reutilização de Edifícios Industriais em Lisboa para a criação de

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reutilização de Edifícios Industriais em Lisboa
para a criação de Residências Universitárias
João Manuel Pereira da Silva
Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em
Arquitectura
Júri
Presidente: Professor Arquitecto António Manuel Barreiros Ferreira
Orientação: Professora Doutora Maria Alexandra de Lacerda Nave Alegre
Vogal: Professor Doutor Vítor Manuel de Matos Carvalho Araújo
Outubro 2012
0
Agradecimentos
A todos os que me ajudaram durante o curso.
2
3
Resumo
A presente dissertação pretende reflectir sobre as condições da cidade de Lisboa no que
diz respeito à oferta de alternativas para residências destinadas a estudantes universitários,
considerando simultaneamente a existência de inúmeros imóveis desaproveitados com
potencial para satisfazerem os requisitos da função referida através de uma reabilitação.
Sob esta óptica, este estudo almeja combinar esforços no melhoramento de um serviço que
a cidade de Lisboa carece e na utilização de infra-estruturas industriais desaproveitadas,
possibilitando também novas dinâmicas inerentes à atracção de população jovem.
Entre as maiores instituições de ensino superior em Lisboa, tais como o Instituto Politécnico
de Lisboa, a Universidade de Lisboa, a Universidade Nova de Lisboa, a Universidade
Técnica de Lisboa, a Universidade Católica Portuguesa, o ISCTE-IUL e a Universidade
Lusófona, podem-se contar 27 residências à sua responsabilidade situadas na capital,
contando com uma capacidade total de 1926 vagas para albergar alunos deslocados. Para
além deste total de camas, existe ainda uma quantidade considerável de estudantes que se
vê forçada a procurar soluções à margem da rede disponível, arrendando quartos ou
apartamentos.
Lisboa é uma cidade com uma relação forte com o rio Tejo. No entanto, e apesar de
existirem exemplos de sucesso na relação da urbanidade com o rio, existem também zonas
desaproveitadas e desqualificadas, onde se encontram bastantes edifícios de génese
industrial, cuja revitalização seria benéfica para o desenvolvimento social e económico da
cidade, nomeadamente Alcântara e todo o património industrial inserido nos seus limites.
É possível afirmar que Lisboa tem potencial para se tornar num destino ainda mais atractivo
para estudantes estrangeiros desde que providencie uma sólida rede de residências
distribuídas ao longo de uma zona cujo carácter periférico permite acessibilidades eficazes
e que merece ser apelidada de nobre no contexto urbano lisboeta.
RESIDÊNCIAS UNIVERSITÁRIAS | REABILITAÇÃO DE EDIFÍCIOS | REVITALIZAÇÃO URBANA
4
Abstract
This thesis intends to reflect upon Lisbon’s conditions in what concerns the offer of credible
alternatives to halls of residence destined for higher education students while
simultaneously taking into account the existence of numerous unused buildings with the
potential to satisfy the pre-requisites of the referred function through the undertaking of an
architectural rehabilitation. In this line of reasoning, this study aims to combine efforts in the
improvement of a service in which the city of Lisbon is lacking and in the use of unused
industrial infrastructures, also encasing the possibility to bring new urban dynamics inherent
to the consequential attraction of a younger population.
The major higher education institutions in Lisbon, such as the Instituto Politécnico de
Lisboa, the Universidade de Lisboa, the Universidade Nova de Lisboa, the Universidade
Técnica de Lisboa, the Universidade Católica Portuguesa, the ISCTE-IUL and the
Universidade Lusófona, add up to a total of 27 halls of residence between themselves
located within the capital, with a full capacity of 1926 places to host displaced students. In
addition to these vacancies there is still a considerable amount of students forced to search
for a solution outside the available network and renting rooms or apartments.
Lisbon is a city that benefits from a strong relation with the river Tagus. However, and
despite the fact that there are many successful examples of an urban relation with the river,
there are also unused and disqualified areas with many industrial buildings whose
revitalisation would be beneficial to the economical and social development of the city,
namely Alcântara and all the industrial patrimony located within its limits.
It is possible to assert that Lisbon has the potential to become an even more attractive
destination for foreign students as long as it provides a solid network of residences spread
throughout an area whose peripheral character allows for effective accessibilities and which
deserves to be identified as noble within the urban context of the city.
UNIVERSITY RESIDENCES
|
BUILDING REHABILITATION
|
URBAN REVITALIZATION
5
6
Índice
Resumo
4
Abstract
5
Índice
7
Índice de imagens
9
01 Introdução
01 01 Introdução
18
01 02 Objectivos a Atingir
22
01 03 Questões da Investigação
23
01 04 Justificação do Tema
24
01 05 Estado da Arte
26
01 06 Metodologia e Organização do Trabalho
29
02 Residências de Estudantes
02 01 Historial
33
02 02 Exigências
34
02 03 Casos de Estudo
46
Residência Eng.º Duarte Pacheco
57
Residência Birkbeck Court
63
03 Edifícios Industriais
03 01 Alcântara
71
03 02 Análise de Edifícios
76
Fábrica de Fiação e Tecidos Lisbonense
81
Fábrica “Sol”
89
Fábrica “A Napolitana”
98
Fábrica de Lanifícios de Bernardo Daupiás
106
Complexo Fabril da SIDUL
112
04 Paralelismos
04 01 Contexto
121
04 02 A Residência
125
7
05 Considerações Finais
138
06 Bibliografia
145
07 Anexos
153
8
Índice de imagens
Imagem 00 Arquitectura e os elementos, excerto.
0
(Fonte: Autor)
Imagem 01 Projecto de expansão do metro.
21
(Fonte: Site do Metro de Lisboa)
Imagem 02 Residência do Instituto Politécnico de Beja.
42
(Fonte: Arquitectura e Vida n.º 2)
Imagem 03 Residência do Instituto Politécnico de Beja – Plantas.
42
(Fonte: Arquitectura e Vida n.º 2)
Imagem 04 Residência de estudantes da Universidade de Coimbra.
43
(Fonte: Arquitectura e Vida n.º 19)
Imagem 05 Residência de estudantes da Universidade de Coimbra – Planta.
43
(Fonte: Arquitectura e Vida n.º 19)
Imagem 06 Residência Universitária Alfredo de Sousa.
44
(Fonte: Arquitectura e Vida n.º 18)
Imagem 07 Residência Universitária Alfredo de Sousa – Planta.
44
(Fonte: Arquitectura e Vida n.º 18)
Imagem 08 Tietgenkollegiet.
45
(Fonte: Site do atelier Lundgaard & Tranberg Arkitekter)
Imagem 09 Tietgenkollegiet – Planta.
(Fonte:
45
http://ftp.vc-graz.ac.at/pub/landsaving/WS11_Berlin/WS11_berlin_wohn
labor/02_architekturfuehrer_neu/b_projekte_anderswo/Cynthia%20Deckers/Rest
material/
Imagem 10 Instituições de Ensino Superior em Lisboa.
48
(Fonte: Autor)
9
Imagem 11 Residências Universitárias em Lisboa.
50
(Fonte: Autor)
Imagem 12 Instituições de Ensino Superior em Glasgow.
53
(Fonte: Autor)
Imagem 13 Residências Universitárias em Glasgow.
54
(Fonte: Autor)
Imagem 14 Residência Eng.º Duarte Pacheco.
59
(Fonte: Autor)
Imagem 15 Residência Eng.º Duarte Pacheco – Cozinha.
60
(Fonte: Autor)
Imagem 16 Residência Eng.º Duarte Pacheco – Sala de convívio.
60
(Fonte: Autor)
Imagem 17 Residência Eng.º Duarte Pacheco – Planta.
61
(Fonte: Cedida por Hugo Silva, Núcleo de Obras do IST)
Imagem 18 Residência Eng.º Duarte Pacheco – Corte e planta do piso térreo.
62
(Fonte: Cedida por Hugo Silva, Núcleo de Obras do IST)
Imagem 19 Birkbeck Court.
65
(Fonte: Autor)
Imagem 20 Birkbeck Court – Corredor.
65
(Fonte: Autor)
Imagem 21 Birkbeck Court – Cozinha.
66
(Fonte: Autor)
Imagem 22 Locais de relevo em Alcântara.
75
(Fonte: Autor)
Imagem 23 (Antiga) Fábrica Nacional de Moagens.
77
10
(Fonte: Autor)
Imagem 24 Antigo Complexo Fabril da Quimigal.
77
(Fonte: Autor)
Imagem 25 Armazéns Portuários.
77
(Fonte: Autor)
Imagem 26 Armazéns Frigoríficos da Doca de Alcântara.
78
(Fonte: Wikipedia.org)
Imagem 27 Edifício da Standard Eléctrica.
78
(Fonte: Wikipedia.org)
Imagem 28 Fábrica de Fiação e Tecidos Lisbonense.
84
(Fonte: Autor)
Imagem 29 Fábrica de Fiação e Tecidos Lisbonense – Corredor.
84
(Fonte: Autor)
Imagem 30 Fábrica de Fiação e Tecidos Lisbonense – Patamar.
85
(Fonte: Autor)
Imagem 31 Fábrica de Fiação e Tecidos Lisbonense – Pormenor reboco.
86
(Fonte: Autor)
Imagem 32 Fábrica de Fiação e Tecidos Lisbonense – Pormenor elevador.
86
(Fonte: Autor)
Imagem 33 Fábrica de Fiação e Tecidos Lisbonense – Planta piso 3.
87
(Fonte: Arquivo Municipal de Lisboa)
Imagem 34 Fábrica de Fiação e Tecidos Lisbonense – Planta último piso.
87
(Fonte: Arquivo Municipal de Lisboa)
Imagem 35 Fábrica de Fiação e Tecidos Lisbonense – Corte.
88
(Fonte: Arquivo Municipal de Lisboa)
11
Imagem 36 Fábrica de Fiação e Tecidos Lisbonense – Alçado.
88
(Fonte: Arquivo Municipal de Lisboa)
Imagem 37 Fábrica “Sol” – Exterior.
93
(Fonte: Autor)
Imagem 38 Fábrica “Sol” – Exterior.
93
(Fonte: Autor)
Imagem 39 Fábrica “Sol” – Pormenor.
94
(Fonte: Autor)
Imagem 40 Fábrica “Sol” – Plantas.
95
(Fonte: Autor e Arquivo Municipal de Lisboa)
Imagem 41 Fábrica “Sol” – Cortes e planta.
95
(Fonte: Arquivo Municipal de Lisboa)
Imagem 42 Fábrica “Sol” – Alçados e corte.
96
(Fonte: Arquivo Municipal de Lisboa)
Imagem 43 Fábrica “Sol” – Plantas.
96
(Fonte: Arquivo Municipal de Lisboa)
Imagem 44 Fünf Höfe – Actual.
97
(Fonte: Internet)
Imagem 45 Fünf Höfe – Pré-existência.
97
(Fonte: Internet)
Imagem 46 Fünf Höfe – Planta esquemática.
97
(Fonte: Internet)
Imagem 47 Fábrica “A Napolitana”.
102
(Fonte: Autor)
12
Imagem 48 Fábrica “A Napolitana” – Fachada Nascente.
103
(Fonte: Autor)
Imagem 49 Fábrica “A Napolitana”.
103
(Fonte: Autor)
Imagem 50 Fábrica “A Napolitana” – Corte longitudinal.
104
(Fonte: Arquivo Municipal de Lisboa)
Imagem 51 Fábrica “A Napolitana” – Planta.
104
(Fonte: Arquivo Municipal de Lisboa)
Imagem 52 Fábrica “A Napolitana” – Corte longitudinal.
105
(Fonte: Arquivo Municipal de Lisboa)
Imagem 53 Plano “Alcântara XXI – Proposta A”.
105
(Fonte: Site do Arq.º Mário Sua Kay)
Imagem 54 Fábrica de Lanifícios de Bernardo Daupiás.
109
(Fonte: Autor)
Imagem 55 Fábrica de Lanifícios de Bernardo Daupiás – Entrada.
109
(Fonte: Autor)
Imagem 56 Fábrica de Lanifícios de Bernardo Daupiás – Antiga planta.
110
(Fonte: Arquivo Municipal de Lisboa)
Imagem 57 Plano de Alcântara – Arq.º Álvaro Siza + Castanheira & Bastai.
111
(Fonte: Site do atelier Castanheira & Bastai)
Imagem 58 Plano “Alcântara XXI – Proposta A”.
111
(Fonte: Site do Arq.º Mário Sua Kay)
Imagem 59 Complexo Fabril da SIDUL.
115
(Fonte: Autor)
Imagem 60 Complexo Fabril da SIDUL – Pormenor.
115
13
(Fonte: Autor)
Imagem 61 Complexo Fabril da SIDUL – Plantas.
116
(Fonte: Arquivo Municipal de Lisboa)
Imagem 62 Complexo Fabril da SIDUL – Plantas pisos 1 e 2.
117
(Fonte: Arquivo Municipal de Lisboa)
Imagem 63 Complexo Fabril da SIDUL – Corte.
118
(Fonte: Arquivo Municipal de Lisboa)
Imagem 64 Complexo Fabril da SIDUL – Fotografia antiga.
118
(Fonte: http://restosdecoleccao.blogspot.pt/2011/sores-acucares.html)
Imagem 65 Plano “Alcântara XXI – Proposta B”.
118
(Fonte: Site do Arq.º Mário Sua Kay)
Imagem 66 Largo do Intendente.
123
(Fonte: Autor)
Imagem 67 N.º 19 do Largo do Intendente.
123
(Fonte: Autor)
Imagem 68 Quarto do Largo Residências.
124
(Fonte: Autor)
Imagem 69 Antiga Fábrica Viúva Lamego – Plantas antigas.
129
(Fonte: Arquivo Municipal de Lisboa)
Imagem 70 Antiga Fábrica Viúva Lamego.
130
(Fonte: Autor)
Imagem 71 Antiga Fábrica Viúva Lamego – Terraço.
130
(Fonte: Autor)
Imagem 72 Antiga Fábrica Viúva Lamego – Vigas.
131
(Fonte: Autor)
14
Imagem 73 Antiga Fábrica Viúva Lamego – Escadas.
132
(Fonte: Autor)
Imagem 74 Antiga Fábrica Viúva Lamego – Corredor.
133
(Fonte: Autor)
Imagem 75 Antiga Fábrica Viúva Lamego – Pormenor.
133
(Fonte: Autor)
Imagem 76 Antiga Fábrica Viúva Lamego – Poço de luz.
134
(Fonte: Autor)
Imagem 77 Antiga Fábrica Viúva Lamego – Planta piso1.
135
(Fonte: Cedida pelo atelier do Arq.º Frederico Valsassina)
Imagem 78 Antiga Fábrica Viúva Lamego – Planta piso 2.
135
(Fonte: Cedida pelo atelier do Arq.º Frederico Valsassina)
Imagem 79 Antiga Fábrica Viúva Lamego – Corte longitudinal.
136
(Fonte: Cedida pelo atelier do Arq.º Frederico Valsassina)
Imagem 80 Antiga Fábrica Viúva Lamego – Cortes transversais.
136
(Fonte: Cedida pelo atelier do Arq.º Frederico Valsassina)
Imagem 81 Antiga Fábrica Viúva Lamego – Alcântara; perímetro de influência.
143
(Fonte: Autor)
15
16
Introdução
01
17
Introdução 01 01
A arquitectura de cariz industrial sempre teve o condão de deixar marcas indeléveis na
paisagem urbana da cidade onde se insere. O seu uso de carácter intensivo causa um
esgotamento do espaço que ocupa e que por sua vez se torna estéril e inóspito. Em todos
os momentos da sua vida, esta arquitectura distingue-se no tecido urbano devido à sua
morfologia e dimensões caracteristicamente distintas do ambiente citadino. A causa deste
fenómeno reside nas exigências funcionais e de produção que a actividade industrial
impõe, resultando normalmente na construção de grandes volumes com uma escala pouco
direccionada para interacção humana individual. Hoje, as manifestações físicas deste
sector de actividade espraiam-se por áreas periféricas assumidamente não urbanas e
consideravelmente distantes dos centros habitacionais de referência. Não é contudo da
exclusividade da sua morfologia a consequência da degradação das áreas circundantes
aos edifícios ditos industriais. Trata-se sobretudo da inexistência de um uso, da ausência
de um renascimento funcional conjugada com a permanência física de uma monolítica
presença no seio de uma consolidada malha de pormenores, identificações e vivências.
São testemunhos paradoxais do que outrora clamava pelos louros do progresso e que hoje
assenta sobre a passadeira rolante do mesmo e a impede de seguir o seu curso.
Mas não se pretende com isto afirmar que o seu destino merecido é a aniquilação total,
quer do plano físico quer do plano da memória. Perda irreparável seria proceder a um tal
empreendimento e consequentemente esquecer o que nos trouxe até aos dias de hoje e
como tudo aconteceu. Tal como o peregrino, o guerreiro e o navegador que regressam
sempre a casa no fim da sua jornada, nós, enquanto civilização, respeitamos os tempos
que nos precederam e sem os quais seria impossível disfrutar do presente como o fruto da
acumulação de conhecimento e experiências verdadeiramente imortais, perpetuadas
expectavelmente pelos nossos descendentes civilizacionais. Conjecturando um cenário
apocalíptico em termos civilizacionais, é mais directo o entendimento e aceitação do facto
de ser imprescindível guardar a sete chaves o conhecimento que nos foi sendo passado
através de livros, pinturas, músicas, acções e arquitecturas, sendo que o património
industrial representa um diamante específico no seio de toda a pedraria que compõe este
espólio. As indústrias passadas desempenharam um papel inegavelmente fulcral na
potencialização da vida de que hoje é possível dispor e os arquitectos que foram
incumbidos de erguer um edifício para as albergar presentearam o mundo com inovações
construtivas e apresentações formais que se tornaram basilares para a arquitectura que se
seguiu. São também estes exemplos de encaração de desafios do passado que nos
18
inspiram hoje a superar os problemas da contemporaneidade de forma criativa, inovadora e
possivelmente geradora de princípios básicos para o futuro.
Põe-se então a questão relativa ao que é possível fazer para preservar estes testemunhos.
É através da aliança da vontade descrita com a de resolver um problema premente que se
pode concentrar numa acção a solução para duas situações distintas. E há um problema,
no qual esta dissertação se foca, que se adequa a estas condições: a escassez de
residências universitárias na capital. Entre as universidades de Lisboa existe um total 27
residências situadas na cidade que se expressam em 1926 camas, sendo que nesta
contagem se incluem a Universidade Técnica de Lisboa, a Universidade de Lisboa, a
Universidade Nova de Lisboa, o Instituto Universitário de Lisboa, o Instituto Politécnico de
Lisboa, a Universidade Católica Portuguesa e a Universidade Lusófona.
Tomando como exemplo comparativo a cidade escocesa de Glasgow e especificamente a
University of Strathclyde, é de notar a enorme diferença na proporção de vagas disponíveis
nas suas residências, que atingem o número de 1838.1 Esta vocação para a recepção de
estudantes estrangeiros por parte da University of Strathclyde reflecte-se positivamente nas
vivências quotidianas não só no domínio universitário como também na sua expansão para
a cidade, onde é possível verificar com relativa facilidade uma grande variedade de etnias
que partilham entre si certos aspectos comuns: juventude e vontade de descobrir. Esta
dinâmica de intercâmbio, suportada pela oferta de condições qualitativas e quantitativas no
que diz respeito ao acolhimento de forasteiros, potencia trocas culturais e sociais de valor
inestimável e consequentemente atrai investimentos e energias externas que vêem nesta
fatia da população uma fonte anual de benefícios. Situações como esta abrem hipóteses de
futuros contactos ou investimentos por parte de estudantes que numa fase posterior da sua
vida desejem voltar ao país que tão satisfatoriamente os acolheu, além de potenciarem um
aumento da procura na área do turismo por parte de cidadãos destas partes do mundo que,
através de comunicação publicitária ou pessoal, tenham tido conhecimento desta vocação
da cidade.
A possibilidade de dotar Lisboa deste poder é aliciante, ainda mais quando se alia a uma
oportunidade única de preservação de marcas identificativas de certas zonas históricas
associadas ao contexto industrial. A morfologia típica de um edifício desta génese torna
pertinente a equação da transformação do mesmo numa residência universitária. Quando
um edifício apresenta plantas livres e espaços homogéneos com poucas ou nenhumas
condicionantes estruturais, a sua versatilidade aumenta e permite uma adaptação menos
1
Informação directamente obtida através de email enviado pela University of Strathclyde
19
custosa a uma reconversão. Uma residência exige um forte seccionamento na sua
configuração espacial baseado num planeamento pormenorizado do espaço individual,
tendo sempre em vista a rentabilização do número de camas. Assim sendo, as
condicionantes impostas por um edifício industrial num acto de reconversão serão sempre
menos castrantes do que aquelas que, por exemplo, uma tipologia de cariz habitacional
imporia devido à sua definição espacial específica.
Lançadas as bases para uma reflexão sobre estes dois campos, impõe-se ponderar sobre
qual a área da cidade de Lisboa que melhor se coaduna à demanda sugerida. Conclui-se
então afirmar que, pelo seu histórico e actual condição corporal, ambos intrinsecamente
relacionados com o desenvolvimento industrial em Portugal, a freguesia de Alcântara
possui um potencial inegável enquanto ninho receptor de intenções de renovação e de
preservação simultaneamente. A sua localização geográfica, especificamente a sua
proximidade com o rio Tejo e a sua posição privilegiada no esquema urbano, provida de
acessos rodoviários, ferroviários e futuramente metropolitanos 2, é também um factor
aliciante na perspectiva de atracção de população jovem que procure não só formação
académica como também experienciar um local de intensa actividade urbana.
2
Ver imagem 01
20
Imagem 01 Projecto de expansão do metro em estudo.
21
Objectivos a Atingir 01 02
A presente dissertação para conclusão de Mestrado Integrado em Arquitectura pretende
contribuir para um melhor entendimento da problemática da escassez de residências
universitárias de forma a servir como estudo base para um possível futuro projecto que vise
suprir a falta deste serviço na cidade de Lisboa, explorando as condicionantes e
possibilidades que adviriam de uma aliança desta vontade com a de reabilitar edifícios
industriais de valor patrimonial em Alcântara.
Definido o objectivo central, entendem-se como consequência as seguintes metas:
◦ Analisar e caracterizar o programa de uma residência universitária entendendo os seus
requisitos funcionais e espaciais, bem como os de relação com a envolvente urbana e
universitária, através de estudos de caso;
◦ Realizar levantamento de edifícios industriais localizados em Alcântara cujo
aproveitamento actual seja nulo, analisando o seu nível de valor patrimonial e o seu
potencial de transformação numa residência;
◦ Relacionar estas duas situações de forma a perceber quais as vantagens da sua
conjugação para a resolução dos problemas de cada uma, integrando-as num contexto
urbano, social e económico.
Posto isto, definem-se como objectos de estudo a residência universitária Eng.º Duarte
Pacheco, em Lisboa, o bloco residencial Birkbeck Court, em Glasgow, a residência situada
na antiga fábrica de cerâmica Viúva Lamego, na Avenida Almirante Reis, a Fábrica de
Fiação e Tecidos de Algodão de Sto. Amaro, actual receptora da LX Factory, a Fábrica
“Sol”, outrora pertencente à CUF (Companhia União Fabril), a Fábrica de Massas “A
Napolitana”, a Fábrica de Lanifícios de Bernardo Daupiás e a antiga Fábrica da SIDUL
(Sociedade Industrial do Ultramar).
.
22
Questões da Investigação 01 03
A dissertação procurará abordar questões tais como a viabilidade das ideias apresentadas,
focando-se sobretudo na componente arquitectónica e procurando perceber quais as
características gerais de uma residência de estudantes e as dificuldades ou facilidades que
existem na adaptação dos edifícios em foco. Considerando que os edifícios sob escrutínio
são de génese industrial, as questões de flexibilidade espacial não serão tão determinantes
devido ao facto de este tipo de construções serem geralmente pouco seccionadas
permitindo mais liberdade numa futura intervenção restruturante. Visto tratar-se também de
um uso que o contexto urbano contemporâneo torna injustificável, é possível afirmar que
haverá uma maior liberdade de intervenção sempre que seja necessário adaptar a préexistência à nova valência.
Não descurando completamente o aspecto económico inerente a qualquer investimento,
especialmente se for tido em conta o contexto actual, impõe-se também questionar quais
os benefícios que um investidor, privado ou público, retiraria de uma intervenção destas. A
rentabilização de uma residência de estudantes passa por uma política de aproveitamento
do espaço e de assegurar um número mínimo de utentes que justifique e sustente os
gastos, sendo que no caso específico de reaproveitamento de uma estrutura pré-existente
é também relevante perceber se as condições físicas do receptor permitem operações
menos dispendiosas do que as impostas por uma construção nova.
Para além dos aspectos relacionados com a arquitectura dos próprios edifícios, este
trabalho
debruçar-se-á
também
sobre
as
possíveis
consequências
que
um
empreendimento desta génese poderá causar no ambiente urbano circundante, tendo
como referência de comparação um caso de estudo de características semelhantes e cuja
inserção no contexto lisboeta permite conjecturar um cenário mais aproximado. Uma
análise superficial aos efeitos da requalificação do Largo do Intendente poderá revelar os
benefícios que a cidade retira de valências cuja premissa base assente na atracção de
população jovem e em constante mudança.
23
Justificação do Tema 01 04
Após passar um ano em Glasgow numa residência, e ao aperceber-me do que a cidade
tem para oferecer nesse campo e os benefícios que dele retira, surgiu a dúvida
relativamente ao que Lisboa oferecia e em que sentido seria possível melhorar as actuais
condições, mantendo simultaneamente a consciência de que existem na capital muitos
edifícios desaproveitados que poderiam albergar novas e úteis funcionalidades.
Observando o exemplo da cidade escocesa, é de notar que apenas considerando duas
instituições (University of Strathclyde e University of Glasgow) é possível contabilizar um
total de cerca de 5338 vagas (1838 + c. 35003 respectivamente), um número
consideravelmente maior do que as 1926 que se verificam em Lisboa, tendo em conta o
facto de estas duas cidades terem sensivelmente a mesma população4. Esta dimensão de
oferta que a cidade britânica evidencia traduz-se numa potenciação dos acontecimentos
quotidianos dentro e fora do ambiente universitário, produzindo fluxos e dinâmicas
populacionais caracterizadas pela multiculturalidade e pela irreverência do espírito da
juventude. Esta dinâmica de intercâmbio, suportada pela oferta de condições qualitativas e
quantitativas no que diz respeito ao acolhimento de forasteiros, potencia trocas culturais e
sociais de valor inestimável e consequentemente atrai investimentos e energias externas
que vêem nesta fatia da população uma fonte anual de benefícios.
O facto de existirem poucas residências universitárias e bastantes edifícios industriais em
Lisboa (cuja antiga função é actualmente irrecuperável dado o contexto urbano em que se
inserem) em desuso em zonas com grande potencial (ao longo do rio Tejo) tornou clara a
possibilidade de se aliarem estas duas problemáticas para que se solucionassem
mutuamente. Pretende-se que esta proposta alerte para a problemática da escassez de
soluções no campo do acolhimento universitário enquanto contribui para a revitalização de
zonas desqualificadas do contexto contemporâneo de Lisboa evitando também a sua
descaracterização. Justifica-se a vontade de encetar esta investigação com a verificação da
escassez de trabalhos na área de residências universitárias no campo disciplinar da
arquitectura, acrescida ao facto de ser um tema de interesse pessoal derivado de uma
experiência marcante.
Tomando interesse no valor patrimonial da arquitectura industrial como elemento
importante na narrativa da evolução da humanidade e reconhecendo Lisboa como uma
Informação obtida no site da University of Glasgow
Lisboa tem 547631 habitantes e Glasgow tem 598830 habitantes (Informação obtida no site
wikipedia.org)
3
4
24
cidade cujas marcas desse processo se encontram presentes mas esquecidas, tornou-se
clara a zona de Alcântara enquanto potencial receptora de um projecto agregador de duas
intenções devido ao seu historial intimamente relacionado com o desenvolvimento da
indústria em Portugal. “O património industrial retém para as gerações futuras as mudanças
operadas ao nível do saber-fazer, da ciência, da mecânica e do automatismo indissociáveis
de uma reestruturação económica, social, cultural e técnica, fazendo avançar as
mentalidades do seu tempo. É, por isso, imperioso salvaguardar o património industrial.”.5
Alcântara possui inclusivamente uma localização na cidade que beneficia de vantagens a
nível de transportes, acessibilidades e proximidade a algumas instituições de ensino
superior, como por exemplo a Universidade Lusíada, o Instituto Superior de Agronomia, o
Pólo Universitário da Ajuda ou até mesmo o Instituto Superior de Economia e Gestão.
Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana, Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e
Arqueológico, Património Arquitectónico — Geral, Lisboa, IHRU, IGESPAR, 2010 (Kits - património,
nº 3, versão 1.0) – Documento obtido no site do IHRU
5
25
Estado da Arte 01 05
O património industrial tem sido, nos últimos anos, alvo de intervenções com intenções
regeneradoras e de preservação, existindo vários casos em Portugal que comprovam esta
tendência. Só em Lisboa, por exemplo, é possível observar dois exemplos significativos de
intervenções com propósitos programáticos de cariz cultural aplicados a obras de grandes
dimensões, nomeadamente o Museu do Oriente, antigos Armazéns Frigoríficos da Doca de
Alcântara e o Museu da Electricidade, antiga central termoeléctrica em Belém. Outro
exemplo de reutilização de um edifício de origem industrial é o reaproveitamento do edifício
da antiga Standard Eléctrica, um projecto do arquitecto Cotinelli Telmo, para sede da
Orquestra Metropolitana de Lisboa. Já a ocupação do edifício da antiga Companhia de
Fiação e Tecidos reflecte uma outra abordagem caracterizada por ser de índole temporária
e intervenção mínima, numa estrutura organizativa promotora de actividades e comércio
nas mais variadas áreas do conhecimento denominada LX Factory. Uma obra que foi
consultada tendo em conta uma pesquisa complementar de casos de reutilização de
edifícios, industriais ou não, foi “Re-Architecture: old buildings/ new uses”, de Sherban
Cantacuzino.
Porém, nem todos os edifícios integrados no legado industrial são alvo de cuidados
especiais. São disso exemplo a antiga Fábrica “Sol” em Alcântara, vendida pela CUF à
empresa PINHOL em 1992, e por esta a um investidor espanhol em 20026 e desde então
votada ao abandono, exteriorizando claros sinais de degradação, e a antiga fábrica “A
Napolitana”, também situada na freguesia em questão e cuja actual ocupação por parte de
escritórios do grupo Auchan é pautada por decisões de intervenção questionáveis, quer a
nível do aspecto exterior, com tubagens e unidades de climatização que descaracterizam o
desenho das fachadas, quer a nível de interiores, onde existe, por exemplo, “… uma laje de
pavimento construída à frente de um vão.”7.
Em relação à temática de residências estudantis, é de referir que a pesquisa bibliográfica
não gerou muitos resultados úteis no domínio crítico, sendo a maioria das obras existentes
apenas repórteres de projectos construídos, com excepção de alguns artigos online algo
descontextualizados da realidade portuguesa, quer por razões urbanísticas quer por razões
económicas. Esta última razão é, aliás, um factor determinante no estado actual da
disciplina específica das residências universitárias, e que se evidencia na ausência de
Informações obtidas directamente através de email enviado pela empresa Pinhol
FERRÃO, Vanessa, 2012. Projectar com o lugar: (dos) Usos Perdidos no Tempo: Antiga Fábrica “A
Napolitana”, pp. 36
6
7
26
iniciativa por parte das universidades na criação de novas infraestruturas8 e até na redução
de vagas em relação a anos anteriores (a UTL, por exemplo, deixou de contar com 3
residências, traduzidas em 105 vagas)9. É, no entanto, digno de registo o facto do prémio
Arquitectar 2011 ter sido atribuído a um projecto de reconversão do quartel de bombeiros
da Ajuda num hostel de estudantes, da autoria do atelier GGLL, denotando assim algum
reconhecimento e valorização deste serviço. Fora do contexto disciplinar da arquitectura, foi
possível consultar duas teses com relativo interesse no âmbito da componente social
inerente à obra de arquitectura destinada a receber um público abrangente: os relatórios de
estágio do Curso de Política Social “As residências universitárias dos SSUTL: uma análise”
e “Os conflitos em duas residências universitárias”, de Maria Elisabete da Silva Gomes e
Maria Lígia de Jesus, respectivamente, sendo a última mais recente e por conseguinte mais
útil na análise à realidade de uma residência universitária, revelando alguns dados
interessantes formados pela opinião dos próprios estudantes.
Assim, o maior benefício retirado da pesquisa neste campo foi a subsequente análise a
casos individuais de residências universitárias, portuguesas e internacionais, e sobretudo a
informação retirada de uma conversa com o arquitecto Nuno Mesquita, do Departamento
de Gestão Patrimonial da Universidade Técnica de Lisboa, na qual foram abordadas as
directrizes pelas quais se pode reger a concepção de uma residência de estudantes e
também referida a importância da segurança contra incêndios enquanto factor a ter em
conta no absoluto início da concepção de um projecto deste foro. Esta componente está
bem planificada na obra “Regulamento de Segurança em Tabelas”, de Marco Miguel e
Pedro Silvano, que facilita a consulta do regulamento publicado em 2008.
Já no que diz respeito à bibliografia relativa ao património industrial de Alcântara, foi
possível encontrar muitas fontes úteis. O livro “Dicionário da História de Lisboa”, direcção
de Francisco Santana e Eduardo Sucena, revelou-se pródigo em informação sobre
Alcântara, quer sobre a sua componente industrial, quer sobre a sua história mais geral,
incluindo ainda textos especificamente focados em alguns edifícios industriais localizados
na freguesia. A revista “Património Estudos N.º6 – Salvaguarda do Património”, publicada
pelo IGESPAR (Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico), foi
também de grande auxílio por intermédio de um texto de Deolinda Folgado, “’A Napolitana’
– Programa Arquitectónico ao Serviço da Indústria”, que, tal como transparece no nome,
analisa histórica e arquitectonicamente a antiga fábrica ao serviço da indústria moageira.
Segundo o Dr. Carlos Dá Mesquita, tanto a UTL como a UL não inauguram uma residência há
cerca de 30 anos, exceptuando a Residência Eng.º Duarte Pacheco, do IST (1998). Entrevista em
anexo.
9 Residências: Mendonça Monteiro (54 vagas), Andrade Corvo (29 vagas) e Gonçalves Crespo (32
vagas). Após consulta do site do “Guia do Estudante – Alojamento”, onde estas residências se
encontram mencionadas, e do site da UTL, onde as residências não se encontram.
8
27
No entanto, para encontrar informação arquitectónica relativa a outros edifícios para além
deste, foi necessário recorrer ao Arquivo Municipal de Lisboa, uma vez que todas as fontes
consultadas continham apenas registos textuais históricos.
Finalmente, é de referir dois exemplos cuja especificidade coincide com o tema abordado
neste trabalho: a tese para obtenção de Grau de Mestre em Arquitectura
“Projectar com o lugar: (dos) usos perdidos no tempo: antiga fábrica ‘A Napolitana’”, de
Vanessa Ferrão, da Faculdade de Arquitectura de Lisboa e o projecto de reconversão para
residência de estudantes Erasmus realizado na antiga Fábrica de Cerâmica Viúva Lamego,
na Avenida Almirante Reis em Lisboa. A tese referida propõe precisamente a reconversão
da antiga fábrica “A Napolitana” numa residência universitária, justificando a plausibilidade
de um investimento neste campo com a procura de alojamento por parte dos estudantes
deslocados e com a necessidade de rejuvenescer e evitar a descaracterização do bairro de
Alcântara, citando inclusivamente o programa Lisboa: Cidade Erasmus, onde se verifica um
paralelismo com a proposta desta tese, expressa na intenção da Câmara Municipal de
Lisboa, que “… propõe a reconversão do Estabelecimento Prisional de Lisboa em
residência universitária, no sentido de atrair estudantes Erasmus para o país.”10. Já o
projecto de reconversão da antiga Fábrica de Cerâmica Viúva Lamego trata-se de um
exemplo em primeira mão da execução de uma obra correspondente aos ideais
preconizados por esta dissertação.
FERRÃO, Vanessa, 2012. Projectar com o lugar: (dos) Usos Perdidos no Tempo: Antiga Fábrica
“A Napolitana”, pp. 49
10
28
Metodologia e Organização do Trabalho 01 06
O presente estudo foi desenvolvido em três fases.
Numa primeira fase recolheu-se a informação sobre residências universitárias existentes
em Lisboa associadas às maiores instituições de ensino superior, analisando as suas
características arquitectónicas e programáticas, bem como as opções de localização na
cidade. Partindo da informação disponível sobre a capacidade da oferta existente,
procurou-se saber qual a realidade dos números anuais relativos a estudantes deslocados
a estudar na capital, de forma a discernir melhor a carência real de que a cidade padece e
contribuir para os critérios de selecção dos edifícios alvo de intervenção futura. Esta
informação foi obtida através dos sites das faculdades e dos respectivos serviços de acção
social. A informação relativa aos alunos deslocados a estudar em Lisboa centrou-se
apenas no caso específico do Instituto Superior Técnico, suportada pelos dados fornecidos
pelo NEP (Núcleo de Estatística e Prospectiva)11, sendo feita uma extrapolação para as
restantes instituições de ensino superior. Este acto deveu-se ao facto de se ter revelado
problemático obter esta informação afecta às restantes universidades.
Numa segunda fase, realizou-se um levantamento de edifícios industriais desaproveitados
em Alcântara, com o agrupamento destes em tipologias distintas, após o qual se aplicaram
critérios de selecção através duma análise das suas características espaciais e construtivas
que permitiram a caracterização deste universo, tais como época de construção, a estrutura
espacial, os acessos e relação com a envolvente e a caracterização construtiva. Para além
de um levantamento superficial do estado de conservação dos edifícios, serão também
analisadas as suas acessibilidades e áreas, onde se procurará perceber quais as
capacidades espaciais mínimas de forma a tornar plausível uma intervenção reestruturante
cujo objectivo final é suprir a falta de oferta residencial universitária em Lisboa. Sendo
assim, a capacidade de cada edifício no que diz respeito ao número máximo de habitantes
que consegue albergar revela-se como um critério de selecção basilar.
Nesse sentido, partindo das análises anteriores, realizou-se uma terceira fase de
conjugação das duas ideias complementada com a análise de um caso de estudo, onde se
procurará demonstrar o impacto que esta proposta teria na oferta actual do serviço
residencial universitário e no ambiente urbano circundante.
Caracterização Global da População Escolar Ingressada no IST em 2011/2012. Documento obtido
no site do NEP. Em anexo, pp. 4.
11
29
A dissertação assentará nos resultados destes estudos e procurará demonstrar a
plausibilidade desta proposta e identificar as suas vantagens no plano urbano e social.
30
31
Residências de Estudantes
02
32
Historial 02 01
Desde o século XIV que as residências de estudantes fazem parte do mundo universitário,
providenciando guarida aos que por razões financeiras ou logísticas não têm alternativa no
seio da urbe. As configurações desta tipologia evoluíram com o passar dos séculos e em
concordância com as transformações sociais e culturais sofridas pelos meios em que se
inseriam. Neste início da existência de edifícios destinados a albergar estudantes, era
prática comum as universidades permitirem aos próprios terem controlo total sobre a
residência, algo que se veio a desvanecer com o tempo, assim como a própria iniciativa de
criar residências integradas na experiência do ensino superior. A excepção desta tendência
deu-se em Oxford e Cambridge, onde as residências se mantiveram sempre como parte
totalmente integrante e característica de toda a vida universitária, e consequentemente em
instituições de países colonizados pelo Reino Unido, como por exemplo os Estados Unidos
da América. Dos primeiros exemplos destaca-se sobretudo a espacialidade pouco dada ao
privilégio da privacidade, onde o espaço destinado a dormida chegava a ser comum a 200
pessoas, como era o caso das universidades alemãs do século XV.12 Esta situação seria
impensável nos dias de hoje, onde a preocupação com o espaço privado se assume como
uma prioridade na mentalidade moderna, sendo apenas possível verificar situações
semelhantes à referida em estabelecimentos prisionais ou camaratas militares. Até nestes
últimos dois exemplos existe uma preocupação maior com o espaço individual do que a
existente há 600 anos, fruto da evolução do pensamento ocidental. O quarto é o espaço de
descanso, de reflexão e de solidão13, que é o estado onde o indivíduo se encontra e
estabelece o equilíbrio que lhe permite enfrentar e interpretar o mundo. A possibilidade de
ter momentos de solidão é entendida pelo mundo ocidental como elemento fulcral na saúde
mental do ser humano e a hipótese de criar residências com quartos para mais de duas
pessoas raramente é equacionada e mesmo estes são alvo de um planeamento cada vez
mais profundo e esmiuçador de conceitos de espaço interpessoal e proxémia, termo
introduzido por Edward T. Hall que, dentro do domínio do espaço pessoal, define
claramente quatro distâncias de relacionamento entre seres humanos: a distância pública,
a social, a pessoal e a íntima.
Informação retirada de excerto do livro “The Resident Assistant”, (BLIMLING, Gregory S.;
MILTENBERGER, Lawrence, 1981), adquirida no endereço online http://blog.acuhoi.org/2009/10/you-were-asking-the-early-history-of-residence-halls/
12
Convém explicitar o que aqui se pretende ao utilizar a palavra solidão, que difere de isolamento na
medida em que “A nossa linguagem sabiamente se apercebeu destas duas faces do Homem ao
estar sozinho. Foi criada a palavra ‘Isolamento’ para expressar a dor de estar só. E foi criada a
palavra ´Solidão´ para expressar a glória de estar só.”, tal como Paul Tillich afirmou num dos seus
discursos publicados na obra “The Eternal Now” (1963).
13
33
Exigências 02 02
a ◦ Espaço: Social vs Privado
O trabalho desenvolvido pelo antropologista abriu novos horizontes no entendimento da
relação do Homem com o espaço, e a arquitectura não foi excepção enquanto área do
conhecimento que de alguma forma foi influenciada. Hall (1966) refere, relativamente ao
espaço pessoal, que “… as pessoas podem-se sentir constrangidas pelos espaços nos
quais têm de viver e trabalhar. Podem inclusivamente ser forçadas a ter comportamentos,
relações ou desabafos emocionais demasiado stressantes. Tal como a gravidade, a
influência de dois corpos um sobre o outro é inversamente proporcional não apenas ao
quadrado da distância mas possivelmente até ao cubo da distância entre eles. Quando o
stress aumenta, a sensibilidade às aglomerações aumenta – as pessoas ficam mais no
limite – de modo a que cada vez mais espaço é necessário e cada vez menos está
disponível.”14. Esta característica territorial do ser humano é cada vez mais assumida como
uma premissa básica no planeamento arquitectónico, não sendo, por exemplo, plausível
projectar um quarto individual com menos de 9 m2, tal como afirmado pelo Dr. Carlos Dá
Mesquita enquanto representante da entidade reguladora das infraestruturas residenciais
da UTL.
No entanto, existe um ponto comum entre a mentalidade dos primórdios do mundo
universitário e os dias de hoje, que é o desejo de fomentar um sentido de comunidade entre
estudantes pertencentes às mais variadas áreas do conhecimento, aumentando então a
interdisciplinaridade. Esta componente torna-se mais premente no século XXI devido às
consequências que a globalização e as tecnologias trazem. Numa época em que é possível
percorrer grandes distâncias em pouco tempo, muitos estudantes escolhem continuar a
viver no lar familiar mesmo que este se situe a 30 km da universidade, quer seja por
questões de conforto, quer por falta de alternativas nas áreas de proximidade da escola.
Mesmo no caso de jovens que vivam em residências por força de uma distância ainda
maior às suas origens, existe o hábito de sair aos fins-de-semana para visitar a família.
Estas situações fazem com que os estudantes se relacionem quase exclusivamente com
outros do mesmo curso ou área de estudo. Assim, uma residência com óptimas condições
de adaptabilidade e acessibilidade, que atraia actividades sociais que ultrapassem a
necessidade básica de dormir, possui uma grande capacidade agregadora capaz de
contribuir para uma experiência de ensino superior mais enriquecedora a nível pessoal e de
conhecimentos.
14
HALL, Edward T., 1966. The Hidden Dimension, pp. 129. (Tradução do autor)
34
Segundo o Arq.º Nuno Mesquita, uma residência universitária assenta no confronto entre
dois conceitos: privado e social.15 Cabe ao arquitecto gerir o ruído produzido numa
residência através da efectiva formalização arquitectónica. É a arquitectura que vai informar
quem nela habita sobre o que se pode fazer e onde, convidando a certas atitudes e
desencorajando outras em determinados locais. No caso da residência Eng.º Duarte
Pacheco, esse seccionamento é evidente na medida em que os espaços de comunidade,
potenciais geradores de ruído, se situam completamente separados dos espaços de
solidão, de privacidade. Já no caso da residência Birkbeck Court, ao não existir nenhum
espaço destinado a momentos de descontracção colectiva, o que sucedia eram
organizações de festas ou outro tipo de encontros ruidosos dentro do próprio apartamento,
ocupando a divisão da cozinha/ sala por completo. Esta situação é, para todos os efeitos,
uma invasão da privacidade de quem não quer, por qualquer razão que lhe pertença,
participar na actividade social, sendo mesmo impossível estar completamente dissociado
dela devido ao ruído que chega até ao quarto mais distante.
Porém, sete mil milhões de pessoas não são todas iguais. Hall (1966) analisa os
comportamentos de diferentes povos relativamente ao conceito de espaço, expondo as
divergências entre as características inerentes a pessoas oriundas de diferentes
localizações no globo.16 É então importante não pensar que apenas uma solução, a que
melhor se adequa à mentalidade predominante de um ocidental, é viável. Nesse sentido, e
numa residência que se quer assumir como um atractivo de estudantes provenientes de
outras culturas, é pertinente planear as duas soluções de quartos evidenciadas, por
exemplo, na residência Eng.º Duarte Pacheco: o duplo e o individual.
No que diz respeito à configuração e sobretudo ao dimensionamento espacial de uma
residência, para além das condicionantes acima expostas, é de referir que ambos estão
sujeitos a uma mentalidade de rentabilização do espaço que tem como fim evitar que o
edifício gaste mais recursos económicos do que os que gera. Essa sustentabilidade passa
por maximizar o número de camas e uma das soluções frequentemente adoptadas é a
Entrevista com Arq.º Nuno Mesquita. Em anexo.
É interessante verificar que, ao debruçar-se cobre o contexto árabe, o autor descobre que “Os
espaços árabes no interior das casas de classe média-alta são enormes. Eles evitam divisões pois
não gostam de estar sozinhos. […] Se um indivíduo não estiver com ninguém e activamente
envolvido de alguma forma, estará privado de vida. Um velho ditado árabe reflecte este valor: ‘Um
Paraíso sem pessoas não deve ser penetrado pois é o Inferno.’ […] Já que não existe privacidade
física como a conhecemos no seio de uma família árabe, nem sequer uma palavra para privacidade,
será de esperar que os árabes possam usar outros meios para estarem sozinhos. A sua maneira de
estar sozinho é parar de falar.”. HALL, Edward T., 1966. The Hidden Dimension, Pp.158-159.
(Tradução do autor)
15
16
35
utilização de configurações modulares na concepção dos quartos. Este caminho permite o
planeamento muito cuidadoso de um número reduzido de soluções, concentrando
eficazmente os esforços criativos e permitindo depois a multiplicação mais proveitosa
possível no contexto específico de cada situação.
b ◦ Localização e Envolvente
O processo de planeamento de residências universitárias tem ainda que considerar outro
factor que pode influenciar o seu sucesso: a localização. A proximidade à instituição de
ensino ou à rede transportes é, sem dúvida, um objectivo a alcançar na criação de uma
residência. Jesus (2005) refere que, dos 71 alunos questionados sobre quais seriam as
características ideais de uma residência universitária, 35 referiram que a proximidade à
faculdade era o aspecto mais relevante, deixando para segundo plano a exigência de
melhores condições.17 Porém, caso essa proximidade não seja exequível – e muitas vezes
não o é – é possível atenuar a desvantagem que advém desse facto com uma procura de
integração num tecido urbano vivo, activo na engrenagem do quotidiano citadino, que
permita aos estudantes absorverem o ambiente da cidade e verdadeiramente integraremse na comunidade. Nesse caso, é de grande potência a ideia de criar, no piso térreo de
uma residência, um sistema de espaços que sirvam propósitos comerciais ou culturais,
chamando assim a cidade e aproximando-se mais da energia característica da vida de
bairro de Lisboa. Apesar de, numa primeira observação, ser extremamente benéfica a
proximidade ao campus universitário, devido aos óbvios factores do tempo de deslocação e
integração na vida universitária, esta não é uma condição cujo cumprimento siga normas
dogmáticas. Muitas vezes, aquilo que um estudante procura relaciona-se com as
possibilidades que lhe são oferecidas no que diz respeito a alternativas de lazer e
centralidade em relação às zonas activas da cidade.
Assim, a existência de uma residência universitária longe do campus mas perto de redes
de transportes e zonas urbanas consolidadas, com uma oferta variada de valências
comerciais, culturais, de lazer e até mesmo paisagísticas, torna-se num factor de
exponenciação com um peso considerável na probabilidade de sucesso da mesma e na
contribuição para o bem-estar dos utentes. É, aliás, esta capacidade de integração na
cidade que permite a uma residência aliviar a sua própria carga de serviços, ou seja,
quanto mais próxima estiver de uma área que forneça, por exemplo, comida e
entretenimento, menos preocupação haverá pela existência destes elementos no seio do
17
JESUS, Maria Lígia de, 2005. Os Conflitos em Duas Residências Universitárias.
36
próprio edificado e consequentemente mais espaço de dormida sobrará para os
estudantes.
c ◦ Segurança Contra Incêndios
Porém, no planeamento de uma residência para estudantes, tal como em qualquer outro
edifício, há que ter em conta, antes de qualquer outro avanço no campo projectual, a
segurança contra incêndios. Este é um aspecto crucial e basilar na medida em que irá
influenciar toda a configuração arquitectónica do projecto, tanto a nível espacial e funcional
como a nível das infra-estruturas básicas de saneamento, ventilação e iluminação. As
decisões que afectam a definição das vias horizontais e verticais de fuga, por exemplo, têm
de ser tomadas no início do processo projectual, sob pena de se tornarem num entrave
caso sejam apenas consideradas numa fase mais adiantada do planeamento do edifício,
podendo levar a alterações radicais que atrasam o processo e hipotecam a sua fluidez.
Após uma breve consulta ao Regulamento de Segurança em Tabelas (2009), é fácil
perceber que a legislação referente à prevenção, fuga e extinção de incêndios tem um
grande peso nas opções de projecto. Uma residência de estudantes insere-se na definição
da Utilização-Tipo VII, denominada “Hoteleiros e Restauração”, sendo considerada um local
de risco “E”. Partindo destas definições, é possível observar rapidamente muitas
condicionantes sobretudo, mas não exclusivamente, a nível de dimensionamento:
◦ As
actividades
administrativas, arquivos
documentais
e locais
de
armazenamento não deverão ultrapassar 10% da área bruta da UT;
◦ Os espaços de reunião ou lazer (entre outros) não deverão possuir um efectivo
superior a 200;
◦ Os espaços comerciais, bibliotecas e exposição (entre outros) não deverão ter
uma área útil superior a 200 m2.
Nestes três casos referidos, se em alguma situação os valores referidos forem
ultrapassados, estes espaços passam a ser tratados como se fossem UT distintas. Num
campo mais específico, dos locais de risco, é de referir que apesar do edifício em questão
possuir uma função predominantemente de dormida, cada local é classificado de acordo
com a natureza do risco. Ou seja, espaços comuns em geral, tais como salas de estudo ou
convívio, são considerados locais de risco “A” ou “B”, dependendo do efectivo. Estes locais,
acessíveis “… ao público ou ao pessoal afecto ao estabelecimento…”18, sofrem de
condicionantes específicas à sua condição, nomeadamente os de categoria “B” que, ao
MIGUEL, Marco; SILVANO, Pedro, 2009. Regulamento de Segurança em Tabelas de acordo com
o novo Regime Jurídico de Segurança Contra Incêndio em Edifícios e Regulamento Técnico de
Segurança Contra Incêndio em Edifícios, pp. 12.
18
37
diferir dos “A” apenas no maior número de efectivo, devem situar-se em pisos próximos das
saídas para o exterior. Esta imposição, apesar de não ser tão específica que se torne
incontornável, não deixa de limitar a dimensão deste tipo divisões caso sejam projectadas
em pisos relativamente elevados em relação ao plano de referência. Já aos locais de risco
“E”, tais como os quartos, apenas se impõe que não se situem abaixo do nível de saída.
Existem também regras relativas ao exterior do edifício que têm de ser cumpridas. Para
facilitar o acesso às equipas de bombeiros, exige-se um número mínimo de fachadas
acessíveis, dependendo da altura do edifício, e um número mínimo de pontos de
penetração nas mesmas, que no caso de se tratar de janelas, “… o pano de peito deve ter
uma espessura ≤ 0,3 m em toda a sua largura, com um mínimo de 0,5 m abaixo do
peitoril.”19. Esta última condicionante é um exemplo de como a SCIE (Segurança Contra
Incêndio em Edifícios) pode influenciar as características formais mais visíveis de um
edifício, neste caso a nível de tratamento de fachada. Também outros factores externos,
não tão imediatamente implicativos de condicionantes arquitectónicas, têm de ser tidos em
conta, tais como a existência de marcos de incêndio e a sua disposição e o afastamento
das paredes exteriores de edifícios em confronto, medida que depende da altura da obra
em questão e cuja exigência de cumprimento é flexível, podendo compensar-se a sua falta
assegurando uma determinada classe de resistência ao fogo. Este é, aliás, um aspecto
também a ter em conta em muitas situações, exteriores e interiores. É necessário satisfazer
requisitos de materiais com determinadas reacções e resistência ao fogo. Porém este não é
um aspecto que determine a espacialidade e o dimensionamento, pelo que no caso
específico de adaptação de um novo uso a uma pré-existência, as limitações à propagação
do incêndio não são as mais complicadas de seguir.
No seguimento desse raciocínio, impõe-se enunciar os aspectos a ter em conta que
possam alterar a morfologia do edifício:
◦ As vias horizontais e verticais de evacuação devem respeitar várias regras de
dimensionamento, dependendo do efectivo e evitar longas distâncias em impasse,
não podendo, por exemplo, as vias horizontais interiores em impasse que sirvam
quartos situar-se a mais de 10 metros de uma saída;
◦ A determinação do efectivo de um edifício depende de cada espaço específico.
No caso de se tratar de locais com capacidade definida (como quartos ou salas
com lugares fixos), o número é de automática obtenção. Nos espaços restantes, o
MIGUEL, Marco; SILVANO, Pedro, 2009. Regulamento de Segurança em Tabelas de acordo com
o novo Regime Jurídico de Segurança Contra Incêndio em Edifícios e Regulamento Técnico de
Segurança Contra Incêndio em Edifícios, pp.
19
38
efectivo é determinado por índices definidos no regulamento, medidos em pessoas
por m2;
◦ Também dependente do efectivo está a definição da largura das portas, saídas e
caminhos de evacuação, medida através de UP (Unidades de Passagem) e a sua
quantidade, não sendo contabilizadas como saídas, pro exemplo, as portas
giratórias e de deslizamento manual;
◦ As vias verticais de evacuação, estando sob as naturais exigências que advém
do dimensionamento de escadas e rampas, são elementos do edifício com pouca
margem de manobra, devendo cumprir várias regras relativas a larguras, degraus,
ângulos, declives e guardas.
Por fim, em relação a paredes de empena e coberturas, para além das exigências a nível
de materiais e dimensionamento de guardas, existem exigências relativas à forma como se
tem acesso às mesmas. No caso de edifícios até 28 metros de altura, o acesso pode ser
realizado a partir das zonas comuns ao passo que se esta altura for ultrapassada, terão de
ser utilizadas escadas protegidas. Todas estas condicionantes, sendo apenas uma parte do
total, têm de ser integradas no processo criativo inicial de forma a evitar dissabores em
fases mais adiantadas de projecto, sendo que no caso de uma reabilitação, podem surgir
situações muito complicadas de cumprir e esse é um aspecto a ter em conta logo na fase
de lançamento da ideia, estabelecendo-se como um conjunto de critérios determinantes na
aprovação de um determinado edifício para obras de reabilitação e afectação a um novo
uso.
É importante, no entanto, perceber que a legislação tem como objectivo assegurar, entre
outras coisas, as condições básicas para uma habitabilidade minimamente confortável e
segura, algo que o ser humano sempre procurou, sobretudo pela necessidade de realizar o
acto de dormir, que é o estado de vulnerabilidade mais óbvio no qual nos podemos
encontrar. Essas condições passam essencialmente por uma asseveração de ventilação,
iluminação, isolamento, estanqueidade e mobilidade.20 Esta conjuntura reflecte nada mais
do que a mais primordial relação do Homem com o ambiente.
d ◦ Epítome
Sumarizando todos as condicionantes e factores que determinam o sucesso de uma
residência, é possível enumerar as peças do esqueleto que não devem faltar, deixando em
20
Entrevista com Arq.º Nuno Mesquita. Em anexo.
39
aberto a possibilidade de adicionar outros espaços e valências que, à partida, possam não
ser consideradas fulcrais:21
◦ Quartos (equipados com cama, mesa de estudo, cadeira, iluminação e armário);
◦ Cozinhas (com área de preparação de legumes, lava-louça triplo, fogão eléctrico,
forno micro-ondas com grill, grelhador, torradeira, tostadeira, frigoríficos, armários
comunitários para louça e utensílios e armários individuais ventilados onde cada
utente possa guardar alimentos);
◦ Instalações sanitárias e balneários, desde a configuração individual à colectiva
(com bateria de duches individualizados, cubículos com sanita e lavatório com
espelho corrido e tomadas de corrente);
◦ Lavandaria (com máquinas de lavar, secar, tábuas de passar, tanque para
lavagem manual e pequeno estendal com impermeabilização e drenagem no
pavimento para secagem de roupa sensível) e rouparia (armazém de roupa de
cama e toalhas com ligação por porta ao exterior para recepção de lavandaria
externa);
◦ Sala de trabalho (espaço com mesas para trabalhos em grupo e prateleiras altas
corridas para armazenamento de trabalhos em curso e libertação de mesas) com
isolamento acústico;
◦ Sala de refeições, convívio e TV (espaço misto de socialização e área onde
tomar refeições);22
◦ Sala de estudo (espaço para estudo, em silêncio, com mesas e iluminação
individuais e estantes para fundo básico de biblioteca).
Para além destes espaços, cuja função está mais directamente relacionada com o acto de
habitar, existe depois toda actividade de bastidores que administra e mantém a
infraestrutura em funcionamento, sendo necessários assegurar a existência de divisões tais
como uma sala dos funcionários de limpeza, um gabinete para o responsável dos SASUTL
(Serviços de Acção Social da Universidade Técnica de Lisboa), com posto médico, um
espaço de arrumos para os alunos (também durante períodos de férias), um espaço de
arrumos de equipamento de limpeza e uma área técnica. Outro factor importante,
relativamente à lavandaria, é o tempo de espera inevitável. Entre a lavagem e a secagem
da roupa perde-se sensivelmente uma hora e meia, sendo necessário trocar a roupa de
máquina ao fim de 45 minutos. Se um jovem tiver de se deslocar muito para ir à lavandaria,
perderá tempo precioso num contexto de estudo intenso como é o caso da época de
Retirado de um documento esquemático redigido e facultado pelo Arq.º Nuno Mesquita.
Segundo o Arq.º Nuno Mesquita, este conceito funciona com sucesso nas residências Pedro
Nunes e FMH, da UTL.
21
22
40
exames. Ao perder apenas uns segundos, esta hora e meia em que o processo fica
completo pode ser aproveitada ao máximo para estudo, lazer ou descanso, sendo apenas
interrompida uma vez. Em suma, existem nos dias de hoje exigências básicas que no
passado não eram tidas em conta com a mesma preponderância entre as quais se destaca
uma das mais óbvias e cada vez mais indispensável para trabalhar, entreter e comunicar,
que é o fornecimento de internet.
Na concepção de um espaço tão único como uma residência universitária têm que ser tidos
em conta inúmeros factores, que abrangem um espectro que vai desde o elemento mais
puramente técnico até questões humanas e sociais. Os carris directores de um projecto
desta índole devem ser, sobretudo, a criação de um ambiente propício ao estudo e à
integração na comunidade, pois são precisamente esses os objectivos na mente de um
jovem que escolhe sair do conforto de casa dos pais para um outro tipo de conforto: o de
sentir que o vasto mundo desconhecido o acolhe, onde quer que ele vá.
41
Imagem 02 Residência de estudantes do Instituto Politécnico de Beja, da autoria dos Arq. os José
Soalheiro, Teresa Castro e Ana Paula Calheiros.
Imagem 03 Residência de estudantes do Instituto Politécnico de Beja – plantas de piso térreo e piso 2.
42
Imagem 04 Residência de estudantes – Pólo II da Universidade de Coimbra, da autoria dos Arq.os Manuel
Aires Mateus e Francisco Aires Mateus.
Imagem 05 Residência de estudantes – Pólo II da Universidade de Coimbra – Planta do piso 1.
43
Imagem 06 Residência Universitária Alfredo de Sousa, da Universidade Nova de Lisboa, em Campolide,
da autoria dos Arq.os Alberto de Souza Oliveira e Júlio de Saint-Maurice.
Imagem 07 Residência Universitária Alfredo de Sousa – Planta do piso-tipo.
44
Imagem 08 Tietgenkollegiet – Residência de estudantes em Copenhaga, da autoria do atelier Lundgaard
& Tranberg Arkitekter.
Imagem 09 Tietgenkollegiet – Planta do piso 4. A disposição espacial da residência promove o espírito de
comunidade, criando um espaço comum semi-privado que potencia as relações entre os mais de 300
estudantes que nela habitam. Ao mesmo tempo, a formalização dos quartos permite também uma
individualização incomum neste tipo de edifícios, gerando assim uma sensação conforto proveniente do
princípio de que cada jovem se irá familiarizar com o seu quarto de uma forma mais íntima, visto o
mesmo ser diferente de todos os outros.
45
Casos de estudo 02 03
a. Contexto
Lisboa, capital de Portugal, cidade histórica e viva. Com mais de meio milhão de habitantes
nos seus limites administrativos e quase três milhões englobados na sua área
metropolitana23, Lisboa é marcada pela forte aura invocativa de um passado de intercâmbio
e descoberta, às quais o rio Tejo está inexoravelmente ligado. E este intercâmbio continua.
Lisboa permanece na vanguarda das trocas culturais, sendo uma das cidades mais
visitadas do Sul da Europa por pessoas de todo o mundo. Nesta perspectiva surge o
interesse de jovens estudantes universitários, de origem nacional e internacional, ao saírem
do conforto caseiro com destino a uma cidade que promete descoberta, cultura,
conhecimento, pluralismo e a mesma medida de festa e introspecção.
Para que esta energia seja aproveitada, é indispensável à cidade possuir algo que a
absorva, espaços destinados a receber quem quer dormir, comer, observar e viver Lisboa.
Actualmente existem na cidade 27 residências sob a tutela da Universidade Técnica de
Lisboa, da Universidade de Lisboa, da Universidade Nova de Lisboa, do Instituto
Universitário de Lisboa, do Instituto Politécnico de Lisboa, da Universidade Católica
Portuguesa e da Universidade Lusófona. Estas instalações totalizam entre si 1926 vagas
disponíveis num universo de 10522624 estudantes universitários, o que é escasso num
panorama global de trocas internacionais como é aquele em que hoje o ensino superior se
encontra, sendo que existem ainda outras instituições não referidas que não possuem
serviços de acolhimento, agravando ainda mais a insuficiência em questão.
No caso específico da Universidade Técnica de Lisboa, é relevante referir que dos seus
24330 estudantes, 2534 são estrangeiros o que se expressa em cerca de 10,4%.25
Considerando que existem ainda os alunos portugueses deslocados e que a UTL dispõe de
apenas 508 vagas disponíveis nas suas sete residências situadas dentro dos limites da
cidade de Lisboa26, fica suportada a afirmação de que existe uma carência de serviços de
alojamento. No caso ainda mais específico do Instituto Superior Técnico, os alunos
deslocados da sua residência permanente totalizam cerca de um terço da população
estudantil, sendo que no caso do campus da Alameda apenas 6% habitam numa residência
de estudantes, ao passo que 20% são forçados a procurar soluções no mercado
Informação obtida do site wikipedia.org.
Informações obtidas após consulta aos sites das universidades em questão.
25 Informação obtida no site da UTL.
26 Ver imagem 11.
23
24
46
imobiliário27, verificando-se assim a predominância da prática de arrendamento de
apartamentos e quartos fora da rede fornecida pelas instituições de ensino. Tal situação
não beneficia a imagem de Lisboa enquanto local atractivo como destino de estudo por
parte de estudantes estranhos ao nosso país.
Caracterização Global da População Escolar Ingressada no IST em 2011/2012. Documento obtido
no site do NEP. Em anexo, pp. 4.
27
47
Imagem 10 Instituições de Ensino Superior em Lisboa.
1 – Universidade Lusíada
2 – Instituto de Higiene e Medicina Tropical (UNL)
3 – Faculdade de Belas-Artes (UL)
4 – Instituto Superior de Agronomia (UTL)
5 – Instituto Superior de Economia e Gestão (UTL)
6 – Escola Superior de Dança (IPL)
7 – Faculdade de Arquitectura (UTL)
8 – Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (UTL)
9 – Faculdade de Medicina Veterinária (UTL)
48
10 – Faculdade de Ciências Médicas (UNL)
11 – Instituto Superior de Estatística e Gestão de Informação (UNL)
12 – Faculdade de Economia (UNL)
13 – Faculdade de Direito (UNL)
14 – Instituto Superior Técnico (UTL)
15 – Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Lisboa (IPL)
16 – Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (UNL)
17 – Faculdade de Medicina (UL)
18 – ISCTE-IUL
19 – Instituto de Ciências Sociais (UL)
20 – Faculdade de Farmácia (UL)
21 – Faculdade de Medicina Dentária (UL)
22 – Escola Superior de Educação (IPL)
23 – Escola Superior de Música de Lisboa (IPL)
24 – Escola Superior de Comunicação Social (IPL)
25 – Universidade Católica Portuguesa
26 – Faculdade de Direito (UL)
27 – Instituto de Geografia e Ordenamento do Território (UL)
28 – Faculdade de Psicologia (UL)
29 – Instituto de Educação (UL)
30 – Faculdade de Letras (UL)
31 – Faculdade de Ciências (UL)
32 – Universidade Lusófona
33 – Escola Nacional de Saúde Pública (UNL)
34 – Instituto Superior de Engenharia de Lisboa (IPL)
35 – Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Lisboa (IPL)
49
Imagem 11 Residências Universitárias em Lisboa afectas a instituições de ensino superior.
1 – Residência Luís de Camões (UL)
2 – Residência Gago Coutinho (UTL)
3 – Residência Monte Olivete (UL)
4 – Residência António Aleixo (UL)
5 – Residência Professor José Pinto Peixoto (ICTE-IUL)
6 – Residência dos Olivais (UL)
7 – Residência Eng.º António Monteiro Alves (UTL)
8 – Residência Erasmus (UTL)
9 – Residência Artilharia Um (UL)
50
10 – Residência Tomás Ribeiro (UL)
11 – Residência Egas Moniz (UL)
12 – Residência Pedro Nunes (UTL)
13 – Residência Filipe Folque (UL)
14 – Residência Alfredo de Sousa (UNL)
15 – Residência Defensores de Chaves (IPL)
16 – Residência Leite de Vasconcelos (UL)
17 – Residência D. Dinis (UL)
18 – Residência Feminina (UCP)
19 – Residência da Universidade Lusófona
20 – Residência Alfredo Bensaúde (UL)
21 – Residência Ribeiro Santos (UL)
22 – Residência do Campo Grande (UL)
23 – Residência Maria Beatriz (IPL)
24 – Residência de Benfica (UTL)
25 – Residência do Lumiar (UNL)
26 – Residência do Lumiar (UL)
27 – Residência Eng.º Duarte Pacheco (IST-UTL)
51
Tomando como exemplo a cidade de Glasgow, pode-se afirmar que esta é muito receptiva
a estudantes estrangeiros através da vasta oferta de residências, bem expressa nos
números alcançados pela University of Glasgow e pela University of Strathclyde (5338
vagas para um número total de 46955 estudantes), criando consequentemente uma
dinâmica populacional que contribui para o fluxo económico, social e cultural da cidade. A
University of Strathclyde, actualmente com 20405 estudantes, dos quais 2465 possuem a
sua residência base fora do Reino Unido28, acolhe anualmente um número considerável de
estudantes asiáticos, por exemplo, com especial ênfase em países como a República
Popular da China e a Malásia29 que são uma forte presença pelo campus da universidade e
pelas áreas urbanas de maior movimento, verificando-se algumas tendências do comércio
local em satisfazer as necessidades específicas destes jovens cujo panorama cultural
difere grandemente do nosso. O facto de se investir nesta valência permite, não só à
instituição que o faz como também à cidade onde esta se encontra, expandir os seus
círculos de influência e consequentemente atrair novas fontes de investimento.
Informação obtida com rigor do site da HESA
Para além de se tratar de uma informação baseada na observação em primeira mão, é também
verificável nos links das associações de estudantes desses países na universidade:
http://www.strathstudents.com/malaysianstudents e
http://www.strathstudents.com/chinesestudentsassociation
28
29
52
Imagem 12 Instituições de Ensino Superior em Glasgow analisadas.
1 – University of Strathclyde
2 – University of Glasgow
53
Imagem 13 Residências Universitárias afectas às instituições de ensino superior analisadas.
1 – Maclay Residences (UG)
2 – Kelvinhaugh Gate (UG)
3 – Patrick Thomas Court (US)
4 – Andrew Ure Hall (US)
5 – Kelvinhaugh Street (UG)
6 – Cairncross House (UG)
7 – James Young Hall (US)
8 – James Goold Hall (US)
9 – James Blyth Court (US)
54
10 – Thomas Campbell Court (US)
11 – Chancellors Hall (US)
12 – Forbes Hall (US)
13 – Murray Hall (US)
14 – Garnet Hall (US)
15 – Birkbeck Court (US)
16 – Student Apartments (UG)
17 – Murano Street Student Village (UG)
18 – Queen Margaret Residence (UG)
19 – Lister House (UG)
20 – Winton Drive (UG)
21 – Wolfson Hall (UG)
55
Comparativamente, Lisboa é uma cidade com pouca oferta neste campo apesar do
potencial que demonstra no que diz respeito a factores de atractividade, nomeadamente a
oferta cultural, gastronómica, comercial, turística e o clima quente relativamente a todas as
outras grandes metrópoles europeias, auxiliada ainda pela vasta linha costeira que remata
a área da Grande Lisboa e presenteia as populações com um variado leque de praias. A
capital beneficiaria ainda mais destas características se lhe fosse acrescida notoriedade no
campo do alojamento estudantil, quer em quantidade quer em qualidade e, sobretudo, se
isso se procedesse acedendo aos vazios urbanos causados pelo passado uso industrial,
revitalizando-os e relançando essas zonas da cidade para o século XXI. Porém, neste
momento, muitos estudantes vêem-se forçados a arrendar apartamentos ou quartos cujo
preço raramente está abaixo dos €200, ao passo que um quarto numa residência
universitária pode descer a valores como €32.30 Para muitos estudantes que não consigam
garantir uma vaga num alojamento fornecido pela universidade, esta situação é
incomportável e consequentemente invalida o seu ingresso na instituição em questão.
Segundo o Dr. Carlos Dá Mesquita, coordenador do gabinete dos Serviços de Acção Social
da Universidade Técnica de Lisboa, era frequente em anos anteriores que cerca de 250
alunos tivessem insucesso na sua tentativa de candidatura a um lugar numa residência,
sendo que este número diminuiu gradualmente devido ao facto de se ter tornado
conhecimento comum que não se vai conseguir colocação nas vagas disponíveis,
reflectindo uma descrença nos serviços de alojamento providenciados pela universidade.31
30
31
Informação obtida no site Guia do Estudante – Alojamento
Entrevista com Dr. Carlos Dá Mesquita. Em anexo.
56
b. Análise a Residência Eng.º Duarte Pacheco
A residência Eng.º Duarte Pacheco, do Instituto Superior Técnico, situa-se na zona Oriental
de Lisboa, a menos de um quilómetro a Sul da ponte Vasco da Gama, sendo necessária
uma caminhada de 15 minutos para alcançar a estação do Oriente, que por sua vez dá
acesso à linha vermelha do metro. O percurso entre a residência e a universidade, neste
caso, pode variar entre os 35 e os 45 minutos, o que, ao fim de um ano lectivo, se traduz
num desgaste acrescido às exigências diárias do ensino superior.
i. Programa e Distribuição
A visita à residência Eng.º Duarte Pacheco permite verificar como se estrutura
uma residência de estudantes construída de origem, relativamente recente (1998)
e inserida no contexto nacional e lisboeta. A residência está dividida em três
blocos idênticos, com três pisos de quartos, elevados em relação ao plano de
entrada no recinto. Um bloco possui uma sala de música, outro tem uma sala
exclusivamente dedicada ao estudo e o último a zona de lavandaria de serviço. Os
restantes espaços comuns, tais como sala de estar e sala de jogos situam-se num
volume separado, juntamente com a recepção. Para aceder aos pisos cuja função
é a de dormida, existe um elevador e uma caixa de escadas separada em cada
bloco. Ao chegar a qualquer piso, excepto ao último, existe uma pequeno espaço
de distribuição de onde é possível aceder à cozinha, aos dois corredores de
quartos diametralmente localizados e a um pequeno espaço com contacto directo
com o exterior, aparentemente útil para estender roupa e servir quem assume as
responsabilidades de limpeza semanal da residência. Como anteriormente
mencionado, o último piso difere dos restantes na medida em que não possui o
espaço correspondente ao dos quartos duplos, sempre situado a Nascente do
acesso vertical.
ii. Confronto: Social VS Privado
É de relevo verificar que aqui houve a intenção de separar ao máximo as zonas de
potencial ruído e agitação das zonas de estudo e das zonas de repouso. Apesar
de todo o complexo estar bastante interligado, os blocos de habitação não
possuem quase nenhum espaço de convívio ao mesmo nível dos quartos,
exceptuando a cozinha. Todos os espaços potencialmente geradores de ruído
encontram-se no piso térreo, sendo que os de maior expressão, tais como a sala
de jogos e de convívio, chegam mesmo a localizar-se num edifício diferente.
Chegando finalmente ao espaço mais íntimo, de pormenor, todos os quartos, que
57
podem ser duplos ou individuais, possuem uma instalação sanitária, o que
contribui grandemente para o sentimento de privacidade do utente.
iii. Espaços de serviço: Cozinha, Lavandaria e Instalação Sanitária
Como já foi anteriormente referido, cada quarto possui uma instalação sanitária. Já
a cozinha, com cerca de 28 m2, afigura-se como um espaço comum a todo o piso,
possuindo um fogão eléctrico, um lavatório, dois frigoríficos e zonas de
armazenamento individualizadas e seguras. Para além da necessidade básica de
alimentação, há também a de lavagem da roupa cuja proximidade ao local onde se
dorme e se guardam os pertences eu pude verificar ser de grande importância. Os
serviços de lavandaria beneficiam muito mais os estudantes se forem instalados
no próprio edifício ou integrados no complexo em que este se insere, sendo ideal
se forem apenas destinados ao uso estudantil. O piso térreo de cada bloco possui
uma lavandaria destinada aos residentes, com duas máquinas de lavar e uma de
secar, uma instalação sanitária e uma divisão comum, diferente nos três blocos.
58
Imagem 14 Residência Eng.º Duarte Pacheco – Vista exterior de bloco Sul.
59
Imagem 15 Residência Eng.º Duarte Pacheco – Cozinha de piso, com armazenamento individual seguro,
mesas e equipamentos.
Imagem 16 Residência Eng.º Duarte Pacheco – Sala de convívio no piso térreo, contígua à sala de jogos.
60
Imagem 17 Residência Eng.º Duarte Pacheco – Planta dos pisos-tipo. O bloco Norte difere dos restantes,
na medida em que a distribuição para os quartos individuais se efectua por um corredor numa passagem
aérea. A separação entre este grupo de quartos e a zona comum é assim maior.
61
Imagem 18 Residência Eng.º Duarte Pacheco – Corte e planta do piso térreo, que inclui as zonas comuns
de cada bloco, a garagem e as salas de convívio no volume independente.
62
c. Análise a Residência Birkbeck Court
A residência situa-se imediatamente ao lado do campus principal da universidade,
integrando-se no complexo habitacional composto apenas por residências e cuja
organização e distribuição se assemelha a uma pequena aldeia.
i. Programa e Distribuição
Apesar dos edifícios se encontrarem dispersos, é perceptível a divisão entre
residências através das distintas dimensões e tipologias. Neste caso, a residência
em questão é a que possui as condições mais básicas e é também a que tem mais
capacidade de alojamento. Com cerca de 380 quartos, todos individuais, a
residência divide-se em 16 blocos de quatro pisos cada um, com seis estudantes
por piso. Os blocos dispõem-se pelo terreno emparelhados em grupos de três ou
quatro, organizando-se de modo a formar um espaço público reminiscente de um
pátio ajardinado. Por sua vez, cada piso possui seis quartos, um espaço de
arrumação e uma sala/ cozinha. Os blocos não têm elevador, existindo apenas
uma escada de acesso numa das extremidades e todos os pisos servem o
propósito habitacional, incluindo o piso térreo, que por sua vez sofre bastante do
ruído proveniente da rua a horas imprevisíveis. Existe apenas uma lavandaria
integrada neste complexo, sendo no entanto possível aceder a outras que se
situam relativamente perto, ainda pertencentes ao campus residencial. No que diz
respeito a espaços comuns, apenas existe um pub, inserido no edifício central de
toda esta aldeia e cujas funções passam pela administração e asseveração dos
serviços de manutenção da mesma.
ii. Confronto: Social VS Privado
Não existindo nenhum espaço comum para além das salas/ cozinhas de cada
apartamento, grande parte das actividades sociais que se dão na residência
acontecem nessa mesma divisão, que serve seis pessoas. A configuração
espacial do piso é simples, com um corredor de acesso aos quartos e instalações
sanitárias, situando-se a sala precisamente no início desse percurso, logo à
entrada do apartamento. Assim, quem entra e quer aceder a um quarto tem que
passar pela entrada da sala e pelos sanitários. É de notar que, mesmo estando
dentro do quarto mais longe da sala, é impossível escapar ao ruído proveniente
dessa divisão quando lá se dão socializações numerosas, o que é bastante
comum. O espaço do quarto possui uma cama individual, um armário, uma
secretária e três prateleiras acima dela, sobrando muito pouco espaço livre,
tornando-se assim num espaço confortável pelo seu carácter privado e acolhedor
63
mas também de difícil aproveitamento para actividades estudantis que requeiram
algum espaço, tais como trabalhos de arquitectura. É de salientar que, apesar do
frio constante que se faz sentir na cidade, todos os espaços interiores são
generosamente aquecidos, com um aparelho por divisão, providenciando um
conforto térmico constante e eficaz ao longo de todo o ano lectivo.
iii. Espaços de serviço: Cozinha, Lavandaria e Instalação Sanitária
A cozinha está integrada no espaço de estar e tem cerca de 2 m2 de chão livre,
fornecendo aos estudantes dois frigoríficos, um lavatório, um fogão eléctrico e um
micro-ondas, bem como bastante espaço de armazenamento na forma de
armários, quer ao nível do chão quer ao nível do tecto. Porém, uma vez observado
o seu interior, estes armários não possuem qualquer divisão ou segurança,
obrigado a que os pertences de cada pessoa estejam sujeitos a qualquer extravio.
A parte da divisão destinada ao acto de estar possui um sofá, alguns bancos e
uma televisão. As instalações sanitárias dividem-se em dois espaços distintos,
intercalados pelo corredor de distribuição. Num dos espaços existe um lavatório e
uma retrete, a única. No outro espaço existem dois lavatórios e uma cabine
chuveiro, também única. A lavandaria situa-se num dos 16 blocos e serve as 380
pessoas da residência, sendo necessário para a maioria delas caminhas ao ar livre
para lá chegar. O espaço possui três máquinas de lavar e quatro máquinas de
secar, cuja utilização depende do pagamento no momento e da utilização de
detergente à responsabilidade de cada estudante.
64
Imagem 19 Birkbeck Court – Ambiente exterior, com jardim e edifício da lavandaria à direita
Imagem 20 Birkbeck Court – Corredor de distribuição de cada apartamento, com despensa para arrumos
ao fundo. À esquerda, não perceptível na imagem, está a porta de entrada e à direita, mesmo em frente a
esta porta, está a entrada para a sala/ cozinha.
65
Imagem 21 Birkbeck Court – Único espaço comum de cada apartamento, a sala, com a zona de cozinha
visível. O espaço é insuficiente para mais de três pessoas simultaneamente e a mesa padece do mesmo
problema. Os armários não são seccionados no interior.
66
d. Comparação: Pontos fracos VS Pontos fortes
Com base na experiência pessoal que tive em Glasgow durante um ano, encaro o aspecto
da localização como detentor de um peso considerável na determinação do bem-estar
providenciado por uma residência, não sendo no entanto a única faceta a equacionar. A
proximidade com o campus foi indubitavelmente uma mais-valia logo a partir do primeiro
dia, pois precisava apenas de dois minutos para chegar ao edifício de Arquitectura. Porém,
ao fim de algum tempo comecei a sentir um vazio, causado pela ausência de cidade. A
residência situava-se entre muitas outras, perto do campus universitário, perto da
biblioteca, delimitada a norte por uma via de trânsito movimentada e no topo de uma colina
com um declive muito acentuado. Todos estes factores contribuíam para o afastamento de
todo este mundo universitário do resto da cidade. Era sempre necessário caminhar
bastante para fazer algo tão simples como comprar comida. E ainda mais me afastava se
queria aproveitar os pubs, as praças, as lojas, o cinema, os transportes e os parques. Na
verdade, eu vivia num subúrbio, mesmo que exclusivamente no plano atmosférico.
Em oposição com a residência Birkbeck Court em Glasgow, a residência do IST dedicou
um grande esforço ao privilégio da individualidade e do conforto, intenção expressa na
existência de uma instalação sanitária por quarto e no dimensionamento e características
da cozinha. Nesta divisão, existem condições para guardar comida e outros pertences de
forma segura, fora do alcance de outros residentes, através de compartimentação
individualizada e acessível apenas com uma chave. Apesar de não ser pretendido
subestimar a civilidade das pessoas, impõe-se afirmar que este aspecto é muito importante.
Na residência escocesa, cada piso é destinado a seis alunos e a cozinha/ sala de refeições,
espacialmente insuficiente, possui apenas o mobiliário suficiente para armazenamento,
descurando completamente o facto de cada pessoa ter as suas posses e alimentos. Várias
situações surgem em que louça ou tachos de alguém são utilizados por outrem e deixados
no lavatório, sujos, para além do facto de algumas vezes serem subtraídos alimentos, algo
que apenas não acontece mais vezes devido à diferença das origens, e consequentemente
hábitos gastronómicos, de cada um dos ocupantes. Numa residência é inevitável que no
momento de armazenar pertences, tais como alimentos, em sítios comuns a todos,
algumas coisas desapareçam. Como tal, deverá ser intrínseco ao planeamento de um
espaço de habitação colectiva que se projectem espaços de armazenamento e se assegure
a ventilação necessária de forma a evitar que as condições de salubridade se deteriorem.
Porém, o factor que mais distancia as filosofias destas duas residências é o facto de, na
residência escocesa, existir apenas uma instalação sanitária para os seis utentes, o que
causa inúmeros incómodos, quer a nível de logística ou a nível de higiene. A própria cabine
de chuveiro é diminuta, forçando qualquer pessoa a ter os braços encolhidos. Em Glasgow,
67
apesar de alguns quartos se situarem a apenas 20 metros da lavandaria, muitas vezes os
utentes têm de suportar as intempéries constantes naquela cidade no caminho a céu aberto
a percorrer entre as instalações e o quarto, enquanto na residência Eng.º Duarte Pacheco o
espaço que separa o quarto da lavandaria é sempre dentro do mesmo edifício. Num
sentido mais amplo de observação, é de notar também que em todo o complexo de
residências da University of Strathclyde localizado no campus, não existe uma única sala
de estudo ou convívio, apenas um pub.
68
69
Edifícios Industriais
03
70
Alcântara 03 01
Alcântara, a ponte. Outrora, o seu significado prendia-se nos sons árabes que
expressavam o conceito de ponte. Hoje, Alcântara é, para o imaginário colectivo lisboeta, o
sítio que está debaixo da ponte, uma feita de metal e cabos retesados sob uma tensão
equiparável ao quotidiano da modernidade na qual foi gerada, e não a actualmente
inexistente ponte de origem remota que durante séculos uniu as actuais ruas de Alcântara
e Prior do Crato, essa quase soterrada sob as camadas da memória colectiva que
compõem a identidade de um povo. O seu carácter industrial só viria ser desenvolvido
muito mais tarde sendo que até tal acontecer, o vale era pautado pela presença de quintas
pertencentes a classes nobres, pequenos aglomerados populacionais e conventos. Nesta
era pré-industrial é de referir ainda a existência de vários moinhos hidráulicos e eólicos,
bem como de antigos fornos de cal, sendo que nos finais do séc. XVII se inicia o fabrico da
pólvora numa fábrica estatal e mais tarde, por volta de 1736, se constitui a Tinturaria da
Real Fábrica de Sedas. Após o terramoto de 1755, fizeram-se sentir consequências
marcantes. Uma fatia da população lisboeta instalou-se em Alcântara e nas suas
proximidades, contribuindo para um significativo aumento da população deste bairro.
Também como consequência da catástrofe, vieram-se a instalar novos fornos de cal
destinados à produção de material para a reconstrução da cidade, aproveitando a
existência das pedreiras de calcário do vale.32
A existência da ribeira, onde hoje se encontra a Avenida de Ceuta, conjugada com a
necessidade de expansão extramuros por parte das indústrias através de unidades
manufactureiras e fabris, determinou a apetência de Alcântara para albergar estas novas
entidades industriais, sendo que ao longo do séc. XIX a zona foi-se consolidando enquanto
bairro industrial e o seu carácter periférico diluiu-se, eventualmente culminando na sua
integração total nos limites administrativos da capital e na sua afirmação como “… o maior
parque motriz a vapor de Lisboa e do País, da industrialização oitocentista…”. 33 Durante
este período surgem manufacturas de curtumes e pequenas e médias estamparias de
algodão, levando estas ao desenvolvimento da indústria têxtil no local. Ganha também
relevância o fabrico da pólvora, mantendo-se em actividade a Real Fábrica da Pólvora de
António Cremer até depois de 1888, tendo esta deixado marcas físicas apenas totalmente
apagadas em 1992 e cujo legado maior se expressa hoje no nome de uma rua. Em meados
do século instalam-se também algumas unidades relacionadas com a indústria química.
SANTANA, Francisco (dir.); SUCENA, Eduardo (dir.), 1994. Dicionário da História de Lisboa.
SANTANA, Francisco (dir.); SUCENA, Eduardo (dir.), 1994. Dicionário da História de Lisboa, pp.
34.
32
33
71
Entre os edifícios merecedores de destaque encontra-se a Fábrica de Fiação e Tecidos de
Algodão de Santo Amaro, inaugurada “… em 1849. Era uma unidade fabril moderna,
quadrilonga, em quatro pisos, estabelecendo a ligação entre a fiação e a tecelagem, tudo
movido por máquina a vapor, de 90 C/V, de baixa pressão (então a mais potente do
país).”.34 Outros edifícios de destaque são a Fábrica de Lanifícios de Bernardo Daupiás,
que tinha “…uma estética tipicamente novecentista e estava adaptada à instalação da
máquina a vapor, estando num centro de um complexo de vários edifícios, que dependiam
de energia da máquina aí instalada”35, a Fábrica “Sol”, pertencente à Companhia Aliança
Fabril, que mais tarde se fundiu com a Companhia União Fabril e “A Napolitana”, fábrica de
massas construída pela parceria Vieillard & Touzet e originalmente pertencente à empresa
Gomes, Brito, Conceição, Reis & Cª. Este último, “… destaca-se pela utilização do tijolo
sílico-calcário e sua sábia articulação com a exploração de um léxico depurado,
vincadamente funcional, adaptado exclusivamente ao cumprimento de um programa para
fabrico de massas.”36
Com este desdobrar da industrialização e a consequente necessidade crescente de mãode-obra, Alcântara, assim como outras áreas da cidade, assiste a um considerável aumento
da população e ao subsequente surgimento de uma nova classe social, operária e de
fracos recursos. No início desta transformação, estas famílias viam-se obrigadas a
improvisar as suas habitações com recurso a espaços desocupados em que as condições
de salubridade eram mínimas ou nulas, não excluindo a ocupação de palácios e conventos
vazios. É neste contexto que surgem os pátios, espaços em caves e traseiras de prédios
fornecidos por senhorios mediante o pagamento de uma renda. No entanto, com o tempo
surgiram interesses privados com vista a um investimento na resolução deste problema,
desenvolvendo-se então uma tipologia designada por vilas, “… edifícios ou conjuntos
expressamente construídos para habitação de famílias operárias…”.37
Ao tomar consciência das transformações pelas quais Alcântara passou ao longo dos
séculos e conhecendo a génese do seu processo evolutivo no que diz respeito ao seu
povoamento, torna-se apetecível estabelecer um paralelismo entre o passado e o futuro.
Os estudantes deslocados não são operários e as fábricas já não fabricam. Porém, tal
como há mais de um século, muitos dos novos habitantes de Lisboa que a ela chegam com
SANTANA, Francisco (dir.); SUCENA, Eduardo (dir.), 1994. Dicionário da História de Lisboa, pp.
377.
35 MARQUES, Beatriz, 2009. O Vale de Alcântara Como Caso de Estudo: Evolução da Morfologia
Urbana, pp. 30.
36 Excerto de texto de Deolinda Folgado, no site
http://www.igespar.pt/pt/patrimonio/itinerarios/industrial1/10/
37 PEREIRA, Nuno Teotónio, 1994. “Pátios e Vilas de Lisboa 1870-1930: a Promoção Privada do
Alojamento Operário” in Análise Social, Vol. XXIX (3.º), 1994 (n.º 127), pp. 512.
34
72
perspectivas de futuro vêm monetariamente condicionados e com a esperança de que uma
recepção hospitaleira por parte da capital seja o cenário que os espera. E que melhor
preservação do passado do que a invocação de uma era marcada pela migração intraurbana? Os primeiros chegaram para trabalhar e os de hoje chegarão para estudar, ambos
despoletadores de dinâmicas sociais e urbanas refrescantes e cuja consequência foi, e
será, o desenvolvimento da urbe em torno da actividade industrial, algo que hoje se poderia
metaforizar como uma indústria de intercâmbio internacional, social e cultural, uma indústria
de trocas pessoais e rejuvenescimento da cidade.
Para além de toda a carga histórica que emana desta área da cidade, Alcântara beneficia
de certos aspectos, de um cariz mais prático e funcional, que lhe permitem destacar-se
como uma engrenagem relevante na mecânica citadina. Com o seu limite meridional
definido pela linha ferroviária e pela Avenida da Índia, é perceptível à partida a potência de
que a freguesia dispõe no âmbito dos transportes. A estação de Alcântara-Mar permite o
embarque nos comboios da linha de Cascais e abre assim a possibilidade de alcançar o
metro no Cais do Sodré em pouco tempo, tal como todo o sistema rodoviário da zona
permite o acesso a diferentes pontos de Lisboa, com a Avenida de Ceuta para Norte, a
Avenida Infante Santo para Nordeste e a Avenida da Índia para Nascente, não esquecendo
o facto de ser também um portal de acesso ao Sul do país através da ponte 25 de Abril.
Para além da linha já referida, também a estação de Alcântara-Terra, situada 600 metros
terra adentro em relação à sua congénere marítima, permite o acesso à linha ferroviária de
Sintra, mais a Norte. É também importante referir que, apesar de ainda não ser uma
realidade, estão previstas condições para que o esquema metropolitano estenda uma linha,
a vermelha38, até Alcântara, engrossando assim o rol de hipóteses de mobilidade a
ponderar por parte da população.
Mas as vantagens estratégicas da sua localização não se ficam por aqui. Para além da
proximidade do rio e de toda a panóplia de alternativas de entretenimento que em seu torno
orbitam, desde estabelecimentos de diversão nocturna ao simples prazer do acto
contemplativo, existem em Alcântara e na sua área de influência algumas instituições de
ensino superior de relevância, nomeadamente as que compõem o pólo universitário da
Ajuda, o ISA (Instituto Superior de Agronomia), a Universidade Lusíada e até mesmo o
ISEG (Instituto Superior de Economia e Gestão), em S. Bento, este último rapidamente
acessível pela Avenida Infante Santo e pela Calçada da Estrela. 39
38
39
Informação obtida no site do Metro de Lisboa.
Ver imagem 22.
73
O património industrial de Alcântara trata-se de um elemento essencial para o
entendimento da cidade e da sociedade na sua evolução ao longo dos séculos XIX e XX,
constituindo “… um factor importante para um desenvolvimento mais sustentável e
harmonioso entre o passado e o presente, mantendo a identidade e a singularidade de
cada local.”40. Nos casos em que este património se encontra imerso em zonas de carácter
urbano, justifica-se não só a sua preservação como também a sua adaptação à
contemporaneidade. Desta mentalidade são exemplo o Museu do Oriente e a LX Factory,
com níveis interventivos bastante diferentes, de carácter permanente e temporário,
respectivamente, mas ambos baseados na mesma premissa.
40Instituto
da Habitação e Reabilitação Urbana, Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e
Arqueológico, Património Arquitectónico — Geral, Lisboa, IHRU, IGESPAR, 2010 (Kits - património,
nº 3, versão 1.0).
74
Imagem 22 Alcântara e pontos de relevo – Instituições de Ensino Superior e pólos de transportes.
1 – Universidade Lusíada
2 – Instituto de Higiene e Medicina Tropical (UNL)
3 – Estação ferroviária de Alcântara-Mar
4 – Largo do Calvário
5 – Estação Ferroviária de Alcântara-Terra
6 – Instituto Superior de Agronomia (UTL)
7 – Instituto Superior de Economia e Gestão (UTL)
8 – Faculdade de Arquitectura (UTL)
9 – Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (UTL)
10 – Faculdade de Medicina Veterinária (UTL)
75
Análise de edifícios 03 02
Entre os edifícios industriais que pontuam a paisagem de Alcântara, vários são aqueles que
podem ser tidos em conta enquanto alvo de reutilização para uma residência, existindo
também aqueles que não se integram neste lote devido ao facto de se encontrarem já
recuperados, ocupados ou com características espaciais, construtivas e de acessibilidades
que não se adequem ao uso proposto. Para além dos edifícios de função exclusivamente
destinada à produção, a Câmara considera ainda património a correnteza de habitações
operárias de dois andares que se estende pela rua 1º de Maio, entre a ponte 25 de Abril e o
Largo do Calvário. Refiram-se também alguns exemplos de fábricas cujos vestígios são
mínimos ou até mesmo nulos, como o caso da Fábrica União, em que o único sinal visível
da sua existência é uma chaminé no Largo das Fontainhas e da Fábrica de Chocolates
Regina, totalmente substituída por um condomínio privado, o Páteo Sá de Miranda.
A pesquisa de campo efectuada revelou então os vários edifícios industriais que ainda se
erguem. No domínio dos que se apresentam recuperados e/ou ocupados, enumeram-se os
Armazéns Portuários que albergam a Delegação Aduaneira na Rua da Cintura do Porto de
Lisboa, o Complexo Fabril da Quimigal, a (Antiga) Fábrica Nacional de Moagens 41, os
Armazéns Frigoríficos da Doca de Alcântara e o edifício da Standard Eléctrica. No segundo
caso, apenas sobra do complexo as fachadas viradas a Sul e a Poente, que dão para a
Rua Fontainhas e para a Rua Fradesso da Silveira respectivamente, tendo nascido um
empreendimento de cariz habitacional de luxo e restauração, integrando ainda o Consulado
Geral de Angola. No terceiro caso, o edifício alberga apartamentos em loft, cujo projecto fez
por manter o aspecto exterior do edifício intacto. No quarto caso, a obra efectuada traduzse hoje no Museu do Oriente, projecto realizado pelo arquitecto Carrilho da Graça. Por fim,
destaca-se o notável edifício da Standard Eléctrica, construído entre 1945 e 1947 com
projecto original do arquitecto Cotinelli Telmo e “… que apresenta uma rigidez rítmica,
formal e acromática, à semelhança de obras de betão armado do período modernista do
princípio do século…”42.
O edifício correspondente a esta designação padece de uma ambiguidade insolvível da minha
parte: no site do empreendimento (http://www.homesconcept.com/home.php), é referido que este se
desenvolveu “… no antigo Edifício da Fábrica de Lâmpadas Osram…”. Porém, num documento
integrado no Plano de Urbanização de Alcântara, o mesmo edifício é designado por (Antiga) Fábrica
Nacional de Moagens, por associação ao código 26.52. Visível nos excertos da planta e do
documento (pp. 18) em anexo. Adoptou-se esta última designação, não existindo no entanto dúvidas
em relação a qual edifício ambos se referem.
42 SANTANA, Francisco (dir.); SUCENA, Eduardo (dir.), 1994. Dicionário da História de Lisboa.
41
76
Imagem 23 (Antiga) Fábrica Nacional de Moagens – Apartamentos em loft.
Imagem 24 Antigo Complexo Fabril da Quimigal – Consulado Geral de Angola, Comércio e Habitação.
Imagem 25 Armazéns Portuários – Delegação Aduaneira.
77
Imagem 26 Armazéns Frigoríficos da Doca de Alcântara – Museu Oriente.
Imagem 27 Edifício da Standard Eléctrica – Orquestra Metropolitana de Lisboa.
78
Já no domínio dos edifícios vazios, com utilizações temporárias ou de potencial
galvanizador da dinâmica urbana circundante, encontra-se o edifício da antiga Fábrica da
Sociedade Industrial do Ultramar (SIDUL), a antiga fábrica “A Napolitana”, a antiga fábrica
de lanifícios Daupiás, a antiga Fábrica “Sol” e o edifício da antiga Fábrica de Fiação e
Tecidos Lisbonense. Destes cinco casos, apenas três se encontram totalmente desprovidos
de qualquer uso, abandonados. Os outros dois, a Fábrica de Fiação e Tecidos Lisbonense
e a fábrica “A Napolitana” estão actualmente ocupados pela iniciativa temporária LX
Factory e pelos escritórios do Grupo Auchan, respectivamente.
Esta característica de distinção entre os edifícios é a grande responsável pelos diferentes
níveis de conservação verificados, pois um edifício que sirva um uso é sempre alvo de
constantes manutenções, ao passo que um edifício sem qualquer tipo de presença humana
está condenado a sofrer uma degradação muito mais acelerada. Para além deste critério,
existem ainda outros que, aquando de uma análise metodológica, tornam possível
estabelecer comparações entre cada um dos exemplos e ter a percepção da exequibilidade
e dos possíveis efeitos de uma intervenção reabilitadora.
De forma a tornar o processo de comparação mais directo, estas análises serão traduzidas
através de tópicos, cada um com o desenvolvimento que melhor se adequa:
01 ◦ Localização: A localização face aos pontos onde é possível aceder à rede de
transportes é o primeiro critério a ter em conta e, partindo daí para uma
observação progressivamente mais pormenorizada, podem-se enumerar as metas
seguintes;
02 ◦ Acessibilidades: Analisar as acessibilidades, pedonais e rodoviárias, que
servem o edifício em questão;
03 ◦ Dimensões: Analisar as dimensões do edifício e consequentemente a
capacidade quantitativa de alojamento;
04 ◦ Ambiente Urbano: Perceber o ambiente urbano circundante e a relação que o
edifício tem com a envolvente, por exemplo, através da análise à configuração do
piso térreo;
05 ◦ Espacialidade Interna: Analisar a disposição espacial no interior do edifício,
como os espaços delimitados pela estrutura original se adequam à proposta;
79
06 ◦ Aplicabilidade do Regime Jurídico de Segurança Contra Incêndio em Edifícios
(RJ-SCIE): Analisar a aplicabilidade de alguns aspectos cruciais do RJ-SCIE,
tendo em conta o facto de serem edifícios construídos muito antes da legislação
em vigor existir;
07 ◦ Estado de conservação: E, por fim, analisar o nível de conservação do edifício
em geral.
80
A Fábrica de Fiação e Tecidos Lisbonense, que actualmente alberga a LX Factory,
caracteriza-se na seguinte conjuntura:
01 ◦ O edifício situa-se a cerca de 330 metros do Largo do Calvário, que é um pólo
de transportes urbanos de grande intensidade, por onde passam autocarros e
eléctricos. A cerca de 670 metros é possível aceder à estação CP de AlcântaraMar e a cerca de 850 metros, à de Alcântara-Terra. Todos estes locais são
alcançáveis a pé, com passeio e declive nulo;
02 ◦ O acesso, pedonal e rodoviário, é possível através da Rua Rodrigues Faria,
que acaba no beco sem saída que é todo o complexo operário. Existe ainda uma
passagem, actualmente fechada com um portão, que une esta rua à Rua 1º de
Maio, passando por baixo das habitações operárias. Trata-se de um atalho útil
para quem quer aceder mais rapidamente à rua em questão, que é uma artéria de
relevo na malha de Alcântara, unindo o Largo do Calvário e a Rua da Junqueira.
Existe ainda a possibilidade de aceder ao complexo através do portão no limite
Sul, delineado por um muro marginal à Avenida da Índia;
03 ◦ O edifício, de planta rectangular, tem cerca de 123 metros de comprimento e
uma largura que varia entre os 20 e os 30 metros. O volume eleva-se,
praticamente uniformemente, 18 metros acima do plano de referência, dividindo-se
em 5 pisos. Após uma breve análise às plantas dos pisos, é possível fazer uma
estimativa de quantos quartos o edifício poderia conter. Considerando que cada
janela corresponde a um quarto, que o piso térreo não tem quartos e que alguns
espaços de piso seriam destinados a zonas comuns, pode-se afirmar com
segurança que cada piso tem capacidade para cerca de 50 módulos que,
multiplicando pelos 4 pisos elegíveis, totaliza os 200 quartos. Este número não
corresponde ao total do que a residência poderia receber pois, tendo em
consideração a utilização da tipologia do quarto duplo, seria possível receber 400
estudantes numa situação extrema;
04 ◦ O piso térreo tem mais 0,4 metros de pé-direito do que os restantes pisos,
pelo que esse destaque pressupõe uma utilização mais nobre no contexto urbano,
um uso que funcione como uma esponja entre a cidade e o edifício, potenciando a
introdução de valências comerciais, culturais ou sociais que valorizem a residência
enquanto peça da engrenagem urbana. A zona imediatamente circundante ao
edifício, que tem todas as suas faces livres excepto no piso térreo no extremo
81
Norte, é caracterizada por uma certa atmosfera de conforto, quase como um
pequeno bairro cujas construções partilham todas o facto de serem de origem
industrial na sua concepção. A relação entre os edifícios, de grande proximidade, e
o trânsito muito escasso são as causas deste ambiente, existindo até, por vezes,
ligações entre blocos aparentemente independentes, tal como uma passagem
aérea no primeiro piso do edifício em análise que o une à construção que se
encontra no seu tardoz;
05 ◦ Tal como o actual seccionamento temporário demonstra, é possível criar no
piso tipo, por exemplo, um longo corredor central de acesso a quartos adjacentes
às duas fachadas, ambas marcadas por muitas janelas que estão suficientemente
distantes para que cada uma delas sirva um quarto. Se cada janela servisse esse
propósito, cada quarto teria cerca de 3,2 metros de largura, sendo possível uma
profundidade muito maior. O edifício possui duas colunas de acesso vertical,
ambas com elevador e escadas, existindo ainda no extremo Norte uma escada
que assegura apenas a ligação entre o piso térreo e o imediatamente acima.
Apesar de o edifício possuir as suas fachadas intensa e regularmente fenestradas,
existem dois volumes verticais acoplados ao lado tardoz que interrompem esta
sucessão. No extremo Sul ergue-se um paralelepípedo com fenestração esguia e
horizontal perto do nível do tecto de cada piso e de configuração muito mais
depurada do que o restante edifício, tendo sido originalmente concebido como
espaço de balneários para os trabalhadores. O outro volume, de formalização
idêntica ao anterior mas consideravelmente menor, foi inicialmente concebido
como uma coluna de instalações sanitárias. Por fim, é de referir que a estrutura
metálica que suporta os pisos, através de duas fileiras longitudinais de esguias
colunas e as correspondentes vigas, permitiu aos pisos serem livres, sem
compartimentação influente na estrutura;
06 ◦ Dado o comprimento acentuado do edifício, surge a dúvida relativa à sua
capacidade para cumprir as exigências do RJ-SCIE, nomeadamente as que se
referem a distâncias nas vias horizontais de evacuação. Não podendo a distância
de qualquer ponto a uma saída ser superior a 30 metros (quando a via tiver duas
saídas), é de referir que não existem problemas no espaço situado entre as
colunas de distribuição vertical. Porém, entre as colunas dos extremos e os limites
do edifício nos mesmos, as distâncias ultrapassam os valores estipulados para as
vias em impasse (10 metros), o que pressupõe uma limitação à existência de
quartos apenas no espaço central, entre as saídas verticais. Ainda a considerar,
82
há o facto da escadaria Norte não aceder a todos os pisos, algo que restringe
significativamente a expansão de zonas de risco “E” (quartos). Este problema
poderia ser resolvido com o prolongamento das escadas em toda a verticalidade
do edifício. No que diz respeito à largura das saídas, com cerca de 1,4 metros,
verifica-se o cumprimento de, pelo menos, uma UP (0,9 metros), que é a medida
exigida por cada 100 pessoas ou fracção (neste caso, cada piso). Para além
destes cuidados, outros teriam de ser tidos relativamente às exigências de
resistência e reacção ao fogo dos materiais;
07 ◦ Visto pelo exterior, o edifício apresenta poucos sinais de degradação. O pano
de fachada está envelhecido e com sujidades mas não aparenta ter perdido as
suas propriedades estruturais. Existe, no entanto, uma janela da fachada principal
que falta completamente, cantaria e pano de peito incluídos. Interiormente, os
elementos estruturais metálicos, as colunas e as vigas, encontram-se em perfeito
estado de conservação, tal como as cantarias e o pavimento, embora nestes se
note o facto de terem sido implantados há mais de 160 anos, apresentando o
desgaste típico deste tipo de materiais em construção. As caixilharias de ferro são
elementos importantes na leitura do edifício enquanto património industrial. No
entanto, impõe-se perceber se as exigências térmicas e de isolamento de um local
destinado ao acto de habitar com o pressuposto do conforto permitem a
manutenção destes elementos. No que diz respeito aos rebocos, são apenas
mencionáveis algumas falhas pontuais, nomeadamente o desgaste das tintas, uma
zona do tecto com cerca de 0,5 metros de diâmetro que revela a composição de
alvenaria da abóbada ou até mesmo no interior da caixa do elevador central, de
concepção antiga, e que também revela sinais de desgaste superficiais.
83
Imagem 28 Fábrica de Fiação e Tecidos Lisbonense – Exterior.
Imagem 29 Fábrica de Fiação e Tecidos Lisbonense – Corredor de distribuição do piso 1. Todas
delimitações laterais do corredor são construções leves, em nada influentes no equilíbrio estrutural do
edifício.
84
Imagem 30 Fábrica de Fiação e Tecidos Lisbonense – Patamar da caixa de escadas no extremo Sul, com
elevador do lado direito.
85
Imagem 31 Fábrica de Fiação e Tecidos Lisbonense – Reboco deteriorado no tecto de um corredor, com
alvenaria visível.
Imagem 32 Fábrica de Fiação e Tecidos Lisbonense – Poço de elevador central, de construção antiga e
com alguns sinais de degradação visíveis.
86
Imagem 33 Fábrica de Fiação e Tecidos Lisbonense – Planta antiga de piso 3. Do lado direito é possível
observar o edifício sem qualquer seccionamento interior, com um open space marcado pela sucessão de
colunas metálicas.
Imagem 34 Fábrica de Fiação e Tecidos Lisbonense – Planta antiga do último piso, de área menor que os
restantes.
87
Imagem 35 Fábrica de Fiação e Tecidos Lisbonense – Corte na zona de escadas central.
Imagem 36 Fábrica de Fiação e Tecidos Lisbonense – Alçado Sul, demonstrativo do volume dos
balneários em destaque, à esquerda.
88
À Fábrica “Sol”, que se revelou impossível de ser observada ao pormenor e cujo
abandono e carácter hermético facilitou o desenvolvimento de bastante vegetação,
apontam-se as seguintes características:
01 ◦ O complexo fabril situa-se a cerca de 157 metros de uma paragem de
autocarros com sete opções de percurso distintas, enquanto o Largo do Calvário,
com a importância já anteriormente referida, fica a cerca de 456 metros. A 310
metros de distância, é possível alcançar a estação ferroviária de Alcântara-Mar, ao
passo que a de Alcântara-Terra fica a 530 metros. Apesar da maior parte da
topografia não apresentar declives significativos, a própria implantação da fábrica,
no seu prolongamento setentrional, estende-se por uma colina que se eleva pouco
mais de três metros até à Rua do Arco de Alcântara. Se nesse local se
encontrasse, por exemplo, um acesso ao interior do complexo, seria necessário
para um estudante vencer a inclinação quando regressasse de um dia de labuta;
02 ◦ Sito na Avenida 24 de Julho, o complexo tem a sua entrada principal virada
para essa mesma via, sendo que existem ainda outros dois pontos de penetração,
um do lado Poente, na Travessa do Baluarte, e outro do lado Norte, na Rua do
Arco de Alcântara. Apesar da avenida em questão ser caracterizada
maioritariamente por um fluxo de tráfego intenso, a zona específica onde se
encontra a fábrica não se insere nessa dinâmica, o que facilita o acesso pedonal;
03 ◦ A área bruta do complexo ronda os 8033 m2 e é ocupada por uma série de
edifícios de dimensões variadas, com áreas de implantação entre os 248 m2 e os
2730 m2, embora seja de difícil compreensão a percepção dos verdadeiros limites
dos volumes, pois a documentação é escassa e o acesso ao local não foi possível.
Do total de 6587 m2 de implantação construída, apenas 1581 m2 não se encontram
documentados. No entanto, os documentos, que chegam a ser datados de 1898,
não devem ser entendidos como elementos muito rigorosos naquilo que é a
representação do estado actual dos edifícios. A partir destes desenhos, tentou-se
fazer uma aproximação ao número de quartos que poderiam ser implantados,
excluindo os volumes edificados que não têm qualquer tipo de registo e os pisos
térreos, sendo que se pode afirmar que seria possível introduzir 127 quartos na
estrutura existente. Este número pode, mais uma vez, corresponder a mais alunos,
quer devido à hipótese de executar quartos duplos quer devido ao facto de se
omitirem hipóteses cuja verificação não foi possível;
89
04 ◦ Mais uma vez, este exemplo insere-se numa propriedade completamente
delimitada por muros ou construções, à semelhança de um condomínio privado.
Os efeitos deste tipo de morfologia urbana, neste caso específico, podem ser
ambíguos. Por um lado, é possível que se crie um isolamento em relação ao resto
da cidade, onde só sejam permitidos estudantes numa área de quase um hectare,
e que o potencial dinamizador desta valência morra logo à nascença, preso dentro
de si próprio. Por outro lado, se forem criadas condições para deixar a cidade fluir
através do complexo, nomeadamente com a atribuição de permeabilidade através
da criação de várias entradas, este pode afirmar-se como um centro catalisador de
renovação urbana. Toda a área circundante encontra-se actualmente desprovida
de qualidades que a recomendem enquanto destino urbano de interesse, pelo que
a criação de uma série de serviços conjugada com a atracção de uma população
jovem e em constante mudança poderia inverter esta situação;
05 ◦ Os edifícios distribuem-se pela propriedade com uma organização pouco
clara, sobressaindo o facto de se encostarem à periferia e deixarem um espaço
vazio central. Esta configuração sugere a atribuição do valor de praça a esse
vazio, sendo perfeitamente possível estabelecer uma continuidade circulatória
entre os edifícios, o que poderia contribuir para uma maior interacção entre os
utentes. No entanto seria moroso o planeamento dos quartos pois cada volume
edificado tem as suas próprias características espaciais e construtivas, forçando a
um planeamento específico para cada caso individual e não podendo ser aplicada
uma metodologia modular. Por outro lado, esta situação acentua o potencial
seccionador da residência, facilitando a separação entre zonas de repouso,
estudo, lazer, convívio e comércio. Esta disposição é reminiscente dos pátios de
Lisboa, que surgem quando as famílias operárias se vêem “…obrigadas a procurar
alojamento em espaços desocupados ou em velhos pardieiros arruinados, onde
improvisam elas próprias precárias habitações ou se acomodam de qualquer
maneira, sempre mediante o pagamento de uma renda ao proprietário. É assim
que surgem os pátios.”43. É possível observar que esta tipologia é um embrião de
grande potencial no seio da cidade, com exemplos recentes de recuperação
urbana a demonstrarem isso mesmo tais como o plano de reabilitação do Chiado,
do arquitecto Álvaro Siza, no qual se podem verificar espaços de interior de
quarteirão de grande permeabilidade com as vias principais, e o projecto Funf
Höfe, executado em Munique entre 1999 e 2003 pela parceria Herzog & De
PEREIRA, Nuno Teotónio, 1994. “Pátios e Vilas de Lisboa 1870-1930: a Promoção Privada do
Alojamento Operário” in Análise Social, Vol. XXIX (3.º), 1994 (n.º 127), pp. 511
43
90
Meuron44, cuja premissa basilar se expressa pela manutenção de grande parte dos
edifícios antigos que delimitam o quarteirão e a criação de novas infraestruturas no
seu interior que formalizam cinco pátios distintos e bastante ecléticos, numa
amálgama de valências culturais, comerciais, habitacionais e de escritórios. É
também de referir que, numa parte considerável dos edifícios e devido ao facto de
serem orientados segundo uma lógica industrial, os seus espaços interiores não se
encontram muito condicionados por elementos estruturais, muitas vezes pilares
metálicos, sendo possível distribuir quartos de uma forma bastante directa como o
é a divisão consequente da fenestração. A maior problemática encontra-se nos
edifícios cujas fachadas se encontram tapadas por outros, não permitindo assim a
entrada de luz e ventilação essenciais num quarto, sugerindo a utilização destes
espaços para funções que não necessitem tanto destas componentes. Porém, tal
como no exemplo alemão citado acima, a intervenção não necessita de se
restringir a uma pura reutilização do pré-existente, podendo perfeitamente
introduzir construção nova que potencie a capacidade de alojamento do local e
que, possivelmente, tenha expressão directa na periferia com a intenção de
integrar a cidade contemporânea no complexo;
06 ◦ Exceptuando as preocupações a ter com os materiais utilizados e as suas
classes de resistência e reacção ao fogo, neste caso específico apenas se verifica
uma característica comum entre todos os edifícios: nenhum é de grandes
dimensões, sendo o maior comprimento verificado de 55 metros. Assim, os
possíveis problemas causados pelas distâncias em impasse às saídas deixam de
ter tanta relevância, sendo apenas necessário acautelar em alguns casos a
existência de uma saída adicional à que já existe. Há no entanto uma
condicionante que é determinante na classificação das UT, que é a limitação da
área útil a 200 m2 nos espaços comerciais, bibliotecas e de exposição. Dadas as
características do complexo, e se a intenção de dotar o piso térreo de valências
como as referidas se mantiver, este será classificado como uma UT diferente,
sujeita a regras completamente distintas das que foram enunciadas relativamente
à tipologia da residência;
07 ◦ Aquilo que do conjunto é visível pelo exterior, denota uma deterioração
superficial semelhante à verificada na Fábrica de Fiação e Tecidos Lisbonense e,
tal como esta, esses elementos parecem manter as características estruturais
básicas para a sua manutenção. No entanto apenas foi possível observar uma
44
Ver imagens 44, 45 e 46.
91
parte reduzida do interior do complexo, onde, em muitos edifícios, a estrutura que
os suporta é metálica, como é possível comprovar através dos desenhos
disponíveis. Tendo em conta o facto dos edifícios não se encontrarem em estado
de ruína, apenas se pode deduzir que estas estruturas possuam ainda condições
que as qualifiquem, exceptuando alguns casos pontuais, como no edifício de
linguagem modernista imediatamente a Norte do bloco da entrada, encostado ao
limite Nascente. Aqui, para além da ausência de cerca de dois metros da parede
exterior no piso térreo, é ainda visível um enorme buraco na laje do tecto do piso
referido.
92
Imagem 37 Fábrica “Sol” – Vista exterior do complexo, do lado Poente.
Imagem 38 Fábrica “Sol” – Vista exterior da Avenida 24 de Julho, com o portão de entrada no complexo
do lado direito, sob a varanda.
93
Imagem 39 Fábrica “Sol” – Pormenor de edifício no interior do complexo, muito deteriorado.
94
Imagem 40 Fábrica “Sol” – Planta geral e planta de conjunto Sul.
Imagem 41 Fábrica “Sol” – Cortes e planta de edifício imediatamente a Norte do conjunto Sul, do lado
esquerdo.
95
Imagem 42 Fábrica “Sol” – Alçados e corte de edifício do lado direito do conjunto Sul, cujas condições de
conservação foram anteriormente demonstradas na Imagem 39.
Imagem 43 Fábrica “Sol” – Plantas de edifício representado na Imagem 42.
96
Imagem 44 Condição actual de um dos pátios da obra Fünf Höfe, de Herzog & de Meuron, em Munique.
Imagem 45 Condição prévia do quarteirão, semelhante à condição actual da fábrica “Sol”.
Imagem 46 (canto inferior direito) – Planta esquemática do sistema de pátios.
97
A fábrica “A Napolitana”, que já foi alvo de um projecto académico cuja intenção passa
precisamente pela reconversão numa residência de estudantes, pode ser descrita da
seguinte forma:
01 ◦ O edifício localiza-se a uns meros 80 metros do Largo do Calvário e a 195
metros da estação de Alcântara-Mar. A estação de Alcântara-Terra fica a 525
metros de distância. Todas estas distâncias, tal como sucede na Fábrica de Fiação
e Tecidos Lisbonense, são sempre percorríveis através de percursos planos;
02 ◦ Apesar da Rua da Cozinha Económica se assumir como a artéria principal
deste aglomerado urbano de carácter industrial, a entrada no edifício não se faz
por aí, mas sim pelas duas ruas perpendiculares a ela, a Rua Maria Luísa Holstein,
sem saída, e a Travessa Teixeira Júnior, que desemboca num pequeno largo
rodeado de habitações. Na primeira, a entrada faz-se indirectamente, através do
pátio de estacionamento e descargas, ao passo que na segunda existem portas
directamente orientadas para a rua. Apesar dos passeios que servem estas vias
serem relativamente exíguos, o fraco fluxo de tráfego rodoviário permite que o
acesso pedonal seja feito de forma descontraída, sendo inclusivamente
convidativa a permanência na via pública, conjecturando situações de convívio
espontâneo;
03 ◦ O edifício situa-se num quarteirão rectangular, com cerca de 80 x 50 metros,
e é composto por vários volumes originalmente independentes, dispostos
perifericamente e deixando o limite Sul da propriedade apenas delimitado por um
muro. Com alturas entre os 14 e os 24 metros, os volumes edificados são
marcados pelo seu material de revestimento, o tijolo sílico-calcário, pelos
acentuados telhados de duas águas, bastante visíveis nas fachadas de topo, e
pelas marcações verticais dos enormes vãos rematados por um arco abatido
distribuídos regularmente e intercalados por pilastras, variando a área
envidraçada. Para além das muitas unidades de climatização que as pontuam, as
fachadas denotam ainda, através de um friso destacado de tijolos, a marcação da
divisão dos pisos no interior e também um friso de azulejos ao nível do 3º piso do
edifício situado na face Nascente do quarteirão. Através de uma sucinta análise às
plantas dos edifícios, tendo em conta também a disposição dos pontos de
penetração nas fachadas e mais uma vez excluindo o nível térreo e plausíveis vias
de distribuição vertical na contabilização de espaços para a criação de quartos, foi
98
possível calcular o número aproximado de 122 locais, que se reflectem num
potencial máximo de 244 vagas para estudantes universitários;
04 ◦ O complexo encontra-se numa zona activa no contexto urbano, cercado por
valências industriais a Sul e habitacionais e comerciais a Norte e Nascente. A rua
com maior movimento, porém, é a Rua da Cozinha Económica, para a qual não
existe nenhuma abertura no piso térreo, o que condiciona a capacidade do edifício
se relacionar com a sua envolvente e integrar-se na dinâmica do quotidiano. O
piso térreo da face da fábrica que encara esta rua possui apenas oito vãos
horizontais, com o topo em forma de arco abatido e os envidraçados escondidos
atrás de um gradeamento. Estimulando a imaginação, apresenta-se como
plausível a possibilidade de abrir estes vãos à cidade, como se de balcões ou
montras se tratassem, e ser assim possível dotar as três frentes de rua do edifício
com ferramentas de permeabilidade. A fachada Norte apresenta algumas
entradas, directamente acessíveis da rua, enquanto o lado Sul é acessível através
de uma zona progressivamente integradora, um pátio que consegue distribuir
fluxos para todos os volumes e pode inclusivamente albergar equipamentos
destinados a convívio e lazer, destinados quer à população estudantil, quer ao
resto do bairro;
05 ◦ Como já foi referido, os volumes edificados distribuem-se pela propriedade de
forma periférica, deixando o lado Sul e o interior do quarteirão livres. No espaço de
pátio central existe, no entanto, um edifício baixo de tijolo branco, cujo
reaproveitamento pode passar, por exemplo, pela criação de um espaço de
restauração/ bar que sirva não só os utentes como também qualquer pessoa que
passe no local. Os edifícios periféricos adequam-se bastante bem à tipologia da
residência pois a clareza da definição dos pisos e, sobretudo, da sequenciação da
fenestração facilitam o seccionamento interior. A variedade na morfologia dos vãos
permite, de forma natural e até mesmo aparentemente sugerida pelo próprio
edifício, a diferenciação entre quartos duplos e quartos individuais. Esta
característica é observável nas fachadas Norte e Nascente do complexo, cada
uma pertencente a um edifício diferente, em que na primeira os vãos são mais
exíguos e menos distantes entre si e na segunda os vãos são bastante largos,
com mais de 2 metros e também mais espaçados entre si. Estas duas escalas
distintas não só facilitam o processo decisório no que diz respeito à atribuição do
efectivo como também tornam a adaptação da fábrica ao uso proposto num
processo mais orgânico, decorrente da linguagem da própria pré-existência.
99
Porém, no edifício situado a Sudoeste, originalmente destinado aos silos, a
fachada apenas apresenta aberturas de vãos regulares num dos seus extremos, a
Sul, sendo que seria necessário abrir os restantes vãos no edifício para o poder
aproveitar ao máximo enquanto local de dormida colectiva. Esta acção seria
também decorrente da própria marcação vertical já existente no volume, as
pilastras que dividem a fachada longilínea em cinco partes iguais. Na articulação
entre o volume que dá para a Rua da Cozinha Económica e o que dá para a
Travessa Teixeira Júnior, sobra uma área interior que pode não comunicar
directamente com o exterior, faltando-lhe assim iluminação natural. Esta área não
aproveitável para quartos pode ser utilizada para uma sala de estudo/ multimédia
ou até mesmo para uma via de comunicação vertical, fortalecendo assim o
carácter de rótula entre dois blocos de diferentes características;
06 ◦ Mais uma vez, dada a extensa área de implantação, o mais provável seria
que a todo o piso térreo, a ser convertido em comércio, restauração ou serviços,
fosse atribuída a classificação de uma UT diferente da que o resto da residência
possui. Outra questão sempre presente é a das distâncias às saídas em qualquer
ponto o edifício, especialmente quando o local de risco é da categoria “E”. Seria
assim necessário providenciar mais vias verticais de evacuação do que as que os
edifícios possuem actualmente, sendo que se estas fossem implementadas
apenas e simplesmente nos extremos dos edifícios, o problema ficaria resolvido,
pois a distância entre as mesmas nunca ultrapassaria os 60 metros, situação em
que o local mais longe de uma saída estaria a uma distância limite de 30 metros.
Outro problema que poderia surgir refere-se às condições exteriores comuns, onde
a largura da via em impasse teria de ser 10 metros no mínimo. No entanto, a Rua
Maria Luísa Holstein tem apenas 6,5 metros de largura e um impasse de 90
metros. Se o impasse possuísse menos de 20 metros, admitir-se-ia esta largura.
Uma solução para este problema passaria pela ligação do beco final desta rua à
Rua Maria Isabel Saint-Léger, que se encontra actualmente fechada precisamente
no ponto de viragem que completaria o contorno ao quarteirão vizinho ao da
“Napolitana”. Esta ligação está, aliás, prevista nos planos “Alcântara XXI” de 2004
para a requalificação de Alcântara, pelo atelier do arquitecto Mário Sua Kay;45
07 ◦ Um dos mais notórios sinais de degradação é o friso de azulejos no edifício
Este, faltando-lhe uma parte considerável de cerâmica. Na restante expressão
exterior do complexo, é de notar o bom estado de conservação da pele tijolar e,
45
Ver imagem 53
100
em contrapartida, algumas adulterações ao projecto original tais como o
tapamento de alguns vãos com tijolos e a introdução de elementos perturbadores
da leitura geral do edifício tais como aparelhos de climatização e tubagens. Uma
vez que não foi possível aceder ao interior do edifício, terá de ser feita referência à
dissertação “Projectar com o Lugar: (dos) usos perdidos no tempo: antiga fábrica
‘A Napolitana’” (2012), que inclui uma breve descrição de parte das alterações que
se puderam observar e afirma que grande parte da materialidade original foi
modificada: “… as coberturas originais foram substituídas por telas
impermeabilizantes de cor verde, parte das caixilharias originais em ferro foram
substituídas por caixilharia em alumínio, e o revestimento do edifício dos motores
(ao centro) foi alterado e pintado de branco e azul; ao nível do interior, os amplos
espaços foram separados com divisórias em materiais leves pré-fabricados, em
algumas zonas, aplicaram-se tectos falsos, e no edifício dos silos, foram retiradas
as estruturas de armazenagem das farinhas, mantendo-se apenas as partes
inferiores e pilares das ensilagens, e construídas lajes para se introduzirem pisos
que não existiam anteriormente.”46. Estas modificações e o facto do edifício se
encontrar em uso atestam também a aceitabilidade do estado de conservação
geral do edifício, pois se assim não fosse, não albergaria os escritórios do grupo
Auchan.
FERRÃO, Vanessa, 2012. Projectar com o lugar: (dos) Usos Perdidos no Tempo: Antiga Fábrica
“A Napolitana”, p. 45.
46
101
Imagem 47 Fábrica “A Napolitana” – Edifício dos silos, no extremo Oeste do complexo.
102
Imagem 48 Fábrica “A Napolitana” – Fachada Nascente.
Imagem 49 Fábrica “A Napolitana” – Fachada Poente do edifício representado na Imagem 48, vista do
pátio interior do complexo.
103
Imagem 50 Fábrica “A Napolitana” – Corte longitudinal de edifício Norte.
Imagem 51 Fábrica “A Napolitana” – Planta de edifício representado na imagem 48.
104
Imagem 52 Fábrica “A Napolitana” – Corte longitudinal de edifício representado na Imagem 48.
Imagem 53 Plano “Alcântara XXI – Proposta A”, da autoria do Arq.º Mário Sua Kay, no qual é visível a
intenção de unir a Travessa Teixeira Júnior à Rua Maria Isabel Saint-Léger.
105
A antiga Fábrica de Lanifícios de Bernardo Daupiás, de 1839, que foi referenciada quer
no projecto de Álvaro Siza47, quer no projecto de Mário Sua Kay48 como um imóvel a
preservar e recuperar, resume-se a:
01 ◦ O edifício localiza-se no fim da Rua Maria Luísa Holstein, que é a sua única
via de acesso no momento. A 222 metros do Largo do Calvário, o edifício pode, no
entanto, ver esta distância reduzida a 155 metros caso seja efectuada a ligação
entre a Travessa Teixeira Júnior e a Rua Maria Isabel Saint-Léger como ilustrada
no plano do arquitecto Mário Sua Kay. A 277 metros encontra-se a estação de
Alcântara-Mar enquanto a de Alcântara-Terra está a 640 metros de distância;
02 ◦ Como já foi referido, a única maneira de aceder ao edifício é através da Rua
Maria Luísa Holstein. Se se der o caso de ser executada a ligação entre as duas
ruas já referidas, passa a ser possível chegar ao edifício pela nova rua criada, quer
pelo lado Sul quer pelo lado Norte;
03 ◦ De todos os edifícios analisados ao pormenor, este é o mais pequeno e com
menos capacidade de se auto-sustentar através do efectivo. Não conseguindo
acesso ao edifício e existindo apenas disponível um desenho, a avaliação será
bastante superficial. Se for tida em conta a fenestração e a planta, rectangular com
as dimensões de 16,5 x 35 metros, pode-se calcular o número de quartos em 12, o
que se traduz num potencial de 24 estudantes. Mesmo que o piso térreo seja
considerado para efeitos de contabilização, são apenas 48 vagas no limite que a
fábrica tem para oferecer, o que é um número bastante reduzido tendo em conta
as despesas que uma residência acarreta a nível de manutenção e pessoal, sendo
que, segundo o Dr. Carlos Dá Mesquita49, uma lotação a partir de 150/ 200 alunos
seria o desejável;
04 ◦ Devido ao facto de se encontrar no fim de um beco sem saída, o edifício
padece de um grande isolamento, apesar de tal factor poder ser atenuado caso
seja executada a abertura já referida. Mesmo assim, continuaria a fábrica a sofrer
da falta de integração num tecido urbano consolidado, dependendo quase
totalmente da arbitrariedade da vontade da população em se dirigir ao local. O
edifício tem cerca de 13 metros de altura e divide-se em dois pisos, sendo que as
marcações verticais do piso térreo evidenciam uma escala totalmente diferente da
Ver imagem 57.
Ver imagem 58.
49 Entrevista com Dr. Carlos Dá Mesquita. Em anexo.
47
48
106
do primeiro andar. Estas aberturas, monumentais portas em arco de volta perfeita,
sugerem uma utilização de cariz fortemente público, capazes de atrair quem as
observe do extremo oposto da rua, a 90 metros;
05 ◦ A planta disponível sugere a existência de um espaço amplo, axialmente
atravessado por uma série de cinco colunas 3,5 metros espaçadas entre si.
Assumindo a existência de uma laje que faça a separação entre os dois pisos
expressos no exterior, devido à representação de uma escada no extremo Sul do
edifício, a divisão dos poucos quartos poderia ser feita muito simplesmente como
um processo decorrente da composição da fachada, atribuindo a cada vão um
quarto, sendo os vãos do lado Poente maiores do que os da fachada principal. O
piso térreo, se destinado a funções não habitacionais, aparenta prestar-se a
qualquer tipo de divisão que possa ser planeada, possuindo, para além do acesso
à caixa de escadas, seis portais de grandes dimensões que podem sugerir o
caminho a tomar no interior. O lado Oeste do edifício é completamente cego,
apesar da marcação de todos os vãos no piso superior e de alguns, irregulares, no
piso inferior;
06 ◦ Num caso tão simples como a Fábrica de Lanifícios de Bernardo Daupiás o é,
a análise às suas condicionantes referentes à segurança contra incêndios torna-se
sucinta. O ponto mais distante da via de evacuação vertical encontra-se a 27
metros de distância em impasse, ou seja, impor-se-ia a criação de uma outra saída
no extremo oposto, possivelmente até num volume novo exterior à pré-existência,
de forma a aproveitar o máximo de espaço disponível na mesma para a criação de
quartos. No que diz respeito à largura das vias e portas, não se afiguram
problemas devido às grandes dimensões dos componentes do edifício;
07 ◦ Não tendo sido efectuado o acesso ao interior, apenas é possível discorrer
sobre o que é transmitido pelo aspecto exterior da fábrica. A tinta com que o
edifício se revestia é praticamente inexistente e em muitas áreas o reboco já se
deteriorou ao ponto de revelar a alvenaria, com maior foco no piso térreo. As
possíveis entradas do piso térreo estão todas tapadas com betão, excepto a
central, fechada com um portão. Os vãos do piso superior encontram-se tapados
por portadas de madeira inutilizáveis. As coberturas, que formam dois telhados de
duas águas longitudinais, são pautadas ao longo de toda a sua extensão por um
segmento de 20 pequenas clarabóias emparelhadas, a maior parte das quais já
107
sem envidraçado, sugerindo a possibilidade da ocorrência de uma inelutável maior
deterioração no interior do que seria expectável se estivesse tudo tapado.
108
Imagem 54 Fábrica de Lanifícios de Bernardo Daupiás – Vista do lado Poente
Imagem 55 Fábrica de Lanifícios de Bernardo Daupiás – Fachada Nascente, com entrada para o edifício.
109
Imagem 56 Fábrica de Lanifícios de Bernardo Daupiás – Antiga planta do complexo hoje inexistente, com
o edifício em destaque.
110
Imagem 57 Plano de urbanização de Alcântara da autoria do Arq.º Álvaro Siza e do atelier Castanheira &
Bastai, onde é visível a intenção de manter o edifício em questão (suportada pela afirmação da mesma
na descrição do projecto, no site do atelier)
Imagem 58 Plano “Alcântara XXI – Proposta A”, da autoria do Arq.º Mário Sua Kay, no qual é visível a
intenção de preservar o edifício em questão.
111
Por fim, com entrada pela avenida da Índia, o edifício de escritórios do antigo complexo
fabril da SIDUL é o único vestígio desta sociedade no local, depois de demolidos todos os
outros edifícios que ocupavam a área de cerca de 25000 m2:
01 ◦ O edifício localiza-se a apenas 181 metros da estação ferroviária de
Alcântara-Mar e a 444 metros do Largo do Calvário. A estação de Alcântara-Terra
fica a 648 metros sendo que, situando-se a construção em causa numa artéria de
grande movimento, é de referir que se encontra a 406 metros da paragem da
Carris no Museu do Oriente;
02 ◦ O único acesso possível ao público neste momento é através da Avenida da
Índia, visto a Rua Maria Isabel Saint-Léger se encontrar cortada em dois locais,
impossibilitando a entrada no enorme terreno que poderia servir as traseiras do
edifício. Assim, o acesso pedonal é bastante desconfortável, pois é necessário
caminhar no passeio ao longo da Avenida da Índia, que é uma via de tráfego
rodoviário intenso. Caso seja executado então o plano de recuperação da zona, o
acesso ao edifício torna-se mais natural e decorrente da experiência urbana
possibilitada pela nova arquitectura;
03 ◦ Em planta, o edifício caracteriza-se por uma forma trapezoidal irregular, com
50 metros de comprimento, 20 metros de largura no lado Poente e 14 metros de
largura no lado Nascente, com uma área de implantação de 853 m2. Com três
pisos, e partindo da ideologia até agora sugerida, a área bruta total destinada a
quartos seria de 1756 m2, ficando o piso térreo com a missão de filtragem e
transição entre o privado e o social. Com a observação das plantas e alçados, é
possível determinar que o número de quartos a criar seria de 44, estabelecendo
portanto o efectivo permanente máximo em 88, ficando aquém dum número mais
desejável para uma maior rentabilização do espaço;
04 ◦ A única relação com a envolvente que se pode apreender do local neste
momento é uma total nulidade de características urbanas. O edifício é uma
autêntica ilha, com uma via de trânsito intenso a Sul e uma enorme extensão de
terreno interdito a Norte. Com a eventual requalificação dessa mesma área, o
edifício ficaria servido por equipamentos e serviços urbanos totalmente novos e
expectavelmente activos e benéficos. Porém, mesmo conjecturando um cenário
positivo a nível da requalificação urbana do local, o edifício continuaria a sofrer de
uma condição que hoje se nota bem: o ruído. Ao passar no local, os sons dos
112
veículos são tão intensos que dificilmente seria confortável habitar a 3 metros da
avenida;
05 ◦ Dividindo-se em três pisos, o edifício possui também uma divisão vertical
tripartida em que a secção central serve de pórtico de entrada no que foi outrora o
complexo fabril, causando uma interrupção na continuidade do piso térreo,
inexistente nos pisos superiores. Os pilares e vigas metálicas que suportam o
pavimento dos pisos 1 e 2 permitem ao espaço interior ser completamente livre,
verificando-se nas plantas algumas divisórias aparentemente irrelevantes no
contexto estrutural. Apesar de não ser visível nas plantas, é perceptível através de
uma observação contextualizada na contemporaneidade que foi adicionado um
volume paralelepipédico às traseiras do edifício, em consonância simétrica com o
volume apresentado nas plantas situado no lado Poente. Estes dois volumes
dotam o edifício de uma profundidade capaz de suportar a existência de quartos
nas duas fachadas opostas, relegando o volume central para a possível criação de
um espaço comum. Em relação às comunicações verticais, é interessante verificar
a existência de um monta-cargas com uma volumetria perfeitamente visível do
exterior e que pode manter a sua função. No que diz respeito às escadas, é visível
nas plantas a substituição de uma configuração algo confusa, diferente em todos
os pisos, por uma coluna de acesso vertical bastante linear, encostada à fachada
principal;
06 ◦ Devido à grande proximidade com a Avenida da Índia, o acesso por parte dos
bombeiros em caso de incêndio não apresenta problemas. Em relação ao interior,
surge uma vez mais a dúvida relativamente às distâncias em impasse que, não
podendo ultrapassar os 10 metros, neste caso causariam a necessidade de
providenciar uma caixa de escadas em cada um dos extremos do edifício. As
larguras de portas e vias de evacuação não apresentam problemas devido ao
facto de serem completamente susceptíveis de planeamento, exceptuando a
actual caixa de escadas situada no centro do edifício que, mesmo assim, cumpre
todos os requisitos impostos pelo regulamento;
07 ◦ O exterior do edifício apresenta condições variáveis de acordo com o material
em avaliação. As cantarias apresentam algumas fissuras, especialmente nos
elementos decorativos das janelas em arco dos primeiros dois pisos. A parede
lateral Nascente apresenta, na zona em que antigamente se acoplava a outro
edifício, uma quase total ausência de reboco, deixando uma grande área de
113
alvenaria a descoberto. As caixilharias, de madeira, assim como as portas, não
apresentam as condições que se exigem a uma obra contemporânea que vise
níveis elevados de conforto térmico e acústico como o é uma residência,
encontrando-se inclusivamente inúmeros vidros partidos ou ausentes. No entanto,
a maior parte da área de fachada, rebocada e pintada, encontra-se em condições
perfeitamente aceitáveis. Considerando o facto de o edifício marcar presença no
plano urbanístico do Arq.º Mário Sua Kay – pelo menos em três das cinco
propostas apresentadas – é de supor que esta intenção de o manter seja
consequência de um estado de conservação aceitável a nível estrutural,
obviamente entre outras razões de génese projectual mais relevantes.
114
Imagem 59 Complexo Fabril da SIDUL – Vista exterior do edifício.
Imagem 60 Complexo Fabril da SIDUL – Pormenor de cantaria deteriorada na fachada principal.
115
Imagem 61 Complexo Fabril da SIDUL – Plantas de subterrâneo e piso térreo.
116
Imagem 62 Complexo Fabril da SIDUL – Plantas de pisos 1 e 2.
117
Imagem 63 Complexo Fabril da SIDUL – Corte transversal.
Imagem 64 Complexo Fabril da SIDUL – Fotografia antiga demonstrativa do complexo ainda existente e
em funcionamento, com o edifício do lado esquerdo.
Imagem 65 Plano “Alcântara XXI – Proposta B”, da autoria do Arq.º Mário Sua Kay, no qual é visível a
intenção de preservar o edifício em questão.
118
119
Paralelismos
04
120
Contexto 04 01
Considerando a conjugação das duas temáticas anteriormente explanadas, é possível
encontrar um exemplo de reconversão de um edifício industrial histórico para uma
residência estudantil: a transformação do edifício da antiga fábrica Viúva Lamego na
Avenida Almirante Reis numa residência para estudantes Erasmus, em conjunto com todo
o projecto de recuperação do Largo do Intendente e denotando assim uma vontade geral
de se aliarem problemas distintos na procura de uma solução comum.
O quarteirão em questão, situado entre a Avenida Almirante Reis e o requalificado Largo do
Intendente Pina Manique, possui actualmente vários edifícios destinados a alojamento
temporário, maioritariamente de iniciativa privada, destacando-se o n.º6 da avenida e o
n.º19 do largo, como residência para estudantes Erasmus e alojamento para artistas e
turistas respectivamente.
Este último, com o nome de LARGO Residências, nasceu da necessidade de crescimento
da associação cultural SOU, cuja finalidade é a de formação na área das artes
performativas e a promoção de actividades culturais. Ao ocupar um dos edifícios
pertencentes ao legado da empresa Viúva Lamego, a associação integrou-se também no
programa da Câmara Municipal de Lisboa BIP/ZIP50 (Bairros e Zonas de Intervenção
Prioritária), com o objectivo de contribuir para a regeneração do local no plano social,
regendo-se por três linhas de actividade: artes, actividades sociais e alojamento turístico.
Para além de acolher artistas e providenciar condições específicas para o desenvolvimento
do seu trabalho, o LARGO compromete-se a integrar a comunidade em todas as
actividades e projectos que estes realizarem, trabalhando com o património material e
imaterial da zona e procurando constantemente a integração dos habitantes no movimento.
Esta filosofia permite, numa escala um pouco mais alargada, a colocação do Intendente
num plano mais central e de relevância em relação ao que Lisboa oferece em termos
culturais, lançando as bases para uma recuperação urbana tão almejada por uma área
estigmatizada. Para além das valências referidas, o complexo incluirá ainda uma loja de
aluguer e reparação de bicicletas e um café com um estúdio que estará ao dispor dos
artistas da residência, não descurando a vertente turística na medida em que se encontram
actualmente em fase de acabamento os apartamentos destinados a qualquer pessoa que
deseje visitar a cidade com um olhar focado na oferta cultural. O edifício tem um total de 21
quartos, capazes de albergar 35 pessoas.
50
Informação relativa ao programa no site do Pelouro da Habitação de Lisboa
121
Outro factor que reflecte a relevância do investimento feito na zona é a actual instalação do
gabinete do presidente da Câmara Municipal de Lisboa no edifício no extremo Nordeste do
quarteirão, até 2013. Para além de todo o espaço habitacional ainda presente nos edifícios,
da loja de cerâmica virada para o Largo e de todo o comércio virado para a Avenida, existe
ainda no n.º 4 da mesma um hostel, o NextHostel, sob a tutela da mesma gerência que
administra a residência Erasmus. Todo este investimento e actividade procuram dar
segurança e vida ao local que, através de uma maior ocupação populacional, se prevê que
contribuam para uma recuperação urbana significativa. 51
Grande parte desta informação foi retirada de entrevista com Susana Alves, responsável do Largo
Residências pelos Projectos na Comunidade. Em anexo.
51
122
Imagem 66 Largo do Intendente Pina Manique, no seu estado actual.
Imagem 67 N.º 19 do Largo do Intendente. Edifício que alberga o projecto Largo Residências.
123
Imagem 68 Quarto da residência de artistas do projecto Largo Residências.
124
A Residência 04 02
O edifício, símbolo principal de apresentação da antiga Fábrica de Cerâmica Viúva Lamego
à cidade, esteve fechado durante quase vinte anos desde a transferência da actividade
fabril para fora da capital, tendo sido efectuadas algumas obras de restauro devido à
eminência de colapso da estrutura. Consideraram-se então várias hipóteses de reutilização
do imóvel, chegando-se à decisão de o converter num restaurante a ocupar todos os pisos.
No entanto, já depois de se ter dado início às obras, o empreendimento foi descartado por
razões económicas. Neste processo, foi retirada uma escada metálica que o IGESPAR
considerou de relevância, devido ao seu avançado estado de degradação.
Foi então equacionada a hipótese de se criar um espaço de hotelaria mas, no seguimento
de uma acção semelhante levada a cabo no edifício ao lado pelos mesmos proprietários, o
NextHostel, decidiu-se investir na criação de uma residência destinada a um público jovem,
nomeadamente estudantes universitários, com grande incidência para aqueles cuja
proveniência é exterior a Portugal. Após a determinação desta intenção, foi efectuado um
projecto de arquitectura que, apesar de ter sido começada a sua execução, foi mais tarde
substituído pelo projecto actualmente visível, da autoria do arquitecto Frederico
Valsassina.52 É também de interesse referir que, durante o período de Verão, o mesmo
edifício funciona como um bed & breakfast, contribuindo para a sua rentabilização e para
uma valorização ininterrupta da área em que se insere.
A residência, em funcionamento desde 2011, está instalada no número 6 (A, B, C, D, E, F,
G, H, I, J, K) da Avenida Almirante Reis e nos números 19 e 21 da Travessa Cidadão João
Gonçalves. Exteriormente, a fachada não é uniforme, aparentando a existência de dois
edifícios distintos, um com cerca de 25 metros de comprimento e outro com cerca de 11
metros, sendo este último o volume que remata o extremo Noroeste do quarteirão, fazendo
esquina com a travessa anteriormente mencionada. Ambos os panos de fachada são
quase integralmente revestidos a azulejo, sendo o mais pequeno composto por um padrão
geométrico regular e o maior por uma composição complexa de motivos florais, animais,
paisagísticos e antropomórficos. A entrada para a residência é feita através do piso térreo
situado sob esta última metade, deixando o resto do nível livre para a ocupação de
pequenas actividades comerciais. Com capacidade para 41 utentes, a residência ocupa o
Grande parte desta informação foi retirada de entrevista com Mariana Vasconcelos, da família
herdeira do espólio da Viúva Lamego. Em anexo
52
125
edifício quase todo, exceptuando-se apenas o último piso. Uma vez no interior, é bastante
clara a organização de cada piso:
a ◦ Programa e Distribuição
A entrada faz-se directamente através do n.º6, por uma porta de vidro com cerca
de 1,5 metros de largura. O primeiro espaço que surge, com cerca de 15 m 2, dá
acesso imediato às escadas que ligam os pisos todos, ao único elevador instalado
e ao espaço de serviço de lavandaria da residência. Para além das acessibilidades
referidas, o local contém ainda, debaixo do segundo lanço de escadas, um espaço
destinado a recepção. As escadas, ao se elevarem, permitem a observação de
toda a sua extensão vertical, visto estarem separadas da parede, apoiando-se
pontualmente por vigas metálicas. Os pisos-tipo são praticamente semelhantes, na
medida em que se organizam em torno de um corredor de distribuição paralelo à
fachada, passando por um espaço central aberto, destinado a convívio e a zona de
transição para a cozinha. Porém, apesar dos três pisos poderem ser resumidos
desta forma, cada um deles tem especificidades inevitavelmente decorrentes da
pré-existência.
b ◦ Confronto: Social VS Privado
Ao entrar no Piso 1, deparamo-nos com um corredor com cerca de 31 metros de
comprimento que atravessa toda a extensão do edifício e acaba numa janela
virada para a Travessa Cidadão João Gonçalves. Do lado esquerdo, o corredor é
inteiramente delimitado por uma parede que dá acesso à maioria dos quartos. Do
lado direito, a exiguidade é interrompida por um espaço de cerca de 37 m2, a sala
de estar. Esta sala, guarnecida com alguns sofás, uma televisão e uma mesa de
refeições, dá acesso à cozinha, a uma sala pessoal mais resguardada e a um
saguão. Este saguão constitui a solução encontrada para fornecer iluminação e
ventilação ao piso em questão e ao único quarto duplo situado no limite Norte do
edifício, assumindo-se como um espaço de convívio ao ar livre com uma
atmosfera especial, conferida pela iluminação zenital.
No Piso 2 e no Piso 3, o corredor de distribuição é igualmente interrompido do lado
direito relativamente a quem entra no apartamento mas, neste caso, a zona de
estar tem uma configuração rectangular perpendicular à fachada. Este espaço,
munido de fenestração orientada a Norte, de alguns sofás, de uma televisão e de
uma mesa de refeições, assegura o acesso ao único quarto nessa área, à cozinha
e à sala pessoal. No entanto, ao penetrarmos mais ainda no corredor, existe ainda
126
outro elemento marcante, uma porta de vidro com quase 2,5 metros de largura que
dá acesso ao terraço, com vista para o Largo do Intendente e todo o desenvolver
do bairro pela colina.
Assim, é de notar que não existe um seccionamento muito expressivo entre as
zonas comuns e as privadas, existindo no entanto uma certa gradação. No
máximo, apenas três quartos têm a sua porta orientada directamente para o
espaço comum, ao passo que os restantes acedem ao corredor, de cariz bastante
hermético. As zonas comuns têm, elas próprias, dimensão e configuração para
permitir algum afastamento entre as actividades de comunidade e as zonas onde
se requer mais silêncio. Porém, no acesso às instalações sanitárias, muitos
utentes vêem-se obrigados a atravessar distâncias consideráveis e com falta de
privacidade.
c ◦ Espaços de serviço: Cozinha, Lavandaria e Instalação Sanitária
Em cada piso existe uma cozinha, com dois frigoríficos e um fogão, sempre
acessível através da sala de estar. A separação entre estes dois espaços é
apenas estabelecida pela arquitectura, não existindo nenhuma porta entre eles. A
lavandaria, com duas máquinas de lavar e uma de secar, situa-se no piso térreo e
serve a residência toda, partilhando o seu espaço com uma zona destinada aos
lixos produzidos. Existe, aliás, um espaço destinado aos lixos de cada piso no
exterior do apartamento, em frente ao elevador.
As instalações sanitárias encontram-se dispersas por cada piso, no qual existe
apenas um quarto com a vantagem de ter este serviço ao seu dispor. A sala
pessoal possui também uma instalação de serviço, sobrando as restantes três
para servir os quartos todos, que compreendem uma média de doze utentes por
piso. Todas as instalações sanitárias, sem excepção, possuem um lavatório, uma
sanita e uma cabine de chuveiro.
d ◦ Intervenção: Novo VS Pré-existente
A estrutura original do edifício é ainda visível, expressa nas colunas metálicas que
suportam as lajes e nas vigas de perfil em “I” visíveis na caixa de escadas. Estes
elementos metálicos foram, no entanto, pintados de cinzento, contribuindo para a
linguagem bastante neutra e depurada de toda a intervenção. Outro elemento que
se manteve foram as caixilharias de ferro das janelas do lado Norte do edifício, ao
passo que as do lado Sul foram todas introduzidas em concordância com a
127
contemporaneidade da intervenção. Esses são, aliás, os únicos elementos não
originais visíveis do exterior para além da zona de entrada no piso térreo, que
eliminou o portão e montra anteriores para dar lugar a um pano forrado a azulejo
branco com três aberturas niveladas, que são as actuais duas portas e janela
visíveis. Devido às exigências de segurança contra incêndios, foi também criada
uma via vertical de evacuação no extremo Oeste do edifício. A organização
espacial interior é o aspecto que mais difere da configuração original pois esta
apresentava cada piso como um open space, contrastando com o seccionamento
actual decorrente das exigências de uma residência.
128
Imagem 69 Antiga Fábrica Viúva Lamego – Plantas anteriores à actual reconversão. A ligação entre os
dois edifícios que compõem a residência ainda não era total.
129
Imagem 70 Antiga Fábrica Viúva Lamego – Fachada principal no seu estado actual.
Imagem 71 Antiga Fábrica Viúva Lamego – Vista para o terraço Nascente.
130
Imagem 72 Antiga Fábrica Viúva Lamego – Vigas pré-existentes, pintadas, visíveis na caixa de escadas
actualmente construída.
131
Imagem 73 Antiga Fábrica Viúva Lamego – Caixa de escadas actual, encostada à fachada principal do
edifício.
132
Imagem 74 Antiga Fábrica Viúva Lamego – Corredor de distribuição do piso 1 da residência, com colunas
metálicas visíveis, pintadas.
Imagem 75 Antiga Fábrica Viúva Lamego – Pormenor de caixilharia antiga restaurada, em zona de
acesso ao terraço.
133
Imagem 76 Antiga Fábrica Viúva Lamego – Poço de luz na zona comum do piso 1, assegurando
iluminação natural e ventilação.
134
Imagem 77 Antiga Fábrica Viúva Lamego – Planta do piso 1 da actual residência, da autoria do Arq.º
Frederico Valsassina.
Imagem 78 Antiga Fábrica Viúva Lamego – Planta do piso 2 da actual residência, da autoria do Arq.º
Frederico Valsassina.
135
Imagem 79 Antiga Fábrica Viúva Lamego – Corte longitudinal da actual residência, da autoria do Arq.º
Frederico Valsassina.
Imagem 80 Antiga Fábrica Viúva Lamego – Cortes da actual residência, da autoria do Arq.º Frederico
Valsassina. No primeiro, é perceptível a solução encontrada para munir o primeiro piso do poço de luz. O
segundo corte ilustra a exiguidade do espaço a partir do momento em que se dá a transição para o
edifício Norte.
136
137
Considerações Finais
05
138
O reduzido número de alternativas de alojamento estudantil em Lisboa, aliado à
obsolescência das residências já existentes, tem causado um aumento progressivo da
procura de soluções fora do contexto universitário, acrescendo dificuldades e entraves a
quem tenha por destino a capital. Neste sentido, pode-se afirmar que é notável o potencial
presente na criação de edifícios especificamente destinados a habitação para estudantes
universitários. Para além de fortalecer um serviço do qual a cidade carece, esta acção tem
a capacidade de tornar Lisboa numa cidade mais atraente enquanto destino de estudo,
consequentemente angariando mais estudantes, estrangeiros ou nacionais, para as
universidades, beneficiando-as.
Já a cidade retiraria benefícios do aumento da afluência de jovens habitantes anualmente,
num processo de constante rejuvenescimento populacional e, consequentemente, de
renovação urbana. Este factor será, aliás, bastante mais potente se a implantação das
novas valências se der num local integrado numa malha urbana de cariz central e,
simultaneamente, que padeça de sintomas de degradação urbana. A freguesia de
Alcântara é pródiga não só em situações em que a conjuntura urbana apresenta sinais de
abandono, como também em edifícios igualmente votados ao esquecimento ou a
reutilizações que em nada contribuem para a sua valorização ou da sua área de influência.
Neste caso concreto, a situação actualmente verificável advém directamente do passado
fortemente industrial da zona, que assistiu a grande parte do desenvolvimento das
actividades fabris de Lisboa ao longo dos séculos XIX e XX. Surge assim a possibilidade de
aproveitar este património para requalificar Alcântara, introduzindo as residências
universitárias enquanto elementos despoletadores de desenvolvimento e de novas
dinâmicas populacionais, mantendo a identidade do local.
Para serem incumbidos desta tarefa, os edifícios em questão teriam, antes de mais, de ter
a capacidade de albergar um mínimo de 150 estudantes. Esta questão, implícita na
vertente económica da proposta, prende-se na necessidade de fazer com que a residência
gira mais recursos do que os que gasta ou, por outras palavras, que não dê prejuízo. Os
custos acumulados de segurança, limpeza, logística e manutenção têm que ser cobertos
pelas contribuições dos utentes para que seja, pelo menos, sustentável investir na criação
de uma infra-estrutura deste género, sendo que, para tal, as directrizes de projecto passam
por uma mentalidade de rentabilização máxima do espaço. No entanto, existem condições
espaciais mínimas que devem ser asseguradas, não sendo aceitável que um quarto possua
menos de 9m2. Esta preocupação é inclusivamente justificada por Hall (1966), alertando
para a sua maior importância num contexto citadino: “No coração da cidade, é preciso mais
espaço em casa, e não menos. A casa tem de ser um antídoto para os stresses da
139
cidade.”53. Partindo dessa condição inicial, os benefícios provenientes de uma intervenção
destas seriam afectos a todas as partes envolvidas no processo: as instituições de ensino
superior, pois conseguiriam apresentar uma oferta de um serviço que funciona como
catalisador de migração de estudantes provenientes de outros países do globo; a cidade,
pois veria uma parte do seu património aproveitado e explorado ao ponto de regenerar uma
área actualmente negligenciada, potenciando o seu desenvolvimento económico; e, de uma
forma menos marcante, o investidor, que de qualquer modo apenas mostraria interesse
partindo do princípio que iria retirar algum lucro da operação, seja directamente através da
residência ou como consequência de um serviço prestado às universidades e à cidade.
Porém, nem todos os edifícios possuem o mesmo potencial para uma concretização de
sucesso, devendo essa característica não só à já mencionada capacidade de efectivo como
também às condições físicas e estruturais actuais, bem como à própria formalização
arquitectónica. Deverá existir uma avaliação cuidadosa que consiga prever se os custos da
uma reabilitação não ultrapassam os custos de uma construção de raiz, pois em alguns
casos é possível que os elementos construtivos se encontrem de tal forma deteriorados
que já não é possível aproveitar nada. Nos casos em que a estrutura e as demais
componentes resistiram ao teste do tempo, é necessário perceber quais as dificuldades ou
facilidades que existem na adaptação às exigências gerais de uma residência de
estudantes. Tratando-se os casos de estudo de edifícios de génese industrial, muitas vezes
os pisos apresentam apenas colunas metálicas a interferir num espaço muito pouco ou
nada seccionado, permitindo mais liberdade numa futura intervenção restruturante. Na
maioria dos casos é também interessante verificar que o ritmo da fenestração sugere quase
imediatamente o número de quartos possíveis de serem introduzidos. No entanto, é
também conclusivo que, para cumprir os regulamentos patentes no RJ-SCIE, algumas
modificações de relevo teriam de ser perpetradas, nomeadamente a introdução de vias de
fuga verticais em grande parte das extremidades dos edifícios sob escrutínio, algo que teria
uma relevância menos positiva na intenção de manutenção das características estruturais
originais. Esta intenção, aliás, é sempre algo a almejar quando se intervém em património
prezado pelo seu valor de inovação nos campos da arquitectura e engenharia.
Mas a vertente regenerativa da proposta é a que mais se destaca numa perspectiva global.
As consequências que um empreendimento desta génese poderá causar no ambiente
urbano específico em que se insere podem, de certa forma, ser antevistas através da
observação de um caso semelhante: o da Residência de Estudantes Erasmus instalada na
antiga Fábrica de Cerâmica Viúva Lamego. A atracção de uma população jovem e com
53
HALL, Edward T., 1966. The Hidden Dimension, pp.178.
140
sede de descoberta, aliada ao projecto artístico do Largo Residências, à instalação do
gabinete do presidente da Câmara Municipal de Lisboa e à recuperação do próprio Largo
do Intendente são elementos despoletadores do processo de requalificação de todo o
bairro. O largo é, neste momento, um pólo de actividades culturais, comerciais e de
restauração graças ao investimento que nele foi feito e à crença de que se daria um retorno
de ordem social, cultural, urbana e financeira, promovendo não só a valorização do
património material como também do imaterial, ao comportar, por exemplo, visitas guiadas
e actividades culturais inclusivas que procurem abrir a Mouraria à cidade como também,
por consequência, melhorar a qualidade de vida dos habitantes. Com a instigação de toda
esta actividade, os problemas pelos quais o local era conhecido, como a prostituição e o
tráfico de drogas, tendem a desvanecer-se automaticamente, completando assim um
processo cíclico de regeneração urbana.
A questão que se impõe ao paralelizar a situação referida para o contexto de Alcântara
prende-se na determinação do peso atribuível a cada uma das valências criadas. Não é
certo que a Residência Viúva Lamego contribuísse para todas as mudanças benéficas
ocorridas se a sua implantação não tivesse sido integrada em todo aquele processo
multifacetado. Provavelmente, ao reabilitar um edifício industrial para uma residência
estudantil em Alcântara sem qualquer outra acção, a almejada requalificação urbana não
se sucederia tão marcadamente nem, certamente, de forma tão célere. Seria sempre
plausível, e de maior garantia, considerar a integração do investimento num plano mais
alargado de intervenção, quer a nível físico, quer a nível estratégico. Esta comparação não
pode, no entanto, descurar a diferença de efectivo entre o caso de estudo do Largo do
Intendente e as possibilidades sugeridas no capítulo 03 da presente tese. É possível que
um mesmo serviço com quase o quádruplo da capacidade de efectivo tenha maior impacto
na zona envolvente, tal como não são de previsão fácil as consequências decorrentes da
própria zona de implantação. Apesar da Avenida Almirante Reis ser um eixo rodoviário de
cariz central e de forte movimento, a freguesia de Alcântara beneficia da proximidade com
o rio Tejo, que é um factor de grande influência no que diz respeito à atractividade de
investimento na cidade de Lisboa, conjugada com a proximidade à linha ferroviária de
Cascais e à Ponte 25 de Abril.
Uma outra abordagem que pode surgir é o aproveitamento não apenas de um mas, por
exemplo, dos cinco casos analisados. As localizações dos edifícios estabelecem um
perímetro fechado, no qual se insere uma vasta área54 que, apesar de pertencer aos limites
administrativos da cidade, dificilmente se pode classificar de urbana. Em toda esta área, a
54
Ver imagem 81.
141
continuidade pedonal apenas é interrompida pela Rua Cascais/ Avenida de Ceuta, pelo que
surge a possibilidade de, com estas intervenções pontuais, lançar as bases para uma
renovação mais ampla, estabelecendo também uma continuidade urbana que, com o
decorrer do tempo, se pode consolidar. Esta possibilidade permitiria não só a preservação
da memória colectiva do local, enraizada na industrialização da cidade, como também um
desenvolvimento urbano, social e económico ponderado e auspicioso.
142
Imagem 81 Os cinco edifícios sob escrutínio em Alcântara, cujas localizações possibilitam a idealização
de um perímetro de influência.
143
144
Bibliografia
06
145
Livros 06 01
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148
Endereços Internet 06 04
Arquivo Municipal de Lisboa
http://arquivomunicipal.cm-lisboa.pt/
Biblioteca de Arte da Gulbenkian
http://www.biblartepac.gulbenkian.pt
Bibliotecas da Universidade Técnica de Lisboa
http://thesaurus.reitoria.utl.pt
Câmara Municipal de Lisboa
http://www.cm-lisboa.pt/
Castanheira & Bastai Arquitectos Associados
http://www.carloscastanheira.pt/
DGEMN – Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais
http://www.monumentos.pt/Site/APP_PagesUser/Default.aspx
Frederico Valsassina Arquitectos
http://www.fvarq.com/
Guia do Estudante – Alojamento
http://aeiou.guiadoestudante.pt/ge-area_geo.asp
HESA – Higher Education Statistics Agency
http://www.hesa.ac.uk/
IGESPAR – Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico
http://www.igespar.pt/pt/
IHRU – Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana
http://www.portaldahabitacao.pt/pt/ihru/
Informações complementares relativas a universidades
149
http://estudos.universia.net/portugal/instituicao/universidade-lusofona-humanidadestecnologias
http://www.online24.pt/universidades-publicas-de-lisboa/
IPL – Instituto Politécnico de Lisboa
http://www.ipl.pt/
ISCTE-IUL – Instituto Universitário de Lisboa
http://www.iscte-iul.pt/home.aspx
LARGO – Residências Artísticas e Turísticas
http://www.largoresidencias.com/
Lundgaard & Tranberg Arkitekter
http://www.ltarkitekter.dk/
Marcas das Ciências e das Técnicas – Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa
http://marcasdasciencias.fc.ul.pt/pagina/inicio
Metro de Lisboa
http://www.metrolisboa.pt/obras/projectos-de-expansao/
NEP – Núcleo de Estatística e Prospectiva
http://nep.ist.utl.pt/
Pelouro da Habitação de Lisboa
http://habitacao.cm-lisboa.pt/
Rede Municipal de Bibliotecas de Lisboa
http://catalogolx.cm-lisboa.pt
SASUTL – Serviços de Acção Social da Universidade Técnica de Lisboa
http://www.sas.utl.pt/boas-vindas/
Sua Kay Arquitectos
http://www.suakay.com/
150
UCP – Universidade Católica Portuguesa
http://www.ucp.pt/site/custom/template/ucptplportalhome.asp?sspageid=1&lang=1
UL – Universidade de Lisboa
http://www.ul.pt/portal/page?_pageid=173,1&_dad=portal&_schema=PORTAL
ULHT – Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias
http://www.ulusofona.pt/index.php?lang=pt
University of Glasgow
http://www.gla.ac.uk/
University of Strathclyde
http://www.strath.ac.uk/
University of Strathclyde Students’ Association
http://www.strathstudents.com/
UNL – Universidade Nova de Lisboa
http://www.unl.pt/
UTL – Universidade Técnica de Lisboa
http://www.utl.pt/
Wikipedia
http://www.wikipedia.org/
151
152
Anexos
07
153
Anexo Caracterização Global da População Escolar Ingressada no IST em 2011 / 2012, pp. 4. (Fonte:
site do NEP)
154
Anexo Plano de Urbanização de Alcântara – Termos de Referência, pp. 18. (Fonte: site da CML)
155
Anexo Planta de Ordenamento do Inventário Municipal de Património, excerto. (Fonte: site da CML)
156
Anexo Conversa com Dr. Carlos Dá Mesquita, dos SASUTL
No que diz respeito a estratégias de possível criação de novas residências, a prioridade
recai sobre a construção nova ou reabilitação? Como seria encarada uma mentalidade
focada na reabilitação e reconversão para uma função residencial colectiva?
A reabilitação de edifícios é algo extremamente importante e também apetecível por parte
das entidades camarárias pois permite não só preservar certos valores e registos da
evolução da cidade como também promove o rejuvenescimento e a qualificação das áreas
circundantes à intervenção, beneficiando assim de vantagens políticas e sociais. Assim
sendo, é uma hipótese com potencial para ser desenvolvida em parceria com a câmara.
Porém, nem sempre os edifícios se adaptam aos usos que lhes são propostos e no caso
específico das residências de estudantes, é necessário que a volumetria seja significativa
para que seja sustentável investir. Concretamente, é possível afirmar que o rácio
sustentável não possuiria menos de 150/ 200 camas de forma a suportar os custos de
segurança, limpeza, logística e manutenção. No entanto, construir de raiz seria mais fácil
no sentido de adaptabilidade da construção às necessidades inerentes à tipologia em
questão.
Qual o tipo de edifícios que considera terem o maior potencial para serem alvo deste tipo
de operação?
A tipologia habitacional é a menos adequada para este objectivo pois não é tão versátil
como, por exemplo, as características típicas de um edifício industrial que apresentam
quase sempre zonas homogéneas que permitem uma mais fácil adaptação aos requisitos
de uma reconversão. Apesar de não ser um exemplo completamente paralelo à questão
que aqui se coloca, é de referir o caso da Universidade da Beira Interior que utilizou um
antigo edifício industrial para a criação de um polo universitário. Outro tipo de edifícios que
se adaptam bem a estas circunstâncias são hotéis e lares devido ao seu carácter de
compartimentação se assemelhar naturalmente ao de uma residência.
Que zonas da cidade de Lisboa considera serem passíveis de receber uma residência
universitária, independentemente do tipo de solução adoptada?
Se for tida em conta a lógica de raciocínio presente no domínio do investimento privado, a
linha de metropolitano e as áreas de influência serão o indicador fulcral para a definição do
surgimento destes equipamentos. As dinâmicas que este serviço de transporte permite
asseguram um potencial retorno financeiro que torna mais plausível a possibilidade de
investimento por parte de entidades privadas. Já a linha de pensamento da UTL passa por
considerar a proximidade aos campi das faculdades, nomeadamente o Instituto Superior de
157
Economia e Gestão, em S. Bento, a Faculdade de Motricidade Humana na Cruz-Quebrada,
o Polo Universitário da Ajuda, o Instituto Superior de Agronomia na Tapada da Ajuda e o
Instituto Superior Técnico na Alameda. Assim sendo, as zonas de S. Bento, Belém, Ajuda,
Av. Almirante Reis, Areeiro, Alameda e Alcântara são consideradas potenciais receptoras
de serviços residenciais estudantis.
Qual seria a viabilidade de um projecto de reabilitação de um edifício de cariz industrial?
A viabilidade de reabilitação ou construção de raiz de uma residência nova é, em termos de
investimento público, nula. Porém, existe vida no sector privado e a cidade de Lisboa tem
potencial neste mercado sendo que há uma forte percentagem de estudantes deslocados.
Por exemplo, a percentagem de estudantes estrangeiros na Universidade Técnica de
Lisboa é de 10,4% (2534 estudantes) e o número total de camas das 9 residências
(contando com as da FMH) é de 448 (+153 do IST), pelo que é possível depreender que
seria um investimento apetecível do ponto de vista económico devido à sustentabilidade
garantida pela procura, sem referir ainda os estudantes portugueses deslocados. É de
referir que tanto a UTL como a UL não inauguram uma residência há mais de 30 anos.
Há, neste momento, algum projecto de reabilitação em curso? Ou alguma construção nova
planeada?
Neste momento existe apenas no plano teórico a equação das hipóteses de reabilitação e
de construção nova, sendo que a tendência recai pela segunda opção a situar-se no Alto
da Ajuda.
Quais as regras pelas quais a concepção de residências se rege? Elementos como o
programa base ou outros que possam conter dados como áreas mínimas, número de
quartos, serviços necessários, acessibilidades, etc.
Não existe uma definição rígida de como se devem projectar as residências de estudantes,
existindo apenas uma normativa por parte da câmara tal como á aplicada em todos os
edifícios. A partir daí é a UTL que decide em função do investimento e do público-alvo. Por
exemplo, 9m2 é o mínimo aceitável para um quarto individual sendo que 12m2 seria o ideal.
Qual seria o grau de abertura para a possibilidade de reconverter edifícios industriais na
zona de Alcântara por parte da entidade responsável?
O grau de abertura para a possibilidade de reconverter edifícios industriais na zona de
Alcântara tendo em vista a implementação de novas residências de estudantes é bastante
elevado.
158
Qual o número anual de alunos da UTL deslocados? Quantos pedidos de residência não
são atendidos todos os anos?
Há uns anos atrás, verificava-se comummente uma situação desconfortável. Anualmente
ficavam cerca de 250 alunos de fora das candidaturas a um lugar nas residências. Porém,
este número tem vindo a diminuir devido ao facto de já ser conhecimento comum que não
se vai conseguir colocação nas vagas disponíveis.
159
Anexo Conversa com Arq.º Nuno Mesquita, dos SASUTL
O acto físico de fazer listas é essencial para o arquitecto, porque exige uma capacidade de
síntese, de priorização, deixando de fora o que não é importante. Permite pensar
globalmente - projectar uma residência de estudantes - para agir localmente - dadas as
circunstâncias específicas de cada caso: a partir de um terreno, de um edifício ou de uma
carcaça.
O que é habitar?
Cada um de nós sabe o que é habitar, pelo simples facto de o fazer no seu dia-a-dia. Mas
por estarmos demasiado mergulhados no conceito de habitar devemos reflectir sobre ele,
distanciando-nos. Habitar. Devemos reflectir acerca do espaço existencial onde nos damos
a liberdade de adormecer, abandonando-nos, estando frágeis perante o inimigo. Ir a um
lado público qualquer e pensar que tenho de dormir ali (um edifício, uma cidade, etc). Onde
vou dormir? Tenho que escolher um espaço e depois um cantinho. E depois vou ter que lhe
dar condições minimamente aceitáveis para poder dormir. Dormir é algo de mais crucial no
acto de habitar. Temos que garantir algumas condições.
Em primeiro lugar, deve estar garantida a impermeabilização. Não pode chover lá, não
pode haver água.
Em segundo lugar, o isolamento. Devo garantir que a temperatura do meu corpo não sai
por contacto com uma superfície fria. Pode-se falar também do isolamento acústico, mas
não é tão premente.
Em terceiro lugar, a iluminação, artificial ou natural, nem que seja para ver onde vamos
dormir. É importante haver contacto com o exterior, neste aspecto.
Em quarto lugar, a ventilação. Depois de estarmos num espaço isolado e fechado é que
percebemos o acto de habitar. Estar na solitária da prisão é a antítese de habitar. Está
fechado, não vemos a rua, não há ventilação, cheira mal.
Por último, a mobilidade. Não apenas escadas e acessos, mas a movimentação no espaço.
Se o espaço for confinado, não é agradável.
160
Reflectir acerca do espaço existencial é experienciar com o próprio corpo o facto de ter de
dormir em algum lado, pensando nas escolhas que se fazem. Ninguém ensina isto a
ninguém. Se há mais pessoas no espaço, como se garante o conforto? Como se garante a
privacidade?
Para responder a estas questões temos que pensar que numa residência de estudantes
saímos do conforto da nossa casa e vamos procurar esse mesmo conforto na residência.
Porém, o conforto maior que existe é o da nossa casa, não há maior esfera de conforto. No
nosso quarto há conforto em que nunca reparamos. Quando o perdemos é que reparamos
nisso. Um hotel pode ter todo o conforto mas não tem a relação familiar que temos com o
quarto da nossa casa. A residência também não. Na residência não vivemos nem sozinhos
nem com a nossa família. Na residência de estudantes não somamos os nossos pais,
somamos pessoas que não conhecemos. É um processo construtivo de relações humanas,
um processo evolutivo, que altera o edifício de um bloco puro e duro para ser um edifício
público com habitação. A nossa casa é não só um sítio para morar mas sim um sítio
familiar.
Ao projectar uma residência de estudantes não estamos a fazer habitação, estamos a dar
dormida a estudantes deslocados. Há que ter um sítio onde dormir, um sítio onde arrumar
os pertences, etc. Arrumar roupa e não só. O armário tem que ser ventilado também para
arrumar batatas e cebolas, pois guardar os alimentos num local onde todos podem aceder,
muitas vezes não dará bom resultado. É crucial, a ventilação, perto de uma corete ou num
sítio de ventilação cruzada.
Avaliando um projecto, é prioritário que se garanta a sua funcionalidade - as cinco
condicionantes referidas acima (impermeabilização, isolamento, iluminação, ventilação e
mobilidade) - em detrimento de questões estéticas. A base é a relação do Homem com o
ambiente e depois vêm questões de ordem cultural. O edifício está ali 24 horas por dia e é
bom que ele não seja feio, porque quando ele o é, está a ofender as pessoas. Mas
podemos estar dentro de um edifício feio em que as condicionantes estão garantidas. O
resultado final desta conta de merceeiro é ver as pessoas com um largo sorriso nos lábios.
Uma residência de estudantes é o confronto entre a esfera privada e a social. As
residências de estudantes têm dois grandes pilares na sua constituição, garantidas as cinco
condições iniciais: segurança contra incêndios e gestão do ruído.
161
A segurança contra incêndios tem que estar desde o início a ser planeada pois condiciona
a arquitectura. Na constituição inicial do edifício há que garantir questões essenciais, como
por exemplo as distâncias em impasse às caixas de escadas (num corredor só com uma
saída possível, a distância até ela diz-se em impasse), o número de saídas que há para a
rua, a dimensão das vias verticais de fuga, o efectivo (número de pessoas no edifício), que
é o elemento definidor das dimensões dos elementos arquitectónicos (corredores, portas,
etc), entre outras. Isto define-se antes de começar a pensar em qualquer outra coisa, por
isso não se deve começar a desenhar sem conhecer a legislação.
O ruído é uma variante da privacidade. As residências de estudantes juntam pessoas entre
os 18 e os 23 anos, que não ouvem muito mas fazem muito barulho. O clima é de festa,
mas as pessoas estão ali para estudar, e é essencial compatibilizarem-se estas duas
realidades. É preferível assumir que estes dois tipos de espaços vão coexistir. Tem que
haver áreas preparadas para o ruído que não transtornem o espaço onde as pessoas
querem efectivamente estudar. A arquitectura autoriza o ruído que pode ser feito - salas
com sofás e televisão convidam a esfera social. Corredores longos e inóspitos
desencorajam permanência e garantem silêncio. Aliás, tal como disse Winston Churchill “primeiro construímos os edifícios, depois eles constroem-nos a nós”.
É preciso também ter em atenção os custos, controlá-los, rentabilizando o espaço,
maximizando o número de camas e assegurando a sustentabilidade. Rentabilizar não é
ganhar dinheiro mas sim evitar que o edifício gaste dinheiro. A criação de módulos é uma
solução.
162
Anexo Conversa com Susana Alves, do Largo Residências
O projecto de crescimento da escola começou há um ano atrás como consequência da
necessidade de espaço na escola de artes performativas SOU. O espaço em que a escola
se encontrava anteriormente já não era suficiente, as salas de aulas estavam já todas
ocupadas e não havia espaço para os horários livres. No sentido de expandir as
competências da associação, pensou-se em fazer uma residência para artistas,
eventualmente chegando-se a este edifício pertencente ao espólio dos herdeiros da Viúva
Lamego, aqui no Intendente.
Isto começou em Junho de 2011, inserido no âmbito do programa BIP-ZIP (Bairros/ Zonas
de Intervenção Prioritária), programa que incide em projectos cujo objectivo é dinamizar
pequenas intervenções locais de melhoria das condições de vida da população através da
participação da mesma.
O projecto ultrapassou já a dimensão da SOU, constituindo-se como uma identidade à
parte, identificada enquanto cooperativa cultural, e estabelecem-se três caminhos centrais o artístico, o social e o turístico.
O caminho artístico visa acolher no espaço artistas de todo o tipo de áreas, até culinária.
Mesmo que não haja artistas, o carácter artístico da residência impõe-se, promovendo
actividades para os clientes.
O caminho social implica o envolvimento da comunidade. Descobrir os hábitos das pessoas
torna-se indispensável para a requalificação da zona, tanto a nível arquitectónico como
social. O património material e imaterial (cultura do fado, história dos mouros, etc) é um
tema muito vasto que é trabalhado com a condição de envolver a comunidade, fazendo as
pessoas sentirem-se parte do movimento. É bom que venham pessoas de fora mas é
preciso que as pessoas de dentro as queiram receber. É preciso um trabalho continuado
para integrar as pessoas que chegam de fora, criando uma relação de confiança com as de
dentro, para terem uma porta aberta a tudo o que queiram fazer. Organizam-se eventos em
que as pessoas participam, não só na execução como também na concepção. Há, por
exemplo, muitos idosos que vivem isolados e tínhamos uma actividade que organizava
pequenos teatros, espectáculos muito específicos, a serem realizados nas suas próprias
casas. O objectivo é utilizar a arte para melhorar a qualidade de vida da comunidade.
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Há ainda o terceiro caminho, o que sustenta tudo o resto, que é o alojamento turístico. Está
distribuído em dois andares, um com dois apartamentos com quartos e Instalação Sanitária
partilhada, e outro com quartos com WC individual. Há ainda programas e acordos com
instituições culturais que dão descontos em espectáculos e eventos, e também acordos
com instituições de artistas que em vez de se alojarem em hotéis, hospedam-se neste lugar
pensado para artistas.
As obras em curso actualmente, no primeiro andar, são de acordo com projecto da autoria
do AtelierMob - uma plataforma multidisciplinar de desenvolvimento de ideias, investigação
e projectos nas áreas da arquitectura, design e urbanismo. O edifício tem 21 quartos, que
têm capacidade para albergar 35 pessoas.
No piso térreo haverá uma loja de aluguer, arranjo e aulas de bicicleta e um café com um
estúdio destinado somente aos artistas.
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Anexo Conversa com Mariana Vasconcelos, herdeira do espólio da Viúva Lamego
Originalmente a estrutura do edifício estava em risco de ruir, pelo que se deram algumas
obras de recuperação. Surgiu um investimento para transformar o edifício num restaurante
e chegaram a iniciar-se obras com crédito bancário, mas o investidor acabou por desistir
devido às circunstâncias económicas que o país atravessa, o que significou a demolição
posterior de alguns elementos já construídos, aquando da reconversão para o estado
actual.
O IPPAR queria que a escada metálica existente fosse conservada, o que não foi possível
pelo seu estado avançado de degradação.
Para se rentabilizar o espaço pensou-se em transformar o edifício num hotel, mas não
existia investimento que o possibilitasse, pelo que se optou pela solução da residência de
estudantes, pois esta modalidade não exige o cumprimento da legislação aplicável às
unidades hoteleiras mas simplesmente às aplicáveis ao alojamento local, acarretando
inclusivamente menos custos. O edifício contíguo (o nº 4), que hoje é o Nexthostel, já tinha
sido recuperado por nós para alojamento jovem e portanto decidiu-se seguir este rumo.
O primeiro projecto para dar resposta a este novo programa foi da autoria do Arq.º Aires
Mateus, que acabou por se revelar demasiado oneroso. O desentendimento com o
arquitecto deu lugar ao abandono da proposta, novamente em fase de construção, em
detrimento da proposta do Arq.º Frederico Valsassina, actualmente visível.
Para além da proximidade com o metro, que leva os jovens para todo o lado, a própria zona
de inserção melhora a olhos vistos. Hoje, o Intendente já não é o local concebido na mente
das pessoas como sinistro e perigoso, apesar de admitir que esse estigma demora mais
tempo a desvanecer-se do que a sua efectiva correspondência nas próprias condições do
bairro.
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