Cap 21 ERASMO (1466-1536) Ramiro Marques Erasmo nasceu em Roterdão e faleceu, aos 70 anos de idade, em Basileia, na Suiça. Doutorou-se na Universidade de Bolonha e, embora tenha seguido a vida religiosa, destacou-se sobretudo como humanista, filósofo e pedagogo. Foi um grande escritor da língua latina que dominava com poucos no seu tempo. Para além de nos ter deixado algumas importantes obras, foi também um excelente tradutor de autores clássicos. Viajou muito e viveu, durante vários anos, no estrangeiro: Itália, Inglaterra, França e Suiça. Foi amigo de Tomás Moro e de Lutero, mas rompeu com este, em 1524, recusando aderir ao protestantismo. relacionou-se com vários portugueses da sua época, nomeadamente André de Resende e Damião de Góis. Embora sacerdote católico, Erasmo criticou o luxo de algumas ordens religiosas e pugnou pelo fim do método escolástico nas universidades. As suas obras mais importantes são "O Elogio da Loucura", publicado em 1509, e "A Educação do Príncipe Cristão", dado à estampa em 1516. Erasmo escreveu "A Educação do Príncipe Cristão", em 1516, a propósito da educação do Aquiduque Carlos da Áustria, futuro imperador Carlos V, de quem foi preceptor. "Redigida em latim, ao gosto da época, esta obra não é propriamente um tratado de política, mas pode ser considerada como um compêndio de formação política. É uma obra pedagógica, justamente porque Erasmo, como preceptor de príncipes, procura através dos seus ensinamentos, da sua doutrina, da sua moral, tornar o príncipe cristão virtuoso e justo, como ele entendia que os príncipes deviam ser" (1). Numa monarquia hereditária, a maior esperança em que surja um bom rei está na educação do jovem príncipe. Quanto mais excelente for a educação do jovem príncipe, mais probabilidades há em que venha a ser um bom rei. O principal objectivo da educação do jovem príncipe é inculcar nele o sentido do Estado. O príncipe deve ser ensinado a desejar, não os privilégios de quem reina, mas as responsabilidades de quem governa. Como cristão, Erasmo considera que o estudo das Sagradas Escrituras deve estar sempre presente no currículo escolar do jovem príncipe. "Há que imprimir na mente do príncipe a clara distinção entre o bem e o mal. A verdadeira honra dos príncipes é a que vem da virtude e da prática das boas acções - e não do número de estátuas, ou da linhagem da família, ou das pompas e riquezas. O dever do príncipe é ter em conta o bem-estar do seu povo, mesmo que com o sacrifício da sua própria vida, se necessário. Erasmo, noutro passo da "Educação do Príncipe Cristão", completa o seu pensamento indicando expressamente quais as obras que o jovem príncipe deve ler. São elas, por ordem de importância: em primeiro lugar, os Provérbios e o Livro da Sabedoria, de Salomão; segundo, os Evangelhos; terceiro, os livros de Plutarco e de Séneca; quarto, a Política de Aristóteles; quinto o "De Officiis" de Cícero; e sexto, a República de Platão" (2). Fazendo lembrar Platão, Erasmo considera que o príncipe também deve ser filósofo, pois sem o concurso da filosofia o rei governa às cegas. "Erasmo propõe co o boa preparação para a vida cristã a leitura sensata dos poetas e filósofos pagãos, seguindo o exemplo de São Basílio, de Santo Agostinho e de São Jerónimo, evitando, obviamente, os maus costumes associados com a cultura grega. A volta aos clássicos tem valor instrumental, pois serve para fins cristãos, ideia contrária ao ideal dos humanistas italianos. Estes consideram os clássicos como meios para alcançar uma vida plenamente humana, sem qualquer preocupação com fins cristãos" (3). Em 1511, Erasmo publicou um importante tratado sobre educação, intitulado "Sobre o Método Certo de Ensino" ( no original latino "De Ratione Studii") e um ano depois deu á estampa um texto didáctico com o título "Sobre a Lista de Palavras" (no original latino "De Copia Verborum"). O tratado "De Ratione Studii" foi "a primeira formulação explícita de Erasmo sobre o processo educativo. Aliás, é a única obra do género, na época, no que diz respeito aos rudimentos, isto é, à aprendizagem da fala e da leitura. Nota-se a influência de Quintiliano. A esse respeito, Erasmo afirma que àquilo que Quintiliano escreve nada se pode acrescentar. A finalidade do trabalho de Erasmo é levar os jovens de inteligência e de capacidade mediana a um nível de estudos aceitável, ensinando-os a conversar em Latim e Grego, numa idade em que, sob as orientações de um mestre comum, não teriam ultrapassado sequer o nível primário" (4). Erasmo revelou uma enorme preocupação com a aprendizagem da escrita, considerando que uma boa escrita não se atinge apenas com o estudo da gramática e a realização de ditados e composições, sendo também necessário mergulhar na Literatura Clássica e em particular Plínio, Platão, Aristóteles, Orígenes, Basílio, Ovídio, Homero e Hesíodo. Erasmo defendeu a utilização dos prémios e das recompensas como forma de incentivar os alunos. Em 1518, Erasmo publicou "Os Colóquios Familiares" ("Familiarium Colloquiorum Formulae"), consistindo em exercícios para o ensino da conversação em Latim. Em 1529, publicou o tratado "Sobre a Educação dos Meninos" ("De Pueris Instituendis"), no qual traça, de uma forma breve, o seu ideário pedagógico. Nesta obra, Erasmo faz uma crítica ao mau estado do ensino na sua época: más instalações, professores mal preparados, alunos ignorantes e directores escolares incompetentes. O bom professor deverá interessar-se por cada um dos seus alunos, conhecer as suas personalidades, dominar muito bem as matérias, ter boa capacidade de comunicação e possuir as virtudes morais. Erasmo foi um pioneiro na defesa da educação infantil, defendendo o início dos estudos a partir dos três anos de idade, mas sempre no respeito pela maturidade da criança, procurando adaptar o ensino à personalidade do aprendiz. Notas 1) Freitas do Amaral, D. (1998). História das Ideias Políticas, vol. I. Coimbra: Livraria Almedina, p. 228 2) Idem, p. 230 3) Giles, Th. (1987). História da Educação. São Paulo: EPU, p. 116 4) Idem, p. 116