Acidente Vascular Cerebral Aline Ferrari Martins Bruno de Souza Mendes Cintia Junko Oshiro Gabrielle Paulo Sérvio da Silva Felipe Ferreira Lima Ambulatório Neurovascular – Prof. Dr. Milton Marchioli Definição: OMS: desenvolvimento rápido de sintomas/sinais clínicos de um distúrbio focal (ocasionalmente global) das funções cerebrais, com duração superior a 24 horas ou que conduzam a morte, sem outra causa aparente para além da vascular. Epidemiologia AVC é a 3ª maior causa de morte natural na população adulta no mundo. Atinge 16 milhões de pessoas ao redor do mundo a cada ano. Dessas, seis milhões morrem. Cerca de 85% ocorre em países não desenvolvidos ou em desenvolvimento e um terço deste eventos atinge pessoas economicamente ativas. Epidemiologia AVC é a 1ª maior causa de morte natural na população adulta no Brasil. No Brasil, são registradas cerca de 68 mil mortes por AVC anualmente (2012). Taxas de incidência no Brasil variam entre 137 e 168 por 100.000 habitantes. Epidemiologia Distribuição: 85% isquêmicos e 15 % hemorrágicos. Mortalidade nos primeiros 30 dias após o AVC isquêmico é de aproximadamente 10%, sendo principalmente relacionada à seqüela neurológica, podendo chegar a 40% ao final do primeiro ano. Maioria dos pacientes que sobrevivem a fase aguda do AVC: 70% não retomaram o seu trabalho e 30% necessitaram de auxílio para caminhar. Fatores de Risco Não Modificáveis: Idade: A incidência dobra a cada década após os 55 anos. Sexo: maior prevalência para o sexo masculino. Raça: predominância em negros. História Familiar: paterna ou materna. Fatores de Risco Modificáveis: Hipertensão Arterial: alta prevalência. Diabetes Mellitus: susceptibilidade à aterosclerose das artérias coronárias, cerebrais e periféricas. Dislipidemia: importante cardiopatia isquêmica. fator de risco relacionado à Presença de doença cardiovascular prévia: fibrilação atrial. Obesidade: associação ao diabetes mellitus e à dislipidemia, constituindo frequentemente a Síndrome Metabólica. Fatores de Risco Tabagismo: efeito causal direto e associado a outros fatores de risco. Ingestão abusiva de álcool. Sedentarismo. Contraceptivos orais: principalmente se relacionados a eventos trombóticos prévios ou tabagismo. Estenose Carotídea Assintomática: risco anual de AVC é de 3,2% nos pacientes com estenose entre 60 a 99%. Anatomia Divisão anatômica do SNC: Central: encéfalo e medula. Periférico: nervos espinhais e cranianos, gânglios sensitivos, SNA, receptores sensoriais e plexo entérico. Cérebro: telencéfalo + diencéfalo Tronco cerebral: mesencéfalo + ponte + bulbo. Divisão funcional do SNC: Motor: função motora somática e visceral. Sensitivo: função de decodificação e interpretação de estímulos originados em órgãos somáticos e viscerais. Integrativo: integração sensorial e motora, interpretação e elaboração de comandos motores. Medula espinhal Encéfalo e Nervos Cranianos Cérebro: Telencéfalo: NC I. Diencéfalo: NC II. Tronco encefálico: Mesencéfalo: NC III e IV. Ponte: NC V, VI e VII (VI e VII em ponte e bulbo). Bulbo: NC VIII, IX, X, XI (XI em bulbo e medula) e XII. Encéfalo e funções Lobo frontal: Processamentos complexos (cognição, planejamento e iniciação de movimentos voluntários). Lobo parietal: Área de projeção e processamento somestésico. Lobo occipital: Área de projeção e processamento visual. Lobo temporal: Área de projeção e processamento auditivo. Encéfalo e funções Telencéfalo: Núcleos da base: motricidade somática voluntária. Diencéfalo: Tálamo: retransmissão cerebral sensorial, motora e límbica. Hipotálamo: coordenação das funções autonômicas neuroendócrinas, expressão das emoções. Epitálamo: integração de funções olfativas. Tronco encefálico: Possui núcleos para controle de pulso, respiração e PA. Envolvimento no nível de consciência Cerebelo: Coordenação motora e planejamento dos movimentos. e Suprimento Sanguíneo Círculo cerebral/de Willis: Anastomose importante na base do cérebro entre as 4 artérias (vertebrais e carótidas internas). Permite que o sangue chegue a áreas em que houve oclusão de uma artéria maior, por meio de circulação colateral. Suprimento Sanguíneo Artérias carótidas internas: Circulação anterior do encéfalo. Originam as artérias cerebrais anterior e média. Artérias vertebrais: Circulação posterior do encéfalo. Originam a artéria basilar (tronco encefálico). Termina dividindo-se em artérias cerebrais posteriores. Artérias cerebrais: Anterior: maior parte das faces medial e superior do cérebro e o polo frontal. Média: face lateral do cérebro e o polo temporal. Posterior: face inferior do cérebro e o polo occipital. Patogênese do AVC AVC Isquêmico: Oclusão aguda de uma artéria intracraniana (território carotídeo ou vértebro-basilar), levando à isquemia seguida de infarto da região nutrida por ela. Aterotrombose: formação de trombo sobre placa de ateroma na própria artéria. Embolia: formação de trombo à distância, que se desloca na direção do fluxo sanguíneo e oclui uma artéria de menor calibre. Patogênese do AVC Os subtipos etiopatogênicos incluem: Cardioembólico. Aterotrombótico: Grandes e médias artérias. Pequenas artérias. Arterioembólico. AVCI Cardioembólico A condição mais associada é a fibrilação atrial (risco médio de 5% ao ano) e pode variar de acordo com a presença de fatores de risco: Idade superior a 65 anos. HAS e DM. Disfunção do ventrículo esquerdo. Cardioembolia prévia. Doença mitral reumática. Valva protética. Origem do trombo: átrio esquerdo, ventrículo esquerdo e valvas. Artérias mais acometidas: artéria cerebral média e seus ramos. AVCI Aterotrombótico De grandes e médias artérias: Ocorre em indivíduos acima dos 50 anos, com fatores de risco para aterosclerose, tabagismo e síndrome metabólica. Artéria mais acometida: Artéria carótida interna (após bifurcação). Origem da artéria cerebral média. Artéria vertebral distal. Artéria basilar proximal. Território mais acometido: artéria cerebral média. AVCI Aterotrombótico De pequenas artérias (AVC lacunar): Decorrente da obstrução de pequenas artérias penetrantes. O processo envolvido pode ser trombo ou lipo-hialinose (depósito de material lipídico hialino). Territórios mais acometidos: Cérebro: cápsula interna, tálamo e gânglios da base. Tronco encefálico: base da ponte. AVCI Arterioembólico Ocorre pelo destacamento de um fragmento de trombo carotídeo, o qual segue o fluxo sanguíneo até se alojar em um ramo arterial. AIT Ataque isquêmico transitório (AIT) é um evento agudo de isquemia não associada a infarto cerebral. A duração média do déficit neurológico varia de 10 a 15min. Existem 3 mecanismos propostos para explicar o AIT. AIT AIT de baixo fluxo em grandes artérias: Associado à estenose grave das artérias extracranianas. Geralmente, os déficits neurofisiológicos são efêmeros, repetindo-se semanalmente, diariamente ou até no mesmo dia. AIT embólico: Ocorre quando a fonte (a. carótida, a. vertebral ou coração) mandam pequenos êmbolos, os quais se alojam em um vaso à distância e, depois, se pulverizam e dissolvem pelo sistema trombótico endógeno. AIT lacunar: Gera baixo fluxo por isquemia cerebral nos territórios nutridos pelas pequenas artérias perfurantes. AVCH Pode ser classificado em: Hemorragia intraparenquimatosa. Hemorragia subaracnoide. AVCH Hemorragia Intraparenquimatosa: Hipertensia: degeneração das paredes arteriais perfurantes, levando a pequenas roturas, e formação de falsos microaneurismas que podem romper. Angiopatia amiloide: microdepósitos de beta-peptídeos amiloides em pequenas artérias corticais, os quais causam fraqueza da parede arterial e rompimento. Outras causas: TCE, sangramento tumoral, drogas (cocaína e anfetamina), transformação hemorrágica do AVCI. AVCH Hemorragia Subaracnoide: Causa mais comum entre indivíduos de 30 a 65 anos é a rotura de aneurisma sacular (dilatações segmentares de uma artéria intracraniana). Formam-se na vida adulta e o risco de rotura é diretamente proporcional ao tamanho (risco alto > 10mm). Está frequentemente associado ao esforço físico ou ato sexual. Diagnóstico Anamnese: Fornece indícios quanto ao local e gravidade de um AVC. O aspecto mais importante a se identificar na suspeita de AVC é o momento do início dos sintomas: nas primeiras 4,5h, o paciente deve ser tratado como emergência aguda, podendo-se evitar sequelas. Os pacientes podem estar confusos, ansiosos ou afásicos e não se lembrarem da duração dos sintomas: tentar associar o início dos sintomas a eventos cotidianos (almoço, jantar, programa de TV). Evolução e sintomas relacionados: fraqueza, dormência, dificuldade para falar, para entender o que os outros falam, para andar, para enxergar com um ou ambos os olhos, cefaleia. Fatores de risco e histórico de doenças cardiovasculares ou cerebrovasculares. Diagnóstico Exame neurológico: Eficaz para iniciar uma avaliação diagnóstica e costuma ajudar a localizar o ponto da lesão. Exame cardiovascular: Deve ser medida a pressão arterial em ambos os membros superiores: pressões alteradas podem indicar obstrução vascular. Hipertensão arterial consequente de um AVC: pode levar à insuficiência cardíaca. Pulsos: podem revelar arritmias, como a fibrilação atrial, que podem causar embolia cerebral. Sopros cardíacos: podem também ocasionar embolia cerebral. Sopros das carótidas: podem ser produzidos por doença aterosclerótica das artérias, associadas a AVCs embólicos e trombóticos. Diagnóstico Exame Laboratorial: Exame de sangue: hemograma completo, contagem de plaquetas, glicemia, tempo de protrombina e tromboplastina parcial, colesterol. Eletrocardiograma: verificar possibilidade de AVC embólico. TC: pode ser normal nas primeiras 3 a 24h; a hipodensidade é detectada com mais facilidade após 24h nos grandes infartos. Apresenta hiperdensidade nos casos de hemorragia intracraniana, e pode ser identificada já no início do quadro. RM: mais sensível do que a TC para isquemia precoce. Angiografia Cerebral: fornece imagens de alta qualidade dos vasos. AVCI e Manifestações Clínicas Artéria carótida interna: Clinicamente silenciosa se o polígono de Willis estiver completo; semelhante à artéria cerebral média; cegueira ipsilateral (variável). Artéria cerebral anterior: Hemiparesia contralateral; hipoestasia (pior no membro inferior); incontinência urinária; abulia; afasia com perda da fluência verbal, mas preservação da capacidade de repetir. Artéria cerebral média: Hemiparesia contralateral; hipoestasia (pior no membro superior e na face); hemianopsia homônima ipsilateral; afasia de expressão (dominante) ou anosognosia e desorientação espacial (não dominante); quadrantanopsia inferior contralateral. AVCI e Manifestações Clínicas Artéria cerebral posterior: Hemianopsia homônima contralateral ou quadrantanopsia superior; hemianestesia contralateral completa; comprometimento da memória; dislexia; discalculia. Artéria vertebral: Náuseas; vômitos; nistagmo; ataxia ipsolateral (tipo cerebelar); ptose e miose ipsolateral; diminuição da sudorese; perda ipsolateral de dor facial e sensibilidade térmica. Artéria Basilar: Paralisia ou paresia de todas as extremidades e dos músculos bulbares; comprometimento da visão com variadas falhas no campo visual; ataxia cerebelar bilateral; variados achados sensitivos (normal à anestesia total). AVCH e Manifestações Clínicas Hemorragia Subaracnoide: Manifestações clínicas: cefaleia grave, focal ou generalizada, acompanhada de náuseas e vômitos; PA elevada; irritação meníngea; fotofobia. Complicações clínicas: novo sangramento, com repetição de um aneurisma não reparado; vasoespasmo, que pode produzir infarto do cérebro, em artéria diferente da responsável pelo sangramento; hidrocefalia; crises convulsivas. AVCH e Manifestações Clínicas Hemorragia Intracerebral: Manifestações clínicas: anormalidades neurológicas não diferem das causadas por AVCI; nas hemorragias, como o sangramento continua, pode haver perda progressiva da função neurológica, enquanto que nos AVCI podem permanecer estáticos. Hemorragias maciças no putâmen: letárgicos ou comatosos minutos a horas depois do inicio; paresia contralateral; hemianopsia contralateral; paresia do olhar (desvio do olhar para o lado da hemorragia). Hemorragias cerebelares: cefaleia occipital; marcha instável; ataxia; náuseas; vômitos. Hemorragias talâmicas: perda de consciência; hemiparesia contralateral; déficits sensitivos e hemianopsia homônima. Hemorragia pontina: coma; vômitos; tetraplegia. Diagnóstico Diferencial de AVCI Enxaqueca: Hemiparesia ou outros déficits focais. Crises Convulsivas: Paresia e hipoestesia. Hiper e Hipoglicemia: Déficits neurológicos focais. AVC hemorrágico: Sintomas muito similares do isquêmico, uma TC pode diferenciá-las. Tratamento Os pilares do tratamento são a possibilidade do uso de trombolíticos e a internação dos pacientes em Unidades de Tratamento de AVC. A penumbra isquêmica (exame de imagem) representa a região sem dano neuronal em que o fluxo sanguíneo cerebral encontra-se entre o limiar de falência elétrica e o limiar de falência energética e colapso da bomba iônica. A penumbra pode evoluir para uma área de infarto em torno de 2 a 3h. Salvar a área de penumbra isquêmica é o objetivo principal no tratamento agudo do AVC, aliando-se a manutenção das condições hemodinâmicas com a busca da rápida canalização do vaso. Trombólise Endovenosa Critérios de inclusão para uso de rtPA (ativador de plasminogênio tecidual): AVCI em qualquer território encefálico. Possibilidade de iniciar a infusão do rtPA dentro de 4,5h do início dos sintomas. TC ou RM sem evidência de hemorragia. Idade superior a 18 anos. Otimização Fisiológica da Homeostase Monitoramento cardíaco/respiratório. Pressão sanguínea. Equilíbrio de fluidos e eletrólitos. Metabolismo de glicose. Temperatura corpórea. Disfagia e nutrição. Prevenção e Tratamento Complicações Infecção pulmonar. TVP. ITU. Broncopneumonia. Úlceras de decúbito. Convulsões. Edema cerebral. de Prevenção Secundária Visa prevenir rescidiva de AVCI: Identificação etiológica do AVC. Identificação e controle dos fatores de risco. HAS: Normal ou limítrofe (até 139/89mmHg): MEV, associando medicação se tiver fatores de risco com lesão em órgão alvo, DM ou DCV; I (140-159/90-99mmHg): MEV até 12 meses, associando medicação na presença de lesão em órgão alvo, DM ou DCV; II (160-179/100-109mmHg) e III (maior que 180/110mmHg): MEV e tratamento medicamentoso. Prevenção Secundária Os medicamentos de escolha são os diuréticos (clortalidona), beta bloqueadores (atenolol), IECA (ramipril e perindopril) e inibidores do receptor de angiotensina 1 (canderartan citexetil). Dislipidemia: Uso de estatinas, artovastatina. principalmente sinvastatina e Fibrilação atrial: Fator de risco mais importante para o AVC cardioembólico. Uso de warfarina (inibidor da vitamina K). Mostrou-se melhor que a aspirina e o risco para hemorragia é menor que o fator protetor. Prevenção Secundária Estenose carotídea: Benefício maior na endarterectomia em relação a terapia medicamentosa. Antiagregante plaquetário: AAS: na fase aguda de 200 a 500mg por dia. Na prevenção secundária, de 50 a 325mg por dia. Clopidogrel 75 mg, sem associações. Dipiridamol 400 mg associado com aspirina de 50 mg A escolha depende do custo-efetividade, efeitos colaterais, tolerabilidade e respostas terapêutica.