Análise Jurídica da Economia Sérgio Mourão Corrêa Lima Professor da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG - Brasil Professor Visitante no Departamento de Direito Mercantil da Universidade de Valencia – Espanha (2009-2010) Doutor pela Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG - Brasil Pós-Doutor pela Universidade de Alcalá de Henares – Espanha Indicado pelo Brasil como Expert para o mecanismo de solução de controvérsias do Mercosul Advogado sócio do Escritório Osmar Brina Corrêa Lima – Advogados Associados Problemas atuais do Mercado Financeiro 1. Ausência de legislação sistêmica sobre o mercado financeiro (Projeto de Código Empresarial); 2. Falta de balizas para os entes reguladores e fiscalizadores (cujos agentes não tem responsabilidade pessoal por seus atos); 3. Concentração de várias atividades, envolvendo diversos “fundos” nas mãos de diferentes sociedades, mas integrantes dos mesmos Grupos empresariais. Legislação empresarial ineficiente A legislação empresarial em vigor tem vários problemas a serem superados. Na parte geral, diversos contratos bastante comuns não mereceram a devida atenção do legislador, como aqueles celebrados no âmbito de shopping center. No Direito societário, o Código Civil transformou a sociedade limitada em instituto complexo e burocrático, incompatível com o pragmatismo próprio das atividades empresariais. Até mesmo no campo das companhias, a legislação precisa de ajustes, para se adequar ao tempo das pequenas e médias sociedades anônimas fechadas, absorvendo as orientações mais modernas ditadas pelo Superior Tribunal de Justiça, como quanto ao livre direito de retirada. Também os complexos e fraudulentos processos de “blindagem patrimonial” precisam de resposta firme da lei, tal como vem cuidando de fazer a jurisprudência do STJ, por meio do instituto da extensão dos efeitos da quebra. São diversos os títulos que não merecem tratamento definido, seja pelo Direito cambial, seja pelas regras de obrigações. O lobby dos bancos, por ocasião da edição da lei 11.101/2005, fez surgir o instituto da cessão fiduciária de títulos de crédito, que vem comprometendo, senão inviabilizando, a recuperação de empresas no Brasil. Em todos estes setores, há modificações a serem feitas. Ausência de capítulo dedicado ao Mercado Financeiro No campo do Mercado Financeiro, é pior: não há um conjunto de normas organizadas e coerentes. Por exemplo, o contrato de depósito bancário, instituto nada recente, não mereceu disciplina própria; tampouco as controvérsias acerca da incidência e cumulação de encargos no contrato de mútuo, que abarrotam o poder judiciário com milhões de demandas, foram superadas por meio de texto legislativo. Neste contexto, tramita nas duas casas do Congresso Nacional, um Projeto de Código Empresarial, cuja conformação inicial foi de autoria do Prof. Fábio Ulhoa Coelho, que não contempla capitulo dedicado a traçar os Princípios gerais e as regras básicas do Mercado Financeiro. Sugestão de capítulo dedicado ao Mercado Financeiro Estas noções fundamentais de teoria geral do Estado e de Na UFMG, um grupo de mestrandos e mestres, doutorandos e doutores, vinculados à linha de pesquisa em Análise Jurídica da Economia, estão trabalhando para apresentar à comissão de especialistas nomeada pelo Senado Federal uma minuta de capítulo versando sobre as atividades desenvolvidas no âmbito do Mercado Financeiro. O trabalho já contempla sugestões muito interessantes, como: • referência à moeda escritural, que hoje supera em muito, na quantidade, a moeda real. Trata-se de bem incorpóreo, que circula apenas por meio eletrônico, mas que consiste em “substituto monetário perfeito”; • a identificação das diversas espécies de instituições financeiras, com vedação expressa a que financiem campanhas políticas e eleitorais, de qualquer natureza; • a polêmica vedação à cumulação das diferentes atividades financeiras por sociedades vinculadas ao mesmo Grupo empresarial, o que fragiliza o sistema, compromete a livre concorrência e propicia a manipulação do mercado; • a vedação à aquisição, por parte dos entes públicos, empresas públicas ou sociedades de economia mista, financeiras ou não, de participação minoritária e sem poder de controle, em instituições financeiras de qualquer natureza, com revogação expressa do disposto no artigo 2o da Lei 11.908/2009, que permitiu que a CAIXAPAR adquirisse participação acionária no PANAMERICANO e que o BB comprasse ações do Banco VOTORANTIM; • a previsão de que as orientações do Comitê da Basiléia de Supervisão Bancária, depois de incorporadas ao ordenamento jurídico nacional por ato do Conselho Monetário Nacional, tenham aplicabilidade direta, imediata e obrigatória no território brasileiro; • a definição dos encargos e da forma de sua incidência, nas diversas espécies de depósito bancário de de mútuo contratados com os bancos; • a obrigação de pronta restituição do dinheiro sempre que solicitado pelo depositante-correntista, sob pena de restar configurado o crime de apropriação indébita; • a disciplina do contrato de conta-corrente bancaria; • a disciplina dos títulos e valores mobiliários que podem ser emitidos pelos bancos para captação de recursos (operações passivas); • limites rigorosos para o empréstimo de dinheiro para pessoas vinculadas ao mesmo grupo empresarial, impostos inclusive e principalmente ao BNDES, de modo a reduzir a discricionariedade na concessão do dinheiro, como ocorreu nas privatizações e no caso das empresas X (Eike Batista); • a disciplina dos fundos, inclusive os de investimentos, sob os aspectos subjetivo e objetivo; • a disciplina do fundo para restituição do dinheiro dos depositantes-correntistas, inclusive para vedar a concessão de empréstimos como aqueles celebrados com a SILVIO SANTOS (inicialmente) e com o BTG/PACTUAL (posteriormente); • a previsão do direito do depositante-correntista à restituição de seu dinheiro nos casos de recuperação judicial e falência de instituição financeira. Análise Jurídica da Economia Este é o papel da Análise Jurídica da Economia, linha de estudos criada por oportunidade de estudos de pós-doutoramento, desenvolvidos na Espanha, com bolsa da CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, orgão do Ministério da Educação do Brasil, entre 2009 e 2010. A análise jurídica da economia é o contraponto à análise econômica do Direito. Esta, já conhecida e muito válida, cuida de enxergar a justiça com os olhos da eficiência e da conveniência econômica. Aquela, inédita e igualmente necessária, consiste em observar a economia na busca do que é admissível, justo, correto e equilibrado. O mais importante na vida e no mundo são as pessoas, em torno delas e para elas se voltam todos os ramos da ciência. Direito e economia não fogem à regra; ambos devem zelar pela segurança, tranquilidade e felicidade das pessoas, individualmente e em coletividade, em qualquer tempo e de todas as formas. A história, contudo, revela que Direito e economia, quase sempre desconectados, têm falhado na estruturação de sistemas monetários sólidos e confiáveis, suficientes a evitar que uns, os mais favorecidos, se aproveitem de outros, que não tiveram as mesmas oportunidades em sua formação. O modelo econômico atual, marcado por sucessivas crises, têm conduzido as pessoas a “perdas” e “sofrimento”, em diferentes países e tempos. Simultaneamente, sem resistência firme, lúcida e fundada de economistas e juristas, a indústria (produção) e o comércio (circulação) de bens e serviços também vem cedendo espaço para as atividades meramente especulativas (especulação), em evidente prejuízo da “função social” da economia e do “pleno emprego”. A reversão deste panorama desolador depende de estudos sólidos: (1) que envolvam análise conjunta da economia e do Direito; (2) que analisem tanto a Doutrina clássica quanto a moderna; (3) que não se impressionem com indicadores econômicos momentâneos e artificiais: O crescimento econômico exagerado e desequilibrado, que geralmente provoca euforia momentânea e satisfação com os governantes da época, pode se tornar insustentável, além de provocar crise e gerar sofrimento, se não houver proporcional poupança e investimento das pessoas e dos governos; (4) que percebam a estreita conexão entre decisões e atitudes isoladas (micro) com o contexto maior (macro): Tal como há o ponto de conexão entre a micro e a macro economia, há ocasiões nas quais uma decisão singular (micro Direito) serve de pilar, de base, de alicerce para fixar o padrão ético, moral e jurídico da coletividade de pessoas (macro Direito). Portanto, há momentos em que o Direito é muito maior do que um caso ou uma decisão; mas confunde-se com o destino ou com o futuro. (5) que estejam comprometidos com o bem de todos, em detrimento dos interesses de poucos: A economia somente pode seguir até os limites que lhe sejam impostos pelo Direito. Os estudos econômicos acerca do Direito são vários e amplamente conhecidos. Os esforços dos juristas sobre a economia são mais raros; e quanto à moeda e aos sistemas financeiros, pode-se dizer quase inexistentes. Estes temas são abordados em obras relacionadas às ciências econômica e da administração. Poucos ou nenhum são os trabalhos voltado à análise jurídica da economia, da moeda e dos sistemas financeiros, tendo o Direito e a justiça como preocupação. O ineditismo e a falta de esforços anteriores são, simultaneamente, a maior dificuldade e a principal razão deste estudo: a Análise Jurídica da Economia.