O Mar do Futuro[1]

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2010/07/08
O M AR DO F UTURO[1]
Armando Dias Correia[2]
«O futuro – o nosso futuro – está sempre além horizonte e a
incerteza que encerra nunca nos demoveu de o
demandarmos, cientes das condicionantes, mas confiantes
no saber, na motivação, na tenacidade e na imaginação
criativa, que são marcas de carácter que nos unem e
identificam!» (Almirante Fernando José Ribeiro de Melo
Gomes, 20 de Maio de 2007).
O futuro é desconhecido e por isso há cenários genéricos para todos os gostos. Thomas Friedman,
no seu livro «The World is Flat», tem uma ideia optimista do desempenho futuro do mundo
globalizado. Os críticos da globalização comungam da previsão de David Korten e de John
Cavanaugh, segundo a qual, os EUA irão liderar a criação de economias locais e regionais mais
fechadas e assim mais capazes de lidar com a reciclagem e a reutilização, com o ambiente e com a
geração de energia limpa. Um terceiro cenário, defendido por Robert Kaplan e Chris Lewis, conduznos para uma visão de colapso político, económico, cultural e ambiental que já se começou a
espalhar em África, a partir dos anos noventa do século passado, e se poderá espalhar pelo resto
do mundo. Esta abordagem direcciona-nos para um cenário de degradação dos padrões de vida do
«primeiro mundo».
Também Michael T Klare, com a sua nova geografia dos conflitos globais, ou James Howard
Kunstler, com a sua previsão catastrófica do «Fim do Petróleo», nos apresentam uma antevisão de
grande angústia em relação ao futuro. Este cenário tem no seu fundamento a ideia do crescimento
do consumo de combustíveis fósseis, da escassez de água, de alterações climáticas, de doenças,
dentre outros. Alerta mesmo para a possibilidade das elites governantes terem de se proteger do
povo que governam, em virtude de uma crescente revolta motivada pela diminuição da sua qualidade
de vida, enquanto assistem à tomada do poder por grandes corporações globais. Uma outra
antevisão interessante é a apresentada no livro «Os próximos 100 anos», de George Friedman
(Fundador e CEO da STRATFOR), que nos apresenta, entre outras previsões, a fragmentação da
China em 2020 e uma guerra global em meados do século.
O Mundo em 2025
O relatório «As tendências globais em 2025: um mundo transformado» publicado, em Novembro de
2008, pelo National Intelligence Council, e o «O novo relatório da CIA – Como será o mundo em
2025?» permitiram-me identificar, da seguinte forma, os contornos do sistema internacional por volta
de 2025:
Em 2025 seremos cerca de 8 mil milhões e em 2050 aproximadamente 9 mil milhões de pessoas.
No entanto, iremos assistir ao envelhecimento da população do mundo industrializado, com
especial significado no Japão, na Europa e na Rússia.
Não haverá muitas dúvidas em relação à afirmação da Índia, em 2030, como país mais populoso do
mundo com 1505 milhões de pessoas (Mp), a China terá cerca de 1458 Mp, os EUA na ordem dos
366 Mp, a Indonésia por volta dos 279 Mp e o Paquistão 240 Mp. A Índia ultrapassará a China por
volta de 2025.
A emergência de um sistema multipolar, marcado simultaneamente pela crescente afirmação do
eixo do Pacífico (China, Índia, Coreia, Japão, EUA) e pelo aumento do poder relativo das redes de
actores não estatais (multinacionais, ONG’s, organizações religiosas).
Significativa deslocação geopolítica do poder económico e da riqueza relativa do Ocidente para o
Oriente. O comércio no Oceano Pacífico é superior ao do Oceano Atlântico desde a década de 80 do
século passado.
Manutenção dos EUA como potência mundial, embora cada vez menos dominante e cada vez mais
focalizada no Médio Oriente (para assegurar o acesso ao petróleo) e no Oceano Pacífico (para
garantir uma posição competitiva no comércio).
A energia é o elemento vital da economia mundial. Apesar dos esforços para aumentar a eficiência
energética e dos investimentos no desenvolvimento de novas tecnologias energéticas, o petróleo e o
gás natural continuarão decisivos por muitos anos. O desenvolvimento económico mundial requer
cada vez mais petróleo e gás. Alguns analistas estimam que, nos próximos anos, a China sozinha
poderá ser responsável por um terço do aumento marginal mundial da procura de petróleo.
O ritmo de inovação tecnológica será a chave para os resultados no futuro próximo. No entanto, as
tecnologias actuais são inadequadas para substituir a matriz energética tradicional, na escala
necessária, numa época em que se sabe que o sector energético leva, em média, 25 anos para que
uma nova tecnologia de produção seja amplamente instalada.
A produção de hidrocarbonetos, petróleo bruto, gás natural e produtos não convencionais, fora do
cartel da OPEP, não crescerá proporcionalmente à procura. A produção de petróleo e gás em muitos
países produtores tradicionais está a diminuir. Por exemplo, na China, na Índia e no México a
produção estagnou. Os países onde actualmente se situam as grandes reservas também acabarão
por sofrer uma retracção da produção e continuarão a ser áreas de instabilidade geopolítica. Como
resultado de tudo isto e de outros factores, o mundo irá enfrentar uma mudança de fontes de
energia, do petróleo para o gás natural, para o carvão e para outras alternativas. No entanto, a curva
de depleção do gás natural é igual à do petróleo biótico com um atraso de poucos anos. O carvão,
que existe em abundância, por exemplo nos Estados Unidos, é muito poluente e arrasador para os
habitats onde é extraído.
O mundo precisa de descobrir e desenvolver fontes fiáveis de petróleo e gás, a preços que permitam
sustentar o crescimento investimentos económico. Aqui há uma enorme incerteza. Não há dúvidas
que têm sido poucas as novas descobertas de petróleo e que estas são, normalmente, encontradas
em países com regimes políticos controversos ou em locais com geografia física muito difícil.
O que baralha toda esta previsão preocupante são as notícias que têm vindo a ser divulgadas pelos
petrogeólogos de que existem reservas de origem abiótica no interior do nosso planeta, em
enormes quantidades no denominado «manto terrestre», a profundidades superiores aos 15 km. O
especialista José Caleia Rodrigues, com quem tive oportunidade de trocar ideias, considera que o
petróleo é muitíssimo abundante e que já há tecnologia capaz de atingir tais profundidades e extrair
o petróleo jazente no manto. É mesmo possível que devido à elevada pressão deste petróleo
abiótico possa haver migração do manto para bolsas mais próximas da superfície e portanto mais
acessíveis, sobretudo em campos muito explorados, quase esgotados, em que a pressão interna é
muito baixa. Se se confirmar esta hipótese será necessário estudar o seu impacto futuro.
Se não houver petróleo de origem abiótica teremos inevitavelmente gigantescas consequências
económicas e sociais para o mundo, já que a civilização moderna depende dos combustíveis
fósseis baratos e abundantes, especialmente para os transportes, produção de alimentos,
processos químicos industriais, tratamento de água, aquecimento doméstico e geração de
electricidade. É difícil imaginar o mundo sem gasóleo para os tractores e ceifeiras, sem pesticidas,
sem plásticos e sem combustível para os aviões e navios.
Os grandes temas estratégicos nos Espaços Marítimos
Com estes vectores orientadores que desafios se podem identificar nos espaços marítimos? Os
grandes temas estratégicos deverão ser:
Competição pelo fornecimento de energia
Alterações climáticas
Globalização
Aumento da complexidade no litoral
Crescimento da competição e diminuição da cooperação internacional no âmbito do uso e da
exploração dos oceanos e dos mares.
Competição pelo fornecimento de energia
Segundo o Development, Concepts and Doctrine Centre (DCDC) do Ministério da Defesa do Reino
Unido, num documento que procura identificar os desafios estratégicos de 2007 a 2036, a
competição por fornecimento de energia dominará a paisagem económica nos próximos 30 anos. O
ritmo de crescimento da procura deverá oscilar entre 1,5 e 3,1%. A procura, por parte das economias
emergentes da China e da Índia, irá aumentar significativamente, enquanto os habituais grandes
consumidores irão procurar manter os níveis de consumo compatíveis com o seu crescimento
económico.
Esta evolução resultará em preços altamente competitivos e na continuação do enriquecimento e
progresso económico dos países produtores, incluindo a Rússia e o Irão. Haverá ainda, em
resultado de um nível de competição cada vez maior, desentendimentos entre países que poderão
conduzir a situações de crise, ou mesmo de conflito.
Este é o tema mais controverso, já que há muitas pessoas que não acreditam que o petróleo vai
faltar. As reservas provadas de petróleo de origem biótica conhecidas, se se mantivesse a produção
e o ritmo de consumo, seriam suficientes para cerca de 45 anos (cálculos efectuados pelo
signatário com base no relatório «BP Statistical Review of World Energy»). No entanto, como
sabemos, o ritmo de consumo vai aumentar e actualmente apenas se descobre um novo barril de
petróleo por cada 4 que se produz, com tendência para se agravar, cada vez mais, a diferença entre a
descoberta e a produção. Naturalmente que o preço do petróleo vai subir, já que é cada vez mais
requerido pelas economias em crescimento. Caso exista petróleo de origem abiótica também será
caro, porque a tecnologia para a sua extracção será complexa. Em termos de petróleo biótico prevêse que as novas descobertas se façam quase exclusivamente no fundo do mar e nas regiões
polares.
Alterações climáticas
As alterações climáticas terão mais impacto no futuro do que se pode pensar, à primeira vista, e o
mar tem uma enorme influência. A água, dos oceanos e dos mares, é reguladora do clima na Terra,
basta pensar que os litorais sofrem menores amplitudes térmicas dos que os interiores
continentais, ou que os países do norte da Europa têm um clima mais ameno devido à corrente do
Golfo. Esta corrente está a enfraquecer, o que é um sinal claro de que a seguir a este aquecimento
do planeta se vai entrar numa nova era de glaciação, que tem sido cíclica ao longo da História da
Terra.
O último período interglacial quente com mais semelhanças com o presente Holocénico terá sido o
Eemiano, que terá ocorrido entre 130 000 anos e 110 000 anos atrás. A transição completa do
período Eemiano para a era glacial que se seguiu não levou mais de 400 anos. Ora, actualmente a
emissão dos gases de efeito de estufa está, potencialmente, a acelerar todo este processo, pelo
que devemos esperar grandes alterações climáticas nos próximos anos.
Prevê-se que as alterações climáticas venham a amplificar o sofrimento humano através de
tempestades catastróficas, diminuição da área de terra arável e da pesca costeira, o que pode
conduzir à perda de vidas, à migração involuntária, à instabilidade social e a crises regionais.
Actualmente há 21 países com 600 milhões de pessoas a sofrer de escassez de água e terra arável.
Em 2025 serão cerca de 36 países e aproximadamente 1400 milhões de pessoas.
Nesta perspectiva, os países arquipelágicos como Portugal já identificaram a necessidade genética
de ser edificada a capacidade que permite apoiar rapidamente as suas populações,
designadamente através de um navio polivalente logístico satisfazendo requisitos para emprego em
missões de natureza militar e não militar.
As alterações climáticas estão também a abrir novas rotas potenciais e a criar a expectativa do
acesso às riquezas do Oceano Árctico e do Oceano Antárctico. A ligação do Oceano Atlântico ao
Oceano Pacífico, através do Oceano Árctico, é possível através da Passagem Noroeste, a norte do
Canadá. É uma rota extensa, muito difícil e bloqueada por gelos em longos períodos do ano. Há
sessenta anos o navio «St Roch» da Royal Canadian Mounted Police efectuou a primeira viagem de
oeste para leste através da Passagem Noroeste. O navio levou 27 meses para o conseguir. Devido
às alterações climáticas, em 2000, o navio «St Roch II» (com o nome a honrar o seu antecedente)
efectuou a mesma viagem do Pacífico até à Baía Baffin, a oeste da Gronelândia, em apenas um
mês. Este feito abriu novas perspectivas em relação a rotas comerciais, permitindo encurtar uma
viagem da Ásia para a Europa em 5000 milhas náuticas, ou seja metade do trânsito via Suez do
Japão para a Holanda e, para já, sem riscos de ataques de pirataria. A empresa russa Sovcomflot,
de transporte de petróleo, já vai ensaiar o transporte por esta via desde o nordeste da Rússia até à
Ásia.
Globalização
A própria globalização está a formatar novas formas de migração humana, a ter impacto na saúde e
na doença, na educação e na cultura. Teme-se que a globalização abra um fosso, ainda maior, entre
o mundo civilizacional ocidental e o mundo civilizacional oriental, que tem cada vez maior expressão
demográfica.
Os meios de comunicação irão realçar o drama do sofrimento humano e as populações menos
afortunadas estarão, progressivamente, mais conscientes da sua situação, ficando menos
tolerantes e mais radicais, permitindo o crescimento de comportamentos extremistas. O crime
organizado e o radicalismo irão explorar esta instabilidade social.
A conjugação da globalização com a inevitável pressão em direcção aos países do Golfo, onde se
localizam as grandes reservas mundiais de petróleo, irá gerar maior instabilidade na região. A
situação será mais grave à medida que os actores regionais forem conseguindo obter armas
nucleares ou armas de destruição maciça ou de efeitos de massa.
Aumento da complexidade no litoral
Prevê-se o aumento da complexidade do litoral em resultado do facto da maioria da população
mundial viver a pouca distância da orla costeira, 37% vive a menos de 100 km, onde a actividade
humana deverá desenvolver os mais variados projectos que, em muitos casos, se prolongarão pelo
mar e onde irão produzir um elevado impacto.
As regiões costeiras desenvolvem-se mais política, económica e demograficamente do que as
interiores, porque beneficiam directamente das vantagens associadas às comunicações marítimas.
No futuro nenhuma alternativa se vislumbra capaz de substituir a capacidade de transporte dos
navios e por isso esta tendência tenderá a aprofundar-se.
A desertificação de terras, a escassez de água e de recursos, ou simplesmente a procura de
melhores condições de vida, também levarão a uma concentração ainda maior no litoral. Nas
regiões litorais sobrepovoadas com governos fracos e corruptos haverá cada vez mais tensões
devidas ao aumento do número de jovens sem perspectivas de futuro, ao agravamento da
insatisfação dos excluídos, ao extremismo religioso, ao nacionalismo étnico e às alterações
climáticas, que deverão originar ambientes propícios a crises e conflitos. Este ambiente de
instabilidade social irá ser explorado pelo crime organizado e pelo radicalismo. Além disso, o
homem continuará a despejar nos oceanos produtos extremamente nocivos para os ecossistemas
marinhos, como são os hidrocarbonetos, os pesticidas e os metais pesados.
Crescimento de competição nos oceanos
A desmaterialização do espaço e a compactação do tempo levam a que o mar, através das suas vias
marítimas, continue a ser, cada vez mais, determinante na vida internacional, num mundo
globalizado onde as economias são sensíveis a alterações no fluxo do comércio, tão habituadas que
estão ao just-in-time. Os navios no mar são os verdadeiros armazéns da economia moderna e
transportam 90% do comércio mundial. Em paralelo com esta evolução espera-se o incremento da
poluição marítima e a utilização dos espaços marítimos pelo crime organizado e por organizações
terroristas. Há assim um novo paradigma para os Estados-nação que é a protecção dos espaços
marítimos e das linhas vitais para comunicação.
Como vimos, o transporte marítimo entre a Ásia e a Europa, poderá passar a circular, na sua vasta
maioria, através de vias marítimas situadas no Oceano Árctico.
Noutra perspectiva de competição internacional a ter lugar nos oceanos, pode antecipar-se que o
alto mar, o fundo do mar e as regiões polares irão ser palco de disputas à medida que a tecnologia
permitir o acesso aos seus recursos e a necessidade desses recursos encorajar a sua exploração.
A competição irá centrar-se na pesca, cada vez mais escassa, na mineração do fundo oceânico, na
extracção de petróleo e gás, mas também se pode estender aos direitos de passagem e de
negação de passagem.
A Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar de 1982 abriu a possibilidade dos países
mais pobres usufruírem das riquezas dos fundos dos oceanos que ficam para além das
plataformas continentais dos Estados, ou seja na «Área». No entanto, a dinâmica a que estamos a
assistir é apenas a da extensão dos limites das plataformas dos Estados ribeirinhos.
Desde 1982, data de referência da Convenção, muitas evoluções houve na capacidade técnica para
explorar petróleo e gás do fundo do mar. No início dos anos 80 explorava-se o petróleo, no mar, a
menos de 300 m de profundidade. Actualmente, exploram-se estes recursos sob uma coluna de
água de 3000 m. Se tivermos em conta que o Oceano Atlântico tem uma profundidade média de
3350 m podemos antever que haverá iniciativas futuras dos Estados ribeirinhos para ampliarem os
limites das suas plataformas, em especial se descobrirem indícios de grandes riquezas
submersas. Há áreas do Oceano Pacífico e do Índico que já estão concessionadas pela Autoridade
Internacional dos Fundos Marinhos. Os exploradores são os países tecnologicamente mais
evoluídos.
Os recursos naturais motivam muitas acções subtis dos Estados. Recorda-se, por exemplo, que em
2007, foi notícia a colocação de uma bandeira russa no fundo oceânico Árctico. A Dinamarca
respondeu com uma expedição científica e o Canadá com uma «operação de soberania», ou seja,
manobras militares. No Oceano Atlântico também há áreas de conflitualidade, um exemplo é a
reclamação, unilateral, do Reino Unido sobre parte da bacia Hatton-Rockall que também é disputada
pela Irlanda, Dinamarca (para as Ilhas Faroe) e Islândia. No Oceano Atlântico Sul também já há ecos
de algum desentendimento entre o Reino Unido, a Argentina e o Chile relativamente à delimitação
da plataforma continental.
Portugal e os desafios marítimos
A dimensão do mar português, um dos maiores no espaço europeu, reúne condições para se
expandir ainda mais quando for reconhecida a pretensão de expansão dos limites da plataforma
continental. Passaremos de 1,7 milhões de quilómetros quadrados para 3,6. Este alargamento
geopolítico oceânico dos limites da plataforma continental representa um grande desafio nacional e
uma oportunidade para as gerações futuras. No entanto, requer um esforço acrescido do País no
seu estudo, aproveitamento, segurança e defesa.
Segundo a SaeR no estudo o Hypercluster da economia do mar, apresentado em 17 de Fevereiro de
2009, o efeito total no Produto Interno Bruto (PIB) português das actividades ligadas ao mar, no ano
de 2005, terá sido da ordem dos 5% a 6% do PIB nacional. Nestes valores não são considerados os
resultados obtidos pelo turismo marítimo (balnear) e pela imobiliária turística costeira, que são
muito significativos.
Em termos futuros, as oportunidades que se vislumbram são muitas, vejamos algumas:
Se houver segurança em terra e no mar poderemos cativar turistas, balneares e náuticos, que
deixarão de ir para outras paragens, que se vão tornar inseguras.
Os portos nacionais vão ser importantes para o hypercluster do mar e mais importantes ainda à
medida que o preço dos combustíveis aumentar ou o petróleo escassear e começar a fazer sentido
ao transporte da América, de África e do Médio Oriente entrar em Portugal e ser depois transportado
por comboios eléctricos. Tal será viável se a Europa desenvolver a ferrovia e se conseguir gerar
energia barata a partir de fontes renováveis.
A Energia tem um potencial enorme, já que a União Europeia tem a ambição de gerar entre 14 a
17% da sua energia em 2020 a partir de geradores eólicos offshore. Prevê-se que em 2030 esse
número passe para um valor entre 26 a 35%. Assim, por exemplo, até 2030 vai ser necessário
instalar 10 000 novas turbinas no mar.
A Pesca é cada vez mais escassa e, por isso, é preciso valorizar o que existe, uma das
possibilidades é através da certificação do pescado. A aquicultura deverá compensar a diminuição
das capturas no mar e como tal deverá passar dos actuais 3% em Portugal e 19% na média
europeia para 50% em 2030. As algas também têm muitas aplicações entre as quais os
biocombustíveis, a alimentação ou a retenção de carbono.
Em Portugal, no Arquipélago dos Açores, temos uma situação única à escala mundial, em especial
na junção das três placas litosféricas (placa Americana, Africana e Euroasiática), trata-se de uma
região de ascensão de material a partir de regiões profundas do manto originando muitas fontes
hidrotermais. As estranhas formas de vida que aí vivem são a matéria-prima para a biotecnologia
azul.
Na nossa plataforma sabe-se que há nódulos, crostas e sulfuretos polimetáticos. Podemos obter do
mar manganês, que é importante para fazer aço super-duro, níquel, para o aço inoxidável e cobalto
para sistemas que funcionam a elevadas temperaturas. Os hidratos de metano são a energia
conhecida mais disponível no planeta. O Japão tem testes de produção previstos para este ano e
prevê a comercialização em 2016. Portugal também já descobriu a sul do Algarve a presença de
hidratos de metano. No fundo do mar é possível depositar dióxido de carbono que fica sob o aspecto
de gel. Pode ser uma potencialidade pois podemos vir obter compensações financeiras por conta de
quotas de carbono.
Se arrancar todo este potencial por certo que se começarão a desenvolver, em Portugal, novos
equipamentos que poderão ser exportados.
Considerações finais
Só mesmo a existência de petróleo abiótico nos pode suavizar as dificuldades que nos esperam.
Portugal importa a totalidade do petróleo e 2/3 do gás natural que consome por via marítima. Isto
significa que a segurança energética, que é muito mais do que a garantia do acesso às fontes e a
protecção do seu transporte, também vai ser um tema estratégico para Portugal. A análise
prospectiva que apresentei revela, com clareza, que este século será de corrida aos oceanos na
busca dos recursos que guardam.
O interesse pelos oceanos é tão grande que países como o Brasil vivem em grande euforia com as
descobertas de petróleo que têm feito no fundo do mar. A ideia da riqueza é tão animadora que o
Brasil chama à sua plataforma continental a «Amazónia Azul».
Deixo aqui umas ideias dispersas que se podem considerar no âmbito da elaboração de uma
estratégia como fazendo parte da análise de ambiente. No entanto, quando se entra num período de
incerteza e quando as alterações nas condições de acção exigem a adaptação de actividades e de
comportamentos para se conseguir manter a viabilidade e a sustentabilidade, o que é necessário é
pensamento estratégico e é da sua qualidade que dependerá a diferença entre o sucesso e o
fracasso, entre a autonomia e a subordinação, entre o crescimento e a estagnação, entre o
progresso e a decadência. O pensamento estratégico e a respectiva operacionalização é o que nos
deve mover como Nação se queremos enfrentar com serenidade o futuro. Só teremos as
capacidades necessárias para usar, explorar e proteger o nosso mar e as nossas linhas para
comunicação se soubermos desenvolver e concretizar ideias que consigam integrar de forma eficaz
e eficiente os elementos do Poder Nacional de que o País dispõe
O mar assegura-nos, de novo, uma oportunidade de grandeza, uma janela de liberdade e de
esperança, mas os complexos desafios que se avizinham requerem uma liderança política com
visão, sabedoria, antecipação, determinação, agilidade e imaginação, pois só assim poderemos
continuar a ser uma Nação «valente e imortal».
[1] Artigo publicado na Revista da Armada n.º 443, edição de Julho de 2010. Este artigo surge na
sequência de um outro sobre “o mar actual” publicado na Revista da Armada de Maio de 2010.
[2] Capitão de Fragata de Marinha.
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