1 REPRESENTAÇÃO DE SISTEMAS DINÂMICOS POR VARIÁVEIS DE ESTADO Um sistema é dito dinâmico se a resposta presente depender de uma excitação passada. Caso contrário, se depender apenas da excitação presente, é dito um sistema estático. A representação de sistemas dinâmicos tanto pode ser feita no domínio do tempo, como no domínio da freqüência, cada uma delas com suas técnicas, vantagens e desvantagens. Da mesma forma, os sistemas de controle realimentados podem ser analisados e sintetizados nestes dois domínios, dando origem a duas abordagens, distintas nos seus métodos e nas ferramentas matemáticas que utilizam. A primeira é conhecida como Abordagem Clássica, cujas ferramentas de análise e de projeto são definidas no domínio da freqüência. A representação dos sistemas é do tipo entrada-saída na forma de uma função de transferência. Sua principal vantagem é prover informações rápidas a repeito da estabilidade e da resposta transitória do sistema. Sua principal desvantagem é seu escopo de aplicação, limitado a sistemas lineares e invariantes no tempo ou que possam ser assim representados. Além disso, o uso desta abordagem para sistemas multivariáveis é quase inviável. A segunda é conhecida como Abordagem Moderna, cujas ferramentas de análise e de projeto são definidas no domínio do tempo. A representação dos sistemas é do tipo interna na forma de um sistema de equações diferenciais de primeira ordem, que relacionam as variáveis de estado às entradas, mais um conjunto de equações algébricas, que relacionam as saídas às variáveis de estado e às entradas. Esta abordagem é aplicável igualmente a sistemas lineares e não-lineares, variantes ou invariantes no tempo, monovariáveis ou multivariáveis, com ou sem condições iniciais. Porém, a interpretação física não é aparente. Representação por Variáveis de Estado A representação por variáveis de estado é dita do tipo interna, pois além das variáveis de entrada e de saída, variáveis internas do sistema dinâmico também são representadas. Para um sistema com muitas variáveis, como tensões em indutores, capacitores, resistores, correntes, cargas em capacitores, não são necessárias equações diferenciais que envolvam todas as variáveis. Um subconjunto selecionado dentre elas é suficiente para descrever as relações dinâmicas do sistema. As demais variáveis podem ser obtidas por meio de combinações lineares das variáveis deste subconjunto. Cada uma das variáveis deste subconjunto é conhecida como um estado do sistema. Estado. O estado de um sistema dinâmico pode ser definido como um conjunto de n variáveis denotadas por x1(t), x2(t), ..., xn(t), chamadas de variáveis de estado do sistema, cujo conhecimento num dado instante t = t0, aliado ao conhecimento da entrada do sistema para todo t ≥ t0, permite determinar x1(t), x2(t), ..., xn(t) para todo t ≥ t0. Representação de Sistemas Dinâmicos por Variáveis de Estado 2 Variáveis de estado não são necessariamente grandezas físicas, embora a prática recomende, quando for possível, a escolha de variáveis que possuam interpretação ou significado físico. A razão é que mais tarde essas variáveis estarão envolvidas em estratégias de controle por realimentação. Consequentemente, precisarão ser medidas. Exemplo 1: Circuito RLC Série Os principais conceitos da representação de sistemas dinâmicos por variáveis de estado serão apresentados através da análise do circuito mostrado na Figura 1. Todas as variáveis são dependentes do tempo, porém, preferiu-se omitir a variável independente t para simplificar a notação. Figura 1 – Circuito RLC série Trata-se de um sistema de segunda ordem, cujo comportamento pode ser descrito através da seguinte equação íntegro-diferencial: v = v R + v L + vC = R.i + L Considerando que i = dq dt di 1 + idt dt C ∫ (1.1) , a equação (1.1) pode ser re-escrita como uma equação diferencial de segunda ordem em q: v=L d 2q dq 1 +R + q 2 dt C dt (1.2) Sabe-se que uma equação diferencial de ordem n pode ser convertida em n equações diferenciais de primeira ordem, cada um delas com a seguinte forma: dxi = a i1 x1 + a i 2 x2 + ... + a in xn + bi f dt (1.3) onde cada xi é uma variável de estado dependente do tempo, f é a entrada, que também é uma função do tempo e aij e bi são constantes (para sistemas lineares e invariantes no tempo). No caso de um sistema de segunda ordem, duas equações de primeira ordem são usadas para representá-lo, isto é: x&1 = a11 x1 + a12 x2 + b1 f x& 2 = a21 x1 + a22 x2 + b2 f (1.4) Universidade do Estado de Santa Catarina Representação de Sistemas Dinâmicos por Variáveis de Estado 3 para as quais o ponto sobre os estados xi denota a derivada em relação ao tempo. Desta forma, definindo x1 = q e x2 = i, a equação (1.2) é equivalente às duas equações de primeira ordem apresentadas em (1.5), a saber: x&1 = x2 x& 2 = − 1 R 1 x1 − x2 + v LC L L (1.5) Para representar totalmente o sistema, é necessário acrescentar às equações diferenciais (1.5) uma equação que relacione os estados e a entrada à saída. A saída é uma combinação linear dos estados e da entrada. Por exemplo, se a tensão vL for escolhida como saída, sua relação com os estados e a entrada será: y = vL = L di = Lx& 2 dt 1 = − x1 − Rx2 + v C (1.6) É possível escolher outros estados, porém nenhum dos estados pode ser uma combinação linear dos demais. As variáveis de estado têm que ser linearmente independentes! Notação Matricial A representação por variáveis de estado é geralmente escrita em notação matricial, por como segue: x& = Ax + Bu ⇐ Equação de Estado y = Cx + Du ⇐ Equação de Saída (1.7) onde: x u y A B C D é vetor de estados n x 1, é entrada, é a saída, é a matriz de estados n x n, é a matriz de entrada n x 1, é a matriz de saída 1 x n e é a matriz 1 x 1 de transmissão direta da entrada para a saída. Neste caso, supôs-se que o sistema, além de linear e invariante no tempo, é SISO (simple input simple output – uma entrada e uma saída). Por isso, B é um vetor coluna, C é um vetor linha e D, u e y são escalares. A representação de estados para o exemplo 1, dada pelas equações (1.5) e (1.6), passa a ser descrita por (1.8) na forma matricial, onde o argumento t foi omitido para simplificar a notação. A entrada u = v e a saída y = vL. Universidade do Estado de Santa Catarina Representação de Sistemas Dinâmicos por Variáveis de Estado x&1 0 & = − 1 x2 LC 1 x1 0 − R x + 1 u L 2 L x1 y = −1 − R + 1.u C x2 [ 4 (1.8) ] Sugestão de Procedimento A etapa crucial do procedimento para obtenção da representação de estados de um sistema é a seleção das variáveis de estado. Observações: • As variáveis escolhidas têm que ser LI (Linearmente Independentes) e suficientes para descrever completamente o sistema. • A ordem do sistema ou o seu número de armazenadores de energia indicam o número mínimo das variáveis de estado. • Se x1, x2 e x3 forem as variáveis escolhidas e x3 = 5 x1 + 4 x2, então x3 não é LI com x1 e x2. • vL e iL, vC e iC são variáveis LI entre si, porém vR e iR não o são. Freqüentemente, o vetor de estados inclui mais do que o mínimo necessário de variáveis de estado. Há casos em que estas variáveis, embora LI, são também desacopladas. Considere o sistema composto de uma massa e de um amortecedor viscoso, cujo comportamento é descrito por M dv + Dv = f dt (1.9) onde v é a velocidade da massa e f é a força aplicada ao corpo. Como se trata de uma equação diferencial de primeira ordem, uma só equação de estado (1.10) é suficiente para representá-lo no espaço de estados, tendo a velocidade como sua variável. dv D 1 =− v+ f dt M M (1.10) Entretanto, a massa possui uma posição x. Se ela for incluída, o número de estados LI aumenta para dois e a equação de estados passa a ser de segunda ordem (1.11). x& = v v& = − D 1 v+ f M M (1.11) O diagrama de blocos da Figura 2 ajuda a esclarecer estas duas representações no espaço de estados. Universidade do Estado de Santa Catarina Representação de Sistemas Dinâmicos por Variáveis de Estado 5 Figura 2 – Sistema Massa-Amortecedor Um procedimento de cinco passos é proposto a seguir: 1. Escrever a equação simples da derivada para cada um dos elementos armazenadores de energia; 2. Selecionar as variáveis que foram derivadas como os estados; 3. Expressar a derivada com uma combinação linear das variáveis de estado e da entrada; 4. Expressar as demais variáveis em termos dos estados e da entrada; 5. Escrever a equação de saída. Exemplo 2: Aplicação deste Procedimento ao Circuito RLC Série Considere novamente o circuito RLC série mostrado na Figura 1. Inicialmente, escrevem-se as equações dos dois elementos armazenadores de energia: Equação do Capacitor Equação do Indutor ⇒ ⇒ dvC 1 = i dt C di 1 = vL dt L (1.12) Com isso, ficam definidas vC e i como as variáveis de estado. Após estes dois primeiros passos, as derivadas de (1.12) são relacionadas às variáveis de estado e à entrada, resultando nas equações de estado (1.13). dvC 1 = i dt C di 1 = (v − R.i − vC ) dt L (1.13) Estas mesmas equações podem ser re-escritas usando a notação usual de estados, fazendo x1 = vC e x2 = i, o que resulta em: 1 x2 C 1 R 1 x& 2 = − x1 − x2 + v L L L x&1 = (1.14) Neste ponto, qualquer variável do circuito pode ser escrita como uma combinação linear dos estados e da entrada. Isto também vale para a saída. Se a tensão no indutor for a saída desejada, ela será descrita por: y = vL = − x1 − Rx2 + v (1.15) Universidade do Estado de Santa Catarina Representação de Sistemas Dinâmicos por Variáveis de Estado 6 Finalmente, juntando-se a equação de estado (1.14) e a equação de saída (1.15), obtém-se a representação de estados na forma matricial (1.16). 1 x 0 x&1 0 C 1 + u = & 1 1 R − − x x 2 L L 2 L (1.16) x y = [− 1 − R] 1 + 1.u x2 Universidade do Estado de Santa Catarina