Conceitos-Chave

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texto 11 - Aristóteles, (384/383- 322 a.C.)
“Mais do que ‘o mestre daqueles que sabem’, como o reconhecia
Dante, Aristóteles mereceria ser chamado de o inspirador daqueles que
questionam, em todos os campos do saber, como o fora de seus alunos que
andavam para cá e para lá conversando com ele” (François Stirn)
Conceitos-Chave
Hegel, em sua História da Filosofia, denominou o momento de Aristóteles no
desenvolvimento do espírito ocidental como sendo o do “conceito determinado”. Isto significa que
Aristóteles não é apenas o filósofo de um ou alguns conceitos-chave, mas é o filósofo que instaura a
própria forma da conceituação em filosofia. Assim, até hoje, mesmo sem nunca ter entrado numa
aula de filosofia ou aprendido sequer uma palavra em grego, qualquer homem ocidental, em sua fala
quotidiana, transpira o idioma aristotélico, seja diretamente do grego, quando falamos de: lógica,
ética, física, energia, categoria, gênero espécie, técnica, poética política, fenômeno, dinâmica,
etiologia, teoria, etc. seja, ainda mais, pelas suas traduções e derivações latinas: causa, matéria,
forma, substância, sujeito, acidente, eficiente, essência, potência, ato, etc., etc. De modo que,
diretamente ou via escolástica medieval, o vocabulário aristotélico de há muito transcendeu as
fronteiras das academias. No tocante à filosofia, estritamente falando, é quase impossível dizer uma
frase sem resvalar neste conceituário clássico. Todavia, é possível eleger alguns conceitos-chave em
que se articulam as diversas facetas do pensamento de Aristóteles, e que tornam coerente a sua teoria
em diversos campos do saber. Aqui apresentamos alguns dos mais importantes desses conceitos
transversais. Como são termos que passam por vários campos semântico, próprios a diversas
ciências, nem sempre a tradução pode manter o mesmo termo. Portanto, apontamos, além de
algumas variantes em português, também a expressão em grego (transliterado).
Essência (ou substância) – ousia
É o conceito mais importante para a filosofia aristotélica. O termo já era usado por Platão,
mas neste equivalia à idéia transcendente. Em Aristóteles, a “essência” é o indivíduo, a forma
imanente, o substrato concreto e determinado. Guilherme de Moerbeke traduziu esse conceito por
“substância” e essa tradução entranhou-se, pelo vocabulário escolástico, em toda a metafísica
ocidental. A “essência” é o centro da hierarquia das formas de dizer o ente: é a unidade substantiva
que recebe os “predicados categoriais” (kategoriai), é o “substrato” ou “subjacente” (hypokeimenon)
sobre o qual podem incidir os “acidentes” ou “coincidentes” (synbebekota) não necessários e
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passageiros. A “essência” é o que permanece idêntico ao longo das transformações, salvo na
“geração” – gênesis e na “corrupção” – phthora (quando algo vem a ser, ou deixa de ser, isto que é).
Potência (ou capacidade) - dynamis; e Realização (ou atividade, ato) – energeia
Para dar conta do impasse metafísico da necessidade de determinar a identidade de uma
essência ao longo do movimento de sua realização concreta, e assim permitir a ciência dos entes
naturais, Aristóteles estabelece uma diferenciação fundada no tempo; a “realização” ou”ato” ou
“atividade” é a forma tal como se dá no presente, e a “potência” é a forma determinada futura que é
determinante dos limites de transformação da coisa no presente. Assim, a semente “em ato” (no
presente) é uma árvore “em potência” (posto que sua natureza, vindo a consumar-se no futuro, vai
configura-la como tal). Com isso, Aristóteles pode integrar a semente na totalidade final do ente
árvore e dizer que trata-se de um mesmo ente em momentos diferentes do processo.
Fim (ou meta) – telos
Aristóteles também chama o “fim” pela expressão: o”a-fim-de-que” – hou heneka, e o
considera equivalente ao “bem” – agathon. Como o pensamento de Aristóteles organiza o mundo de
modo teleológico, o fim (telos) é a figura mais importante em todas as suas hierarquias. A idéia de
fim é determinante na ética e na política e identifica-se com a felicidade para o homem. A natureza
de cada coisa é determinada por sua forma consumada e final, chamada de “enteléquia”. Em toda a
natureza há uma orientação para um fim último que é o primeiro motor imóvel divino. Mesmo na
análise dos fenômenos de linguagem, a finalidade é determinante e distingue os diversos saberes:
linguagem para conhecer é estudada na Lógica; discurso para persuadir, na Arte retórica; e para
educar, purgar e agradar, na Arte poética.
Texto extraído de:
SANTORO, Fernando. Aristóteles. In: PECORARO, Rossano (org.) Os Filósofos. Clássicos da
Filosofia. De Sócrates a Rousseau. Petrópolis: Vozes/PucRJ, 2008, p. 72-3.
“A substância, compreendida no sentido mais próprio, em primeiro lugar e por excelência, é o que não
se predica de nenhum sujeito nem se encontra em nenhum sujeito; por exemplo: um homem determinado, um
cavalo determinado... Substância por excelência, porque são o sujeito de todas as outras realidades, e todas as
outras realidades delas se enunciam ou nelas se encontram... Cada substância parece designar um determinado
ser real. É verdade e está fora de discussão que as substâncias primeiras designam um determinado ser real,
porque o que designam é sempre um ser individual e um de número. Das substâncias primeiras, nenhuma é
mais substância do que as outras: assim, um homem determinado não é mais substância do que um determinado
boi...Chamam-se, logo, substâncias segundas as espécies em que subsistem as substâncias primeiras; estas, e
também os gêneros de tais espécies, por exemplo: um determinado homem encontra-se na espécie homem, e o
gênero desta espécie é animal; por isso, dizem-se substâncias segundas, tais como: homem e animal...Entre as
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substâncias segundas, é mais substância a espécie do que o gênero, porque mais perto da substância
primeira”(Categ.c,5,2-3)
“A substância é, pois, o sujeito: sob certo ponto de vista é matéria (chamo matéria aquilo que não é algo
determinado em ato, mas somente em potência); e, sob outro aspecto, é conceito e forma (enquanto sendo algo
determinado, pode-se, mentalmente, considerá-la separadamente); em terceiro lugar, a resultante de ambas, que
só tem nascimento e morte, e é a única que existe separadamente em si mesma.” (Metaf.,VIII,1, l042)
Por isso, se alguém, ao definir o que é uma casa, dissesse que são pedras,ladrilhos e madeiras, diria o
que é a casa em potência, pois tais coisas são a matéria; quem, em compensação, dissesse que é um refúgio de
pessoas e de bens, ou outra coisa semelhante, diria o que é o ato da coisa, e finalmente, quem juntasse uma
coisa a outra, expressaria a substância no terceiro sentido, resultante dos já citados”.(Metaf.VIII,2,1043)
Extraído de:
MONDOLFO,Rodolfo. O Pensamento Antigo. São Paulo, Mestre Jou,1973,p.22-5,v.2.
2. a potência e o ato - as quatro causas
“Enquanto os eleatas, ao negar toda mudança, condenavam sua ciência à esterilidade de uma dupla
proposição “o Ser é, o não-ser não é”, e nada mais podiam fazer para compreender a realidade
sensível, Aristóteles parte da realidade do movimento e se esforça por explicá-lo: é aqui que
intervém a distinção capital entre o Ato e a potência: uma bolota é um carvalho em potência. A
árvore será em ato quando tiver crescido. O mármore existente no estúdio do escultor é uma estátua
em potência. Ele será estátua em ato quando o artista a tiver modelado. Quando eu me instruo,
torno real ou atual um saber que, até então, só era potencial em mim. Entre o ser e o não-ser há,
portanto, um intermediário, a potência. Vale notar que, enquanto alguma coisa de real, a potência só
é concebida em relação ao ser que a completa, em relação ao ato: o devir do mundo aparece,
portanto, a todo momento, como o despertar do que está adormecido, como a incessante atualização
de “potências”.
b) Podemos distinguir a causa material (aquilo de que), a causa formal (aquilo que), a causa eficiente
(aquilo por que), a causa final (aquilo para que). A causa material é aquilo de que uma coisa é feita:
o mármore, por exemplo, é a causa material da estátua, enquanto a madeira o é do plátano. Podemos
observar que a causa material é o princípio que rege os acidentes pelos quais cada indivíduo difere
dos outros do mesmo tipo. Um plátano difere de outro por sua matéria,isto é, pelos acidentes de sua
madeira, uma estátua de Hermes é dissemelhante de outra por sua matéria. É por sua matéria que
Cálias e Sócrates se distinguem e não por sua forma ou essência, a racionalidade, comum aos dois.
Vale notar, igualmente que a matéria é uma potência, é susceptível de receber formas diversas. De
um mesmo mármore o escultor poderá fazer um Deus, uma mesa ou uma pia. No entanto, uma
matéria não pode receber qualquer forma arbitrária. A arte do carpinteiro exige madeira e , diz
Aristóteles brincalhonamente, “não poderia surgir nas flautas”.
A causa formal é o tipo, a essência, aquilo que dá a cada coisa sua forma determinada - em suma, a
Idéia platônica, porém tornada imanente e não existindo fora da substância individual que ela
atualiza. No ser humano, a alma é a forma do corpo, na estátua é a idéia pensada pelo escultor - por
exemplo , a figura de Hermes - que constitui a forma.
c) A causa eficiente é o antecedente direto que provoca uma mudança e, por isso, é o
princípio imediato do movimento. Os golpes do cinzel do escultor, por exemplo, são a
causa eficiente da fabricação da estátua. A causa final é o fim em vista do qual todo o resto
se organiza. O escultor, por exemplo, trabalha pelo dinheiro ou pela glória, ou com o
simples objetivo de concretizar a beleza. Mas compreendamos bem que, para Aristóteles, a
causa final não se encontra apenas nas produções artificiais da arte humana. Ela age
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também na natureza, é ela que orienta as mudanças da glande para a realização da forma
perfeita - o carvalho em ato. Somente que, na arte humana, o fim é exterior ao objeto
modelado, ao passo que na natureza ele é imanente. O fim natural é como uma arte
imanente às coisas, a tendência de uma matéria a se realizar por si mesma numa forma que é
seu próprio desenvolvimento, o seu aperfeiçoamento espontâneo. Para Aristóteles, finalista
convicto, a natureza nada produz em vão”
Extraído de:
HUISMAN,D. e VERGEZ, A.História dos filósofos ilustrada pelos textos. Rio de Janeiro: Freitas Bastos,
1980. p.45-48.
Leituras sugeridas:
BARNES, Jonathan. Aristóteles. São Paulo:Loyola, 2000 (Mestres do Pensar)
CAUQUELIN, Anne. Aristóteles. Rio de janeiro: Zahar, 1995.
CRESSON, André. Aristóteles. Lisboa: Edições 70.1983
ERLER, Michael; GRAESER (orgs.). Fílósofos da Antiguidade. Dos primórdios ao período clássico. São
Leopolodo: Unisinos. 2003 (História da Filosofia)
FARIA, Maria do Carmo Bettencourt de. Aristóteles: a plenitude como horizonte do ser. São Paulo, Moderna,
1994.
GUTHRIE, W. K.C. Os filósofos gregos de Tales a Aristóteles. Lisboa: Presença, 1987.
JAEGER, Werner. Aristoteles: bases para la historia de su desarollo intelectual. Mexico: fondo de Cultura
Economica. 1995.
JORDI, Cortés Morató;Antoni Martínez Riu. Diccionario de filosofía en CD-ROM. Herder: Barcelona, s/d.
McLEISH, Kenneth. Aristóteles. A poética de Aristóteles. São Paulo: Unesp, 2000 (Grandes Filósofos)
PECORARO, Rossano (org.). Os Filósofos. Clássicos da Filosofia. Petrópolis: Vozes/PucRJ, 2008.
PHILIPPE, Marie-Dominique. Introdução à Filosofia de Aristóteles. São Paulo: Paulus, 2002.
REALE, Giovanni. História da Filosofia Antiga. São Paulo: Loyola. 1994, v.2.
_______. Introduccion a Aristoteles. Barcelona: Editorial Herder, 1985. (Biblioteca de Filosofia, 16)
______. Metafísica. São Paulo: Loyola, 2002, 3 v.
STIRN, François. Compreender Aristóteles. Petrópolis: Vozes, 2006
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