República Populista (1930 - 1964) 1. O Conceito de Populismo O populismo foi um regime político e também pode ser visto como uma ideologia que caracterizou diversos países da América Latina no período entre guerras. O populismo marcou um período de transição entre uma sociedade agrária e rural para uma sociedade urbano e industrial, na qual o operariado passou a ser reconhecido com um agente social. 2. Características a) O Estado de Compromisso Diferente do Império e da República, períodos em que fica claro o controle hegemônico de uma classe ou fração de classe sobre o poder político, no populismo diversos setores da sociedade se opuseram, por razões distintas, à República Oligárquica, mas nenhuma fração de classe controlou o poder político. Desta forma houve um vazio de poder, um vácuo de poder. O Estado se colocou acima das classes sociais buscando satisfazer os interesses de todos os setores da sociedade. Tenentes: O tenentes criticavam a República Oligárquica, tentando por duas vezes depor o governo e muitos deles acabaram participando da Revolução de 1930. Contudo carecia ao movimento uma ideologia definida, um projeto político definido que possibilitasse os militares controlar o poder político. Getúlio Vargas nomeou os tenentes como interventores para governar os Estados. Contraditoriamente, quando isto ocorreu, os tenentes desaparecem enquanto um movimento político. Classe Média A classe média (também chamada de pequena burguesia) cresceu numericamente com o processo de urbanização e industrialização e reivindicavam uma maior participação política, já que as eleições eram controladas pelo voto do cabresto. Contudo carecia também à classe média uma ideologia definida, um projeto político definido que possibilitasse controlar o poder político. Getúlio Vargas buscou satisfazer a classe média criando o voto secreto e o voto feminino. Operariado A Primeira República tratava o operariado apenas através da repressão, como um caso de polícia. As leis de proteção ao trabalhador eram inexistentes e os sindicatos e as greves eram violentamente reprimidos. Os operários reivindicavam direitos sociais e políticos. Apesar desta situação, o movimento operário era incipiente. Mesmo com a criação do Bloco Operário e Camponês (BOC) o movimento operário não tinha amadurecimento político para controlar o poder com a derrubada da República Oligárquica. Getúlio Vargas buscou satisfazer os operários criando as primeiras leis trabalhistas, a Consolidação das Leis do Trabalho, o salário mínimo, a jornada fixa de trabalho, etc. Burguesia Industrial A Primeira República defendia, quase que exclusivamente, apenas os interesses do setor cafeeiro. A burguesia industrial reivindicava uma política de proteção ao setor industrial. A burguesia industrial, contudo, era nascente, cujas origens estavam vinculadas ao setor cafeeiro e carecia de um nível de consciência política e um projeto de conquista do poder político. A partir de Getúlio Vargas, o governo vai desenvolver uma política de apoio ao setor industrial. Durante o período populista o Brasil vai deixando de ser um país agrário e rural e passa a ser um país urbano e industrial. Oligarquia Dissidente A Primeira República defendia, quase que exclusivamente, apenas os interesses do setor cafeeiro. As oligarquias dissidentes, ou seja, não produtoras de café, reivindicam uma política de proteção aos outros setores da economia. Contudo, sendo oligarquia, estes setores defendiam a manutenção da estrutura agroexportadora da economia, não apresentando profundas divergência com o setor oligárquico cafeeiro. Getúlio Vargas criou uma política de apoio a diversos setores da economia, como o Instituto do Cacau, Instituto do Açúcar e do Álcool, Instituto da Erva Mate, etc... Burguesia cafeeira Apesar de toda crise do café, este setor continuava a ser o mais importante da economia brasileira e a grande fonte de dividas para o país. Getúlio Vargas adotou uma política mais radical de valorização do preço do café ao comprar e destruir centenas de toneladas de café. b) Características socioeconômicas Estado Intervencionista O Estado populista atuou intervindo na economia, como ocorreu na maioria dos países, como mecanismo para a superação dos efeitos da Crise de 1929. O Estado criou diversos órgãos governamentais para apoiar os mais variados setores da economia, além de regular a relação entre o capital e o trabalho Estado industrializante A carência de capital privado e os altos investimentos, cujo retorno ocorrem a médio e longo prazo, fizeram com que o Estado fosse o grande promotor do processo de industrialização do país. Estado Nacionalista O populismo não se colocou contra o capital estrangeiro. Este penetrou em forma de empréstimo e/ou nos setores da indústria de bens de consumo. Contudo o populismo defendia que os setores estratégicos para o desenvolvimento autônomo do país, como as riquezas naturais, geração de energia, indústria de base (siderurgia, metalurgia, ...), etc, deveriam ser controlados pelo Estado A base de sustentação política do populismo O populismo brasileiro, assim como o argentino, tinham como base de sustentação política o operariado. Getúlio Vargas, assim como Perón, criaram uma série de leis trabalhistas, mas elaboraram também mecanismos de controle sobre o operariado. A base do populismo foi o operariado urbano controlado e manipulado pelo Estado. Este controle levou ao surgimento do sindicato pelego. Sindicatos que atendiam aos interesses do patronato. O imposto sindical, cobrado de todo trabalhador sindicalizado ou não (um dia do trabalho) é recolhido pelo Ministério do Trabalho e repassado aos sindicatos. Os governos populistas utilizavam deste expediente para manter sobre controle os sindicatos. No Brasil e na Argentina, como não havia até a década de 1960 um movimento camponês organizado, a legislação trabalhista não atingiu o trabalhador rural. Diferente do México, quando em 1910 estoura a Revolução Mexicana liderada por Pancho Villa e Emiliano Zapata, líderes populares que lutaram pela reforma agrária. Isto faz com que o populismo mexicano liderado por Lázaro Cárdenas concedesse direitos aos trabalhadores rurais para controlá-los. Era Vargas (1930 - 1945) 1. Governo Provisório (1930 - 1934) 1.1. Introdução Este período é chamado de provisório pois Getúlio Vargas governa sem uma Constituição, na medida em que a Constituição da Primeira República deixou de existir e ainda não havia sido elaborada uma nova Constituição para o Brasil. O período do governo provisório estabelece as primeiras bases do populismo, como com a criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, do Ministério da Educação e Saúde. No aspecto econômico o governo provisório estabelece a Política de Valorização do Café e cria diversos órgãos como o Conselho Nacional do Café e o Instituto do Cacau. No aspecto social, o governo provisório cria as primeiras leis trabalhistas como a lei de sindicalização. 1.2. Revolução Constitucionalista de 1932 Em 1932 estourou em São Paulo um movimento armado que busca derrubar o governo de Getúlio Vargas. Os objetivos declarados deste movimento foi a nomeação de um interventor civil e paulista para São Paulo, visto que Getúlio Vargas havia nomeado um tenente e que nem era paulista para governar o Estado. O movimento defendia também a convocação de uma assembleia constituinte para elaborar uma nova Constituição para o Brasil. Apesar de Vargas atender as reivindicações dos paulistas, o movimento se deflagrou por que, na verdade, o que os paulistas queriam eram a retoma do poder político pelos cafeicultores. Getúlio Vargas foi hábil ao divulgar a intenção de São Paulo se separar do país, o que isolou os paulistas levando a sua derrota. Posteriormente Getúlio Vargas anistiou os revoltosos. Mas, de qualquer maneira, Getúlio Vargas convocou a Assembleia Constituinte que elaborou uma nova Constituição para o Brasil. 2. Governo Constitucional (1934-1937) 2.1. A Constituição de 1934 A grande novidade da Constituição de 1934 foi a criação dos Deputados Classistas, eleitos pelos sindicatos controlados pelo Estado, que criaram uma base de apoio do governo no Congresso Nacional. A Constituição de 1934 incorporou o voto secreto e feminino estabelecido no Código Eleitoral de 1932. Getúlio Vargas foi eleito indiretamente presidente do Brasil para um mandato de quatro anos. O tribunal do trabalho foi criado e uma legislação trabalhista. 2.2. Partidos Políticos Surgem dois principais partidos políticos que refletiam a disputa ideológica existente na Europa: a) Ação Integralista Brasileira (AIB) Liderada por Plínio Salgado, a AIB defendia o estabelecimento do fascismo no Brasil. Os integralistas tinham uma organização partidária militarizada, hierarquizada, com símbolos e palavras de ordens como o partido fascista italiano e o nazismo alemão, defendendo um governo ultranacionalista, ditatorial e anticomunista. b) Aliança Nacional Libertadora (ANL) Liderada por Luis Carlos Prestes, agora convertido ao marxismo e o maior líder do Partido Comunista do Brasil (PCB). A ANL era uma frente antifascista que aglutinava, comunistas, social – democratas, liberais, etc. A ANL tinha como plataforma política a * suspensão do pagamento da dívida externa * nacionalização das empresas estrangeiras * reforma agrária * luta contra o imperialismo * formação de um governo popular 2. 3. A Intentona Comunista (1935) O grande crescimento da ANL e o acirramento das críticas à Getúlio Vargas fizeram com que o governo colocasse a ANL na ilegalidade proibindo a sua atuação. Luís Carlos Prestes, acreditando que o Brasil já estava maduro para uma revolução comunista e crendo na manutenção da sua liderança sobre o exército, ao tempo em que foi líder do movimento tenentista, liderou uma tentativa de tomada do poder com apoio financeiro de Moscou. O movimento fracassou e Getúlio Vargas se aproveitou para decretar o Estado de Sítio, prendendo não só os comunistas, mas qualquer opositor ao seu governo, já preparando o golpe de estado que iria levar a implantação da ditadura. 2. 4. O Plano Cohen Getúlio Vargas não conseguiu prorrogar definitivamente o Estado de Sítio, quando o governo pode estabelecer a censura, estabelecer o toque de recolher, proibir reuniões, etc., ou seja, quando as liberdades civis e políticas foram temporariamente suspensas. Ao mesmo tempo as eleições se aproximavam e alguns candidatos já se lançavam para a disputa presidencial. A intenção de Vargas, contudo, era continuar no poder. Vargas então criou uma farsa que foi o Plano Cohen. Cohen seria um suposto comunista cujos planos de matar as autoridades brasileiras e tomar o poder foram suspostamente descobertos pelo governo. Com esta farsa Vargas justificou o golpe que estabeleceu a sua ditadura pessoal, que ele intitulou de Estado Novo. 3. Estado Novo (1937 - 1945) 3.1. A Constituição de 1937 A Constituição de 1937, inspirada no modelo polonês, foi criada com características ditatoriais, apesar de manter as bases do populismo. O golpe de Estado extinguiu os partidos políticos, o poder legislativo e estabeleceu a censura e a repressão. 3.2. A Intentona Integralista (1938) Os integralistas, frustrados por não controlarem o poder político, tentaram um golpe para tomar o poder que fracassou. Cessou a oposição aberta e organizada à ditadura varguista e a repressão, as prisões e a censura se intensificaram. 3.3. O Desenvolvimento Econômico O governo intensificou a sua política de industrialização com a criação de indústrias de base, como a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), a Usina de Volta Redonda, a Companhia Vale do Rio Doce, a CHESF, etc. A queda das exportações do café, ao diminuir a entrada de divisas, reduziu a capacidade de importação, favorecendo a indústria nacional. O contexto da Segunda Guerra Mundial se tornou um fator que favoreceu o processo industrial brasileiro, principalmente à indústria de bens de consumo no processo chamado de substituição das importações, ou seja, o Brasil passou a produzir o que antes importava. 3. 4. Leis Trabalhistas Em 1943 foi criada a Consolidação das Leis do Trabalho, buscando estabelecer uma série de benefícios aos trabalhador urbano, mas retirando à autonomia sindical, controlando e manipulando a classe trabalhadora. O governo Vargas instituiu a carteira de trabalho, a semana de 44 horas, o salário mínimo, as férias remuneradas, a justiça do trabalho e outros benefícios. 3.4. Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) O DIP foi o grande responsável pelo controle dos órgãos de comunicação, da censura, assim com da criação da imagem de Vargas como o “Pai dos Pobres” O governo passou a patrocinar Escolas de Samba no Rio de Janeiro, cujos sambas exaltavam o trabalho, a nacionalidade, o Brasil. O governo criou a União Nacional dos Estudantes buscando controlar o movimento estudantil e sempre no dia Primeiro de Maio (dia do trabalhador), anunciava uma medida de impacto social. O rádio tornou-se o grande veículo de unidade nacional e propagandista do governo – é criada a Hora (voz) do Brasil. LENÇO NO PESCOÇO LENÇO NO PESCOÇO WILSON BATISTA MEU CHAPÉU DO LADO TAMANCO ARRASTANDO LENÇO NO PESCOÇO NAVALHA NO BOLSO EU PASSO GINGANDO PROVOCO E DESAFIO EU TENHO ORGULHO EM SER TÃO VADIO SEI QUE ELES FALAM DESTE MEU PROCEDER EU VEJO QUEM TRABALHA ANDAR NO MISERÊ EU SOU VADIO PORQUE TIVE INCLINAÇÃO EU ME LEMBRO, ERA CRIANÇA TIRAVA SAMBA-CANÇÃO COMIGO NÃO EU QUERO VER QUEM TEM RAZÃO E ELES TOCAM E VOCÊ CANTA E EU NÃO DOU BONDE DE SÃO JANUÁRIO O BONDE SÃO JANUÁRIO WILSON BATISTA QUEM TRABALHA É QUEM TEM RAZÃO EU DIGO E NÃO TENHO MEDO DE ERRAR QUEM TRABALHA... O BON DE SÃO JANUÁRIO LEVA MAIS UM OPERÁRIO SOU EU QUE VOU TRABALHAR O BONDE SÃO JANUÁRIO... ANTIGAMENTE EU NÃO TINHA JUÍZO MAS HOJE EU PENSO MELHOR NO FUTURO GRAÇAS A DEUS SOU FELIZ VIVO MUITO BEM A BOEMIA NÃO DÁ CAMISA A NINGUÉM PASSE BEM! 3.5. Crise do Estado Novo O governo Getúlio Vargas, buscando obter um empréstimo dos Estados Unidos para a construção da Usina de Volta Redonda e a Companhia Siderúrgica Nacional declarou guerra ao Eixo (Alemanha – Japão – Itália). Em outra situação dificilmente o Brasil conseguiria este empréstimo, mas devido a posição estratégica do Brasil no contexto da Segunda Guerra Mundial, para o patrulhamento do Atlântico Sul e o desembarque no norte da África, o Brasil entrou na guerra do lado dos aliados. Esta participação gerou uma contradição, pois o Brasil externamente luta contra o fascismo (ditadura) e internamente era uma ditadura Os militares e diversos setores da sociedade brasileira começaram a pressionar pela redemocratização do país, o que Vargas prometeu após o fim da guerra. 3.5. Crise do Estado Novo O Primeiro Congresso Nacional dos Escritores divulgaram um manifesto pedindo o fim da censura, assim como o chamado Manifesto dos Mineiros defendendo a redemocratização do país. Alguns militares se manifestaram favoráveis ao retorno da democracia. O governo Vargas permitiu a reorganização dos partidos políticos: UDN: antigetulista, defendia abertura ao capital estrangeiro PTB: populista, getulista e nacionalista, com a base sindical controlada por Vargas PSD: criado por Getúlio e formada pelos interventores estaduais e pela burocracia estatal. O PTB começou a organizar o movimento queremista que defendia a volta da democracia com a presença de Vargas no poder, o que era inaceitável para os militares e a oposição. Quando o chefe da polícia do Rio de Janeiro proibiu um comício queremista, Vargas demitiu o chefe de polícia e nomeou seu irmão. Isto acaba sendo o pretexto para a deposição de Vargas. A queda de Vargas não significou, contudo, nem o fim do populismo, nem o fim de Vargas. Para o povo, o pai dos pobres fora deposto pelos ricos e alguns anos mais tarde Vargas voltaria ao poder eleito democraticamente.