158 ARTIGO DE REVISÃO Claúdia Layse Almeida Souza1 João Márcio Nunes de Alencar2 Marcella Alves da Paz3 Ulisses Umbelino dos Anjos4 Jailson Alberto Rodrigues5 Influência da multiparceria sexual na infecção pelo vírus da imunodeficiência humana em jovens: uma revisão sistemática com meta-análise Influence of multiple sexual partnerships on Human Immunodeficiency Virus infection in young people: a systematic review with meta-analysis > RESUMO Objetivo: Identificar a influência da multiparceria sexual na vulnerabilidade à infecção pelo HIV nos jovens. Fontes de dados: Realizou-se uma revisão sistemática da literatura, com meta-análise de estudos observacionais, sobre a associação da infecção pelo vírus da imunodeficiência humana - HIV e multiparceria sexual. Foi realizada uma busca de artigos nas bases de dados PubMed e ADOLEC e, no periódico Journal Adolescent Health. 41.690 artigos foram encontrados, desses 29 atendiam os critérios de inclusão. Para avaliar a qualidade metodológica dos artigos foi utilizada a escala PEDro, onde somente seis (06) trabalhos científicos mostraram-se elegíveis para a meta-análise. Síntese dos dados: Após a aplicação dos procedimentos meta-analíticos, observou-se que a adoção da multiparceria sexual aumenta em 2,66 vezes as chances de o jovem ser infectado pelo HIV. Conclusão: A multiparceria sexual é um forte determinante da infecção pelo HIV nos jovens, evidenciando, assim, a importante necessidade da implementação de estratégias preventivas que considerem os aspectos sexuais desse público. > PALAVRAS-CHAVE HIV, saúde do adolescente, parceiros sexuais. > ABSTRACT Objective: To identify the influence of multiple sexual partnerships on vulnerability to HIV infection among young people. Data source: A systematic review of the literature, with meta-analysis of observational studies on associations between HIV infection and multiple sexual partnerships. A search for papers was conducted in the PubMed and ADOLEC databases and the Adolescent Health Journal, resulting in 41,690 papers, of which 29 met the inclusion criteria. The methodological quality of the papers was assessed by the PEDro scale, leaving only six scientific studies eligible for the meta-analysis. Data Synthesis: On completion of the meta-analysis, it was noted that multiple sex partnerships increase HIV infection risks by 2.66 among Bacharel em Enfermagem pela Universidade Federal do Piauí (UFPI). Teresina, PI, Brasil. 1 2 Graduando de Enfermagem da Universidade Federal do Piauí (UFPI). Teresina, PI, Brasil. 3 Bacharel em Enfermagem pela Universidade Federal do Piauí (UFPI). Teresina, PI, Brasil. Doutor em Estatística pela Universidade de São Paulo (USP). São Paulo, SP, Brasil. Docente do Programa de Pós-Graduação em Modelos de Decisão e Saúde da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). João Pessoa, PB, Brasil. 4 Doutorando de Modelos de Decisão e Saúde da Universidade Federal do Piauí (UFPI). Teresina, PI, Brasil. Mestre em Modelos de Decisão e Saúde pala Universidade Federal da Paraíba (UFPB). João Pessoa, PB, Brasil. Docente do curso de Enfermagem do campus Amílcar Ferreira Sobral, Universidade Federal do Piauí (UFPI). Teresina, PI, Brasil. 5 Jailson Alberto Rodrigues ([email protected]) - Rua França, 11, Jardim Europa, Patos - PB. CEP: 58705 - 090. Recebido em 11/07/2014 – Aprovado em 18/10/2014 Adolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, supl. 2, p. 158-166, setembro 2016 Adolescência & Saúde Souza et al. INFLUÊNCIA DA MULTIPARCERIA SEXUAL NA INFECÇÃO PELO VÍRUS DA IMUNODEFICIÊNCIA HUMANA EM JOVENS: UMA REVISÃO SISTEMÁTICA COM META-ANÁLISE 159 young people. Conclusion: Multiple sexual partnerships constitute a major determining factor for HIV infection among young people, thus underlining the need to implement preventive strategies tailored to the sexual habits of this public. > KEY WORDS HIV, adolescent health, sexual partners. > INTRODUÇÃO Desde o surgimento da infecção pelo HIV e, por conseguinte, de sua manifestação através da síndrome da imunodeficiência adquirida (Aids), o mundo testemunhou grandes conquistas no sentido de prevenir e controlar esse grave problema de saúde pública. Entretanto, apesar dos grandes avanços, a incidência de infecção pelo HIV continua crescendo. Aproximadamente, 70 milhões de pessoas já foram infectadas pelo HIV, desde seu aparecimento e, cerca de 36 milhões de pessoas morreram de Aids. No Brasil, desde os primeiros registros da Aids até junho de 2013, 686.478 casos foram registrados1-3. A Aids surgiu inicialmente como uma ‘doença do outro’, acometendo especialmente alguns subgrupos populacionais, os quais supostamente mostravam ser mais vulneráveis à infecção pelo HIV. Incluíam nestes ‘grupos de risco’ os homens que fazem sexo com outros homens (HSH), hemofílicos e usuários de drogas injetáveis (UDI)4. Entretanto, a partir da década de 1990, as análises epidemiológicas começam apontar importantes mudanças no perfil da epidemia, delineando tendências multifacetárias da infecção pelo HIV, apontando contextos de vulnerabilidade e caracterizando um perfil de heterossexualização, feminização, juvenização, interiorização e pauperização da Aids no Brasil5. Vê-se, diante dessa conjuntura, que a epidemia atrelou-se em definitivo as iniquidades econômicas e de gênero, recaindo seus custos, sociais, morais e financeiros, desproporcionalmente sobre populações e indivíduos mais vulneráveis socialmente. Entre esses atores sociais estão os jovens, público entre 15 e 24 anos de idade, que, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), representa 50% das novas infecAdolescência & Saúde ções pelo HIV em todo o mundo, cinco a seis mil jovens se infectam a cada dia, e a maioria delas nos países em desenvolvimento6. No Brasil, o número de casos de Aids registrados na população jovem, de 1980 a junho de 2013, foram 72.196 casos, destacando que, a partir de 2007, houve um aumento da taxa de detecção de casos, passando 7,7/100.000 habitantes, em 2006, para 11,8/100.000 habitantes em 2012. Observa-se tendência de aumento na taxa de detecção em jovens em quase todas as regiões, exceto na região Sul, e, entre aquelas regiões com aumento, destacam-se as regiões Norte e Nordeste1. Tais dados tornam o percentual de infecções na população jovem mais significativo, considerando o período de incubação do HIV em uma média de 10 anos. Supomos que grande parte das notificações em pessoas com idade entre 30 e 49 anos, faixa etária em que a Aids apresenta maiores taxas de detecção, corresponda a indivíduos que se infectaram na juventude1, 7. Dentre os fatores determinantes da alta incidência de casos Aids na juventude, tem-se: maior número de parceiras(os) sucessivas(os) ou simultâneas(os); concepções erradas a respeito do HIV/Aids e de sua transmissão; falta de uso constante e correto dos métodos de prevenção; taxas mais elevadas de IST (Infecções Sexualmente Transmissíveis), influência dos grupos sociais em que os jovens se relacionam; as relações desiguais de poder e relações de gênero8-10. Os jovens integram um grupo populacional com multifatores que os vulnerabilizam a infecção pelo HIV e, dentre eles, se inclui a multiparceria sexual: esse tipo de atitude está muito presente nas relações afetivos sexuais dos jovens, e a maioria desses vê isso como uma práAdolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, supl. 2, p. 158-166, setembro 2016 160 INFLUÊNCIA DA MULTIPARCERIA SEXUAL NA INFECÇÃO PELO VÍRUS DA IMUNODEFICIÊNCIA HUMANA EM JOVENS: UMA REVISÃO SISTEMÁTICA COM META-ANÁLISE tica comum a todos. Diante disso, emerge a necessidade de identificar o quanto a variabilidade de parceiros sexuais interfere na infecção pelo HIV, na população jovem. Pois o conhecimento acerca desta temática torna-se importante colaborador na promoção da saúde, prevenção e controle da infecção. Além disso, percebe-se que a realização deste estudo trouxe a oportunidade de definir mais precisamente o quanto a variabilidade de parceiros sexuais interfere na infecção pelo HIV. A partir disso, melhores estratégias de enfrentamento desta problemática poderão ser implementadas, bem como políticas públicas mais eficazes e integrais voltadas à juventude poderão ser discutidas loco regional e nacionalmente. Como objetivo, tem-se identificar a influência da multiparceria sexual na vulnerabilidade à infecção pelo HIV nos jovens. > MÉTODOS Trata-se de uma revisão sistemática com meta-análise de estudos observacionais, onde se realizou um levantamento bibliográfico no banco de dados PubMed (National Center for Biotechnology Information/ National Library of Medicine), no Journal Adolescent Health e ADOLEC (Biblioteca Virtual em Saúde do Adolescente). A escolha desses bancos de dados para busca dos estudos se justifica pela relevância científica dos mesmos, bem como pelo fato do Journal Adolescent Health e ADOLEC possuírem estudos específicos para a faixa etária em questão neste estudo. A população do estudo é do tipo finita, composta por todos os artigos encontrados nas bases de dados, por meio das estratégias de busca utilizadas, os quais abordaram em seu conteúdo a multiparceria sexual entre os jovens. A amostra é do tipo não probabilística, definida a partir dos critérios de inclusão. Utilizaram-se como critérios de inclusão dos textos para compor a amostra: - Artigos classificados no sumário da revista como texto completo ou de pesquisa original; Adolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, supl. 2, p. 158-166, setembro 2016 Souza et al. - O artigo deveria estar disponível para acesso a seu conteúdo online e gratuito em quaisquer umas das bases de dados citadas; - Ser publicado por revista classificada com qualis CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) ou de classificação internacional; - Artigo publicado no período de 2004 a 2014; - Apresentar dados suficientes para calcular a estimativa ou medida de efeito, razão de chances (OR- odds ratio); - Que a amostra do artigo apresentasse pelo menos dois extratos; - Ser aprovado nos critérios classificatórios estabelecidos na Escala PEDro11 e que obtenha pontuação afirmativa igual ou maior que 60% das respostas, quando da avaliação pela aplicação da escala. Utilizaram-se como critérios de exclusão para os textos não participarem da amostra: - Trabalhos que não abordaram a temática ou a multiparceria sexual em jovens como uma das variáveis de interesse. Descreve, aqui, como multiparceria sexual ter mais de um parceiro sexual, em período de três meses, um ano, ou durante a vida inteira, ou, ainda, simultaneamente em uma mesma relação sexual, ou seja, até o momento que respondeu o questionário dos estudos em questão. - Não seguir os critérios de inclusão. A todos os artigos selecionados, foi aplicada a escala PEDro, com vistas a avaliação da qualidade metodológica, mas também foram analisados a partir de um instrumento norteador de avaliação da qualidade e cumprimento dos critérios de inclusão. Para cada item avaliado e aprovado, a partir do instrumento de avaliação, atribuiu-se peso um. Dessa maneira a pontuação total alcançada variou de zero (artigo de má qualidade) a sete (artigo de boa qualidade). A coleta de dados foi realizada no período de setembro de 2013 a fevereiro de 2014. As pesquisas foram realizadas através da internet, Adolescência & Saúde nas bases de dados escolhidas. Durante a busca utilizamos os seguintes descritores, cadastrados nos Descritores em Ciências da Saúde - DeCS: (em inglês) HIV, Aids, young, adolescent, sexuality, sexual partners, riskfactors, sexual behavior; (em português) adolescentes, comportamento sexual, fatores de risco, sexualidade. Houve, também, busca com termos livres, sem o uso de vocabulário controlado (descritores), para maior abrangência de estudos. Para isso, foram utilizados os termos: teen, HIV positive, HIV negative. Os artigos encontrados, 41.690, foram inicialmente filtrados e desses, 7.952 artigos encontravam disponíveis em texto completo e gratuito, com ano de publicação igual ou superior a 2004. Posteriormente foram avaliados quanto aos critérios de inclusão com auxílio do instrumento de avaliação da qualidade. Aqueles que obtiveram aprovação - pontuação igual ou superior a quatro - seguidamente foram consultados quanto à idade dos participantes que compõem a amostra, já que este trabalho objetiva identificar a influência da multiparceria sexual na infecção pelo HIV em jovens. Assim, a idade estabelecida como critério de inclusão variou de 15 a 26 anos de idade. Dos 29 artigos aprovados pelo instrumento de avaliação da qualidade, oito deles tinham amostra composta por participantes de idade entre 15 e 26 anos. Os oitos artigos foram analisados a partir da escala PEDro, e seis (06) deles foram aprovados. Todos os estudos selecionados foram apresentados descritivamente em tabelas e gráfico. Realizou-se a meta-análise pelo método dos efeitos randômicos, considerando-se como hipóteses testadas: H0 : A Influência da multiparceria sexual, independente do tamanho e características da amostra, a vulnerabilidade à infecção pelo HIV dos jovens (modelo de efeito fixo). H1: A Influência da multiparceria sexual de modo diferente, considerando o tamanho e características da amostra, a vulnerabilidade à infecção pelo HIV dos jovens (modelo de efeito aleatório). Adolescência & Saúde 161 INFLUÊNCIA DA MULTIPARCERIA SEXUAL NA INFECÇÃO PELO VÍRUS DA IMUNODEFICIÊNCIA HUMANA EM JOVENS: UMA REVISÃO SISTEMÁTICA COM META-ANÁLISE O banco de dados do estudo, contendo os dados para cálculo das estimativas ou medidas de efeito, bem como seus intervalos de confiança, foi elaborado no Excel for Windows 2007 e, convertido em texto separado por tabulação (txt). Utilizou-se o software R para condução dos procedimentos estatísticos e elaboração do forest plot. Esses indicaram a estimativa meta-analítica, considerando um nível de significância de 5% (alfa = 0,05), e foi calculada a estatística do teste – (I2)12. RESULTADO E DISCUSSÃO > Souza et al. Os estudos inclusos em uma meta-análise podem apresentar resultados/indicadores tão heterogêneos, que o resultado síntese dos estudos pode não ser confiável. No entanto, mesmo que os artigos amostrais apresentem alto grau de heterogeneidade, isso não invalida a possibilidade de realização de uma meta-análise com eles13. Diante das possíveis diferenças – heterogeneidades – metodológicas e dos resultados dos estudos selecionados para fazer uma meta-análise, se faz necessário o agrupamento destes, de acordo com a qualidade, os participantes e as intervenções realizadas. A formulação de uma questão-problema específica, sem critérios rígidos de inclusão e exclusão para os participantes desses estudos, intervenção e variáveis estudadas é a forma mais adequada. Esse motivo traz perspectivas para a realização de procedimentos meta-analíticos em estudos de variados recortes de tempo e espaço e, desenhos metodológicos distintos, conforme descrito abaixo, onde foram apresentados os artigos selecionados para a meta-análise com as características de interesse: autores, título e o objetivo principal14-19. Kagimu M, Guwatudde D, Rwabukali C, Kaye S, Walarika Y, Ainomugisha D. Religiosity foi HIV prevention in Uganda: a case study among Christian younth in Wakiso district. African Health Sciences, 2010; 12(01): 17-25. Objetivo: Determinar a associação entre religiosidade e as taxas de prevalência do HIV entre os cristãos. Adolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, supl. 2, p. 158-166, setembro 2016 162 INFLUÊNCIA DA MULTIPARCERIA SEXUAL NA INFECÇÃO PELO VÍRUS DA IMUNODEFICIÊNCIA HUMANA EM JOVENS: UMA REVISÃO SISTEMÁTICA COM META-ANÁLISE Souza et al. Rositch AF, Cherutich P, Brentlinger P, Kiarie JNM, Nduati R, Farguhar C. Hiv infection and sexual partnerships an behavior among adolescent girls in Nairobi, Kenya. Int J STD AIDS. 2012; 23(7): 468-74. Objetivo: Examinar os fatores associados aos comportamentos sexuais e parceiros que expõem as adolescentes para HIV. Oster AM, Dorell CG, Mena LA, Thomas PE, Toledo CA, Heffelfinger JD. HIV Risk Among Young African American Men Who Have Sex With Men: A Case–Control Study in Mississippi. American journal of Public Health. 2011; 101(1): 137-43. Objetivo: Identificar os fatores associados à infecção pelo HIV entre os homens jovens afro-americanos que fazem sexo com homens (HSH). Gómez W, Damaso B, Cortegana C, Lahura P, Motta J. Comportamientos sociales y sexuales asociados a las infecciones de transmisión sexual em jóvenes del alto Huallaga. AnFac Med. 2008; 69(1):17-21. Objetivo: Determinar a associação de comportamentos sociais e sexuais com doenças sexualmente transmissíveis (DST / HIV / AIDS), em jovens do Alto da Huallaga, 2004. Gavin L, Galavotti C, Dube H, McNaghten AD, Murwirwa M, Khan R et al. Factors associated with HIV infection in adolescent females in Zimbabwe. Jounal of Adolescent Health. 2006; 596: 11-19. Objetivo: Identificar os fatores associados com o vírus da imunodeficiência humana (HIV), entre adolescentes do sexo femi- nino em Zimbabwe e estratégias de prevenção adequadas para esta população vulnerável. Jewkes R, Dunkle K, Nduma M, Levin J, Jama N, Khuzwayo N et al. Factors associated with HIV sero-positivity in young, rural South African men. International Journal of Epidemiology. 2006; 35:1455-60. Objetivo: Descrever os fatores associados à infecção pelo HIV em homens com idade entre 15-26 anos. A Tabela 1 apresenta as características de publicação dos estudos que fazem parte da amostra, como ano de publicação de cada estudo, que ficou situado de 2006 a 2012, portanto recentes publicações; apresenta, também, a região onde cada estudo foi desenvolvido, com prevalência de estudos desenvolvidos na África, revelando, assim, a grande necessidade de atenção que esta região necessita por ser uma região que apresenta uma das populações de maior vulnerabilidade para a infecção pelo HIV, e evidencia, também, a carência de estudos dessa natureza desenvolvidos no Brasil; apresenta, ainda, as revistas nas quais foi publicado cada estudo: essas foram todas internacionais. Ao serem avaliados pela aplicação da escala PEDro, os artigos apresentaram pelo menos um resultado-chave para as comparações estatísticas intergrupos, que fossem pertinentes à temática prática da multiparceria sexual por jovens. A partir disso, foi possível extrair uma medida meta-analítica final significativa que justificasse a realização da meta-análise. Autores Ano de publicação Região do estudo Revista de publicação Kagimu et al.14 2012 Uganda African Health Sciences Rositch et al.15 2012 Quênia Int. J. STD AIDS Oster et al. 2011 Estados Unidos American Journal of Public Health Gomez et al. 2008 República do Peru An. Face Med. Gavin et al. 2006 Zimbabwe Journal of Adolescent Health Jewkes et al.19 2006 Província do Cabo Oriental 16 17 18 Adolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, supl. 2, p. 158-166, setembro 2016 International Journal of Epidemiology Adolescência & Saúde Souza et al. A análise dos dados quantitativos foi realizada baseada em um modelo de efeitos aleatórios, em que a inferência estatística é condicionada a estudos já realizados, isto é, o estudo tem característica retrospectiva. A partir disso, apresentamos a medida síntese da razão de riscos (odds ratio) de Mantel-Haenzel, com respectivo intervalo de confiança (IC), ao nível de significância de 0,05. O forest plot mostra o risco relativo de um jovem que pratica a multiparceria sexual infectar-se pelo HIV, com os valores correspondentes à razão de riscos (OR) e respectivos intervalos de confiança a 95% dos estudos selecionados e com base em um modelo de efeitos aleatórios. Intervalo de confiança (IC) é o intervalo no qual as proporções de eventos (prática da multiparceria sexual) seriam verificadas em 95% das vezes, se esse mesmo estudo fosse repetido 100 vezes. A verificação dos limites inferior e superior do intervalo de confiança permite determinar os benefícios da variável em estudo13. Os IC estão representados pelas linhas horizontais e, ao lado direito destas, entre parênteses, estão os valores do limite inferior e superior de cada intervalo. A figura geométrica centralizada em cada IC, neste caso os quadrados, representa o valor da OR de cada estudo que compôs a amostra e seu tamanho é proporcional ao tamanho amostral dos mesmos. Desta forma, quanto maior a amostra do estudo incluso entre os artigos da meta-análise, maior será o tamanho do quadrado, ou seja, maior seu peso na amostra da meta-análise. É possível verificar que a medida sumário (OR = 2,66) ratifica a multiparceria sexual como um fator ou comportamento de risco para infecção pelo HIV, ou seja, sua adoção torna o indivíduo mais vulnerável. Diante dessa medida síntese, é possível notar que a adoção dessa prática pode aumentar em 2,66 vezes as chances de o jovem ser infectado pelo vírus. A relação multiparceria sexual e infecção pelo HIV em jovens é um fato estatisticamente comprovado neste estudo, corroborando, dessa forma, com o resultado de outros estudos em Adolescência & Saúde INFLUÊNCIA DA MULTIPARCERIA SEXUAL NA INFECÇÃO PELO VÍRUS DA IMUNODEFICIÊNCIA HUMANA EM JOVENS: UMA REVISÃO SISTEMÁTICA COM META-ANÁLISE 163 que a multiparceria sexual também foi apontada como fator agravante da vulnerabilidade dos jovens ao HIV20-22. Com isso, os principais fatores estudados e evidenciados na literatura sobre a prática da multiparceria sexual ligada à vulnerabilidade da infecção pelo HIV em jovens estão relacionados ao consumo de drogas, à saúde mental, ao nível de escolaridade, à iniciação sexual precoce, ao tipo de relacionamento, ao estilo de vida e à situação econômica. O consumo de bebidas alcoólicas e o uso de drogas lícitas e ilícitas também estão associados ao aumento do número de parceiros sexuais, pois esses comportamentos aditivos, geralmente, determinam outros, os tornando comportamentos inter-relacionados. O uso frequente de cigarro ou maconha e manter relação sexual não planejada, sob a influência de álcool, aumentam as chances de ocorrência da multiparceria, ressaltando-se que esses comportamentos podem estar relacionados com o caráter exploratório da adolescência22-24. Isso torna essa etapa da vida um momento difícil, com relação ao desenvolvimento psicossocial. A luta para encontrar e testar sua própria identidade, para ‘encaixar’ e construir a autoestima, muitas vezes ocorre por meio da experimentação em diferentes áreas do comportamento, incluindo as relações sexuais23. A baixa escolaridade dos jovens também pode ser associada ao aumento do número de parceiros sexuais. Para manter uma vida sexual sadia o jovem precisa ter conhecimento sobre a prevenção do HIV e se autoperceber vulnerável à infecção, saber assimilar informações e, a partir disso, prevenir-se. Portanto, o processo de escolarização contribui para o estabelecimento de um comportamento de autoproteção, o qual se faz necessário aos jovens para a adoção das práticas de prevenção contra o HIV24. A idade precoce da primeira relação é outro fator que pode aumentar as chances de ocorrência da multiparceria sexual e, por conseguinte, da infecção pelo HIV. Quanto mais cedo o jovem iniciar a vida sexual, mais vulnerável estará, pois mais oportunidades terá de vivenciar novas Adolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, supl. 2, p. 158-166, setembro 2016 164 INFLUÊNCIA DA MULTIPARCERIA SEXUAL NA INFECÇÃO PELO VÍRUS DA IMUNODEFICIÊNCIA HUMANA EM JOVENS: UMA REVISÃO SISTEMÁTICA COM META-ANÁLISE experiências sexuais e, consequentemente, mais parceiros sexuais. Por isso, a abstinência sexual e o atraso no início da vida sexual são apontados como fortes estratégias de prevenção20. O tipo de relacionamento determina o aumento das práticas sexuais vulnerabilizantes ao HIV. Em relacionamentos casuais do tipo ‘ficar’, onde não há o compromisso afetivo e sexual de se estar com um único parceiro por indeterminado período de tempo, torna o envolvimento com diferentes parceiros sexuais mais comum. No entanto, há estudos25-27 que apontam esse tipo de relacionamento como protetor, já que é marcado pela imprevisibilidade do ato sexual e a preocupação com as IST incentiva a adoção de estratégias de preventivas. Stoebenaue e colaboradores21 descrevem, em seu estudo, associações significativas entre o estilo de vida e comportamento sexual de risco entre jovens. O estilo de vida do ‘jovem moderno’, de sair para a balada, ter múltiplos parceiros, consumir álcool, e manter-se na moda, pode incentivá-lo a prática da multiparceria sexual, pois visa mantê-lo inserido no estilo de vida socialmente mais aceito pelo imaginário da juventude. O interesse ou desejo de consumir bens pós-modernos, de tudo aquilo que é ‘padrão’ para a juventude, motiva o comportamento sexual. Isso acaba oportunizando aos jovens a visão do sexo como uma mercadoria. Assim, a prática da multiparceria sexual em jovens de baixo poder aquisitivo torna-se um indicativo da multiplicidade das necessidades a serem supridas, as quais não são suficientemente atendidas pelos pais e parceiro fixo, para manter-se nos padrões socioeconômicos da juventude 21, 28. Assim, todos os estudos selecionados, por exemplo, após aplicação da escala PEDro, evidenciaram a multiparceria como fator de risco para infecção pelo vírus por diferentes fatores associados a isso. O que exceto ocorreu no estudo conduzido por Rositch e colaboradores15, fato que pode estar associado ao tamanho da amostra ou ao processo de amostragem. De igual modo, dos indicadores encontrados nos estudos selecionados para amostra, Adolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 13, supl. 2, p. 158-166, setembro 2016 Souza et al. todos obtiveram significância estatística, no entanto, apenas o estudo realizado por Oster e colaboradores16 e Kagimu e colaboradores14 apresentaram um intervalo de confiança considerado grande. Fato que pode indicar a presença de viés por efeito do desenho metodológico desses estudos. Todas as medidas, inclusive a medida meta-analítica, apresentaram valores positivos. Pela análise dos intervalos de confiança, pode-se inferir que em nenhum dos estudos houve possibilidade de o OR encontrado apresentar valor igual a um (01), ou seja, da ocorrência de não relação entre o fator estudado (prática da multiparceria sexual) e o desfecho (infecção pelo HIV), comprovando a relação causal entre a variável estudada e a infecção HIV. Com isso, o método estatístico para testar a heterogeneidade dos dados foi baseado na variância geral, calculando-se o valor de Q (distribuição qui-quadrada com os graus de liberdade – número de estudos menos um) para os grupos de estudos escolhidos, fixando o valor de significância em 0,05 para a rejeição da hipótese de homogeneidade dos estudos. Houve significância estatística dos valores estimados, confirmando a existência de heterocedasticidade, verificando-se um valor Q = 233,9; com 05 (cinco) graus de liberdade e, p-valor < 0,0001. A estatística I2 sugere alto grau de heterogeneidade, evidenciando valor igual a 97,8%. A estatística I2 é a forma mais direta de verificar a existência e heterogeneidade através de proporção. Ela pode variar de valores negativos até 100%. Quando o valor for negativo ele é igualado a 0. O valor p de I2 é equivalente ao valor p de Q. Dessa forma, a estatística I2 quantifica a heterogeneidade: pelo percentual, quando o valor de I2 está próximo a 0% indica não heterogeneidade entre os estudos, próximo a 25% indica baixa heterogeneidade, próximo a 50% indica heterogeneidade moderada, e próximo a 75% indica alta heterogeneidade entre os estudos13. Rejeitou-se a hipótese nula (H0) de homogeneidade, diante da verificação do p-valor < 0,001, aceitando que existem diferenças signiAdolescência & Saúde Souza et al. ficativas, ao nível de 95%. Portanto, os estudos selecionados apresentam medidas diferenciadas da odds ratio. Portanto, diante das evidências apresentadas que a prática da multiparceria sexual é fator vulnerabilizante da infecção pelo HIV, a prevenção do HIV também deve considerar os determinantes dessa prática em jovens na criação de políticas públicas mais eficazes. > CONCLUSÃO O resultado desse estudo torna-se relevante, ao passo que possibilita identificar o quanto a multiparceria sexual influencia a vulnerabilidade à infecção pelo HIV. Embasa a criação de intervenções específicas voltada à juventude e reafirma a multiparceria sexual como fator preditor da infecção. INFLUÊNCIA DA MULTIPARCERIA SEXUAL NA INFECÇÃO PELO VÍRUS DA IMUNODEFICIÊNCIA HUMANA EM JOVENS: UMA REVISÃO SISTEMÁTICA COM META-ANÁLISE 165 Apesar disso, é importante salientar a existência de limitado quantitativo de estudos que abordam a relação da multiparceria sexual e infecção pelo HIV. Esse fato, associado às diversificações encontradas nas abordagens metodológicas dos estudos, pode ter contribuído para alta heterogeneidade encontrada, o que prejudicou, em parte, a validade estatística dos resultados. A enfermagem, conhecendo a influência da multiparceria sexual na infecção pelo HIV em jovens e os diferentes meios e contextos em que esse comportamento de risco se dá, deve ser capaz de planejar e implementar ações integrais, que considerem a interdependência das quatro dimensões da vulnerabilidade (individual, social, programática e cultural). Por meio de intervenções multidimensionais, que considerem as características do estilo de vida dos jovens, poderá contribuir para minimizar a incidência de casos de infecção pelo vírus nessa população. > REFERÊNCIAS 1. Brasil. Ministério da saúde. Secretária de Vigilância em saúde, Departamento de DST, Aids e Hepatites virais. Boletim epidemiológico: AIDS e DST. Brasília: Ministério da saúde. 2013;2(1). 2. 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