CONSIDERAÇÕES GERAIS ACERCA DO PENSAMENTO GEOGRÁFICO DE ALEXANDRE VON HUMBOLDT, CARL RITTER E FRIEDRICK RATZEL Humboldt e Ritter Tematização do espaço terrestre, suas características, variações, acidentes e ocupações humanas. Humboldt (1769-1859) [CAPEL, 1981] Formação científica: empirismo, materialismo, enciclopedismo e ilustracionismo ( século XVIII francês); formação literária: romantismo alemão (Goethe); filosofia: Kant, Rousseau, Fichte, Schelling e Scheiler. - empirismo nos procedimentos descritivos e idealista na explicação. [MORAES, 1996] Influência de schelling: conceito de natureza (harmonia dos seres); de Goethe, a concepção de mundo: estética da natureza. De Rousseau, extraiu a visão de harmonia da natureza somadas as emoções humanas. De Hegel, segundo Moraes, a acepção de totalidade. “A ciência é o espírito aplicado à natureza, mas o mundo exterior só passa a existir para nós no momento em que, pela vida da intuição, se reflete em nosso interior”. Essa teoria do conhecimento faz com que Humboldt, assim como Goethe e os demais citados, valorizem sobremaneira a arte, uma atividade humana que, dada sua característica subjetiva e abstrata, estaria mais apta para falar das analogias e das harmonias morais que ligam o homem ao mundo exterior. Segundo Humboldt, a arte “familiariza os homens com a variedade do mundo e lhes faz sentir mais vivamente o concerto harmonioso da natureza (...) A natureza considerada por meio da razão, isto é, submetida em seu conjunto de trabalho do pensamento, é a unidade na diversidade dos fenômenos, a harmonia entre as coisas criadas, que diferem segundo as formas, a própria constituição e as forças que as animam; é um todo animado por um sopro de vida”. Essa concepção leva a uma postura quse religiosa, de contemplação e adoração da natureza. Diz Humboldt: “A Natureza não perde seu encanto e a atração de seu poder mágico à medida que começamos a penetrar em seus segredos”. Várias passagens da filiação de Humboldt ao idealismo alemão pós-kantiano poderiam ser apontadas em sua idéia de unidade, em sua concepção de movimento, em sua definição de progresso científico, em sua valorização da linguagem e etc. Esta filiação é também explicativa do traço de romantismo contido nas formulações humboldtianas. Esse traço domina totalmente seu estilo ilustrado exemplarmente na seguinte passagem: “muitas vezes a impressão que nos causa a vista da natureza, deve-se menos ao próprio caráter da região do que ao dia em que nos aparecem as montanhas e planuras aclaradas pelo azul transparente dos céus, ou veladas pelas nuvens que flutuam perto da superfície da terra. Do mesmo modo, as descrições da natureza impressionam-nos tanto mais vivamente, quanto mais em harmonia com a nossa sensibilidade; porque o mundo físico se reflete no mais íntimo do nosso ser, em toda a sua verdade. Tudo quanto dá caráter individual a uma paisagem: o contorno das montanhas que limitam o horizonte num longínquo indeciso, a escuridão dos bosques de pinheiros, a corrente que se escapa de entre as selvas e bate com estrépito nas rochas suspensas, cada uma dessas coisas tem existido, em todos os tempos, em misteriosas relações com a vida íntima do homem. Nesta harmonia baseiam-se os mais nobres gozos que a natureza nos oferece”. Humboldt propõe um empirismo raciocinado: fatos submetidos ao entendimento (raciocínio lógico) que compara e combina. A geografia como ciência de síntese: “não há classe específica de fenômenos e sim conexões entre eles e que se manifestam na superfície terrestre” (p. 94). O objeto, neste caso, é a conexão entre os fenômenos e as forças da natureza que se manifestam de modo específico em cada ser. Procedimentos metodológicos: observação, medição e descrição, comparação e generalização. Ritter (1779-1859) Geografia: estudo da superfície terrestre e da atividade humana. Terra: teatro da vida humana. 1. Geografia física, geografia comparada e história Relações entre o meio físico e humano. O território atua sobre os habitantes e os habitantes sobre o território. A preocupação com essas relações se dá em termos de causalidade: por que um fenômeno ocorre de determinada forma e em determinada localização. A ciência da terra – Erdkunde – se dedica a estudar cada parte da terra e cada uma de suas formas, segundo a sua natureza. Ela é comparada no sentido em que outras ciências também tem se dedicado ao estudo do todo e das partes. A geografia, segundo Ritter é uma ciência que procura realizar a mais completa e mais cósmica visão da terra; resumir e organizar uma bela unidade do todo que conhecemos do globo. A geografia é a parte da ciência que estuda o planeta em todas as suas características, fenômenos e relações, como uma unidade independente, e mostra a conexão deste conjunto unificado com o homem e com o criador do homem. Para Ritter o princípio central da geografia é a relação de todos os fenômenos e formas da natureza com a espécie humana. A geografia e história deveriam caminhar juntas. Segundo Ritter, deve-se admitir que as relações homem/meio e as condições próprias de nosso planeta e suas localidades, que evoluem no tempo, no físico e no mental, atuam sobre a humanidade, isto constitui o principal objetivo de estudo da geografia. A idéia de “todo” “O todo geográfico se insere no grande todo da natureza; estritamente interdependente e organizado segundo um princípio de finalidade. Trata-se de um mundo harmônico dado pelo equilíbrio e coesão de suas partes e pela harmonia das relações entre os homens e a natureza”. “Através da atividade racional e da reflexão científica se descobre o lugar do homem no Todo”. A forma da terra e a posição geográfica aparecem como elementos básicos desta configuração da superfície terrestre. Apresenta também as relações numéricas entre os espaços e as formas geométricas, estas permitem obter conclusões sobre o Todo terrestre. Em Ritter as formas geométricas e as relações espaciais eram, sobretudo, um recurso pedagógico que permitia evitar a enumeração detalhada e exaustiva de cada país. Através das formas geométricas e dos números poderia traçar o sistema de relações espaciais. Diz Ritter: “há um número importante de partes e relações fisiograficamente definidas e mensuráveis, elas são necessárias para a compreensão da verdadeira natureza destes espaços, refletem tanto na dimensão horizontal como na vertical”. Ritter analisa as relações entre as formas de vida e o tipo de atividade humana em diferentes classes de terra que os alimentam e tira conclusões sobre o caráter mais ou menos articulado entre território e fatores de desenvolvimento dos povos. O finalismo e o determinismo em Ritter Como bom idealista e fervoroso cristão, Ritter concebia o mundo como sendo organizado segundo um princípio de finalidade e a história como expressão da vontade divina. O determinismo, em Ritter, deriva do ambientalismo da Ilustração e do teleologismo das concepções românticas e idealistas. Ritter buscar descobrir na desordem aparente da natureza a sua ordem subjacente. Ele procura as “infinitas forças em interação”. Essas forças, identificadas como leis cósmicas superiores, explicam a disposição das terras no planeta e, por sua vez, influencia no devir da humanidade. Em relação a Europa, exemplifica: “O mais pequeno dos continentes estava, assim, destinado a dominar os maiores” Método: observação em observação; do simples ao complexo; classificação (semelhanças e comparação); relacionar os meios aos seus contextos históricos; valorizar a intensidade do fenômeno e menos a sua extensão territorial. Geografia: ciência do espaço. Segundo Ritter, “ a ciência geográfica trata essencialmente do espaço, na medida em que se trata de espaço terrestre; se dedica a descobrir como as localidades se repartem umas com respeito a outras no espaço e as relações que mantém, tanto em aspectos particulares como manifestações mais gerais. RATZEL Influência do positivismo comteano e darwinista; a o projeto bismarckiano demandava uma ciência normativa da ação política do Estado.; a unidade nacional passa a ser a unidade do Estado e a tematização do espaço é substituída pela tematização do território – o espaço vital. BIOGRAFIA PONTOS GERAIS - acreditava que a Geografia está a serviço de qualquer outra ciência sem se torna serva; - lutava para encontrar leis e princípios que norteasse a disciplina Geografia, nascente como ciência Moderna; - refletia o espaço do homem de forma sistematizada No primeiro momento classificava os povos em: povos naturais – aqueles que vivem sob o domínio da natureza, dependentes dos recursos ambientais imediatos / povos civilizados – ampliariam o leque dos recursos utilizáveis, efetivando uma relação mais intensa entre a sociedade e seu espaço; as influencias da natureza variam de zona para zona - analisava o homem como um ser terrestre; “O homem é um ser da natureza que possui instintos, necessidades e aptidões.” - defendia o eurocentrismo: “sede dos povos conquistadores é o hemisfério norte e o ocidente, definindo as demais localidades da Terra como área de expansão”. PRINCIPAIS FONTES TEÓRICAS Principais fontes teóricas do pensamento Ratzeliano - no nível do objeto: - a filosofia da história de Herder (a terra enquanto teatro da humanidade) - a geografia comparada de Ritter - no nível do método: - a filosofia positivista de Comte - a ecologia de Haeckel - os estudos de Darwin – a concepção orgânica da terra / planejamento integrado dos fenômenos vitais - Ratzel se preocupa com as relações entre os distintos tipos de organismos vivos entre si e as relações entre estes organismos e o meio ambiente CONTEXTO HISTÓRICO Pontificavam,no âmbito acadêmico alemão, concepções, que limitavam o universo de preocupação geográfico ao domínio dos fenômenos naturais – GERLAND “A terra é um conjunto de matéria em processo de desenvolvimento (...) A tarefa do geógrafo é pesquisar a influencia das forças que operam no material dessa terra, e os resultados da operação de tal força no formato e na modificação desse material”. A geografia assim definida dever ser uma exata ciência física, isto é, uma ciência cujas leis são fixas e exatas. O homem, por conseguinte, deve ser excluído, em parte porque não pode ser tratado por leis exatas, e em parte porque estudos tais como a antropologia, etnologia, geografia histórica, que se relacionam com o homem, não nos ensinam nada sobre a própria terra, e, nos mesmos, a geografia serve apenas como auxílio elucidativo dos dados. A geografia de Gerland consistiu, dessa forma, em uma combinação da geofísica e da geografia física descritiva, incluindo, por estranho que pareça, a geografia das plantas e dos animais. REBATIMENTO Três vertentes: - Geografia Física “Toda Geografia Humana séria e sólida devia fundar-se na Geografia Física” Nelson Werneck Sodré, p. 50 - Biogeografia - Antropogeografia – Relação Homem/Natureza que se alocam os fatores explicativos para entender a Antropogeografia; Para incluir o Homem nas relações com o meio físico, Ratzel dedicou a estudar a influência que as condições naturais exerciam sobre a humanidade, condições que a natureza impõe a História. PRINCIPAIS OBRAS Principal Obra – Völkerkunde (Etnologia – apreciação analítica e comparativa das culturas) - 3 volumes – resultado as experiências e registros com as viagens pela América 1) Antropogeografia: introdução a aplicação da Geografia e da História (1882) - Sociedade / Natureza = a diversidade dos povos junto a diversidade das condições ambientais explicaria o espaço do homem; 2) Antropogeografia: a distribuição geográfica do homens (1891) - A distribuição da sociedade humana sobre o globo – a localização atual dos grupos / áreas originárias e itinerários = oferta de recurso / preocupação com a cartografia - difusão dos povos na superfície terrestre Etnografia: forneceria um quadro da humanidade em todas as suas porções Etnologia: explicitaria as formas de coesão interna de cada grupo Historia: recomporia o movimento dos povos no planeta Geografia: compreenderia as relações que impulsionaram e frearam o movimento dos povos, as trocas que se estabeleceram, entre os homens e os meio naturais e dos espaços que os trafegaram; 3) A Terra e a vida: uma geografia comparada (1901 – 1902) – A formação do território Conceitos chaves: – Território – determinada porção da superfície terrestre apropriada por um grupo humano; espaço que alguém possui / a posse que lhe atribui identidade - Espaço Vital – necessidade territorial de uma sociedade – tendo em vista seu equipamento tecnológico, seu efetivo demográfico, seus recursos naturais disponíveis; Ratzel observa que “entre o movimento da vida, que nunca descansa, e o espaço da Terra, cujo tamanho não cresce, existe um claro contraste: é deste contraste que se origina a luta pelo espaço” Fome, miséria e decadência dos povos primitivos da África, da Ásia e da Oceania é uma conseqüência da oferta disponível de recurso. - Ecúmeno – área geográfica que é permanente habitada pelo homem GEOGRAFIA POLITICA Período Bismarckiano – legitimar o projeto expansionista, seja através da naturalização da guerra e da competitividade entre as nações, seja pela apologia ao Estado; - Geografia Política “todas as condições, portanto, que facilitam a mobilidade dos povos acelera o curso da história;” - expansividade – exaustão do meio/pressão demográfica - isolamento – barbárie/estagnação CRITICA Para alguns historiadores – os escritos de Ratzel denunciavam como um colaborador do determinismo geográfico .... visão equivocada, uma vez que em toda as obras, Ratzel discutia que “ a existência de influencias das condições naturais não implica uma passividade total do elemento humano”, as influencia se põem na forma mediatizada - no indivíduo – como condicionamento somático – anatômicos e como estimulo psicológico; - na constituição social – pelos recursos e riquezas disponíveis; - na constituição étnica – pelas condições de difusão propiciada pelo meio - na organização do trabalho – pelos estímulos e barreiras existentes - na formação dos Estados – pela posição geográfica desfrutada Assim, os condicionamentos naturais são, portanto, atuantes na vida material dos homens através de suas necessidades como recurso (produção e reprodução da vida material do Homem) A crítica as outras ciências - “A geografia do Homem não deve considerar os povos como elementos inertes e muito menos fechados e encerrados em si mesmo”. CONSIDERAÇOES Malinowiski – colocou-o como um dos pioneiros formuladores da teoria difusionista; (Antropologia Social) Mackinder – influenciou-o (Geopolítica) Brunhes na obra – Human Geography – p. 33 sumariou a obra de Ratzel como: “Ratzel viu os homens como realidades que cobrem parcelas da superfície terrestre, vivo revestimento, tão digno da observação do geógrafo como o revestimento vegetal e o repovoamento animal” “viu os grupos humanos ou as sociedades humanas desenvolvendo-se sempre dentro dos limites de certo marco natural, ocupando sempre uma posição precisa no globo e necessitando sempre, para nutrir-se, para subsistir, para crescer, de um certo espaço.