Medicamentos e Plantas - Universidade de Évora

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Universidade de Évora – Departamento de Química
Cristina Costa e Dora Teixeira
MEDICAMENTOS E PLANTAS
A maior parte das pessoas pode ficar surpreendida ao saber que 25% dos medicamentos que adquire
na farmácia foram desenvolvidos a partir de compostos químicos isolados a partir de plantas, subindo
o número para 40%, se forem considerados também aqueles medicamentos que têm a sua origem em
compostos produzidos por microrganismos. Dificilmente se reconhecem hoje nos comprimidos que
tomamos, os chás, as tinturas e os xaropes associados aos ervanários. No entanto, foi através do
reconhecimento pelo Homem do poder curativo de certas plantas que nasceu e se desenvolveu a
farmácia tal como hoje a conhecemos.
Todas as culturas nas diferentes partes do mundo desenvolveram um conhecimento das plantas locais
que lhes permitiu o seu uso para fins terapêuticos. Chegaram aos nossos dias fontes escritas da
Babilónia, Egipto, Índia e China onde são descritos os procedimentos relativos à recolha,
manuseamento e uso dos diferentes materiais vegetais com vista à valorização do seu poder curativo.
O uso de plantas para fins medicinais envolve a utilização de extractos mais ou menos complexos
sendo por vezes complicado atribuir o seu poder curativo a uma única substância. Apesar de em
algumas partes do globo a população ser ainda dependente destes conhecimentos ancestrais para
aliviar os seus males, no denominado mundo ocidental a medicina prefere o uso de substâncias puras.
A tentativa de racionalizar o “processo de cura” por parte da medicina ocidental levou ao estudo e
tentativa de isolamento dos princípios activos das plantas medicinais isto é identificar qual o produto
químico responsável pelo seu poder curativo.
Muitas das plantas usadas em medicina tradicional foram assim avaliadas, tendo sido isolados
inúmeros compostos que servem hoje de “modelos” à indústria farmacêutica para o desenvolvimento
dos medicamentos que compramos na farmácia. Assim, muitos dos fármacos usados hoje em dia têm
uma história que envolve o seu isolamento a partir de material vegetal, identificação em termos
químicos, síntese química e avaliação das propriedades farmacêuticas do composto puro. Muitas vezes
esta avaliação tem como consequência a necessidade da modificação da estrutura química inicialmente
identificada no composto extraído da planta, o que é feito de forma aperfeiçoar as suas propriedades
farmacológicas diminuindo muitas vezes os efeitos adversos associados à estrutura química inicial.
Todo este processo foi iniciado no século XIX com a investigação de plantas usadas no tratamento de
algumas doenças, tendo a identificação dos compostos isolados em termos da sua estrutura química
sido feita muito mais tarde, já em pleno século XX. Os primeiros compostos puros isolados foram a
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morfina (isolada a partir do ópio que é obtido das cápsulas da papoila branca) e a quinina da
Chinchona spp. (família de plantas usada na América do Sul no tratamento da malária). Ambos os
compostos são ainda hoje usados para fins terapêuticos. Este processo iniciado no século XIX nunca
mais parou, sendo actualmente facilitado devido ao aperfeiçoando de técnicas que permitem o
isolamento e determinação da estrutural dos compostos químicos.
Apesar do sucesso da medicina convencional, baseada na utilização de compostos puros, é inegável o
actual aumento da utilização dos “medicamentos naturais” (fitofármacos) nas sociedades ocidentais,
isto apesar destes produtos serem por vezes olhados com desconfiança por parte dos profissionais
ligados à administração de cuidados de saúde. Um dos problemas associados à utilização dos
medicamentos de origem vegetal advém do facto de, na maior parte dos casos, estes produtos serem
vendidos sem qualquer controle. A concentração dos compostos farmacologicamente activos depende
da estação do ano em que foi feita a colheita, do estado de maturação e das condições em que cresceu
a planta. A falta de regulamentação pode ter como consequência que o mesmo produto vegetal que foi
adquirido em alturas diferentes venha a ter diferente actividade biológica.
Na Alemanha, onde o consumo dos “medicamentos naturais” é mais frequente, a sua regulamentação é
também mais efectiva. Em Portugal existem alguns (poucos) medicamentos de origem vegetal que são
vendidos na farmácia (a raiz de valeriana usada para estados de ansiedade moderada é um desses
exemplos) onde é garantida a concentração para um ou mais dos compostos com reconhecida
actividade nessa planta. Diferentes lotes do material vegetal são analisados para determinar o seu
conteúdo em compostos com reconhecida actividade farmacológica, e depois o teor pretendido é
conseguido misturando lotes diferentes da planta (por exemplo no caso da valeriana garante-se que
cada comprimido contém 45 mg de extracto seco que contém os compostos biologicamente activos e
que pode ser obtido por extracção do material vegetal com uma mistura de etanol e água).
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