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O Pecado de Deus
Por Victor Maristane, em 09/04/09
Através deste mortal fala a entidade até então conhecida pelos cristãos como
Gabriel, o Arcanjo da Esperança, da Anunciação, da Revelação, a Voz de Deus, dentre
outros nomes e títulos que pouco importam, especialmente neste momento. Não trago
boas novas, como sempre fiz, mas sim informações antigas, que, contudo, não deixam
de ser boas, se bem interpretadas. Tentarei ser claro e simplista na linguagem, uma vez
que o poder de compreensão humano acerca das questões divinas provou-se muito
baixo, e é justamente para reparar o dano causado por essa incompreensão que venho
lhes fazer este comunicado.
Contarei uma história, a mais famosa de todas. Entretanto, fá-lo-ei de forma
diferente, fá-lo-ei incluindo um trecho que até então acreditei não ser necessário contar,
já que as mensagens espirituais de tal trecho poderiam ser absorvidas das entrelinhas
das versões oficiais da história, embora pouquíssimos tenham tido a capacidade de fazêlo.
Deus, que nessa época era o Deus dos Judeus, era um Deus de punição e
obediência. Desde o pecado primordial, o Senhor acreditou ter perdido o controle da
humanidade, pensou ter errado severamente ao dar ao homem o livre-arbítrio. Fez,
então, com que Seus sacerdotes e profetas pregassem uma religião rígida. Puniu
austeramente os traidores, blasfemadores e hereges. Não seguir Sua religião tornou-se,
erroneamente, sinônimo de não fazer bom uso do livre-arbítrio.
Um dia Ele percebeu que homens bons eram enviados ao Inferno meramente por
ignorar ou negar Sua religião que, em verdade, já se tornava corrupta e depravada por
conseqüência do tolo conceito de que todos que seguiam e professavam Sua religião
eram bons, quando nem sempre eram. O engano era tremendo, e fez Deus ser tomado de
todos os sentimentos ruins... Mas Ele deveria ser o referencial supremo da bondade. Foi
então que deu início a Seu triste e grandioso plano de redenção da humanidade, que
começa quando Ele próprio resolve descer à Terra.
A alma de Jesus não era unicamente divina, nem unicamente humana, mas um
eterno conflito entre as duas. Isto porque Deus precisava assumir uma existência semimortal, por motivos que serão compreendidos adiante. Deus e Jesus conversavam entre
si mentalmente, e se tratavam como pai e filho.
O dito Filho de Deus pregou a nova filosofia divina, de amor, compreensão, paz
e perdão. Guiado pelo Senhor, tornou-se um revolucionário, criticou severamente a
religião de aparências e hipocrisias que havia se tornado a religião de seu Pai. Ao fim,
foi mandado à cruz pelo próprio povo que o seguiu.
A decepção de Deus foi gigantesca, e foi com toda a tristeza do mundo que Ele
sofreu as mesmas dores de Jesus, e chegaram ambos ao calvário. Lá, conversavam
mentalmente. “Está tudo perdido, meu Pai?” perguntou Jesus, “Minha fé na
humanidade, quase. Tomarei uma ação drástica.” Respondeu o Senhor, e então Jesus
disse em voz alta, no furor da preocupação de que Deus quisesse punir os homens “Pai,
perdoa-lhes, eles não sabem o que fazem!”, ao que Ele respondeu “Hei de perdoá-los,
perdoá-los-ei todos, é para isto que estou aqui, e meu desejo é que este perdão mude a
maneira como crêem em Mim e fazem a Minha vontade, é o meu último recurso.”,
“Pareces fraco, Pai, és mesmo o Deus de que todos falam?”, perguntou Cristo, agora
mentalmente. E Deus respondeu “Preciso que morras com a dúvida para que eu alcance
meu objetivo.”, ao que Jesus, sem mais forças, se conformou e permaneceu em silêncio
por alguns momentos, antes de fechar os olhos e viajar ao Reino dos Mortos.
Subiu aos portões do Céu. Havia uma grande fila de almas, mas que avançava
rápido, havendo as que prosseguiam pelo portão, guiadas por anjos, e outras que
desciam ao Inferno. Chegada a vez de Jesus-Deus, o anjo que catalogava as almas olhou
triste e demoradamente para a alma, que emitia uma discreta aura dourada. Jesus-Deus
então disse, com sua voz dupla, “Faça o que lhe foi pedido.”. O anjo, com isso,
calmamente se pôs a trabalhar, escrevendo e entregando a Jesus-Deus um bilhete onde
se lia, no idioma celestial, “Duvidar do poder de Deus”, e catalogando o nome, o pecado
e o destino da alma em um grandíssimo livro. Um anjo tomou a mão de Jesus-Deus e
um instante e um furacão depois, estavam no Inferno. O anjo subiu novamente aos céus,
e a alma dupla ficou a esperar sua vez na gigantesca fila.
Esta fila também prosseguia rapidamente, mas numa rapidez bruta, impaciente.
Demônios liam os bilhetes e iam guiando, com pressa e violência, os condenados aos
setores onde deveriam cumprir suas eternas penas. O mesmo procedimento não
aconteceu a Jesus-Deus. Os demônios estavam assustados, pois tocar naquela alma os
reduzia a cinzas. “Eu sei que aqueles que duvidaram do poder de Deus vão primeiro ter
com Lúcifer, de onde se decide se serão conselheiros do Inferno, ou se serão jogados
aos sofrimentos eternos como as outras almas. Desconheço, porém, o caminho. Como
não podem me segurar em suas garras e levar-me em vôo ao meu destino, guiem-me e
seguirei caminhando.”
Novo terror se aplacara sobre os demônios. Almas que descem ao Inferno
perdem a capacidade de falar, podem apenas gemer. E aquela não só falava, como o
fazia sem abrir a boca. Um deles, que parecia uma espécie de general, fez sinal para que
Jesus-Deus o seguisse, e em seguida ordenou algo para um dos demônios, que rápido
alçou vôo em direção aos recônditos do Inferno.
O Inferno era uma colossal caverna de gelo. Havia tochas eternas, com flamas
azuis e brancas, em tantos lugares que terminava por ser um lugar claro, o que de
maneira alguma é antitético, até faz mais sentido, visto que, se Deus criou a luz, o lar de
Deus é nas trevas, e a luz é mundana.
A viagem foi longa, e foram vistas almas sofrendo as mais hediondas penas. Os
que abusaram da fraqueza ou ingenuidade dos outros, especialmente pedófilos, eram
sodomizados por demônios de membros gigantes e espinhosos, que das almas saíam
pela boca, ensangüentados e emaranhados em vísceras. Os que viveram uma vida sem
objetivos perambulavam ou rastejavam em eterna insônia, cansados ao extremo, mas
sem poder dormir. Alguns cumpriam penas igualmente angustiantes, mas que não
podiam ser observadas, como os mentirosos, que passavam a eternidade a cair em um
abismo sem fim. Nem seus gritos eram ouvidos.
Enfim, após dantesca jornada, aproximavam-se do trono de Lúcifer. Um largo
lago de gelo semi-circundava o local onde se sentava o Diabo, que seria uma pequena
ilha se um dos lados dela não fosse colado à parede da caverna, a mesma parede na qual
se encostava o trono. O Rei dos Demônios era gigantesco, tanto que, apesar da
distância, podia-se ver seu largo sorriso. O mesmo demônio que o general havia enviado
para avisar Lúcifer vinha voando da semi-ilha, em direção ao general. Ao aproximar-se,
falou-lhe algo, ao que ele fez sinal para que Jesus-Deus seguisse sozinho dali em diante,
e então os dois demônios voaram para longe.
Jesus-Deus deu apenas alguns passos sobre o gelo até surgirem as primeiras
almas. Elas esmurravam o gelo de maneira fantasmagoricamente audível. Era possível
ver-lhes as mãos golpeando o gelo, e por vezes seus rostos, que pareciam gritar a eterna
agonia de se afogar sem morrer, pela qual passavam. Em pouco tempo eram dezenas,
que juntas geravam a sonoplastia de uma chuva de granizo.
Aquela punição seria adequada para os que, em vida, suprimiram ou deturparam
o direito de livre-arbítrio de outrem, concedido por Deus. Porém não o era. Sob aquele
gelo se encontravam os hereges e blasfemadores. Jesus-Deus olhava triste para seus
rostos desesperados, “O Deus do amor”, pensava consigo enquanto caminhava para o
trono de Lúcifer, “O Deus da compreensão, o Deus do Perdão”. As pancadas já eram
milhares, e em quase todo o lago, o som era ensurdecedor e angustiante. Aquela
orquestra de almas fazia a percussão do grande reencontro entre Deus e o Diabo.
“Algo me diz que isto que você está fazendo agora não será acrescentado ao
Pentateuco”, disse o diabo, gigantesco e sempre sorridente, assim que Jesus-Deus pisou
em terra. Havia almas enfileiradas a sua esquerda e direita, seus conselheiros. “Ei, até
que não estou tão mal nisso. Não é nenhum Adão, mas vá lá...” prosseguiu, enquanto
erguia da neve e do gelo mais um demônio, com aparência muito parecida com a sua,
mas em tamanho menor, “Estou repondo os que você pulverizou lá na frente”
completou. As almas paravam lentamente de bater no gelo.
“Estou aqui para propor um acordo”, começou Jesus-Deus calmamente, quando
as almas silenciaram. “Ah, um acordo com o Diabo! Você sempre foi corajoso, hein?”
disse Lúcifer, ao que o semblante triste de Jesus-Deus ganhou um ar de tédio, e Ele
falou “Tu és o exemplo maior do caráter punitivo de minha gerência do universo, e teu
Reino não o é em menor grau.”, “Hum...”, grunhiu o Diabo, parecendo um pouco menos
sorridente agora. “Uma séria mudança é necessária. Meu nome tem sido usado para
dominar as populações sob o interesse de pessoas vis, mas não é a promessa do Paraíso
que controla o povo, e sim o medo do Inferno.” disse Jesus-Deus. Lúcifer prontamente
perguntou “Se você veio aqui para me destruir, por que não o fez ainda?”, mas Ele disse
“Creio ter dito que pretendo fazer um acordo, não uma guerra.” Uma pausa foi feita, até
o Diabo mexer o supercílio e gesticular com a mão indicando que Jesus-Deus
continuasse.
“Tu me odeias com todas as tuas forças, sou teu arquiinimigo. Como se não
bastasse, concedi, há algum tempo, os poderes de Deus e Senhor do Universo ao
Arcanjo Gabriel, o que, creio, desperta tua ira e inveja como nenhuma outra coisa.”, ao
que não se via mais sorriso algum no rosto de Satanás. Jesus-Deus prosseguiu “Quero
que libertes todas as almas do Inferno e elimines todos os teus demônios. Em troca,
ficarei durante toda a eternidade a ser punido por ti das maneiras que desejar.”, o sorriso
do Diabo voltou por um instante, mas apagou-se logo e este disse “A proposta parece
boa, só não entendo por que você simplesmente não explode tudo isto aqui.”, a resposta
de Jesus-Deus foi curta e deprimente, “Porque preciso pagar pelo meu pecado.”
E foi por isso, humanos, que Jesus ficou conhecido por ter ido ao Reino dos
Mortos e redimido a humanidade de todos os pecados. Jesus-Deus pediu ainda ao Diabo
para voltar à Terra e anunciar a grande salvação, momento conhecido como a
Ressurreição.
Ao retornar da Terra, o Inferno estava repleto de anjos, terminando de fulminar
os demônios com suas espadas de luz e de resgatar todas as almas para que subissem
aos Céus. Jesus-Deus foi levado por anjos à presença de Lúcifer, e logo em seguida
pediu a eles que partissem.
“Você riria se eu dissesse que estou sentindo certa compaixão?”, perguntou
Satanás, muitíssimo sorridente, levantando-se de seu trono e agitando um mangual
incandescente na mão direita. Jesus-Deus demonstrou o maior tédio que poderia ser
expresso por um rosto, e o Diabo concluiu “Claro que não, você nunca gostou das
minhas piadas!”, e seu mangual gigante foi de encontro a Jesus-Deus, e um grito ecoou
pelo Inferno vazio.
Espero que, com isso, homens, percebam a grande mensagem da Nova Era
Divina. Nenhum homem é suficientemente mau para ser punido por toda a eternidade e
a nenhum homem é negado o perdão e salvação. Acabem-se as igrejas e os sacerdotes,
pois não são missas e hóstias que elevarão alguém ao céu. Não faz coisa alguma aquele
que conhece as doutrinas, rituais, vestimentas e objetos santos, todos inúteis, de uma
religião que professa a bondade, mas não pratica a bondade ele próprio. Se uma religião
vive de aparências e ritos, é, pois, mais encenação que outra coisa. Que seja feito o bem
pelo bem, sem medo da punição e sem ambição pelo Paraíso, que é de todos. E
silenciadas sejam todas as orações, que a Mim nada seja pedido ou dado, pois tudo já
tenho, e tudo já vos dei. Façam, pois, bom uso do que lhes pertence.
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