Economia do Território Conceitos básicos e os diferentes tipos de espaço, região, território: qual a inter-relação entre eles? Prof. Ângelo Prates 1 Noção de Espaço: *Noção de espaço através de abstração. *Espaço abstrato: constituído de um conjunto de relações definidoras de certo objeto. • *Os espaços econômicos (abstratos) têm origem na atividade humana. As relações que se estabelecem quando seres humanos atuam sobre o espaço físico na busca de sobrevivência e conforto dão origem aos espaços econômicos. Portanto, os espaços econômicos se caracterizam por relações de produção, de consumo, de tributação, de investimento, de exportação, de importação e de migração. 2 Conceitos de Espaço Econômico Espaço econômico como conteúdo de um plano espaço de planejamento; Espaço econômico como campo de forças - espaço polarizado; Espaço econômico como conjunto homogêneo espaço homogêneo; 3 Espaço de Planejamento Planejar: conjunto de atividades de estudo e previsão que servem para a tomada de decisão. Conceito de espaço como conteúdo de um plano dá origem ao de região de planejamento. Ex: Plano logístico de plantas industriais: Delimitação de zonas de planejamento visando abastecimento de insumos e distribuição de produtos. 4 Espaço de Planejamento Necessidade de estabelecer referência espacial bem definida. Planos de desenvolvimento regional são exemplos típicos de delimitação de região de planejamento pelo setor público. Em suma, referência espacial de decisões econômicas constituem uma região de planejamento. 5 Espaço Polarizado Polarização: forças de atração (centrípetas) e de repulsão (centrífugas) e surge devido às concentrações de população e de produção basicamente. O nome região polarizada (ou nodal) traz implícito a existência de um pólo (ou nó). Uma região polarizada pode, portanto, ser pensada como área de influência de certo pólo. 6 Espaço Polarizado A partir do pólo, as funções que os subespaços desempenham podem ser hierarquizadas de forma decrescente, como na Teoria dos Lugares Centrais: o espaço organiza-se dispondo lugares subordinados em torno de certo lugar central; o conjunto total é funcionalmente integrado, e as funções que os diferentes lugares desempenham podem ser hierarquizadas a partir do lugar central. 7 Espaço Homogêneo Tal espaço é definido como sendo invariante com respeito a algum aspecto econômico de interesse. Dessa forma, variáveis como renda, preço, produção e outras do domínio da Economia podem ser utilizadas para a delimitação de espaços homogêneos. Especificidade do critério homogeneidade e dimensão territorial correlacionados diretamente: quanto maior o critério, menor a dimensão territorial das regiões; e quanto mais abrangente e complexo for o critério, maior essa dimensão. Ex: definição de áreas funcionais que tenham mesmo perfil Produtivo 8 Conceitos Comparados *Região homogênea: espaço invariante, uniforme; *Região polarizada: espaço diferenciado e funcionalmente integrado; *Região de planejamento: espaço enquanto conteúdo plano. O conceito de região homogênea e o de região polarizada serão mais ou menos privilegiados no estabelecimento de uma região de planejamento dependendo da natureza do plano. 9 Regiões Político-Administrativas Macrorregião: corresponde a agregação das unidades da Federação em grandes regiões, a saber Norte, Nordeste, Sudeste, Sul e CentroOeste. 10 11 Regiões Político-Administrativas Mesorregião: área individualizada, em uma unidade da Federação, que apresenta formas de organização do espaço geográfico definidas pelas seguintes dimensões: o processo social, como determinante, o quadro natural, como condicionante e a rede de comunicação e de lugares, como elemento de articulação espacial. 12 13 Regiões Político-Administrativas Microrregião: resultam da subdivisão das mesorregiões em espaços que apresentam especificidades, basicamente relacionadas à produção. O conceito de estrutura da produção usado é abrangente, englobando produção, distribuição, troca e consumo urbanos e rurais. 14 15 Ratzel e Hartshorne são autores que primeiramente desenvolveram um significativo esforço para a teorização da noção de espaço. 16 Para Hatzel, território e espaço vital são conceitos centrais e fortemente influenciados pela ecologia e pela política. Para ele a natureza influencia o desenvolvimento das sociedades na medida em que define as condições de reprodução destas, expressas no vínculo com o solo que as sociedades desenvolvem. Disto resulta a constituição do Estado, criado para defender o território necessário ao desenvolvimento das sociedades. Assim, surge seu mais famoso (e criticado) conceito de espaço vital que representa uma proporção de equilíbrio entre a população de uma dada sociedade e os recursos disponíveis para suprir suas necessidades. 17 No pós IIGM, a geografia passa por significativas transformações com o avanço das tecnologias de informação, o que levou à uma tentativa de matematização crescente do conhecimento geográfico. Esse movimento conhecido como geografia teorético-quantitativa, tendo como principais autores Bunge, Ullman e Watson. Para essa corrente a distância passa a ser uma categoria essencial no estudo do espaço. 18 O espaço passa a ser visto assim a partir de calculos geométricos, um conjunto de pontos e distâncias (como veremos nas teorias de localização de Thünen, Christaller, Weber). Nessa concepção o espaço é visto como dado, fixo, morto, sem movimento ou história. Nos anos 1970, surgirão as primeiras críticas à essa concepção de espaço, trazendo de volta à análise espacial o papel das transformações sociais a partir de uma ótica marxista de análise. 19 Grande parte desses autores recorrerão a Lefébvre, considerado o maior formulador da renovação do pensamento espacial dentro do marxismo. Lefébvre define o espaço ao mesmo tempo como locus e produto da reprodução das relações sociais de produção e, portanto, como centro da luta de classes. Em sua concepção, o espaço é mais importante que o tempo, pois é a condição da reprodutibilidade do capital, o que significa, nestes tempos de globalização, que o capital necessita dessa escala para garantir sua reprodução. 20 Como coloca Lefébvre: “A reprodução das relações de produção implica tanto a extensão quanto a ampliação do mode de produção e de sua base material. Por um lado, portanto, o capitalismo se estendeu ao mundo inteiro, subordinando a si, como Marx o havia concebido, as forças produtivas antecedentes e transformando-as para seu uso. Por outro lado, o capitalismo constituiu novos setores de produção e consequentemente de exploração e de dominação (...) As forças produtivas, no seu crescimento (...) atingiram uma tal potência que produzem o espaço. 21 Avançando nessa direção e ressaltando as contradições presentes no processo de produção do espaço, Lefébvre cunha sua definição de espaço: “No curso deste vasto processo e transformação, o espaço revela sua natureza, aquilo que ele sempre foi: a) um espaço político, lugar e objeto das estratégias; b) uma projeção do tempo, reagindo sobre ele e permitindo dominá-lo, e por conseguinte, atualmente explorá-lo até a morte.” 22 Essa centralidade conferida por Lefébvre ao espaço influenciou fortemente a geografia, pensadores como Milton Santos cunhou o conceito de formação sócio-espacial, sustentando ser o espaço um fator e não um reflexo social. Para Santos, 4 categorias deveriam ser consideradas na análise do espaço: a) a forma, isto é, a aparência dos processos espaciais; b) a função, ou seja, a tarefa dos objetos; c) a estrutura, qual seja, a natureza social e econômica da sociedade; d) o processo, isto é, ação de organização do espaço. 23 Outra conceituação de Santos sobre o espaço o conceitua como uma dimensão da realidade, produzida e reproduzida permanentemente pelas relações sociais. No contexto atual é o meio técnico-científico informacional a nova cara do espaço e do tempo, onde se instalam as atividades hegemônicas onde os lugares e temporalidades se unem hierarquicamente. 24 Segundo Martins (1999), as contradições do espaço explicitam-se pelo processo de captura do espaço pelo mundo das mercadorias, sendo que o movimento reprodutivo do capital representa mais do que a reprodução do capital través da mais-valia, mas a tentativa de reprodução incessante do capitalismo, desempenhando o Estado papel fundamental nesse processo. 25 Para martins (1999): “O espaço não é mero receptáculo das coisas produzidas pelas atividades humanas. Como meio e objeto e trabalho universal que é, constitui-se como necessidade e condição prévia de toda atividade social e econômica, logo da manifestação da própria vida. Ele próprio constitui uma força produtiva, da qual o capital também se apodera para criar as condições gerais de sua reprodução.” 26 Um dos autores pioneiros na abordagem do território foi Claude Raffestin. Merece destaque na sua obra o caráter político do território, bem como a sua compreensão sobre o conceito de espaço geográfico, pois o entende como substrato, um palco, pré existente ao território. 27 Nas palavras do autor: “É essencial compreender bem que o espaço é anterior ao território. O território se forma a partir do espaço, é o resultado de uma ação conduzida por um ator sintagmático (ator que realiza um programa) em qualquer nível. Ao se apropriar de um espaço, concreta ou abstratamente [...] o ator “territorializa” o espaço. (RAFFESTIN, 1993, p. 143). 28 Dentro da concepção enfatizada pelo autor, o território é tratado, principalmente, com uma ênfase político-administrativa, isto é, como o território nacional, espaço físico onde se localiza uma nação; um espaço onde se delimita uma ordem jurídica e política; um espaço medido e marcado pela projeção do trabalho humano com suas linhas, limites e fronteiras. Segundo o mesmo autor, ao se apropriar de um espaço, concreta ou abstratamente, o ator territorializa o espaço. Neste sentido, entende o território como sendo: 29 “[...] um espaço onde se projetou um trabalho, seja energia e informação, e que, por consequência, revela relações marcadas pelo poder. (...) o território se apoia no espaço, mas não é o espaço. É uma produção a partir do espaço. Ora, a produção, por causa de todas as relações que envolve, se inscreve num campo de poder [...] (RAFFESTIN, 1993, p. 144). 30 Na análise de RAFFESTIN (1993), a construção do território revela relações marcadas pelo poder. Assim, faz-se necessário enfatizar uma categoria essencial para a compreensão do território, que é o poder exercido por pessoas ou grupos sem o qual não se define o território. Poder e território, apesar da autonomia de cada um, vão ser enfocados conjuntamente para a consolidação do conceito de território. Assim, o poder é relacional, pois está intrínseco em todas as relações sociais. 31 Rogério Haesbaert analisa o território com diferentes enfoques, elaborando uma classificação em que se verificam três vertentes básicas: 1) jurídico-política, segundo a qual “o território é visto como um espaço delimitado e controlado sobre o qual se exerce um determinado poder, especialmente o de caráter estatal”; 2) cultural(ista), que “prioriza dimensões simbólicas e mais subjetivas, o território visto fundamentalmente como produto da apropriação feita através do imaginário e/ou identidade social sobre o espaço”: 3) econômica, “que destaca a desterritorialização em sua perspectiva material, como produto espacial do embate entre classes sociais e da relação capital-trabalho”. 32 SOUZA (2001) salienta que o território é um espaço definido e delimitado por e a partir de relações de poder, e que o poder não se restringe ao Estado e não se confunde com violência e dominação. Assim, o conceito de território deve abarcar mais que o território do Estado-Nação. Nas palavras do autor, “todo espaço definido e delimitado por e a partir de relações de poder é um território, do quarteirão aterrorizado por uma gangue de jovens até o bloco constituído pelos países membros da OTAN”. (SOUZA, 2001, p.11). 33 Da mesma forma que em Claude Raffestin, a idéia de poder também é uma constante na discussão sobre território feita por Marcos Aurélio Saquet: “O território é produzido espaço-temporalmente pelas relações de poder engendradas por um determinado grupo social. Dessa forma, pode ser temporário ou permanente e se efetiva em diferentes escalas, portanto, não apenas naquela convencionalmente conhecida como o “território nacional” sob gestão do Estado -Nação.” (SAQUET apud CANDIOTTO, 2004, p. 81). 34 Por sua vez, Manuel Correia de Andrade (1995), faz uma análise da questão do território no Brasil, retratando o conceito de território com uma abordagem profundamente política e econômica de ocupação do espaço. A exemplo de Raffestin, a idéia de poder é uma constante na análise do território feita por Andrade: “O conceito de território não deve ser confundido com o de espaço ou de lugar, estando muito ligado à ideia de domínio ou de gestão de uma determinada área. Deste modo, o território está associado à ideia de poder, de controle, quer se faça referência ao poder público, estatal, quer ao poder das grandes empresas que estendem os seus tentáculos por grandes áreas territoriais, ignorando as fronteiras políticas.” (ANDRADE, 1995, p. 19). 35 Em sua obra, ANDRADE (1995) faz uma diferenciação entre território e espaço. O território associa-se mais à ideia de integração nacional, de uma área efetivamente ocupada pela população, pela economia, a produção, o comércio, os transportes, a fiscalização etc. É no território que as relações capitalistas efetivamente se fazem presentes. Já o espaço é mais amplo que o território, englobando também as áreas vazias que ainda não se territorializaram, isto é, que ainda não sofreram uma ocupação humana efetiva. Assim, o espaço é mais amplo que o território, englobando-o. É uma área delimitada geograficamente e administrativamente pelas suas fronteiras. 36 Sobre o conceito de Região: É importante salientar que o conceito de região não é um conceito unívoco, uma vez que ele não comporta uma única forma de interpretação e não se aplica a sujeitos diversos de maneira totalmente idêntica. O conceito de região que julgamos ser o mais correto não é aquele que descreve exaustivamente uma realidade à sua frente disposta: límpida, fixa e transparente. Mas, ao contrário, é um conceito que expressa um movimento em direção a uma realidade (que não é fixa nem transparente) no sentido de desvendála, explicá-la; penetrar, portanto, no âmago de seu ser em movimento. 37 Segundo abordagem de Alejandro Rofman (1974), tomando por base seu livro Desigualdades Regionales y Concentración Econômica: ei caso argentino, onde estão expressos com bastante nitidez os princípios teóricos com que ele trabalha. Sua preocupação principal, nessa obra, consiste em compreender a origem das desigualdades regionais no contexto de um país de desenvolvimento dependente. Nesse sentido, as observações de Rofman prendem-se às formações sociais capitalistas, no interior das quais se verificam desníveis sócio-econômicos entre os distintos subespaços nacionais. 38 Em sua concepção, a região é um conceito integral que deve dar conta de expressar uma realidade espacial num contexto histórico-social. A partir disso, o autor passa a enumerar os aspectos que devem ser contemplados no estudo de uma região considerada integralmente: a) características do nível de desenvolvimento relativo das forças produtivas da região; b) análise das relações de produção e das formas técnicas e organizativas da atividade em cada setor econômico; c) níveis de concentração econômica e formas de distribuição da renda como processos diretamente ligados ao sistema econômico-social prevalecente; d) análise comparada da estrutura econômico-social regional com a de outras regiões e com a do país. 39 O conceito de região capaz de captar e dar substância analítica a uma realidade em permanente transição deve fazer uso de categorias básicas como espaço (conforme concepção exposta no segundo capítulo), modo de produção e divisão do trabalho. Esse é o instrumental teórico fundamental que o pesquisador deve manusear para tentar compreender uma realidade regional. Sob essa ótica, o pesquisador tem condições de perceber a historicidade da região — que é um dado escassamente considerado nas análises correntes —, evidenciando-se, assim, a noção de processo. 40 Em resumo, podemos apontar as seguintes as seguintes definições acerca do conceito de região, segundo as diferentes escolas da geografia: a) Geografia tradicional; b) Geografia quantitativa; c) Geografia humanista; d) Geografia crítica; 41 *Na geografia tradicional, as regiões eram entendidas como sínteses de elementos físicos e sociais em integração, sendo reconhecidas pela descrição da paisagem. *Na geografia quantitativa, a região passa a ser pensada como uma divisão de área definida a partir de critérios de homogeneidade (Grande ABC) e/ou de relações funcionais (regiões de influência). 42 *Na geografia humanista, a região é definida não apenas com base em critérios econômicos e político-administrativos, mas também como espaço de identidade e de pertencimento. A região é, assim, um espaço mais amplo do que o lugar e onde vivem as pessoas com as quais um determinado indivíduo se identifica. *Na geografia crítica há uma predileção por se trabalhar com os conceitos de território e espaço, relegando a segundo plano o debate sobre região. 43