A ordenação de advérbios no latim clássico e no latim medieval

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Cadernos de Letras da UFF – Dossiê: Patrimônio cultural e latinidade, no 35, p. 49-59, 2008
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A ORDENAÇÃO DE ADVÉRBIOS NO LATIM
CLÁSSICO E NO LATIM MEDIEVAL
Mário Eduardo Martelotta
Wendel Processy
Monique Nascimento dos Santos
RESUMO
Este artigo propõe uma análise da ordenação dos advérbios qualitativos, temporais e locativos em textos
do latim clássico e do latim medieval. O objetivo
principal é estabelecer uma comparação entre as tendências de colocação desses elementos nessas duas fases
da língua latina e também com tendências que começam a se esboçar no português, em sua fase arcaica.
PALAVRAS-CHAVE: Advérbio, ordenação, mudança.
1 - Introdução
O
objetivo deste trabalho é analisar as tendências de ordenação
dos advérbios qualitativos, temporais e locativos1, no latim clás
sico e no latim medieval. Utilizamos como corpus os textos De Bello
Gallico2 e o discurso de Cícero em favor do poeta Arquia, retirado de Cicéron
Discours pour le Poete Archias et pour L. Flaccus3, para o latim clássico e o texto De
Rationibus Fidei de Thomas de Aquino, para o latim medieval. Desses textos,
retiramos os advérbios mencionados, sempre observando seus tipos e sua
ordenação.
1
2
3
Respectivamente, advérbios de modo, de tempo e de lugar, segundo a nomenclatura da gramática tradicional. Não serão observados aqui os casos em que esses advérbios se referem a
adjetivos, particípios ou a outros advérbios.
Foram observados os três primeiros livros do texto De Bello Gallico (Constans, 1926).
Gaffiot e Boulanger (1947).
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Martelotta, Mário Eduardo; Processy, Wendel; Santos, Monique Nascimento dos.
A ordenação de advérbios no latim clássico e no latim medieval
Este trabalho é parte de uma pesquisa desenvolvida, na área do funcionalismo lingüístico4, acerca da mudança de ordenação de diferentes tipos de
advérbios desde o latim, passando pelo português arcaico, até o português
atual. Vários trabalhos acerca da ordenação de advérbios qualitativos5 vêm
demonstrando que a ordenação desses advérbios parece estar associada ao
processo de gramaticalização sofrido por determinadas estruturas sintáticas.
Martelotta (2004), com base em Givón (1979), propõe que a cláusula principal declarativa, afirmativa, ativa, neutra apresenta uma maior liberdade e variedade de elementos significativos, enquanto que a distribuição desses elementos, em todos os outros tipos de cláusula, é sempre mais restrita. Isso faz com
que esses outros tipos de cláusula tendam a exibir grande conservadorismo
sintático, sobretudo, no que diz respeito à ordenação vocabular. Com isso,
essas cláusulas tenderiam a apresentar ordenações mais antigas.
Resta observar qual seria a tendência de ordenação mais antiga do que a
registrada no português arcaico, ou seja, aquela que caracteriza as ocorrências
desses advérbios em textos latinos. Com relação a isso, podemos ver em Ernout
e Thomas (1993: 162), que, no latim, de um modo geral, o elemento
determinante tende a preceder o determinado e que, desse modo, os advérbios se colocam antes do termo que eles modificam. Por sua vez, Marouzeau
(1949: 16), ressalta a tendência de os advérbios qualitativos latinos com valor
semelhante aos de bem e mal (assim como os intensificadores muito e pouco)
ocuparem as posições pré-verbais, freqüentemente constituindo com os verbos “une locution quasi invariable, sinon même um véritable mot composé”.
O presente trabalho tem, portanto, como objetivo constatar o que está apresentado em Ernout e Thomas (1993) e em Marouzeau (1949), detectando as
tendências de ordenação dos advérbios no latim, através da observação de
textos do latim clássico e medieval.
Além disso, procuraremos observar a distância entre o advérbio e o
verbo. A tendência do português atual é o advérbio aparecer posposto, colocando-se exatamente ao lado do verbo, ou seja, não ocorrendo nenhum elemento entre esse dois termos. No caso do latim, acreditamos que, na fase
clássica, esses advérbios ocorram mais distantes do verbo, enquanto que, no
período medieval, em que o latim começa a apresentar tendências de ordena4
5
Cunha, Oliveira e Martelotta (2003).
Martelotta (2004); Martelotta (2005); Martelotta (2006); Martelotta e Vlcek (2006).
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ção mais próximas às do português, os advérbios em estudo ocorram mais
próximos ao verbo a que se referem.
Partimos, portanto, da hipótese de que a colocação mais comum dos
advérbios latinos aqui observados é a pré-verbal, tanto nos textos clássicos
quanto nos medievais. Entretanto, acreditamos encontrar uma diferença de
colocação dos advérbios nas fases clássica e medieval: no latim medieval os
advérbios tendem a ocorrer mais próximos ao verbo. Essa hipótese se relaciona à expectativa de com o desaparecimento das marcas morfológicas de advérbio (sobretudo dos qualitativos, que estão mais semanticamente ligados ao
verbo), passe o funcionar o princípio de iconicidade, mais especificamente ao
subprincípio da proximidade6, que propõe uma relação entre proximidade
semântica e proximidade sintática: como os advérbios são termos de valor
determinante, devem ocorrer próximos aos elementos que determinam.
Seguindo a evolução da mudança, a ordenação pré-verbal tipicamente
latina, começa a desaparecer no português arcaico, conforme propõe
Martelotta (2004), inicialmente na cláusula principal declarativa, afirmativa, ativa, neutra, ficando ainda perceptível em cláusulas que apresentam maiores níveis de encaixamento ou gramaticalização: as chamadas
subordinadas (sobretudo as reduzidas). Isso ocorre, como veremos adiante, pelo fato de que, por serem estruturas altamente gramaticalizadas,
essas cláusulas apresentam alto grau de cristalização, resistindo mais a
estratégias expressivas do falante, como topicalização, focalização e outras que implicam movimento de ordenação.
Apesar de seu conservadorismo sintático, essa tendência, com o tempo,
vai desaparecendo também nas cláusulas mais encaixadas ou gramaticalizadas.
Assim, a mudança de colocação dos advérbios vai ocorrendo, de modo gradual,
da posição pré-verbal latina à pós-verbal do português contemporâneo, começando nas estruturas sintáticas menos gramaticalizadas.
Outros trabalhos, como Martelotta (2005), Martelotta e Vlcek (2006) demonstram que, embora em menor grau, ainda se encontram, no século XIX,
ocorrências pré-verbais em cláusulas gramaticalizadas. Isso reforça a proposta
de autores como Pagotto (1998) e Tarallo (1993) de que o século XIX é o
período em que ocorrem grandes mudanças na sintaxe do português do Brasil.
6
Givón (1990).
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Martelotta, Mário Eduardo; Processy, Wendel; Santos, Monique Nascimento dos.
A ordenação de advérbios no latim clássico e no latim medieval
2- Os graus de gramaticalização e o conservadorismo sintático
Partimos aqui, com Hopper e Traugott (2003), da proposta de que o
chamado período composto apresenta três tipos de cláusulas, que refletem
diferentes níveis de encaixamento:
1 - Parataxe ou independência relativa, exceto como restringida pela pragmática de fazer sentido e relevância.
2 - Hipotaxe ou interdependência, em que há um núcleo e uma ou mais
cláusulas que não podem ficar sozinhas e que, conseqüentemente, apresentam uma relativa dependência. Entretanto elas não se incluem completamente em qualquer constituinte do núcleo, o que as diferencia das subordinadas.
3 - Subordinação, ou, em sua forma extrema, encaixamento; em outras
palavras, dependência completa, em que uma margem está completamente
incluída no núcleo.
Esses três tipos de cláusulas podem ser, então, caracterizados pela
seguinte trajetória de gramaticalização em direção a estruturas mais encaixadas, ou, em outras palavras, mais gramaticalizadas:
parataxe > hipotaxe > subordinação
-dependente +dependente +dependente
-encaixada -encaixada +encaixada
Isso significa que as cláusulas subordinadas são mais gramaticalizadas
do que as hipotáticas, por apresentarem níveis maiores de dependência e
encaixamento7. Do mesmo modo, as cláusulas hipotáticas são mais
gramaticalizadas do que as paratáticas.
Givón (1990), ao tratar de estruturas subordinadas, argumenta que as
cláusulas reduzidas são mais encaixadas do que suas correspondentes não
reduzidas, já que: (i) não apresentam conjunção subordinada, ligando-se diretamente à sua principal; (ii) o sujeito da subordinada tende a ser menos agentivo;
(iii) o verbo da subordinada apresenta características nominais, ou seja, perde
7
Diferentemente da proposta da gramática tradicional, Hopper e Traugott (2003) utilizam o
termo hipotaxe para se referir às tradicionais subordinadas adverbiais e as adjetivas explicativas
e o termo subordinação para englobar os casos tradicionalmente classificados como subordinadas substantivas e adjetivas restritivas.
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status de elemento verbal e (iv) o verbo da subordinada tende a apresentar o
mesmo sujeito do da principal.
No que diz respeito à questão do conservadorismo sintático, Givón (1979)
propõe que a maior liberdade e variedade de elementos significativos tende a
ocorrer no tipo de estrutura que ele caracteriza como a cláusula principal, declarativa, afirmativa, ativa, neutra. Por outro lado, tanto no que se refere a itens
lexicais quanto a construções sintáticas, a distribuição dos elementos significativos, em todos os outros tipos de cláusula, é sempre mais restrita.
Quando Givón menciona outros tipos de cláusulas, quer se referir, em
linhas gerais, às cláusulas subordinadas, imperativas, negativas, passivas, que tendem
a apresentar estruturas mais fixas do que o tipo a cláusula por ele tratada
como apresentando um tipo neutro, ou não-marcado (a cláusula principal, declarativa, afirmativa, ativa). Isso se dá em parte em função do fenômeno da pressuposição discursiva, ou seja, o grau de pressuposicio-nalidade – ou previsibilidade
informativa – dos elementos constituintes da sentença. Esse fenômeno está
relacionado ao grau de dificuldade que o falante acha que o ouvinte terá em
determinar uma única referência para um referente no discurso. E, segundo
Givón (1979), a cláusula principal, declarativa, afirmativa, ativa neutra apresenta a
complexidade pressuposicional mais baixa no discurso, se comparada a todos
os outros tipos.
A lógica por trás desse raciocínio pode ser compreendida se pensarmos
que se há menos informação pressuposta em um determinado tipo de cláusula, o falante pode trabalhar comunicativamente sua estrutura. Por outro lado,
sé há muita informação pressuposta a informatividade da estrutura é mais
baixa, o que tem como conseqüência um arranjo sintático menos expressivo,
portanto, mais fixo.
Para esta análise, o tipo de cláusula que mais importa é a cláusula subordinada, que além de apresentar alto nível de pressuposicionalidade, é mais
fixa, em função de seu nível de gramaticalização. Tomemos como base os
exemplos abaixo:
(1) a. João gosta de jogar futebol.
b. De jogar futebol João gosta.
c. Futebol João gosta de jogar.
d. *João gosta de futebol jogar.
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A ordenação de advérbios no latim clássico e no latim medieval
Se observarmos as quatro sentenças acima, notamos que 1b. e 1c. são
inversões possíveis da ordem mais comum, expressa em 1a., em contexto de
ênfase ou topicalização contrastiva. No caso de 1b., é de jogar futebol que João
gosta e não de outra atividade e, no caso de 1.c., é futebol que João gosta de
jogar e não outro esporte. Esse tipo de ênfase não é possível em 1.d, o que torna
a sentença agramatical, ou pelo menos, menos aceitável do que as demais.
O ponto básico com relação às subordinadas é esse: por apresentar um
alto grau de encaixamento em relação à sua principal, tende a funcionar como
uma parte dela. Assim, são menos passíveis de ter sua ordenação modificada
por questões de pressuposição, de ênfase, de topicalização contrastiva, ou de
qualquer outro fenômeno discursivo. Por isso ela é mais conservadora. Por
isso as inovações em termos de ordenação vocabular – que, segundo a visão
funcionalista aqui utilizada, são provenientes da expressividade do falante no
discurso – penetram nesse tipo de cláusula com mais dificuldade, ou tardiamente, se pensarmos em termos de mudança diacrônica.
3- As posições observadas
Com o objetivo de detectar a colocação dos advérbios estudados, assim
como sua proximidade ao verbo, procuramos observar, no texto analisado, as
seguintes posições8:
a) Posição AXV
(2) ... quamdiu (tempo) incolumis (nom. sing) fuit (verbo)
por tanto tempo
incólume
esteve
(Pro Archia, V, 9)
TRADUÇÃO: ... esteve em segurança por tanto tempo...
b) Posição AV
(3) ...telaque (nom.pl/conj.) ex (prep) loco (abl.sing) superiore (abl.sing)
dardos e
de
local
superior
missa (ac.pl) non frustra (modo) acciderent (v.fin)
coisas enviadas não inutilmente
atingiram
(Bello Gallico, III, XXV,1)
8
A= advérbio (qualitativo, locativo ou temporal), V= verbo e X= qualquer elemento (palavras
ou sintagmas) que ocorra entre o advérbio e o verbo.
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TRADUÇÃO: ...e de um local superior os dardos atingiram inutilmente
as coisas enviadas.
c) PosiçãoVA
(4) ...quod (conj.) ipse (pron.) aberat (v.fin.) longius (lugar)
porque próprio distava mais longe
(Bello Gallico, III, IX,1)
TRADUÇÃO: ...porque o próprio distava mais longe.
Procuramos, então, observar a distribuição dos tipos de advérbios aqui
analisados por essas posições nos textos referentes aos períodos clássico e
medieval do latim. Vejamos agora o que encontramos.
4- Análise dos dados
Passemos agora à análise da ordenação dos advérbios qualitativos, temporais e locativos nos textos do período clássico e medieval da língua latina.
4.1- Os tipos de advérbios
Fizemos um levantamento inicial dos advérbios referentes a verbos que
apareceram nos dois textos do latim clássico e no texto do latim medieval9
analisados, observando sua distribuição na cláusula em que ocorre. Ao final
da análise levantamos um total de 323 advérbios no latim clássico e um total
de 77 no latim medieval, distribuídos do modo como se pode ver nos gráficos
abaixo:
Tabela 1: Distribuição dos advérbios estudados pelas duas fases do latim
9
Como esta é uma pesquisa em andamento, esta análise se refere à observação de dois textos
clássicos e apenas um medieval. Entretanto, pretendemos observar mais um texto medieval
para comparar um quantidade de dados mais equilibrada entre as duas épocas.
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A ordenação de advérbios no latim clássico e no latim medieval
O que merece comentário nessa tabela é o fato de haver maior número
de advérbios qualitativos do que dos demais: temporais e locativos são, em
geral, muito mais produtivos que os qualitativos. Isso se explica pelo fato de
que somente observamos advérbios simples, deixando de lado as locuções
adverbiais. Ocorre que latim era rico em processos morfológicos de formação
de qualitativos, que não ocorria com os temporais e locativos, que apareceram
mais em forma de sintagma adverbial.
Os advérbios qualitativos no latim eram formados por afixos específicos de advérbio, como -e e -iter, colocados, respectivamente, nos adjetivos de
primeira classe e de segunda classe.
(5) His facile pulsis ac proturbatis.
estas facilmente pancadas e expulsáveis
(BG II, XIX, 7)
TRADUÇÃO: E vós expulsáveis facilmente a eles com estas pancadas.
(6) Acriter in eo loco pugnatum est.
energicamente em este local combateu
(BG II, X, 1)
TRADUÇÃO: Combateu-se neste local energicamente.
Por outro lado os advérbios de temporais e locativos tendem a ocorrer
em formação sintática:
(7) Acriter in eo loco pugnatum est.
energicamente em este local combateu
(BG II, X, 1)
TRADUÇÃO: Combateu-se neste local energicamente.
Vejamos, a partir de agora, como esses tipos de advérbios se comportam,
em termos de sua ordenação, nos textos do latim clássico e do latim medieval.
4.2- A ordenação dos advérbios
A ordenação dos advérbios nos textos observados está basicamente
de acordo com o que era esperado. Observando separadamente os dois
momentos do latim, vejamos a tabela abaixo, referente ao latim clássico:
Cadernos de Letras da UFF – Dossiê: Patrimônio cultural e latinidade, no 35, p. 49-59, 2008
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Tabela 2: Distribuição dos advérbios pelas posições estudadas no latim clássico
Podemos notar, na tabela acima, uma forte tendência de os advérbios,
nos textos clássicos, ocorrerem em posições pré-verbais: 313 casos (234 de
AXV + 79 de AV), que correspondem a 97% do total de 323 ocorrências no
Latim Clássico. Encontramos apenas alguns poucos casos de usos pós-verbais (3% do total de 323 ocorrências no Latim Clássico). Cabe também registrar a quantidade razoável de ocorrências em posição AXV, em que o advérbio ocorre distante do verbo a que se refere: 234 casos ou 72,4% do total de
ocorrências.
Duas coisas devem ser observadas nesses resultados. Em primeiro lugar, essa tendência a ocorrer distante do verbo, diferencia os textos do latim
clássico do texto medieval observado, como teremos a oportunidade de ver
mais abaixo. Em segundo lugar, sobretudo no que diz respeito aos advérbios
qualitativos, esses resultados contrastam com a tendência do português atual
– que se inicia timidamente na fase arcaica de nossa língua - de esses advérbios ocorrerem quase categoricamente na posição imediatamente posterior ao
verbo.
Vejamos agora o que acontece com o texto medieval analisado, observando a tabela abaixo:
Tabela 3: Distribuição dos advérbios pelas posições estudadas no latim medieval
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Martelotta, Mário Eduardo; Processy, Wendel; Santos, Monique Nascimento dos.
A ordenação de advérbios no latim clássico e no latim medieval
A mesma tendência às posições pré-verbais pode ser detectada aqui.
Podemos observar 74 casos (37 de AXV + 37 de AV), que correspondem a
96% do total de 77 ocorrências no Latim Medieval. Novamente, os advérbios qualitativos, temporais e locativos ocorreram predominantemente antes
do verbo. Entretanto, como anunciamos acima, há uma diminuição das ocorrências em posição AXV: 37 ocorrências ou 48% do total dos advérbios
estudados (contra os 72,4% encontrados nos textos clássicos). Isso aponta
para uma tendência que vai se tornar forte no português, em função da
atuação do princípio de iconicidade, mais especificamente ao subprincípio
da proximidade10, que propõe uma relação entre proximidade semântica e
proximidade sintática.
4- Conclusão
As análises que desenvolvemos acerca da ordenação dos advérbios qualitativos, temporais e locativos em textos clássicos e medievais levaram-nos às seguintes conclusões:
a) Há uma forte tendência de os três tipos de advérbios latinos observados, tanto no Latim Clássico (97% do total de 323 ocorrências, levantadas dos
dois textos observados), quanto no Latim Medieval (96% do total de 77 ocorrências levantadas do texto observado), de assumirem posições pré-verbais,
ratificando a proposta apresentada em Ernout e Thomas (1993) e em
Marouzeau (1949). Como essa tendência se manifesta nos advérbios também
nos advérbios qualitativos, as descobertas feitas aqui são consistentes com a
proposta de Martelotta (2004) de uma mudança gradual das tendências de
colocação desse tipo de advérbio partindo de posições pré-verbais tipicamente latinas.
b) No Latim Clássico percebeu-se a predominância da posição AXV (73%
do total de 323 ocorrências dos textos observados), que diminuiu consideravelmente para 48% do total de ocorrências no texto do período medieval. Possivelmente isto ocorra em virtude do fato de o Latim Clássico ser mais livre em
termos de ordenação. Por outro lado, no Latim Medieval parece que se está
delineando uma tendência de os advérbios se colocarem mais próximos ao verbo, assumindo características semelhantes às do português atual. Isso provavel10
Givón (1990).
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mente está relacionado ao fato de o latim medieval já não apresentar tanta liberdade de ordenação vocabular – tanto para adjuntos como para elementos
argumentais – quanto na fase clássica.
ABSTRACT
This paper is an investigation of the word order that
characterize manner, time and locative adverbs in
classical and medieval Latin. The main purpose of
the analysis is to make a confrontation between the
tendencies of word order of these adverbs in these
two periods of the Latin language and also with
tendencies that began to arise in archaic Portuguese.
KEYWORDS: Adverb, word order, language change.
Recebido em 19/12/2007
Aprovado em 05/06/2008
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