Slide 1 - ICArabe

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As raízes otomanas do Oriente Médio moderno
Arlene Clemesha, 8 de junho de 2010
História Árabe de 1516 a 1918?
• Maioria das terras árabes governadas por Istambul
• Autores e livros antigos ignoram o período
O estado otomano, nos seus primórdios:
-pequeno principado na Anatólia ocidental, um de vários sultanados turcos, da
desintegração do impérios dos seljuquidas;
-1281, o líder turco Ertoghrul foi sucedido pelo seu filho, Osman;
-justificaram suas conquistas considerando-se como ghazis: pela extensão dos
territórios islâmicos, o Dar al-Islam;
-minorias cristãs e judaicas: dhimmis, protegidos pelo império e com liberdade
de culto.
Dois fatos mudaram sua natureza:
1.
a conquista de Constantinopla em 1453, que se tornou a nova
capital, Istambul. A partir de agora este seria um dos maiores
estados na porção ocidental do mundo muçulmano;
2. a ocupação ao sul de outro grande estado islâmico ocidental, o
estado mameluco de Egito e Síria, em 1516-17;
a partir disso, a ocupação do Hejaz, do Iraque (1638, disputada pelos
safavidas) e do norte da África até a Argélia.
Mapa antigo da expansão do Império otomano, 1481-1683
fonte: Acervo digital da Universidade de Texas
O império otomano adquire uma
natureza específica e complexa:
• Em primeiro lugar, era um estado familiar: onde a
lealdade recaía sobre uma família, os descendentes de
Osman (mais do que sobre qualquer membro
individual, e onde a família como um todo exercia a
soberania);
• Em segundo lugar, era um estado turco, empregava
símbolos turcos (como rabos de cavalos, marca de
patente no serviço imperial), e utilizava a língua turca:
na corte, burocracia e exército;
• Árabes não exerciam poder político direto a serviço dos
otomanos.
Ilustração de oficiais janissários
Campos de ação e ascensão social
árabe:
1.
2.
3.
•
•
•
•
A hierarquia religiosa fornecia o campo de ação;
A língua da teologia e do direito era o árabe;
Abaixo dos postos mais elevados como do qadi (extraído das escolas
imperiais de Istambul ou das famílias tradicionais turcas) havia outros
postos nas capitais de província ocupados por árabes locais: os muftis
(jurisconsultos) das várias escolas legais, os charifs ou descendentes
do profeta, a única aristocracia de sague reconhecida;
Eram geralmente homens das antigas famílias de notáveis árabes (a’yan, intermediários, em geral leais ao sultão);
Com uma tradição de aprendizado e liderança, algumas das quais remontavam ao período anterior aos otomanos;
Mobilizavam a opinião pública através das preces, de lideranças de bairros e de organizações populares;
Finalmente, o que estes faziam nas cidades, outras lideranças árabes podiam fazer no campo: shaikhs de tribos
beduínas, lideranças hereditárias de comunidades das montanhas ou senhores de castelos. “
Assim como os notáveis urbanos, exerciam um papel ambíguo: reconhecidos pelo governo otomano de uma
forma ou de outra, incorporados ao sistema administrativo ou fiscal, geralmente não tentavam remover a
soberania otomana, mas resistindo interferência demasiada em seus distritos ou no seu governo sobre os
mesmos.
O império não era turco no sentido racial:
“Ao longo da história islâmica,
sempre houve uma consciência das
diferenças entre árabes, persas e
turcos (...) Mas que nunca foi uma
distinção profunda o suficiente para
destruir a consciência do que tinham
em comum enquanto islâmicos;
efetivamente, era uma distinção
lingüística e cultural e não uma
diferença racial”.
Um súdito do sultão que não falasse
turco não estaria excluído da
comunidade política a não ser
possivelmente nos últimos anos do
império.
Ascensão, estagnação e crise
• 1520 a 1639: O “ressurgimento do poder
muçulmano” (o Império Otomano, o Estado safávida
na Pérsia, e o império mughal na Índia);
• Séculos XVII-XVIII: estagnação e crise no Império
Otomano (enfrenta o poderio naval da Espanha e
das cidades-estado italianas no Mediterrâneo, e
contra Portugal no Mar Vermelho e Golfo Pérsico);
Aparentemente invencível e imortal, o império otomano viu-se,
ao final do século XVIII, varrido por derrotadas militares
e começa e se desintegrar:
• 1669: a última conquista otomana, aquela da ilha de
Creta, foi seguida de uma longa guerra contra estados
europeus, que terminou numa paz desfavorável em
1699;
• 1774: a Criméia foi perdida para os russos, deixando
clara a inferioridade militar dos turcos;
• 1798: a invasão Napoleônica do Egito só foi repelida
mediante uma aliança com ingleses e russos (a partir
desse momento, os embaixadores europeus começam
a exercer seu papel na política de Istambul);
• 1820-30: independência da Grécia;
Mapa antigo do desmembramento do Império Otomano a partir de 1683
Fonte: Acervo eletrônico da Universidade do Texas
Resposta otomana
• Reformas de modernização e redefinição das
relações imperiais entre governantes
otomanos e seus sujeitos:
Modernização esta que será tanto um projeto
de resistência à dominação européia, quanto
um projeto de poder no interior do próprio
império.
Decreto Gülhane (emitido pouco após a morte de
Mahmud II em 1829):
• dissolução do velho (janissários) e criação de um novo
exército com serviço militar obrigatório e instrutores
europeus;
• a intenção era não apenas restaurar a força do
governo, mas organizá-lo de um novo modo: ao lado
da charia, decreta-se a necessidade de uma nova
legislação:
“...nos últimos 150 anos, devido a uma sucessão de causas difíceis e
diversas, a sagrada charia não foi obedecida...”
(Hourani. 2001: 277)
Tanzimat (1839-1876)
“Ordenação”, ou reorganização:
• exército moderno
controle central
nova
administração e lei secular ; burocracia conciliar;
• novos ideais: cidadania, igualdade; idéia de
civilização, de um modo de vida racional, ativo,
progressivo, auto-determinante, moderno;
“Por trás destas idéias mestras havia uma outra, a da
Europa como exemplo de civilização moderna e do
Império otomano como seu parceiro” (Hourani. 2001:
278).
Uma frágil combinação de forças?
• sultão que queria poder absoluto;
• burocracia que queria regulação e restrição do poder por princípio;
• os ulama, que tinham aceitado e justificado a reforma, tornaram-se hostis
na medida em que ela avançou para além das suas expectativas e
ameaçava a vigência da lei islâmica;
• viam-se contestados pela criação de novos códigos legais e tribunais.
• alguns oficiais avançaram a idéia de governo constitucional;
• uma constituição vigorou durante alguns anos na década de 1870;
• nas províncias, alguns dos governadores mais poderosos puderam realizar
sua própria versão das tanzimat – e como as suas regiões eram menores e
mais compactas- com mais sucesso: Tunísia sob os Beys e Egito sob
Muhammad Ali tornaram-se virtualmente independentes (15).
• ruptura veio sob Abdulhamid II no final do século
Reações no sec. XIX
• o deslocamento da economia,;
• perda de poder e influência de elementos tradicionais;
• sensação de que o mundo do Islã era ameaçado de fora:
•
•
•
•
resultou em vários movimentos violentos contra as novas políticas;
contra a crescente influência da Europa;
contra os cristãos que lucravam com ela;
na Síria e no Líbano: auge em 1860: guerra civil no Líbano e
massacre de cristãos em Damasco;
• intervenção de potências estrangeiras e criação de um regime
especial para o monte Líbano;
Ou seja, a guerra civil no Líbano foi uma das primeiras reações de
cunho violento a essa irrupção de poder da Europa sobre os
domínios otomanos.
Duas mudanças importantes na ordem social
(que perduraram):
-integração ao sistema mercantil europeu (produzindo os
bens primários e importando manufaturados) cria novo tipo
de mercador vivendo da importação-exportação com a
Europa – europeus primeiro, cristãos orientais e judeus nas
camadas inferiores;
-novo grupo de proprietários de terras - através da
concessão de terra pelo governante ou o registro em seu
nome de terras do estado;
Mundança intelectual:
• novas escolas de ensino fund., médio e superior;
• escolas para moças;
• introdução de casas de imprensa e de jornais de opinião (Al-ahram,
1875);
• tradução de livros do inglês e francês;
• novas publicações, ênfase na nova literatura em língua árabe;
• entre funcionários, oficiais, professores, e mercadores, surgiram
novas idéias de como a sociedade deveria se organizar,
particularmente um sentimento de lealdade nacional;
• sérvios e gregos, depois romenos e búlgaros criaram seus próprios
estados-nação;
• logo armênios criaram seu movimento nacional, depois os
próprios turcos, e outros povos muçulmanos, árabes, albaneses e
curdos.
Modernistas islâmicos
• Jamal al-Din al-Afghani (1839-97)
• Muhammad Abduh (1849-1905)
• Rashid Rida (1865-1935)
Dominação européia, comercial e militar:
•
•
•
•
1830, Argélia (acima mencionado);
1881, Tunísia;
1882, britânicos no Egito;
1912, italianos na Líbia;
•
•
•
•
bancos europeus;
comerciantes europeus;
concessionárias nas construções públicas;
‘proteção’ européia a comunidades religiosas (França/católicos,
Rússia/ortodoxos);
• escolas das missões (freqüentadas por muçulmanos bem como cristãos e
judeus).
“Em algumas partes, as esferas de influência foram definidas antes mesmo
de 1914: franceses na costa síria, ingleses no sul do Iraque. Quando o
império ruiu após 1918, o fez em parte sobre linhas já demarcadas”.
Características comuns entre países do Oriente Médio:
podem ser explicadas pelo fato deles terem sido governados por tanto tempo pelo império
otomano;
Muito daquilo que os diferencia:
pode ser explicado pelas diferentes formas com que emergiram do império otomano.
Tunísia e Argélia:
a conexão otomana fora enfraquecida antes da chegada dos franceses;
a colonização européia mudou a estrutura social a tal ponto que pouco restou do passado otomano
Em Tripoli:
a dominação italiana chegou num momento em que o retorno da constituição (1908) e a melhora
nas comunicações reforçavam os laços com o império;
havia certo sentimento pró-otomano;
No Egito:
situação mais complexa;
Muhammad ‘Ali era, em certo sentido, um governador de província na tradição otomana, com todo
poder em suas mãos e reunindo ao redor de si oficiais e funcionários turcos;
os britânicos, a partir de 1882, governavam uma aliança frágil, com palácio e corte ainda turcos em
larga medida;
O nacionalismo egípcio estava voltado principalmente contra os britânicos, sem deixar de expressar
suas vertentes anti-turcas (portanto contra a casa turco-egípcia de Muhammad Ali) e contra os
proprietários de terras.
Árabes na Síria, Iraque e regiões ao redor, situação mais complexa,
com elementos de atração e repulsão das elites:
• inserção dos notáveis no sistema otomano no final do século XIX
- seus filhos passaram a ingressar no serviço imperial otomano, civil
ou militar, através das escolas profissionalizantes e após a
restauração da constituição em 1908, exerceram papel importante
na política otomana.
- tampouco podiam ser indiferentes à reivindicação califal do sultão,
ao fato dele representar a última encarnação da grandeza do Islã.
• Mas o crescimento do elemento nacional turco dentro do governo
otomano afastava os árabes, que encontraram no nacionalismo
árabe um novo meio de expressar sua insatisfação.
A I Guerra Mundial e a Revolta Árabe
• I guerra mundial: momento de maior desgaste das relações árabeturcas;
• a revolta árabe contra o domínio otomano;
• mas, na visão de alguns autores, muitos dos que se juntaram à
revolta árabe lamentavam a quebra da unidade do império e dos
povos islâmicos, muitos mais tarde se arrependeram de o terem
feito, e mesmo após a separação final, o legado otomano
permaneceu;
• a primeira geração de nacionalistas árabes trouxe ao movimento a
memória da unidade otomana, além de um estilo característico de
fazer política e o fato da maioria pertencer às mesmas famílias de
notáveis, de oficiais e servidores otomanos.
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