA CURSO DE DIREITO DISCIPLINA: HISTÓRIA DO DIREITO II (DIREITO ROMANO) 2º SEMESTRE A Profª: Fernanda Matos de Oliveira -Hebreus Vivíam na Palestina e eram monoteístas2 (crença na existência de apenas um Deus). - Edições católicas – 46 livros. - Edições judaica (Tanakh) – 24 livros – os mesmos 39 livros da bíblia hebraica. 03. Direito no Extremo Oriente: Índia e o “Código” de Manu - Hinduísmo e o “Código” de Manu Sociedade dividida em castas (dar uma olhadinha nas castas). O “Código de Manu” redigido entre os séculos II a.C. e II d.C. em forma política e imaginosa, imposta em forma de versos, é a legislação mais antiga da Índia. Esse “Código” de Manu se baseava em castas, considerado extremamente rigoroso e injusto. Há uma série de ideias sobre valores, tais como “verdade, justiça e respeito”. Contudo, os castigos infligidos variavam de acordo com a credibilidade dos testemunhos, que por sua vez variavam de acordo com as castas. 04. Direito na Antiguidade Ocidental - Grécia Inicialmente trata-se de um direito essencialmente consuetudinário, ritualístico, fundado em culto aos antepassados e desenvolvido no sei da própria família. Os gregos desenvolveram também a consciência da existência de uma lei eterna, imutável, a reger o homem indistintamente. Trata-se de uma ideia embrionária do que convencionamos chamar hoje de direito natural ou jusnaturalismo. O direito era tão somente parte do regime de governo das cidades-estados. As leis de Sólon eram ensinadas como poemas. A ausência desse corpo de regras chegava a causar estranheza entre os filósofos, conforme crítica de Aristóteles: “A dispensa da prestação de contas e a perpetuidade sao prerrogativas muito acima de seus méritos. A falta de leis que possam servir-lhes de regra para julgar o caráter arbitrário de seus julgamentos não dá nenhuma segurança aos réus.” - Atenas A expansão colonizadora contribuiu para o surgimento de centenas de novas pólis (cidades-estados). O movimento colonizador, entretanto, não resolveu todos os problemas sociais das cidades gregas. Muitos agricultores empobrecidos que permaneceram na Grécia passaram a exigir a redistribuição das terras e o fim da escravidão por dívidas. 2 Os hebreus eram inicialmente, um pequeno grupo de pastores nômades, organizados em clãs ou tribos, chefiadas por um patriarca. Conduzidos por Abraão, deixaram a cidade de Ur, na Mesopotâmia, e se fixaram na Palestina (Canaã a Terra Prometida), por volta de 2000 a.C. 3 SECAL – FACULDADES SANTA AMÉLIA CURSO DE DIREITO DISCIPLINA: HISTÓRIA DO DIREITO II (DIREITO ROMANO) 2º SEMESTRE A Profª: Fernanda Matos de Oliveira A pressão foi tanta que os ricos tiveram de ceder e procurar resolver o problema. Uma solução em várias cidades foi escolher homens respeitados pelo povo para serem legisladores, isto é, para fazerem importantes mudanças nas leis. Os legisladores eram escolhidos entre indivíduos da parte mais rica da população. Em Atenas, os dois primeiros legisladores foram Drácon e Sólon. A)DRÁCON No período aproximadamente 620 a.C. foi o “operário” especializado em leis, não tratou dos problemas sociais, mas foi ele responsável pela elaboração do primeiro código de leis escritas de Atenas. Até então, as leis não eram escritas, e sim memorizadas. Por isso, as famílias mais poderosas interpretavam essas leis à sua maneira, favorecendo seus próprios interesses. Entre outras coisas, as leis de Drácon proibiam as pessoas de “fazer justiça com as próprias mãos”. Esse legislador ficou conhecido por suas regras jurídicas rigorosas, com base na aplicação da pena de morte para a maioria dos delitos, o que lhe rendeu a reputação de “sanguinário”. Ele já havia diferenciado o homicídio voluntário, involuntário e a legítima defesa. Vale lembrar que o termo “lei draconiana” é corrente na atualidade entre os operadores do Direito, principalmente quando o objetivo é se referir a uma regra cruel, desumana ou excessiva. B)SÓLON Entre 638 a 558 a.C. surge o homem designado a promover uma grande reforma que se estenderia ao campo jurídico. É bem conhecido o fato de que o intelecto de Sólon, aliado às suas boas intenções, foi chamado a corrigir os desvarios de seu antecessor. Ele próprio pertence à aristocracia, mas por temperamento ou por necessidade, fora levado a viajar, o que o colocava um pouco à margem da aristocracia tradicional. Procurou resolver os problemas sociais criando as seguintes leis: - ficou proibida a escravidão por dívida, foi concedida liberdade a todos os devedores escravizados e foram abolidas as dívidas dos pequenos agricultores. Mas Sólon se recusou a fazer a reforma agrária, ou seja, distribuir entre os pobres as terras das grandes propriedades, como muitos camponeses esperavam. As reformas de Sólon foram muito importantes, mas não eliminaram algumas das motivações mais profundas do descontentamento popular. Entre elas, estava o desejo de uma reforma agrária, que não foi realizada. Assim, as agitações continuaram a acontecer em Atenas ainda por muitos anos. Por volta de 560 a.C., chegou ao poder um governante chamado Pisístrato, que conseguiu satisfazer os camponeses, distribuindo terras ainda não ocupadas ou pertencentes a nobres. Os direitos políticos dos cidadãos comuns aumentaram tanto que a nova forma de organização política ficou conhecida como democracia, que significa “governo do povo”. Para os gregos, democracia era o governo do demos. A cidade era governada pelos próprios cidadãos. Eles participavam diretamente do governo da cidade: votavam projetos de lei, decidiam sobre assuntos de interesse geral. Por isso se diz que a 4 SECAL – FACULDADES SANTA AMÉLIA CURSO DE DIREITO DISCIPLINA: HISTÓRIA DO DIREITO II (DIREITO ROMANO) 2º SEMESTRE A Profª: Fernanda Matos de Oliveira democracia grega era uma democracia direta, diferente da democracia de hoje, na qual quem faz as leis e governa são os representantes eleitos pelo povo – vereadores, deputados e senadores. 05. Direito na Antiguidade Ocidental – Roma 01.Realeza ou Monarquia Romana A história da fundação de Roma, como se sabe, perde-se em meio ao vasto universo das contradições alimentadas durante gerações pela propagação dos mitos. Sendo assim, deve-se guardar a advertência de Rousseau de que “não possuímos qualquer documento bastante legítimo dos primeiros tempos de Roma, havendo mesmo muitos indícios de que a maioria das coisas que se dizem a tal propósito não passe de fábulas e, em geral, a parte mais instrutiva dos anais dos povos, que é a história de seu estabelecimento, é a que mais nos falta”. 3 O mais famoso dos mitos de Roma busca explicar, sob o viés fantástico, a origem de seus primitivos habitantes. Para explicar o começo da história de sua cidade, os romanos criaram algumas lendas. A mais famosa conta que Roma foi fundada em 753 a.C. pelos gêmeos Rômulo e Remo, que, além de serem filhos de Marte, o deus da guerra, eram também descendentes do troiano Eneias4. Esse ano foi o ponto de partida para o calendário romano. Diz a lenda que os gêmeos foram abandonados em um cesto, boiando sobre o rio Tibre, quando ainda eram bebês. Isso teria sido feito por um criado que, com pena deles, teria deixado de cumprir a ordem de jogá-los no rio, dada por Amúlio, o tio-avô dos meninos. Amúlio teria tomado à força o trono da cidade de Alba, fundado por Eneias e próxima de onde mais tarde seria erguida a cidade de Roma. Amúlio queria eliminar os gêmeos por serem os únicos descendentes homens de seu irmão Númitor, o verdadeiro rei. No entanto, os bebês se salvaram quando o cesto em que estavam encalhou junto ao monte Palatino. Durante algum tempo, foram amamentados por uma loba, que teria sido enviada por Marte. Passado mais um tempo, foram encontrados por um pastor de nome Fáustulo, que os levou para criar com sua esposa Laurência. Diz a lenda que Laurência era uma prostituta (lupa – loba na gíria latina), daí a lenda da loba. Ao que consta, Rômulo (753-715 a.C.), após cometer o fratricídio5, tornou-se o primeiro rei da cidade. 3 ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do Contrato Social. Trad. Lourdes Santos Machado. Introd. e notas Paul Arboune-Batisde e Lourival Gomes Machado. São Paulo: Abril, 1973. 4 Eneias foi um dos poucos sobreviventes no incêndio à Troia, na famosa “Guerra de Tróia”. Essa guerra teria começado porque Páris, um dos filhos do rei de Troia, teria raptado uma bela mulher: Helena. Acontece que Helena era esposa de Menelau, o rei de Esparta! Por isso, os líderes gregos resolveram se aliar e atacar Troia. Após dez anos de cerco, os gregos resolveram usar um engenhoso artifício para vencer a resistência dos troianos. Construíram um grande cavalo de madeira e o deixaram em frente da entrada da cidade. Ao vê-lo, os troianos pensaram ser uma oferenda à deusa Atena. Acreditando que os gregos haviam fugido, os troianos levaram o cavalo para dentro da cidade e comemoraram a vitória. O que eles não sabiam é que dentro do cavalo de madeira havia guerreiros gregos. O restante do exército grego estava escondido em uma ilha vizinha. À noite, os que estavam no interior do cavalo saíram e abriram os portões da cidade para o exército grego, surpreendendo os troianos, que acabaram sendo vencidos. Os gregos, então resgataram Helena e incendiaram Troia, depois de matar quase todos os habitantes da cidade. 5 É o assassinato de um ser humano pelo seu próprio irmão. 5 SECAL – FACULDADES SANTA AMÉLIA CURSO DE DIREITO DISCIPLINA: HISTÓRIA DO DIREITO II (DIREITO ROMANO) 2º SEMESTRE A Profª: Fernanda Matos de Oliveira Os romanos eram descendentes dos italiotas, um povo que chegou à Itália por volta do segundo milênio a.C. Os italiotas dividiam-se em diversos grupos ou tribos, entre os quais se incluíam os latinos, os sabinos e os samnitas. No século VII a.C., eles se encontravam estabelecidos na parte centro-sul da península. Nessa época, além dos italiotas, outros povos habitavam a Itália. Entre eles, estavam os gauleses, no norte da península; os etruscos, na região centro-norte e os gregos, no sul, na região que ficou conhecida por Magna Grécia. 1.2.Organização social na Realeza Durante esse período, a sociedade romana se dividia basicamente em quatro grupos sociais: os patrícios, os plebeus, os clientes e os escravos. Esses grupos continuaram a existir depois desse período. Os patrícios eram os descendentes dos fundadores de Roma. Eram os donos das terras e formavam a classe dos nobres. Entre os romanos, os modos de vida mais valorizados eram o do guerreiro e o do proprietário rural. Somente os patrícios tinham direitos políticos em Roma durante a realeza. Eles reservavam para si, com exclusividade, os cargos no exército, na justiça e na administração. Também eram eles que dirigiam os cultos religiosos. Os plebeus eram homens livres que não pertenciam a uma família patrícia. Muitos plebeus possuíam terras, mas também eram numerosos os que se dedicavam ao comércio, a atividades bancárias e ao artesanato, ofícios que eram motivo para desprezo entre os romanos. Na época da monarquia, os plebeus não participavam do governo nem eram protegidos pelas leis romanas. Os casamentos entre patrícios e plebeus não eram permitidos. Além de patrícios e plebeus, havia ainda, em Roma, nesse tempo, os clientes e os escravos. Em geral, os clientes eram pessoas livres que se colocavam à disposição de famílias patrícias. Prestavam diversos serviços pessoais aos patrícios e, em troca, recebiam ajuda econômica e proteção social. O conjunto de clientes de um patrício era chamado de clientela. Mais tarde, os plebeus também passaram a ter clientes. Ronaldo Poletti sustenta a ideia de que a clientela era constituída por “...estrangeiros vencidos na guerra (dedícios), os estrangeiros emigrados e os escravos libertados (manumitidos)”6 Os escravos eram prisioneiros de guerras, porém, como em diversas civilizações da Antiguidade, muitos eram devedores. Os escravos não tinham nenhum direito. Eram simples propriedade de seu dono, que tinha autonomia para castigá-los, vendê-los, alugar seus serviços e decidir sobre sua vida ou sua morte. 1.3. Organização política A- Rei 6 POLETTI, Ronaldo. Elementos de Direito Público e Privado Brasileiro. 6 SECAL – FACULDADES SANTA AMÉLIA CURSO DE DIREITO DISCIPLINA: HISTÓRIA DO DIREITO II (DIREITO ROMANO) 2º SEMESTRE A Profª: Fernanda Matos de Oliveira Era o magistrado único e vitalício. A sucessão do rei é matéria controvertida na doutrina. Para uns não era nem hereditária nem eletiva. Para outros o rei era eleito pelo Comícios Curiatos, investido pela Lex Curiata de Imperio e confirmado pela actoritas patrum (autoridade dos pais) do Senado. O rei era o chefe da Cidade-Estado, com poderes de comandante do exército, de declarar guerra e fazer a paz, de juiz e sacerdote da cidade, além dos poderes de polícia e de administrador (dispunha do tesouro e das terras públicas). Apesar disso tudo, o poder, de fato, estava nas mãos dos pater-familias, sendo o Senado sua representação máxima. Eram auxiliares do rei: - o tribunus celerum (comandante da cavalaria) - o tribunus militum (comandante da infantaria) - o praefectus urbis (substituto do rei em suas ausências) Nas funções judiciais, era auxiliado: - duumviri perduellionis (nos crimes de lesa-majestado e de traição) - quaetores parricidii (nos homicídios contra um pater-familias) O rei era o protetor da plebe e, às vezes para obter mais poderes, subjugando os pater-familias, buscava nela o apoio necessário. Esses reis, que apoiados pela plebe obtinham poderes ditatoriais sobre o patriciado, eram denominados tiranos. A maioria deles acaba morta pelo patrícios. B- Senado (Senatus) Os Senadores ou pais (patres) eram pater-familias patrícios, escolhidos dentre os chefes das gentes (famílias patriarcais que ocupavam as aldeias) pelo rei. O Senado tinha a auctoritas para aconselhar o rei, quando convocado, e para confirmar as decisões dos Comícios. C- Povo Romano (Populus Romanus) O Povo Romano ou Populus Romanus era uma instituição política dividida em comícios. A princípio havia duas espécies de comícios populares: os Curiatos e Comitia Calata (Comícios Calados) Cada Comício Curiato era composto, ao que tudo indica, de patrícios de cada Cúria (primeiro local de reuniões do Senado romano). Supõe-se, pois, que cada Cúria tivesse o seu Comício. Todos eles se reuniam por convocações do rei, do interrex ou do tribunus celerum. 7 SECAL – FACULDADES SANTA AMÉLIA CURSO DE DIREITO DISCIPLINA: HISTÓRIA DO DIREITO II (DIREITO ROMANO) 2º SEMESTRE A Profª: Fernanda Matos de Oliveira Ao que tudo indica, não tinham os Comícios funções legislativas, mas votavam para confirmar ou não certas propostas específicas sobre casos concretos, apresentados por quem os presidia. Esses casos poderiam se referir aos testamentos, à alteração do quadro de famílias, à declaração de guerra ou a absolvição de algum condenado. Imagina-se que cada patrício votasse individualmente, apurando-se, em seguida, a maioria em cada Cúria. A decisão dos Comícios tinham que ser ratificadas pela auctoritas no Senado. Os Comitia Calata como o próprio nome diz, eles não se pronunciavam. Eram os mesmos patrícios, convocados para serem comunicados de certas decisões de caráter religioso. A plebe não participava de nada disso. Ocorre que, com o passar do tempo, os plebeus começaram a reivindicar direitos, gerando intermitente luta de classes. D- Fontes do direito O direito nessa fase é extremamente ligado a religião. É direito casuístico, empírico, a posteriori, concreto. Casuístico, porque era criado para cada caso concreto. Empírico porque se baseava na observação prática, nada possuindo de científico. A posteriori, porque nascia depois do fato concreto. Finalmente, concreto, uma vez que nada tinha de abstrato, vinculando-se exclusivamente ao caso concreto. Sua principal fonte era os costumes. A doutrina (iurisprudêntia) provinha dos pontífices. Há quem diga que o rei editava as leis, as leges regiae, votadas pelos Comícios e ratificadas pelo Senado. Contudo, não é opinião dominante. 02. Roma Republicana No ano de 509 a.C. os patrícios expulsaram de Roma o último rei Tarquínio, a quem acusaram de estar abusando do poder. Decidiram que Roma não teria mais rei e sim 2 magistrados que se chamavam Cônsules; e assim a Monarquia7 foi substituída pela República. A palavra república vem do latim res publica e quer dizer “coisa pública” ou “coisa do povo”. Ao usarem essa palavra, os romanos queriam dizer que o espaço da política seria “do povo”, e não “ do rei”. A primeira preocupação dos patrícios, ao organizar a nova forma de governo, foi evitar que o poder se concentrasse nas mãos de uma única pessoa. Por isso, o poder foi descentralizado: os vários cargos executivos seriam exercidos por dois 7 Monarquia: é a forma de governo em que o chefe de Estado é um monarca (rei, imperador, etc.). Seu cargo em geral é hereditário (é transmitido para um descendente) e vitalício, ou seja, o monarca permanece no poder enquanto viver. República: é a forma de governo em que o chefe de Estado é eleito para um período de tempo limitado. Mas nem sempre o chefe de Estado é uma única pessoa. Na República romana, por exemplo, eram duas pessoas; na Suíça atual, são sete pessoas. 8 SECAL – FACULDADES SANTA AMÉLIA CURSO DE DIREITO DISCIPLINA: HISTÓRIA DO DIREITO II (DIREITO ROMANO) 2º SEMESTRE A Profª: Fernanda Matos de Oliveira 8 homens, chamados magistrados , eleitos para o período de um ano e sem direito à reeleição. Nos primeiros tempos da República, todas as funções públicas continuavam reservadas aos patrícios. A nova estrutura política republicana estava fundada no Senado, órgão máximo do Poder. O Senado exercia funções consultivas junto aos cônsules e demais magistrados que podiam convocá-lo para fazer consultas. Ratificavam as leis e decisões dos Comícios, utilizando-se para isso da auctoritas patrum (autoridade dos pais). Os Senadores eram chamados de “pais”- patres. O magistrado romano é um órgão da cidade, um titular do poder (potetas); difere assim do magistrado ateniense, que não é afinal senão um agente da assembléia. Esse órgão era assim divididos: - Cônsules: encarregavam-se do Poder Executivo, ou seja, ditavam as leis e em caso de guerra, nomeavam um ditador temporário; - Pretores: administração da justiça, mas não era juiz. Tratava da primeira fase do processo entre particulares, verificando as alegações das partes e fixando os limites da disputa judicial. Feito isso, o Pretor remetia o caso a um Juiz particular para que este julgasse o caso; - Censores: faziam a contagem e a classificação da população por renda (realizava o censo); - Edis: encarregavam-se de cuidar fisicamente da cidade, ou seja, cuidavam das provisões da cidade, velavam pela segurança pública e pelo tráfego urbano, vigiavam aumentos abusivos de preços e a exatidão de pesos e medidas do mercado, cuidavam da conservação de edifícios e monumentos públicos, de pavimentação da cidade, organizavam e promoviam os famosos jogos públicos. - Questores: encarregavam-se do tesouro público, cobravam os devedores e os denunciavam à justiça, seguiam generais e governadores como tesoureiros. As assembléias eram múltiplas, contrariamente a Atenas onde não havia senão uma. A medida que Roma crescia ia se tornando mais poderosa e a diferença entre os patrícios e os plebeus ia se tornando maior. Marginalizados, os plebeus desencadearam uma luta contra os patrícios que se estendeu por II séculos. Os momentos mais importantes dessa luta foram dois: - Em 493 a.C., os patrícios aceitaram que, a partir daquele ano, passassem a existir magistrados especiais para proteger os interesses da plebe. Esses magistrados eram os tribunos da plebe, que tinham poder de veto sobre decisões dos cônsules ou do Senado que pudessem prejudicar os plebeus. As decisões que eles vetassem não poderiam ser colocadas em prática. - Em 450 a.C., os plebeus conseguiram que os patrícios aceitassem as Leis das Doze Tábuas – a primeira versão escrita das leis romanas. Até aquele momento, as leis não eram escritas, sendo conhecidas apenas pelos patrícios, que administravam a Justiça conforme suas conveniências. 8 Indivíduo que possui poder para agir em nome do Estado. Assim, podemos dizer que, no Brasil, o presidente da República é o primeiro magistrado da nação. Também é muito comum, na atualidade, chamar de magistrados os juízes e outras autoridades que atuam no campo da Justiça. 9 SECAL – FACULDADES SANTA AMÉLIA CURSO DE DIREITO DISCIPLINA: HISTÓRIA DO DIREITO II (DIREITO ROMANO) 2º SEMESTRE A Profª: Fernanda Matos de Oliveira Durante esse período os plebeus conquistaram vários direitos: - de eleger seus próprios representantes (tribunos da plebe); - proibir a escravidão por dívidas - igualdade civil, política e religiosa Surgiram novos conflitos sociais, de um lado os patrícios que detinham todo domínio político e do outro toda população querendo participação política. Júlio César foi assassinado nas escadarias do próprio Senado, gerando uma comoção popular e o retorno das lutas sociais que só se acalmou com o surgimento de Otávio que conseguiu derrotar seus rivais e seu auto-intitulou “Augustus” (divino), concentrando os poderes em suas mãos e realizando uma série de reformas no governo. Otávio Augusto inaugurou o IMPÉRIO ROMANO. A-Fontes do Direito O direito na República sofreu enorme revolução. De um direito empírico, causuístico, a posteriori e concreto, passou a ter contornos modernos. Passou a ser um direito mais científico, genérico, abstrato e apriorístico. Científico porque mais bem elaborado (havia leis escritas) e sistematizado. Deixou de ser empírico. Genérico porque se aplicava a vários casos, não sendo casuístico. Abstrato, uma vez que se abstraía do caso concreto, valendo para uma multitude de problemas. Apriorístico porque elaborado antes do fato, deixando de ser a posteriori. As fontes do direito na República eram: - Costumes: um costume só será fonte de Direito, ou seja, só será verdadeiramente costume se nele estiverem presentes o uso (repetição constante de uma prática) e a opinio necessitatis (convicção de que aquele uso tem força de norma jurídica); - Leis escritas. Havia duas espécies: I) Legis rogatae: eram homologadas pelo Senado; II) Leges datae: eram homologadas diretamente pelos Cônsules, sem qualquer votação pelos comícios, nem homologação do Senado. - Senatusconsultos: O Senado podia ser convocado por um magistrado que lhe fazia uma consulta. A resposta vinha em forma de senatusconsultos, uma espécie de parecer senatorial. No início da República não tinham força de lei, apesar de serem fonte normativa, digamos, indireta. Já no fim da República passaram a ter força de lei. Um senatusconsulto famoso é o Senatusconsulto Macedoniano, recepcionado pelo nosso Código Civil. Segundo ele, o empréstimo feito a menor é inexigível. Isso por causa de um tal de Macedo que, segundo consta, teria matado o próprio pai, para herdar e pagar os seus credores que o perseguiam. - Editos dos magistrados: eram normas de caráter administrativo e processual, promulgadas pelos magistrados, normalmente quando assumiam seu cargo. Os magistrados que detinham o ius edicendi. 10 SECAL – FACULDADES SANTA AMÉLIA CURSO DE DIREITO DISCIPLINA: HISTÓRIA DO DIREITO II (DIREITO ROMANO) 2º SEMESTRE A Profª: Fernanda Matos de Oliveira 03. Alto Império ou Principado 3.1.Organização política A- Imperador A palavra “imperador” significava, originalmente, chefe das armas, comandante supremo. O imperador era indicado por seu antecessor, fosse por adoção ou não. Tinha o poder de controlar o Senado, instituir guarda para garantir a proteção e instituir tributos. Augusto acabou com as guerras civis e deu início a um período denominado “Pax Romana”. Reestruturou o Estado: - Reforma econômica: 1. incentivou a produção; 2. protegeu rotas comerciais; 3. dedicou-se as construções; 4. gerou empregos aos plebeus; - Reformas sociais: 1. Acaba com a superioridade dos patrícios trocando o critério do nascimento pelo critério censitário (quantia de renda do indivíduo) 2. Procurando ganhar popularidade adotou a política do pão e circo distribuindo trigo para a população pobre e organizando espetáculos públicos de circo; O imperador detinha a tribunicia potestas o pró-consulado (comando militar de todas as províncias), o direito de declarar guerra e celebrar paz, fundar e organizar colônias, conceder cidadania, convocar o Senado, cunhar moedas, instituir tribunos, administrar, dizer o direito (jurisdição civil em 2 instancia e jurisdição criminal). B-Consilium principis Era composto por Augusto, os cônsules e 15 Senadores. Controlavam as contas apresentadas pelo Senador. C-Funcionários imperiais - Legados de César: governavam as províncias imperiais; - Procuradores de César: arrecadavam tributos nas províncias imperiais; - Prefeito augustal: governador do Egito, instituído por Otávio; 11 SECAL – FACULDADES SANTA AMÉLIA CURSO DE DIREITO DISCIPLINA: HISTÓRIA DO DIREITO II (DIREITO ROMANO) 2º SEMESTRE A Profª: Fernanda Matos de Oliveira - Prefeitos para o Pretório: eram dois ou três e comandavam as tropas imperiais na Itália e em Roma. Comandavam a Guarda Pretoriana (Imperial). Depois foi-lhes atribuída jurisdição criminal na Itália e sua funções civis acabaram por predominar sobre as militares. - Prefeitos para a cidade: função policial e jurisdição criminal em Roma e em um raio de 100 milhas em torno de Roma; - Curadores: para funções específicas, como cuidar das vias públicas ou do abastecimento d`água; D- Magistraturas republicanas - Consulado: perdeu todos os poderes militares e civis. Cargo honorífico; - Censura: deixou de existir sob Domiciano (81 a 96). Seus poderes passam para o imperador; - Questura: suas funções foram reduzidas. Havia dois que secretariavam o príncipe; - Tribunato da Plebe: recebe novas funções administrativas de menor importância (cuidar das sepulturas, por exemplo). E- Senado Os senadores eram nomeados pelo imperador. Eram atribuições do Senado: - eleitorais - administração de províncias senatoriais - administração do erário de Saturno - legislativas F- Comícios Vão perdendo suas funções. Divergência na doutrina. Para Wolkmer os Comícios não tinham funções legislativas, mas votavam para confirmar ou não certas propostas específicas sobre casos concretos, convocados pelo rei. Para John Gilissen os comícios possuem várias funções: - Comícios centuriatos: funções eleitorais e de segunda instância judiciária; - Comícios tributos: funções legislativas 3.2. Fontes do Direito 12 SECAL – FACULDADES SANTA AMÉLIA CURSO DE DIREITO DISCIPLINA: HISTÓRIA DO DIREITO II (DIREITO ROMANO) 2º SEMESTRE A Profª: Fernanda Matos de Oliveira Eram fontes do Direito os costumes, as leis comiciais, os editos dos magistrados, os senatusconsultos, as leges datae, as Constituições Imperiais e as doutrinas. - As leis comiciais eram propostas pelo imperador aos comícios. - Quanto aos editos dos magistrados, pode-se dizer que, no Alto Império, os magistrados republicanos logo perderam o ius edicendi (direito de editar). Os pretores ainda o mativeram por algumas décadas, mas, por fim, se limitavam a copiar o edito de seus antecessores. Adriano, finalmente, encarregou o jurisconsulto Sávio Juliano de fixar e sistematizar em um único texto os editos pretorianos. A obra denominou-se Edito Perpétuo, por ser imutável. A partir daí, os pretores só podiam inovar por solicitação do Imperador ou do Senado. Na verdade, a expressão “edito perpétuo” sempre foi utilizada para identificar o edito anual do pretor. Era promulgado quando o pretor assumia o cargo. Se houvesse necessidade de alguma solução que não estivesse contemplada no edito perpétuo, o pretor publicava um edito especial, chamado de edictum repentinum, ou edita repentino, extraordinário. - Se na República os senatusconsultos não tinham força de lei, sendo apenas resposta do Senado às consultas dos magistrados, no Alto Império passaram a ter força de lei, sendo fonte direta de Direito; - As Constituições Imperiais ou plácida eram leis outorgadas pelo Imperador, em forma de editos, mandatos, rescritos e decretos. Os editos continham disposições de caráter administrativo, principalmente. Eram, mais ou menos, como os editos dos magistrados. Os mandatos eram instruções normativas transmitidas, principalmente, aos governadores e funcionários provinciais. Os rescritos eram respostas a consultas jurídicas dirigidas ao imperador. Os decretos eram sentenças prolatadas em litígios submetidos ao imperador, tanto em primeira quanto em segunda instância. Todas essas constituições tinham força de lei. - A jurisprudência equivalia a nossa doutrina. Diga-se que o imperador podia atribuir a certos juristas o chamado ius respondendi, que conferia a seus pareceres maior força que aos dos demais. Adriano ampliou o ius respondendi não só às consultas sobre casos específicos, mas à obra de alguns jurisconsultos. Assim, eram fonte de Direito, na medida em que vinculavam as decisões judiciais, principalmente se todos os jurisconsultos tivessem a mesma opinião sobre o fato, segundo o Rescrito de Adriano. Normalmente, principalmente após Adriano, o ius respondendi era conferido a penas aos membros do Consilium Principis. 04. Baixo Império ou Dominato Constantino: Constantinopla e Cristianismo 13 SECAL – FACULDADES SANTA AMÉLIA CURSO DE DIREITO DISCIPLINA: HISTÓRIA DO DIREITO II (DIREITO ROMANO) 2º SEMESTRE A Profª: Fernanda Matos de Oliveira Constantino (307-337) deu continuidade às reformas de Diocleciano, mas as estruturas de Roma, no âmbito social, político e econômico, já se apresentavam fragmentadas e enfraquecidas para o enfrentamento da pressão externas que vinha do nordeste europeu, do Oriente Médio e da Ásia. É provável que Constantino seja o mais famoso imperador do Baixo Império. Fundou, em 330 d.C., Constantinopla, antigo Bizâncio, próximo do Mar Negro, transferindo para lá a capital do Império Romano, por julgá-la estrategicamente mais propícia ao comércio e à defesa aos ataques bárbaros. Com a publicação do Edito de Milão em 313, Constantino estabelece a tolerância religiosa e a liberdade ao culto para os cristãos. O imperador seguinte, Teodósio (378-395), outorgou o Cristianismo como religião oficial do império. Teodósio restabeleceu as divisões Império Romano do Ocidente, com Roma como capital, e Império Romano do Oriente, mantendo Constantinopla como capital, que viria a ser o Império Bizantino. 14