Cartas Apostólicas ou Católicas Introdução Após as epístolas paulinas, o Segundo Testamento tem sete epístolas conhecidas como apostólicas ou católicas, isto é, universais. O primeiro destes nomes vem do fato de elas terem sido escritas por apóstolos, e o segundo porque elas não foram dirigidas a determinada comunidade, como é o caso das epístolas paulinas, e nem a pastores, como as duas dirigidas a Timóteo e a endereçada a Tito, mas para as comunidades em geral. PRIMEIRA, SEGUNDA E TERCEIRA CARTAS DE JOÃO As cartas de João (fim do séc. I) dirigem-se às comunidades cristãs da Ásia Menor que passavam por séria crise provocada por tendências gnósticas que faziam uma interpretação espiritualista do Evangelho. Nelas apareceram também divisões nas comunidades: grupos religiosos diferentes, cristãos e não cristãos, sobretudo gnósticos. As cartas reagiram fortemente contra isto e elaboraram uma síntese da mensagem cristã. Há muitas semelhanças entre as Cartas e o Evangelho de João, mas há uma mudança de foco: os “judeus”, que eram os adversários principais do 4o Evangelho estão ausentes e a atenção se concentra nos enganadores que se separaram da comunidade, chamados “anticristos”. Alguns temas comuns Há muitas semelhanças. Vejamos apenas alguns traços do “discurso de despedida” de Jesus em João presentes em 1Jo: O Pai ama aquele que crê (Jo 14,21;1Jo 4,16) Permanecer em Deus (Jo 15,4; 1Jo 3,24) O dom do Espírito (Jo 14,16-17; 1Jo 4,13) O testemunho do Espírito que é a Verdade (Jo 15,26; 1 Jo 5,6) Perdão dos pecados (Jo 15,3; 1Jo 1,9) A “justiça” (Jo 16,10; 1Jo 2,29) A vida eterna (Jo 17,3; 1Jo 5,20-21) Amar a Deus é cumprir os mandamentos (Jo 15,10; 1 Jo 5,2) O mundo não conheceu a Deus (Jo 16,3; 1Jo 3,1) Rejeitar o comportamento do mundo (Jo 15,18-19; 1Jo 2,15) Algumas diferenças O Prólogo de João enfatiza a encarnação do Verbo. O Prólogo de 1 Jo fala da palavra (mensagem) de vida, que foi vista, ouvida e tocada – a trajetória humana de Jesus 1Jo atribui a Deus qualidades que o evangelho confere a Jesus. Ex: Deus é Luz (1Jo 1,5; Jo 8,12;9,5) / Deus dá o mandamento do amor mútuo (1Jo 4,21; 2Jo; Jo 13,34) Não aparece o termo Paráclito, mas sempre Espírito. Em 1Jo 2,1 Jesus é o Paráclito As 7 Igrejas da Ásia Menor no final do séc I, destinatárias do Apocalipse O Apocalipse é dirigido às “sete Igrejas da Ásia” (1,3;23). São sete comunidades cristãs dessa província, cuja metrópole é Éfeso. Por causa do número sete, que indica plenitude, e do caráter simbólico da linguagem desse livro, supõe-se que seja dirigido a toda a Igreja. As Igrejas da Ásia, destinatárias das Cartas, são todas aquelas situadas nessa mesma Província. As Igrejas da Ásia Menor no final do séc I Contexto Histórico: Expansão das comunidades no final do séc. I Contato dos cristãos da Ásia Menor com tendências helenizantes e gnósticas: Convicção de que o mundo material é fruto da degradação de um ser divino. Dualismo entre o mundo material e o mundo espiritual. Os seres que vivem aprisionados no corpo nesse mundo decaíram do ser divino. Os Gnósticos menosprezam a matéria e a carne e superestimam o espírito. A matéria é má, radicalmente oposta ao espírito e um impedimento para a salvação Recusa do Deus Único, pois na visão dualista, Deus não poderia ter criado um mundo onde existe o mal. Por isso tem que haver dois princípios criadores: um para o bem e outro para o mal (dualismo cósmico). Expectativa de um ou vários redentores cuja tarefa não é a de salvar, mas a de iluminar os gnósticos na descoberta de sua identidade divina. A salvação é conseguida pela evolução a um estágio superior de conhecimento que libera o espírito-alma da prisão desse corpo e o eleva à Plenitude. PRIMEIRA CARTA O DINAMISMO DA FÉ E DO AMOR 3 CHAVES DE LEITURA DE a 1 Jo 1) A cristologia (questão central) A personagem principal de 1 Jo é Jesus Cristo (o Jesus Histórico). O texto não trata da Encarnação, mas da confissão de que em Jesus Deus se revela a nós, isto é, não se diz que Deus vem no homem, mas que a partir desse homem podemos ver Deus. Em Jesus, esse homem concreto, Deus se manifesta, se torna visível. Jesus é um ser humano como nós, mas é o Filho de Deus. Quem vê isso recebe a comunhão com Deus. Os adversários negam a origem divina de Jesus e recusam-se a confessar que Jesus tem Deus por Pai. “… porque a vida se manifestou, e nós a vimos; damos testemunho e vos anunciamos a vida eterna, que estava no Pai e que se manifestou a nós; o que vimos e ouvimos nós vos anunciamos…” (1,23) 2)O Antidocetismo A tendência gnóstica se manifesta na Comunidade do Discípulo Amado na forma de uma heresia chamada Docetismo. Os docetas afirmam que se Jesus era Deus, seu corpo real só podia ser astral, celeste. Seu corpo humano era aparente. Em grego, aparência = dokesis Docetistas = aqueles que acreditam que o corpo humano de Cristo era só aparente. Jesus era uma espécie de divindade fantasiada de homem. Assim, Cristo era verdadeiro Deus mas não um verdadeiro homem. Os docetas esvaziam a realidade histórica de Jesus e negam a Encarnação. Para eles, o anúncio de Deus feito homem e morto na Cruz era escandaloso. Se o filho de Deus tinha uma condição humana aparente, des-historizada, se ele não assumiu nossa carne, então a carne humana não foi salva. Em resposta aos docetas, Santo Irineu afirma que a carne é o gonzo (o eixo) da salvação. O Concílio de Nicéia (325 d.C.), com Irineu, afirma que Jesus é verdadeiro Deus e verdadeiro homem. “ Todo espírito que reconhece que Jesus Cristo veio na carne é de Deus; todo espírito que não reconhece Jesus não é de Deus” (1Jo 4,1-3) “ Porque muitos sedutores que não reconhecem Jesus como Messias encarnado espalham-se pelo mundo” (2Jo 7) 3) Antropologia O cristão, desde já, é filho de Deus, nasceu de Deus (3,1-2) e nisso se baseia seu amor aos outros filhos de Deus (5,1). Na medida em que vive a filiação divina e permanece em Deus pode até se tornar incapaz de pecar (3,1; 5,18), embora na realidade todo ser humano seja pecador (1,8-10) “Considerai com que amor nos amou o Pai, para que sejamos chamados filhos de Deus. E nós o somos de fato. Por isso, o mundo não nos conhece, porque não o conheceu. Caríssimos, desde agora somos filhos de Deus, mas não se manifestou ainda o que havemos de ser. Sabemos que, quando isto se manifestar, seremos semelhantes a Deus, porquanto o veremos como ele é” (3,1-2). Esclarecendo alguns termos joaninos Carne: refere-se ao ser humano em sua temporalidade, fragilidade, precariedade, exterioridade, com suas possibilidades e seus limites (sarx). Chamar o ser humano de carne não significa opô-lo a Deus, mas dizer que na sua finitude ele não é como Deus. A cobiça da carne significa que o ser humano pode desejar ser como Deus e passar dos limites de sua condição de criatura. Mundo: pode ser a humanidade como destinatária do amor de Deus (Jo 3,16) ou o lugar onde se manifesta a dominação de potências hostis à soberania divina, que se fecham a Deus e a Cristo (Jo 1,10; 1 Jo 2,16). A exortação a não amar o mundo levou a muitos mal-entendidos. João não quer dizer que o mundo é mau e deve ser desprezado. Não amar o mundo significa que não se deve compactuar com as forças inimigas de Deus presentes e atuantes na história. Justiça: justiça se opõe ao pecado. O pecado é obra do diabo. Assim, se alguém pratica a justiça, esse nasceu de Deus. O conteúdo da justiça é o mandamento do amor (3,10). Praticar a justiça é agir como Jesus (3,7). Injustiça: no contexto da referência ao pecado esse termo não indica a falta de justiça entre os seres humanos como uma falta entre outras. Na Escritura significa a hostilidade radical contra Deus que leva a todos os pecados (iniquidade). É a oposição à verdade que leva à incredulidade. Estrutura da Carta Trata-se de uma meditação apaixonada sobre a autenticidade cristã, expressa em termos de amor e de fé. Divide-se em três partes que, de modo cada vez mais aprofundado, desenvolvem o tema de fundo de João: conhecer os critérios da verdadeira comunhão de Deus com o ser humano. Esquema 1,1-4 Prólogo = Um anúncio autêntico 1,5-2,28 Primeira Parte = A comunhão com Deus: Caminhar na luz 2,29-4,6 Segunda Parte = A comunhão com Deus: Viver como filhos de Deus 4,7-5,13 A comunhão com Deus: Viver de fé e de amor Prólogo - Um anúncio autêntico (1,1-4) Explica o ponto de partida e a intenção da carta, introduzindo o leitor diretamente no coração da comunidade cristã, que vive na própria experiência as dificuldades em relação à fé em Cristo. “O que era desde o princípio, o que temos ouvido, o que temos visto com os nossos olhos, o que temos contemplado e as nossas mãos têm apalpado no tocante ao Verbo da vida porque a vida se manifestou, e nós a temos visto; damos testemunho e vos anunciamos a vida eterna, que estava no Pai e que se nos manifestou -, o que vimos e ouvimos nós vos anunciamos, para que também vós tenhais comunhão conosco. Ora, a nossa comunhão é com o Pai e com o seu Filho Jesus Cristo. Escrevemo-vos estas coisas para que a vossa alegria seja completa” (1,1-4). Primeira Parte - A comunhão com Deus: Caminhar na luz (1,5-2,28) 1,5-2,2 Caminhar na luz Deus é luz e nele não há trevas (1,5) Quem está na luz se reconhece pecador (1,6-10) Cristo, vencedor do pecado (2,1-2) 2,3-11 Observar os mandamentos: AMAR A autêntica experiência de Deus (2,3-6) Amor: síntese de todos os mandamentos (2,7-8) Ódio e amor (2,9-11) 2,12-28 Proclamar a própria FÉ A vitória dos crentes (2,12-14) Os crentes e o mundo (2,15-17) A última hora e os anticristos (2,18-21) A fé, sinal dos verdadeiros crentes (2,22-25) Permanecer firmes na verdadeira fé (2,26-28) “Eis a mensagem que ouvimos dele e vos anunciamos é esta: Deus é luz e nele não há treva alguma. Se dizemos ter comunhão com ele, mas andamos nas trevas, mentimos e não seguimos a verdade. Se, porém, andamos na luz como ele mesmo está na luz, temos comunhão recíproca uns com os outros, e o sangue de Jesus Cristo, seu Filho, nos purifica de todo pecado. Se dizemos que não temos pecado, enganamo-nos a nós mesmos, e a verdade não está em nós. Se reconhecemos os nossos pecados, Deus aí está, fiel e justo para nos perdoar os pecados e para nos purificar de toda iniqüidade” (1,5-9). Deus é Luz A imagem da luz, pela qual Jesus se designa no evangelho como portador da verdade (Jo 8,12), na Carta aplica-se a Deus, fonte da revelação e por isso mesmo de toda santidade cristã. Falar de luz a propósito da divindade era comum no pensamento religioso daquela época. Mas o misticismo pagão buscava aproximar-se do reino da luz pela iluminação interior, o êxtase ou a iniciação ritual, enquanto João afirma que o cristão anda na luz porque Deus é isento de trevas. Segunda Parte - A comunhão com Deus: Viver como filhos de Deus (2,29-4,6) 2,29-3,10 Justiça, sim; pecado não Somos filhos de Deus (2,29-3,3) Quem é nascido de Deus não peca (3,4-10) 3,11-24 O imperativo cristão: AMA teu irmão Quem não ama está na morte (3,11-18) Quem crê e ama confia em Deus (3,19-24) 4,1-6 A FÉ em Cristo: sinal do Espírito de Deus “Pois esta é a mensagem que tendes ouvido desde o princípio: que nos amemos uns aos outros. Não façamos como Caim, que era do Maligno e matou seu irmão. E por que o matou? Porque as suas obras eram más, e as do seu irmão, justas. Não vos admireis, irmãos, se o mundo vos odeia. Nós sabemos que fomos trasladados da morte para a vida, porque amamos nossos irmãos. Quem não ama permanece na morte. Quem odeia seu irmão é assassino. E sabeis que a vida eterna não permanece em nenhum assassino. Nisto temos conhecido o amor: Jesus deu sua vida por nós. Também nós devemos dar a nossa vida pelos nossos irmãos” (3,11-16). O amor em obras e verdade Esta expressão joanina indica dois aspectos essenciais do amor: para ser autêntico, deve traduzir-se em atos concretos; mas só será verdadeiramente cristão se prolongar na vida concreta da pessoa o amor de Deus manifestado em Jesus Cristo (3,16). Tal amor é portanto a própria expressão da fé e da verdade no ser humano (2Jo 1-2). Amar assim é ser da verdade (3,19). A comunhão com Deus: Viver de FÉ e de AMOR (4,7-5,13) 4,7-21 Na fonte do AMOR Deus é amor (4,7-10) Quem ama vive em Deus (4,11-16) Quem ama não teme (4,17-21) 5,1-13 Na fonte da FÉ A vitória do cristão (5,1-5) O testemunho de Deus (5,6-9) Quem crê no Filho tem a vida (5,10-16) 5,14-21 Exortação final que resume a carta “Caríssimos, amemo-nos uns aos outros, porque o amor vem de Deus, e todo o que ama é nascido de Deus e conhece a Deus. Aquele que não ama não conhece a Deus, porque Deus é amor. Nisto se manifestou o amor de Deus para conosco: em nos ter enviado ao mundo o seu Filho único, para que vivamos por ele. Nisto consiste o amor: não em termos nós amado a Deus, mas em ter-nos ele amado, e enviado o seu Filho para expiar os nossos pecados. Caríssimos, se Deus assim nos amou, também nós nos devemos amar uns aos outros. Ninguém jamais viu a Deus. Se nos amarmos mutuamente, Deus permanece em nós e o seu amor em nós é perfeito”. (4,7-12) Deus é Amor Ao dizer que Deus é Amor (4,8.16), o autor não pretende dar uma definição abstrata do ser divino, mas afirmar que Deus se revelou em seu Filho como o Deus que ama (4,9-11). Esse amor que se manifestou na história da salvação revela ao mesmo tempo o amor do Pai por seu Filho (cf. Jo 3,35;5,20;10,17;15,9;17,26). Para João todo amor vem de Deus (4,7) e reflete entre nós a própria vida da Trindade. Graças à fé, os cristãos conhecem esse amor de Deus que se manifestou a nós (3,16). (2) A comunhão (1) A comunhão (3) A comunhão com Deus: viver com Deus: com Deus: Viver como filhos de Caminhar na Luz de fé e de amor Deus Caminhar na Luz Justiça sim; pecado não Na fonte do AMOR Observar os mandamentos: AMAR O imperativo cristão: AMA teu irmão Na fonte da FÉ Proclamar a própria FÉ A FÉ em Cristo: sinal do Espírito de Deus Exortação que resume a carta SEGUNDA CARTA AMAR NA VERDADE Chave de Leitura: o contexto Os destinatários são comunidades da Ásia menor distantes do centro. A divisão ainda não chegou até lá, mas os pregadores “avançados” (separatistas) estão a caminho (1011). Eles negam que o homem Jesus seja o Messias enviado por Deus e descartam o mandamento do amor mútuo, rompendo assim a comunhão com Deus. O Ancião escreve a essas Igrejas alertando-as sobre o perigo. Enfatiza o mandamento do amor (5-6) e condena os mentirosos, chamados de anticristos, que negam que Jesus veio na carne (7). Instrui a comunidade – Senhora eleita e seus filhos – a não recebê-los em casa (casa-igreja) (10). Esquema 1-3 Saudação e augúrio inicial 4-6 Exortação ao amor mútuo 7-11 Alerta contra os anticristos 12-13 Conclusão e saudação final “Muito me alegrei por ter achado entre teus filhos alguns que andam na verdade, conforme o mandamento que temos recebido do Pai. E agora rogo-te, Senhora, não como quem te escreve um novo mandamento, mas sim o que tivemos desde o princípio: que nos amemos uns aos outros. Nisto consiste o amor: que vivamos segundo seus mandamentos. É este o mandamento que tendes ouvido desde o princípio, e segundo o qual deveis viver.” (4-6) TERCEIRA CARTA REALIZAR O BEM NA VERDADE Chave de Leitura: o contexto O Ancião com certeza é o responsável pelas comunidades da Ásia Menor e encontra oposição de Diótrefes, bispo de uma Igreja local que se mostra autoritário. O Ancião enviou alguns missionários itinerantes, mas Diótrefes não lhes permitiu acesso à comunidade. Agora os reenvia, pedindo ajuda a Gaio, cristão exemplar da comunidade e seu amigo. Demétrio, portador da carta, provavelmente é o líder do grupo missionário. Alude a temas teológicos importantes: cristão é aquele que caminha na verdade; há uma profunda relação entre revelação e conduta honesta de vida; fazer o bem na verdade é viver em comunhão com Deus e ser seus colaboradores. Esquema 1-2 Breve saudação 3-8 Hospitalidade é obra de fé. Elogio a Gaio 9-11 É um mal não ser hospitaleiro. Crítica a Diótrefes 12 Elogio a Demétrio 13-15 Conclusão “Alegrei-me muito com a vinda dos irmãos e com o testemunho que deram da tua verdade, de como andas na verdade. Não tenho maior alegria do que ouvir dizer que os meus filhos caminham na verdade. Caríssimo, fazes obras de fé em tudo o que realizas para os teus irmãos, mesmo para os irmãos estrangeiros. Estes, perante a comunidade, deram testemunho do teu amor. Farás bem em provê-los para a sua viagem, de um modo digno de Deus. Pois por amor do seu nome partiram, sem nada receber dos pagãos. Devemos, portanto, receber a tais homens, para cooperar com eles pela verdade.” (3-8) ABERTURA 1 Professamos a Fé repetidamente, mas, muitas vezes, não vivemos uma fé descorporalizada. Na verdade, as heresias continuam latentes no ar que respiramos. No século I os cristãos são tentados a anunciarem o Cristo Deus esquecendo-se de que ele é um homem real, de carne e osso. Esta tendência doceta está presente em nossa prática, quando buscamos o miraculoso e o espetacular em um Cristo todo divino, desconectado da realidade humana. Falamos com entusiasmo de seus milagres, do poder de curar e expulsar demônios, mas não nos comprometemos com a construção da fraternidade na história. O que fazemos, na prática é, diante do Reino de Deus, escolher Jesus só Deus, sem Reino. Muitas vezes somos cristãos com roupagem de místicos, mas alienados, que não queremos nos encarnar nas misérias da história. Como os docetas, na prática, negamos a humanidade sofredora do Senhor. ABERTURA 2 Uma religiosidade típica de nossos tempos é a Nova Era, que vê Deus totalmente imanente nas criaturas. A pessoa pode evoluir gradativamente na divindade, mediante progressiva iniciação gnóstica do estado de consciência, pois sua alma imortal conserva as qualidades divinas. Para voltar à divindade, da qual caiu, só precisa trabalhar para desenvolver seu estado de consciência e atingir a consciência cósmica que se identifica com o divino. Consequentemente, na religião da Nova Era não há lugar para um Deus Pessoal, nem para a Graça, nem para a Revelação. Não há como conceber Deus como alteridade comunicativa, e nem que Deus Pai envie seu Filho para assumir nossa história, pois dá-se uma fusão da criatura com um divino impessoal. Também não há lugar para a comunidade eclesial, para normas éticas universais ou para qualquer tipo de compromisso. Cada um faz aquilo que achar melhor para chegar à divindade. ABERTURA 3 Em nossa vida de comunidade há muita gratuidade e serviço. Mas não podemos negar que há também muita falta de diálogo, autoritarismo, falta de acolhida. Quantas vezes topamos com líderes comunitários que são “donos da comunidade”, “donos da verdade”!. Quantas vezes falta amor concreto em nossas comunidades, falta perdão, falta escuta… Bibliografia BROWN, R. Introdução ao Novo Testamento. São Paulo: Paulinas, 2004. BERGANT, D. – KARRIS, R (Org). Comentário Bíblico – vol. 3. São Paulo: Loyola, 1999. DEHANDSCHUTTER, B. – KAHMANN, J. – THEVISSEN, G. As cartas de Pedro, João e Judas. São Paulo: Loyola, 1999. FRANGIO, H. História das heresias. São Paulo: Paulus, 1995. ZEVINI, J. Uma comunidade que ama. São Paulo: Salesiana, 1987. Bíblia TEB. São Paulo: Loyola, 1994. Bíblia de Jerusalém. São Paulo: Paulus, 2002.