9 INTRODUÇÃO A linguagem é, intrinsecamente

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INTRODUÇÃO
A linguagem é, intrinsecamente, comunicação com o outro. Constitui o modo mais
elaborado e exclusivamente humano de comunicação, sendo considerada tanto uma função social,
visto que todo ser humano usa a linguagem para organizar-se em sociedade, como um
aprendizado em que a criança desenvolve, progressivamente, pelo contato com o meio, o seu
sistema lingüístico (LAUNAY & MAYSONNY, 1989).
A ausência da linguagem oral repercute, negativamente, sobre as funções mentais,
proporcionando transformações na atenção, memória e raciocínio. Portanto, crianças com
distúrbio da linguagem oral tornam-se um alvo de exclusão na vida social.
A literatura na área de distúrbios de linguagem tem demonstrado que a metodologia
verbotonal traz muitos benefícios em indivíduos com deficiência auditiva e surdez, embora sua
aplicação não se limite apenas a esses indivíduos. Segundo Vial (1972), a metodologia verbotonal
é um método de educação de linguagem e, com este propósito, pode ser aplicado na correção dos
problemas de comunicação tais como distúrbio articulatório, gagueira, disfonias, afasia e atraso
de linguagem.
Na prática fonoaudiológica, em instituições públicas e privadas, já ocorre a aplicação
dessa metodologia em pacientes surdos com resultados positivos. Porém, não existem trabalhos
científicos que enfoquem a sua utilização em criança com atraso simples de linguagem. Este
estudo investigou o desenvolvimento sintático em um paciente com atraso simples de linguagem
com a aplicação de parte da metodologia verbotonal, verificando o seu desenvolvimento,
circunstância em que as diferentes estruturas sintáticas se desenvolveram e, posteriormente,
analisou-se os resultados da sintaxe final da criança.
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Tendo em vista o pequeno número de estudos apresentados na literatura nesta área
específica em Pernambuco, este trabalho coloca como pergunta problema a seguinte questão:
Será que, com a aplicação de parte da metodologia verbotonal em um paciente com atraso
simples de linguagem, ocorrerá um desenvolvimento sintático?
Uma criança com diagnóstico de atraso simples de linguagem não consegue
desenvolver adequadamente a sua sintaxe, pois sua fala, normalmente, é limitada a palavras ou
frases telegráficas. De acordo com Vilela e Koch (2001), a sintaxe ocupa-se da construção do
discurso linearizado, como ele surge no processo de comunicação, compreendendo a frase – a
unidade básica do processo -, o grupo de palavras e os respectivos meios formais, que servem
para construir a frase, e o grupo de palavras. A criança com atraso simples de linguagem,
portanto, apresenta dificuldade em construir esse discurso linearizado, limitando sua produção
lingüística a palavras isoladas.
A aplicação da metodologia verbotonal, a exemplo do que ocorre com surdos, pode ser
uma nova perspectiva para o terapeuta trabalhar, junto à criança, na construção sintática da sua
linguagem.
Para fundamentar teoricamente este estudo, foram abordadas, inicialmente, questões
relacionadas à linguagem e seu desenvolvimento, distúrbio de aquisição da linguagem, atraso de
linguagem simples, metodologia verbotonal, sintaxe da língua portuguesa e gramática na
perspectiva interacionista de Koch.
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1 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
1.1
A linguagem e seu desenvolvimento
Segundo Luria (1986), a linguagem é um complexo sistema de códigos, formado no
curso de história social. O elemento fundamental da linguagem é a palavra. A palavra designa as
coisas, individualiza suas características e codifica nossa experiência.
A linguagem é, evidentemente, comunicação com o outro. É o modo mais elaborado e
exclusivamente humano de comunicação e, ao mesmo tempo, uma função e um aprendizado:
uma função no sentido de que todo ser humano fala e a linguagem constitui um instrumento
necessário para ele; um aprendizado, pois o sistema simbólico lingüístico, que a criança deve
assimilar, é adquirido progressivamente pelo contato com o meio (LAUNAY & MAYSONNY,
1989).
Bloom e Haley (1978, apud Jakubovicz, 1997, p. 94) definem a linguagem como “um
código usado para transmitir idéias sobre o mundo que nos cerca. Esse código é representado por
um sistema de signos arbitrários, que servem para comunicar as idéias”.
A linguagem tem o seu sistema próprio de regras que irá determinar de que maneira os
sons se combinam para formar palavras e frases que, por sua vez, representam o conhecimento
adquirido.
A aquisição da linguagem se desenvolve em todas as crianças em marcos
cronológicos muito semelhantes e seguem etapas de ordem constantes. Isso se explica pelo fato
de que certas capacidades que possibilitam a aquisição da linguagem são geneticamente
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determinadas, embora devam ser consideradas as diferenças individuais, particularmente aquelas
de natureza sócio-culturais das crianças, as quais desempenham importante papel na aquisição
(BOONE & PLANTE, 1994).
Os bebês aprendem a falar, em grande parte, através da imitação dos padrões de fala
dos adultos. Esta imitação requer uma capacidade perceptiva e produtiva já bem desenvolvida
desde cedo.
Segundo Issler (1996), a criança, ao longo do seu desenvolvimento, adquire uma
linguagem expressiva e receptiva através dos familiares. A linguagem expressiva evolui desde os
primeiros choros na interação com a mãe, e é exposta à análise, ao contrário da linguagem
receptiva que antecede à expressiva, a ser percebida aos dois anos de idade.
De acordo com o autor supracitado, o vocabulário receptivo ultrapassa sempre o
expressivo; a linguagem receptiva é semidependente da expressiva, e parece estar ligada mais
diretamente ao desenvolvimento cognitivo do indivíduo e, menos diretamente, às influências dos
fatores ambientais sociais. Quando o desenvolvimento da linguagem receptiva se distancia da
expressiva, pode-se aventar e supor uma dependência maior dos fatores genéticos ou da
integridade do sistema nervoso central e/ou periférico. A linguagem expressiva, por sua vez, pode
se mostrar atrasada ou estacionada devido à influência do meio ambiente.
A linguagem humana para ser realizada necessita da utilização de órgãos periféricos
de um sistema nervoso central apropriado. A criança é bombardeada por estimulações lingüísticas
desde o início de sua existência e, nem por isso, começa a falar logo ao nascer. A linguagem se
realiza através de etapas sucessivas de acordo com a atualização constante de certos potenciais
orgânicos cada vez mais amadurecidos (JAKUBOVICZ, 1997).
Lenneberg (1976, apud Jakubovicz, 1997, p. 96), após estudar exaustivamente a
aquisição, afirma que o desenvolvimento da linguagem acontece devido ao amadurecimento,
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durante um período limitado. Isso quer dizer que, se a aquisição da linguagem não acontecer num
determinado período considerado “ótimo” para aprender, a aprendizagem poderá, ou não,
acontecer. Trata-se, então, de um período marcado por um início e um final, onde não só a
linguagem se desenvolve, mas outras habilidades também surgem e amadurecem.
De acordo com Fletcher (1997), o início da linguagem caracteriza-se pela prélinguagem. Considera-se pré-linguagem os fenômenos que antecedem à linguagem propriamente
dita. Nesse momento, a maioria dos bebês já é capaz de entender algumas coisas que ouve,
embora ainda não consiga se expressar oralmente, uma vez que a linguagem receptiva se
desenvolve antes da linguagem expressiva.
Para Zorzi (2002), o desenvolvimento da comunicação manifesta-se, primeiramente,
através de formas pré-verbais, ou seja, corresponde a uma série de comportamentos usados com
finalidade comunicativa, mas que não incluem o uso das palavras. A função dessa comunicação é
a de permitir ou garantir a interação criança e adulto, caracterizando sua função social. Os sons
que uma criança produz antes de dez ou doze meses de idade, ao enunciar suas primeiras
palavras, fazem parte da fase pré-lingüística.
Nas crianças, observam-se manifestações de contágio vocal, desde as primeiras
semanas de vida, ao redor do oitavo ao décimo quinto dia, quando uma dentre várias delas,
exposta em uma mesma sala, começa a gritar e as outras passam a gritar também. A estimulação
vocal personaliza-se mais a partir do primeiro ou segundo mês, quando a mãe ou outro adulto
procura responder à lalação da criança ou fazê-la reaparecer. Se um adulto, no contato com a
criança esperar que ela comece suas emissões e, logo em seguida, reproduzi-las, depois de um
momento de silêncio, pode-se ouvir a criança reproduzir os mesmos ruídos vocais (LAUNAY &
MAISONNY, 1989).
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De zero aos seis meses de idade, as vocalizações não lingüísticas são biologicamente
condicionadas, com uma escassa influência da língua – mãe quanto a aspectos produtivos.
Com cerca de dois meses de idade, de acordo com Fletcher (1997), o bebê apresentará
indícios iniciais de consciência social, acompanhando os movimentos dos adultos com os olhos e
sorrisos.
Sacaloski (2001) afirma que existem diversos tipos de choros, com padrões sonoros
diferentes, os quais podem sinalizar tipos específicos de desconforto ou problemas. Na maioria
dos casos, no entanto, os ouvintes precisam de muito tempo e esforço para perceber e
compreender um padrão específico relacionado a um estado de carência, como fome ou dor.
De acordo com Launay e Maisonny (1989), é apenas no início do segundo mês que
alguns gritos começam a se diferenciar por sua tonalidade e ritmo. O bebê começa a adicionar
alguns sons diferentes ao seu repertório, como som de gorjeio, mais comum com a vogal /u/,
ouvida em longa extensão. Estes sons parecem estar mais associados a situações agradáveis para
a criança.
Nos três primeiros meses de vida, o bebê produz som de murmúrio e, após um melhor
controle dos órgãos fonoarticulatórios, inicia o balbucio. De acordo com Sacaloski (2001), o
balbucio é a repetição de sílabas sem significado, funcionando como um treino articulatório.
O balbucio facilita, direta e indiretamente, o desenvolvimento da linguagem falada,
por ser foneticamente contínuo em relação à aquisição da fala. Para a maioria dos bebês com
desenvolvimento normal, as características fonéticas do balbucio persistem na produção inicial
das palavras.
O pequeno conjunto de sons emitidos no balbucio é semelhante aos sons da fala
adulta, pois se enquadra em apenas algumas categorias fonéticas, principalmente oclusivas nasais
e semivogais. As fricativas, africadas, líquidas e os encontros consonantais são mais raros. Os
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sons não aparecem no balbucio inicial com freqüências uniformes de ocorrência. Determinados
sons têm uma probabilidade muito maior de aparecer que outros, e são estes sons que tendem a
ocorrer com mais freqüência nos léxicos iniciais.
Do segundo ao quarto mês de idade, o bebê presta atenção à voz falada, responde à
própria voz com um sorriso social, responde chorando a tons vocais raivosos e a tons agradáveis;
tem uma percepção maior do ambiente. Nesse período, direciona sua face e responde aos ruídos
procurando a fonte sonora, detecta variações nos padrões intencionais, apresenta diferentes tipos
de choro para dor, fome e desconforto, entram em jogo vocal com as vogais, risadas, sons velares
e balbucio, emite duas sílabas e repete os monossílabos (CHAPMAN, 1996).
Segundo Casanova (1997), do quarto ao sexto mês, a criança começa a perceber
sentidos de inflexão e intensidade, responde à fala agradável rindo e com o sorriso; há uma maior
percepção e resposta ao ambiente. Nesse período, ocorre o estágio de expansão, havendo
aumento nas consoantes e certas combinações de vocalizações em formas faciais apropriadas. A
criança utiliza o balbucio para obter atenção e expressar exigência, vocaliza desprazer e emite
várias sílabas.
De acordo com esse autor, nos primeiros seis meses de vida, as crianças respondem à
voz e a outros sons e podem ser acalmadas por uma voz familiar amistosa; apresentam sorrisos
reflexos por estimulação tátil e sinestésica, choro e outros sons vegetativos; possível imitação de
gestos faciais, movimentos dos olhos e vira a cabeça em direção ao som.
Em torno de seis ou sete meses de idade, os bebês começam a vocalizar mais
intensamente, juntamente com articulações orais, um processo que se acredita acontecer por
causa dos movimentos de elevação de mandíbula que os bebês começam a controlar. A partir daí,
inicia-se o uso de uma gama maior de sons, incluindo as consoantes /k/ e /g/ (BEE, 1984).
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Durante o período de sete a nove meses, o balbuciar vai se transformando em uma
maior variedade de sons e inflexões. O bebê começa a adaptar-se às vocalizações, antes
aleatórias, aos sons da língua que se fala no ambiente do lar e descobre que sons diferentes
significam coisas diferentes. Nesse período, o balbuciar o ajuda a se preparar para falar palavras
reais.
Fletcher (1997) observa que, devido ao jogo repetitivo do balbuciar, torna-se possível
uma espécie de diálogo: a criança repete o ruído, quando o adulto se cala, para fazê-lo repetir o
som e escutá-lo novamente. Ela passa, então, a imitar realmente os sons emitidos pelo outro,
caracterizando a ecolalia.
Do nono ao décimo mês de idade, segundo Casanova (1997), ocorre a préconversação, a criança vocaliza mais durante os intervalos quando é deixado livre pelo adulto, e
procura espaçar e encurtar vocalizações para dar lugar às respostas do adulto.
De acordo com esse autor, a criança com onze/doze meses já compreende algumas
palavras familiares como “mamãe”, “papai”, “nenê”, apresenta vocalizações mais precisas e
melhora o controle quanto à altura tonal e à intensidade, além de começar a agrupar sons e sílabas
repetidas à vontade.
Por volta dos doze meses de idade, começam a surgir nas crianças os primeiros
desenvolvimentos sintáticos, um vocabulário de cinco a seis palavras, repetição de sons
produzidos por si mesmo, tenta repetir sons produzidos por outros e direciona sons e gestos para
objetos e pessoas. Dos doze aos dezoito meses, aparecem as primeiras palavras funcionais,
geralmente com uma super-extensão semântica; já entende ordens e proibições simples,
reconhece objetos, pessoas e animais de estimulação familiares; apresentam um vocabulário de
dez a vinte palavras (CASANOVA, 1997). Ocorre, assim, um crescimento quantitativo quanto à
compreensão e produção das palavras.
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Dos dezoito aos vinte e quatro meses, ocorre o surgimento de frases de dois
elementos. Existe um período transicional nas quais as seqüências de uma só palavra começam a
aparecer reunidas, mas sem a coerência prosódica que caracteriza uma oração. Costuma
acontecer uma pausa entre as palavras: por exemplo, “papai” “aqui”, “mais” “trem”.
Aos vinte e quatro meses, a criança conduz conversação expressiva com inflexão
através de um jargão fluente, formas verbais simples aparecem: ver, querer, ir. As orações
negativas começam a ser utilizadas por meio do /não/ isolado, ou então, colocando-o no princípio
ou no final do enunciado; começam também a aparecer as primeiras interrogações: que? onde?
As crianças imitam muitas palavras durante este período (NICOLOSI, 1996).
Entre vinte e quatro e trinta meses de idade, as crianças iniciam a seqüência de três
elementos com a estrutura principal S-V-S (substantivo – verbo - substantivo). Costuma-se
chamar este período de fala telegráfica, por não aparecerem no discurso as primeiras palavrasfunção, como artigos, preposições, flexões do gênero, número, pessoa e tempos verbais, que não
aparecerão até o final deste período.
Segundo Casanova (1997), a expansão gramatical propriamente dita inicia-se por
volta do trigésimo mês e se prolonga até os cinqüenta e quatro meses. Dos trinta aos trinta e seis
meses, a estruturação frasal das crianças vai se tornando complexa, chegando à combinação de
quatro elementos; começam a aparecer as primeiras frases coordenadas; aumenta a freqüência do
uso das principais flexões, gênero, número, plural, enquanto vão aparecendo outras novas formas
rudimentares dos verbos auxiliares “ser” e “estar”. Surge o aparecimento e o uso sistemático dos
pronomes de primeira, segunda e terceira pessoa (eu, tu, ele, ela) e dos artigos definidos (o, a).
Diversas frases simples começam a aparecer com a utilização coerente do uso dos advérbios.
Por volta dos trinta e seis aos quarenta e dois meses de idade, a criança aprende a
estrutura das orações complexas, de mais de um período, com o uso notavelmente freqüente de
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conjunção “e”. Aparecem as subordinadas “mas”, “porque” e as estruturas comparativas “mais
que”. Noção inicial do uso do relativo “que”; uso dos negativos com integração da partícula
negativa na estrutura da frase; aumenta a complexidade das frases interrogativas; os verbos
auxiliares “ser” e “ter” são usados, na maioria das vezes, de forma correta o que possibilita o uso
do passado composto e começam a aparecer as perífrases1 de futuro. A criança pode “brincar”
com a linguagem e mostra-se criativa com ela.
Dos quarenta e cinco aos cinqüenta e quatro meses, as diversas estruturas gramaticais
completam-se mediante o sistema pronominal (me, te, se), pronomes possessivos e verbos
auxiliares. Existe uma eliminação progressiva dos erros sintáticos e morfológicos. Começam a
aparecer estrutura de voz passiva, assim como outras formas mais complexas de introdução de
frases nominais (depois de, também...). Entretanto, essas estruturas não estão completamente
consolidadas até a idade de nove a dez anos. As diferentes modalidades do discurso (afirmação,
negação, interrogação) tornam-se cada vez mais complexas. Os advérbios de tempos são usados
com freqüência (agora, depois, amanhã,...), ainda que existam, todavia, confusões quanto aos
advérbios temporais e espaciais.
As últimas aquisições de linguagem oral das crianças ocorrem por volta dos cinqüenta
e quatro meses, pois elas aprendem estruturas sintáticas mais complexas: passiva, condicionais,
circunstância de tempo; aperfeiçoa aquelas com as quais já estava familiarizada, porém só haverá
uma complexa aquisição por volta dos sete ou oito anos aproximadamente. As crianças começam
a apreciar os diferentes efeitos de um língua ao usá-la e julgar a correta utilização da sua própria
linguagem. Dá-se início, então, às atividades lingüísticas (CASANOVA, 1997).
A linguagem é usada de muitas maneiras e propósitos, mas a maior parte do tempo
servirá para estabelecer uma interação entre as pessoas. Usa-se a linguagem para declarar, propor,
1
De acordo com Ferreira (2001), a perífrase significa rodeio de palavras, circunlóquio.
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dar ou obter informações, prevenir, descrever, protestar, etc. Mas, para ela desenvolver-se, é
indispensável que haja integridade do sistema nervoso central, habilidade mental adequada,
funcionamento adequado do sistema sensorial, estabilidade emocional, estimulação do ambiente
e maturação cerebral, pois, caso contrário, poderá ocorrer um retardo no desenvolvimento da
linguagem.
1.1.1 Distúrbio ou retardo de aquisição da linguagem
Crianças apresentando condições evolutivas favoráveis tendem a adquirir à linguagem
entre um e dois anos de idade, outras começam mais tarde.
O problema de aquisição de linguagem configura-se como mais específico, sendo que
outros aspectos do desenvolvimento estão menos comprometidos, ou seja, estão evoluindo dentro
dos limites do que é esperado para a idade.
O distúrbio de linguagem diz respeito a comprometimentos no curso evolutivo da
aquisição da linguagem. Os que mais comumente afetam o desenvolvimento da criança pequena
são os chamados “retardos” de aquisição da linguagem.
O atraso na linguagem é geralmente percebido pelos pais quando a criança está com
três ou quatro anos. Em geral, as lalações e as emissões vocais do período pré-lingüístico
desenvolvem-se normalmente, assim como a “primeira palavra”, entre dez e doze meses. Porém,
não ocorrem os progressos da linguagem oral que, normalmente, são observados entre um e dois
anos, quando a criança produz as primeiras frases de duas a três palavras. A criança com atraso
de linguagem simples, entre dois e três anos, ainda não fala; usa, durante este período, uma
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linguagem gestual que é seu meio de comunicação normal, acompanhada, em geral, de sons que,
algumas vezes, têm a aparência de fonemas, pequenos gritos ou ruídos laríngeos diversos,
acentuando, assim, a sua comunicação por gestos (LAUNAY & MAISONNY, 1989).
Um dos parâmetros que podem ser utilizados para a caracterização dos retardos de
linguagem diz respeito à idade. Segundo Moura (1997), crianças que chegam à faixa etária dos
dois anos sem terem adquirido linguagem merecem uma atenção especial, pois podem estar
revelando dificuldades quanto ao desenvolvimento lingüístico. Porém, pode-se falar, também, em
retardos de desenvolvimento da comunicação, atingindo a evolução de níveis pré-lingüísticos
antes de se manifestar em níveis verbais.
Segundo Launay e Maisonny (1989), não se pode dizer com precisão a partir de
quando o retardo de linguagem assume o caráter de um fato patológico. A aparição da linguagem,
nestes casos, coincide, com maior freqüência, com o início da vida escolar maternal. A
progressão é rápida ou lenta e a criança pode conservar, durante muito tempo, um falar infantil.
Neste momento, o comportamento familiar é muito importante.
Segundo as autoras supracitadas, os distúrbios de aquisição de linguagem têm origem
em crianças com alteração sensorial ou neurológica ou não. A esse último, chama-se atraso ou
retardo simples de linguagem.
1.1.2
Atraso ou retardo simples de linguagem
O desenvolvimento da criança apresenta certa harmonia de evolução: linguagem,
brinquedo simbólico, desenho, atividades construtivas, formação de conceitos, aprendizagem
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escolar e crescimento social. Esses aspectos tendem a caminhar juntos e de forma interligada.
Porém, é comum encontrar crianças com atraso específico ou simples de linguagem.
Segundo Zorzi (1993), as crianças com atraso de linguagem simples correspondem a
um grupo de crianças que, embora já possam estar revelando um desenvolvimento mais avançado
em condutas simbólicas, como o brinquedo de faz-de-conta e a imitação diferida, não apresentam
uma evolução correspondente no plano da linguagem. Revelam uma boa compreensão de
linguagem,porém a capacidade expressiva pode estar ausente, ou em fases mais elementares do
que a esperada para a idade e o desenvolvimento geral que a criança apresenta.
Aimard (1998) complementa afirmando que esse tipo de atraso afeta a compreensão, a
produção, os aspectos da linguagem e, posteriormente, os problemas articulatórios, levando a um
distúrbio articulatório. O distúrbio articulatório, de acordo com Piccolotto (2002), é uma
inadequação dos sons da fala devido a falhas na colocação, no tempo, na direção, na pressão, na
programação e na integração dos movimentos articulatórios.
As causas mais comuns do atraso simples de linguagem, de acordo com Aimard
(1998), são as otites freqüentes, pequeno atraso global, fragilidade somática ou recaída de
doenças graves, além de ambiente lingüístico pobre e imaturidade nas crianças super-protegidas.
Quando o ambiente não cria situações para o desenvolvimento da criança, há prejuízos
na aquisição da linguagem. Quando os pais, ao menor gesto da criança, atendem a todos os seus
pedidos, a criança não vê a necessidade de ser compreendida. Ocorre também o contrário, o meio
gera desequilíbrios maiores do que a capacidade da criança de superar.
Segundo Zorzi (2002), as características gerais comumente encontradas nas crianças
com atraso de linguagem simples são os esquemas de interação com os objetos, a imitação, as
habilidades interativas / sociais, os graus de desenvolvimento da comunicação e as atitudes
comunicativas dos pais.
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Em relação aos esquemas de interação com os objetos, as crianças apresentam
desenvolvimento sensoriomotor sem alterações; habilidades para jogos de construção podem
estar bem desenvolvidas; o brinquedo simbólico revela que a criança tem capacidade para lidar
com símbolos, pois consegue representar conhecimentos e experiências através de brinquedos e
gestos, o mesmo não acontecendo com a linguagem; os significados convencionais e simbólicos
são atribuídos aos objetos; as crianças tendem a apresentar formas variadas de manipulação dos
objetos e tempo mais prolongado de exploração.
Na imitação, as crianças podem não apresentar dificuldades para reproduzir
movimentos não-visíveis no próprio corpo; em geral, não apresentam dificuldades para
reproduzir ações realizadas com objetos; podem não apresentar problemas para imitar modelos
ausentes e tendem a apresentar maiores dificuldades, ou até mesmo desinteresse, na imitação de
sons e palavras.
Nas habilidades interativas / sociais, algumas crianças podem apresentar dificuldades
para organizar comportamentos comunicativos intencionais; outras tendem a atuar diretamente
sobre o meio, buscando a interação com os outros de modo pouco sistemático; a função dos
comportamentos comunicativos tende a ser principalmente regulatória, e apresentam pouca
habilidade para garantir a atenção conjunta e desenvolver atividades com outros.
Em relação aos graus de desenvolvimento da comunicação, a criança pode apresentar
algum domínio de linguagem, estando, porém, defasado em relação ao esperado para a idade
cronológica; pode apresentar formas de comunicação simbólicas não-verbais - gestos simbólicos;
pode estar empregando formas de comunicação vocais e gestuais não-simbólicas e, apesar de já
apresentar uma capacidade para lidar com símbolos, a comunicação pode estar limitada a formas
não-simbólicas.
23
As atitudes comunicativas dos pais tendem a ser diretivas e pouco adequadas às
características das crianças.
Em alguns casos de atraso simples de linguagem, tudo se resolve, mas nem sempre a
evolução é ideal, podendo apresentar diversos tipos de seqüelas, dentre elas, a linguagem
permanece relativamente pobre, pois as crianças têm maior tendência a apresentarem,
posteriormente, episódios de gagueira ou de regressão; e pequenos problemas da fala (AIMARD,
1998, p. 120).
1.2 Metodologia Verbotonal
A metodologia verbotonal, na sua origem, faz parte da corrente oralista, sendo um
método multissensorial (VIAL, 1972). ARPEF (2004) destaca que o verbotonal é um método de
reeducação que se dispõe, antes de tudo, a ensinar a falar, sendo criado para ser utilizado para
crianças com deficiência auditiva que tenham qualquer grau de perda auditiva, desde leves a
profundas. Porém, segundo Vial (1972), o interesse dessa metodologia ultrapassa os problemas
específicos dos surdos, sendo, portando, um método de educação da linguagem, e, com este
propósito, pode ser aplicado na correção dos problemas da comunicação, tais como distúrbio
articulatório, gagueira, disfonias, atraso de linguagem e afasia.
Historicamente, a metodologia verbotonal não considera a linguagem unicamente
como um conjunto de sons significantes organizados, mas como uma produção do corpo, por isto
está inclusa, em sua prática, a participação corporal, os elementos rítmicos e melódicos da
palavra. Foi concebida na década de 50, pelo Professor Peter Guberina, lingüista iugoslavo e
24
professor de línguas estrangeiras, que partiu para análise de linguagem dentro de uma visão
interacionalista e pragmática, considerando a língua falada um ato social e, portanto, só sendo
passível de uma análise a partir da sua realização, do seu funcionamento (ARAÚJO, 1997).
O método verbotonal foi desenvolvido na Croácia, em 1950, para reabilitação de
pessoas com problemas severos de comunicação. Guberina partiu da convicção de que existem
áreas no cérebro capazes de perceber os sons independentes da lesão auditiva e, pesquisando os
campos optimais, encontraria faixas de freqüências que poderiam ser ampliadas e outras que
deveriam ser atenuadas para a melhor recepção dos sons, iniciando, assim, e através de
treinamento auditivo, a facilitação da compreensão sonora. No Brasil, esta metodologia vem
sendo desenvolvida desde 1969 (NORTHERN & DOWNS, 1989).
De acordo com ARPEF (2004), Guberina levantou a importância das informações
auditivas e visuais presentes no ritmo, na entonação, na intensidade, no tempo, na pausa, na
tensão e nos gestos do falante para o significado da fala, afirmando, desta forma, que a fala não é
transmitida apenas por elementos lingüísticos.
Dentre os vários estudos realizados por Guberina, destacamos os primeiros que
estavam relacionados com o aprendizado das línguas estrangeiras baseados em análises
lingüísticas originais. Esse estudo foi criado, juntamente com Paul Rivenc, na Escola Normal
Superior de Saint Cloud, na França, sendo chamado de “Método Áudio-Visual Estrutural
Global”. A partir das observações feitas ao aprendizado destas línguas, surgiram algumas
questões, em particular, sobre os fenômenos da audição e da articulação, impulsionando o
método a crescer. Com isso, Guberina se aprofundou nos problemas de ouvido patológico,
nascendo, em uma segunda etapa, a “Metodologia Verbotonal” de reeducação dos problemas de
audição e da fala. Aos poucos, foram sendo desenvolvidos trabalhos sobre a audição normal,
dando base para o surgimento de uma terceira etapa que visa, atualmente, alargar as aplicações do
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método verbotonal para a correção de problemas de linguagem dos ouvintes. Porém, esta etapa
ainda não foi posta em prática com toda riqueza de que dispõe (VIAL, 1972).
De acordo com Goldfeld (1998), Guberina desenvolveu três tipos de aparelhos
específicos para trabalhar com os surdos, o CT10, recomendado para terapia em grupo, o
SUVAG I e o SUVAG II, mais utilizados para o trabalho individual, porém, não sendo
necessários utilizá-los para a reabilitação de crianças ouvintes.
A metodologia verbotonal é caracterizada por: a) enfatizar freqüências baixas e pistas
vibratórias da percepção dos padrões da linguagem falada; b) corresponder aos aparelhos de
amplificação sonora (SUVAG) aos níveis optimais do “campo de audição” das pessoas surdas; c)
usar movimentos do corpo para ajudar na produção e percepção da fala; d) enfatizar a memória
acústica de produção da fala; e) promover o trabalho da fala e linguagem em situações de jogo
ativo; f) enfatizar a linguagem no contexto de situações significativas (CRAIG & CRAIG, 1972
apud NORTHERN & DOWNS, 1989).
Segundo Vial (1972), essa metodologia possui princípios e objetivos. Dentre os
princípios, destacam-se: todo deficiente auditivo tem um campo optimal da audição aproveitável;
não se deve fazer a adaptação da prótese auditiva no início da reabilitação; deve-se seguir uma
progressão fonética crescente; dá-se ênfase à fala a partir de um sistema natural e estimula-se
constantemente o canal auditivo. Já os objetivos são: desenvolver habilidades de fala e audição;
promover o desenvolvimento da fala mais próxima dos padrões normais, através do trabalho com
os aspectos supra-segmentares (entonação, ritmo, pronúncia e melodia); colocar o surdo em
contato com a sociedade; aproveitar o resíduo auditivo estimulando o canal para aumentar a
capacidade de ouvir e/ou perceber o som e, por fim, o treino do cérebro para utilizar até mesmo
uma mensagem acústica distorcida para a percepção da fala, aproveitando as áreas mais
sensitivas da audição.
26
1.2.1 Técnicas
A Metodologia Verbotonal faz uso de técnicas que utilizam estratégias especiais,
capazes de estimular os diversos aspectos relacionados ao processo de aquisição e
desenvolvimento da linguagem e da fala, são elas: Audiovisual, Conjunto, Ritmo Corporal,
Ritmo Musical e Individual.
1.2.1.1 Audiovisual
Segundo Goldfeld (1998), esta técnica utiliza audiovisuais para estimular a linguagem
oral através de histórias com personagens e diálogos. A escolha dos audiovisuais a serem
trabalhados é muito importante para a ampliação do desenvolvimento lingüístico dos pacientes,
embora devam ser escolhidos pelos profissionais de acordo com o nível de desenvolvimento
lingüístico e cognitivo da criança.
A técnica audiovisual possui como objetivos: a estruturação da língua ao nível
morfossintático; o desenvolvimento da estruturação frasal com todos os elementos prosódicos,
sintáticos e semânticos; a ampliação da capacidade de concentração, compreensão, atenção,
memória e abstração; a estimulação do diálogo-emissão espontâneo; a criação de condição para
elaboração lógica do pensamento e levar as crianças a utilizarem os conceitos aprendidos através
do audiovisual nas situações de vida diária, através da fala espontânea (VIAL, 1972).
27
De acordo com Goldfeld (1998), o audiovisual é a primeira das técnicas da
metodologia verbotonal a ser trabalhada, sendo esta considerada como central, visto que será em
torno do tema escolhido do audiovisual que se estruturará o trabalho desenvolvido nas demais
técnicas que compõem esta metodologia.
Para a aplicação da técnica, deve-se seguir algumas etapas (ARPEF, 1996 apud
Goldfeld, 1998): 1) vivenciar a história com material concreto e /ou ações; 2) apresentar os
personagens e explorar as seqüências da história utilizando a linguagem espontânea; 3) explorar
situações novas a partir do audiovisual; 4) realizar dramatizações; 5) levar a criança a
compreender a seqüência dada explorando a estrutura das frases e 6) realizar treino auditivo.
De acordo com Vial (1972), o trabalho com a técnica audiovisual passa por três fases.
Inicia-se pela apresentação, onde o terapeuta deve apresentar a história duas vezes. A primeira
apresentação acontece de maneira mais formal e normal, para que a criança visualize as cenas e
conheça a história; na segunda vez, a apresentação deverá ocorrer de forma mais lenta. Na
segunda fase, ocorre a repetição, onde o terapeuta irá representar cada cena da história cobrando
a emissão verbal por parte da criança. Por último, trabalha-se a fase da exploração da história
através de experiências vivenciadas pela criança.
1.2.1.2 Conjunto
Esta técnica visa, fundamentalmente, ampliar o universo lingüístico e cognitivo da
criança, principalmente no que se refere ao nível semântico. É, de acordo com o trabalho
28
realizado com a técnica audiovisual, que esta segunda técnica irá utilizar um diálogo mais
direcionado (GOLDFELD, 1998).
A técnica conjunto possui alguns objetivos dentre os quais Vial (1972) destaca a
aquisição e ampliação de vocabulário e conceitos; o desenvolvimento das noções temporais,
orientação e organização espacial, seqüência lógica e casualidade; reviver, nos atendimentos, as
atividades da vida diária; aplicação da capacidade de compreensão, atenção e memória,
estimulação da fala espontânea e desenvolvimento da leitura orofacial (LOF). Esse processo
segue o caminho natural da linguagem, buscando vivenciar com as crianças todas as etapas dessa
aquisição. A língua falada é sempre apresentada dentro de um contexto que permita a
compreensão da criança: a fala tem significado.
O método verbotonal sugere que o trabalho com esta técnica seja realizado em grupos
semânticos com diferentes níveis de abstração, como o nome das crianças do grupo e dos
familiares e de categorias semânticas (frutas, animais, higiene pessoal, dentre outras).
A técnica possui algumas fases que devem ser seguidas, entre as quais ARPEF (2004)
sugere: cumprimento - oi, bom dia, etc; chamada - visa desenvolver o esquema corporal e
reconhecimento do eu e dos colegas, podendo utilizar fotos, espelhos, desenhos, escrita, etc;
calendário - busca a aquisição de conceitos relativos ao tempo e estados do tempo; notícias do
dia – têm por objetivo criar e estimular a necessidade de comunicação, devendo a criança trazer
um objeto ou uma notícia para ser contada aos colegas. Essa notícia deverá ser transmitida de
modo verbal e depois o reabilitador cobrará auditivamente; vocabulário - é o momento em que o
reabilitador apresenta a palavra que irá ser trabalhada durante o dia ou a semana. Essa palavra
deve ser sempre apresentada em situações concretas (histórias, dramatizações), com o apoio de
estruturas frasais simples; e, por último, as histórias - usadas para a apresentação e/ou
29
desenvolvimento do vocabulário bem como de conceitos. Exploram-se ordens, gramáticas,
expressões, absurdos, etc.
1.2.1.3 Ritmo musical
Esta técnica consiste no trabalho dos aspectos supra-segmentais da fala (ritmo,
entonação, tensão, tempo, intensidade e pausa), possibilitando que a criança, progressivamente,
produza enunciados com emissão correta o mais natural possível (CASANOVA, 1997). Vial
(1972) complementa afirmando que estes aspectos são muito importantes, dando à linguagem
significações afetivas. A fundamentação dessa técnica está no conhecimento do período prélingüístico, na importância de se levar a criança a viver ou reviver essas etapas, base estrutural
afetiva onde se apóia a língua oral.
Segundo Vial (1972), o trabalho com o ritmo musical é realizado através da utilização
de estruturas rítmicas que são caracterizadas por pausas, cadências e entonações. Existem três
tipos de estruturas rítmicas: as com sílabas sem sentidos, como papapa, denominadas de
logatomas; estruturas com sílabas que irão servir de apoio para o desenvolvimento de palavras ou
frases, ex. ga ga ato ato gato; e, por último, as estruturas com significados definidos, onde podem
ser utilizadas músicas e rimas. Enfim, o ritmo musical faz uso de estruturas rítmicas compostas
de sílabas simples, palavras e frases, utilizadas de acordo com o nível lingüístico e a condição
rítmica das crianças.
A autora afirma que, durante o trabalho com esta técnica, os movimentos que
acompanham os ritmos musicais são livres, porém eles devem seguir o ritmo da composição dos
30
sons. As estimulações musicais proporcionam a criança a percepção dos ritmos, levando-a a
produzí-los, dando possibilidade de organizar sua palavra de acordo com as diferentes estruturas
rítmicas que compõem a língua.
Segundo Goldfeld (1998), o ritmo musical possui objetivos como melhorar o ritmo, a
melodia, a percepção, a combinação e a articulação dos fonemas.
A técnica ritmo musical utiliza como recursos a dramatização, a música (percepção,
discriminação e produção), os versos, as estruturas rítmicas e o grafismo fonético.
1.2.1.4 Ritmo corporal
A técnica ritmo corporal utiliza movimentos corporais e rítmicos para o ensino da
fala, pois o corpo, além de emissor, serve também como receptor dos sons da fala (VIAL, 1972).
Nesta técnica, o corpo age como “mediador” para que a criança venha a desenvolver a
fala. Segundo Goldfeld (1998), a utilização do corpo é considerada como um aspecto muito
importante para a metodologia verbotonal, sensível às freqüências baixas, facilitando, desta
forma, a percepção do ritmo. Esse autor afirma que existe uma relação entre os movimentos da
fala (ritmo, tensão, tempo, intensidade e freqüência) e os elementos dos movimentos corporais
(tempo, espaço, intensidade e tensão), além de existir uma relação entre a articulação dos órgãos
fonoarticulatórios com a articulação do corpo.
O estado tônico do corpo irá facilitar ou dificultar a emissão dos sons; para cada
vocalização existe movimentos “optimais” que permitem sua produção. Dessa forma, é
importante, antes de realizar o trabalho com essa técnica, adequar a tonicidade muscular do corpo
31
dos pacientes, a fim de obter-se uma fonação satisfatória, isto é, sem hipo ou hipertensão,
acrescentando que o corpo passa a intervir não só na percepção dos fonemas, mas também no
desenvolvimento da linguagem. A linguagem é movimento, e este último merece um valor tão
importante quanto o som, pois, algumas vezes, o movimento pode tomar o lugar da linguagem.
Como exemplo, o autor destaca o movimento de cabeça substituindo a frase “o que você quer?”
(VIAL, 1972).
Os músculos fonatórios são os responsáveis pela produção da fala, e essas produções
são realizadas por movimentos refinados que apresentam difíceis percepções e controle.
Casanova (1997) defende que, ao ser realizado um trabalho com a técnica ritmo corporal,
utilizam-se os macromovimentos de todo o corpo, sendo estes de melhores percepções e controle,
contendo as características dos micromovimentos da articulação. Portanto, a metodologia
verbotonal trabalha os macro associados aos micromovimentos.
Os movimentos corporais globais, macromovimentos, são aprendidos por meio da
imitação, e através de sua aprendizagem a criança irá construir os movimentos articulatórios.
Esses movimentos globais são movimentos simples, de fácil execução e, como foi exposto
anteriormente, caracterizam-se de acordo com a análise fonomotora dos sons da fala (VIAL,
op.cit).
Ao longo das sessões terapêuticas, estes macromovimentos associados à emissão de
fonemas ou grupo de fonemas, serão substituídos pelos micromovimentos até que a criança não
necessite do apoio dos macromovimentos, de forma a excluí-los.
A utilização desta técnica permite que a criança desenvolva a imaginação e a
afetividade, permitindo, desta forma, uma vocalização espontânea e a percepção auditiva desta
emissão (GOLDFELD, 1998).
32
Esta técnica tem como objetivos o desenvolvimento na criança da percepção de como
todo o nosso corpo pode participar como agente facilitador na emissão dos fonemas; a adequação
do tônus corporal; o aumento da capacidade respiratória e fonoarticulatória; a estimulação da
aquisição e correção de fonemas através de movimentos corporais optimais e a introdução dos
fonemas em palavras e frases, trabalhando sempre dentro de contextos.
ARPEF (2004) sugere uma divisão para realização do trabalho com o ritmo corporal.
A primeira está relacionada ao movimento do corpo para estimular a fonação, em que o autor
relaciona o grito com atividades como atirar a criança no ar, rodar, enfim, realizar movimentos
seguidos de vocalizações, afirmando que, assim, a criança irá começar a se expressar
verbalmente. A segunda etapa está relacionada ao movimento do corpo para estimular sons
específicos, sendo através desta que irá ocorrer a estimulação do fonema ou sílaba e, para isto,
como foi citado anteriormente, é necessário que a tonicidade do corpo esteja adequada para que a
criança consiga perceber bem a produção dos fonemas ou sílabas a fim de transpor para a fala. Já
a terceira etapa está relacionada ao movimento do corpo para a correção, sendo esse realizado
individualmente, de forma a observar se a alteração encontrada pela criança não está relacionada
com a presença de uma alteração na tonicidade corporal. Por último, tem-se a quarta etapa que
utiliza o movimento do corpo para corrigir pronúncia e percepção de vocábulos, apresentando
como objetivos a estimulação e o desenvolvimento da fala, utilizando-a com o ritmo e a
entonação. O trabalho é realizado através da variação de combinações de movimentos de forma a
garantir a emissão de palavras ou frases. Vial (1972) complementa que a progressão do trabalho
no ritmo é realizada na seguinte seqüência: grito/choro/riso
etc)
ç palavras (onomatopéias/sujeitos/verbos) ç frases.
ç vogais ç logatomas – (ma, pa, ta,
O trabalho com o ritmo corporal é composto pela adequação da respiração e do tono
corporal, vocalização com movimentos corporais e discriminação auditiva. Os recursos utilizados
33
para desenvolver essa técnica são: o corpo, a dramatização, as estruturas rítmicas e a escrita
pictográfica.
1.2.1.5 Individual
Esta técnica promove a estimulação da fala, audição e leitura orofacial, além dos
demais aspectos em que o paciente apresentou dificuldade nas técnicas já citadas (audiovisual,
conjunto, ritmo musical e ritmo corporal). É bastante valorizada devido ao fato de que nela será
feita a adaptação do AASI (aparelho de amplificação sonora individual) e que a presença dos pais
será mais efetiva, promovendo a integração desses com o terapeuta e a criança (GOLDFELD,
1998).
Antes de iniciar o trabalho com a técnica individual, o paciente precisa passar pelo
setor de triagem, possibilitando ao terapeuta ampliar o seu conhecimento sobre o mesmo quanto
ao local, grau, época da lesão e sua causa.
Segundo Vial (1972), esta técnica tem fases e objetivos diferentes, dependendo da
idade da criança (maturidade) e nível de linguagem. Porém, seus objetivos gerais são trabalhar os
fonemas em progressão, palavras, frases e qualidade vocal; fixar o material trabalhado na técnica
audiovisual reforçando a concentração e a atenção; possibilitar o desabrochar da criança como
um todo, investindo no aspecto criativo; estimular a psicomotricidade; possibilitar a integração
dos pais no processo terapêutico, além de trabalhar as necessidades específicas de cada criança.
O trabalho do treinamento auditivo com crianças com surdez deve passar
progressivamente por algumas etapas. É importante destacar que nem todas as crianças irão
34
chegar à última fase, pois dependerá da capacidade do paciente. As etapas necessárias são:
desenvolvimento e consciência do mundo sonoro; desenvolvimento e atenção em direção ao
mundo sonoro; reconhecimento e localização da fonte sonora; desenvolvimento da discriminação
auditiva; aumento do grau de dificuldade para a discriminação auditiva e, para finalizar, o
reconhecimento auditivo (GOLDFELD, 1998).
Assim como o treinamento auditivo segue etapas, o mesmo ocorre com o trabalho da
leitura orofacial, em que são compostos por estabelecimento do contato visual, reconhecimento
de onomatopéias, palavras, ordens simples, frases do dia-a-dia e diálogo espontâneo.
1.3 Sintaxe da língua portuguesa
Os estudos lingüísticos se caracterizam, no século XIX, essencialmente, pelo interesse
em fenômenos fonéticos e morfológicos, época em que a sintaxe tornou-se uma disciplina
lingüística independente. A partir das idéias do lingüista suíço Ferdinand de Saussure, no início
do século XX, e das várias aplicações e desenvolvimentos que delas fizeram seus seguidores é
que a sintaxe foi adquirindo o estatuto de disciplina autônoma (MUSSALIM & BENTES, 2001).
Do grego, syntaxis significa ordem, disposição. De acordo com os mesmos autores
acima citados, o termo sintaxe, tradicionalmente, é a parte da Gramática dedicada à descrição do
modo como as palavras são combinadas para compor sentenças, sendo essa descrição organizada
sob a forma de regras.
35
Faraco e Moura (2003, p. 280) destacam que a “sintaxe é a parte da gramática que se
ocupa das combinações e das relações das palavras nas frases”. Para Vilela e Koch (2001,
p.285),
A palavra sintaxe significa, etimologicamente, ordenação, “disposição”,
“organização” e tem sido entendida como o conjunto das propriedades das
estruturas que estão subjacentes aos enunciados existentes (ou possíveis) numa
dada língua particular e a discrição dessas estruturas.
Ainda de acordo com Vilela e Koch (2001), a sintaxe ocupa-se da construção do
discurso linearizado, como ele surge no processo de comunicação, compreendendo a frase – a
unidade básica do processo -, o grupo de palavras e os respectivos meios formais, que servem
para construir a frase, e o grupo de palavras.
Um indivíduo se comunica com seu meio falante da forma mais eficiente possível,
sabendo ou não gramática. Oliveira (2000) afirma que linguagem e língua se auto estimulam,
dando a impressão de que a língua surgiu primeiro, uma vez que a linguagem não pode existir
num único indivíduo isolado e que a língua nasce, pelo menos, da comunicação entre duas
pessoas que precisam trocar informações para a manutenção de suas vidas. De acordo com
Bechara (1999), linguagem é qualquer sistema de signos simbólicos empregados na
intercomunicação social para expressar e comunicar idéias e sentimentos, isto é, conteúdos da
consciência; por outro lado, língua, de acordo com Koch (2003), é um código através do qual um
emissor comunica a um receptor determinadas mensagens.
Oliveira (2000) complementa dizendo que qualquer língua pode ser recheada de uma
quantidade incalculável de elementos léxicos sem mudar sua estrutura sintática que permite a
intercompreensão pessoal dos falantes nativos do mesmo meio. A fonética, a fonologia, o léxico,
a semântica e a sintaxe constituem parte intrínseca da língua nativa de uma sociedade
determinada, embora o léxico esteja sempre em extensão pela incorporação de novas formas
36
resultantes da evolução e do contato das línguas. A gramática ordena os elementos da estrutura
própria da língua através de regras.
De acordo com quase todos os prefácios dos compêndios de Gramática Tradicional, as
regras costumam ser obtidas da seguinte forma: (i) elenca-se um grande número de escritores
consagrados e (ii) listam-se, sob a denominação de regras, as formas segundo as quais tais
escritores combinam e organizam as palavras de seus textos em sentenças (MUSSALIM &
BENTES, 2001).
Algumas dessas regras são bem conhecidas. Em uma frase, pode aparecer a ordem
direta e inversa. Ainda segundo Mussalim e Bentes (2001), a ordem direta é natural e
predominantemente formada pelos elementos da frase, em português e nas outras línguas
românicas, sujeito – verbo - complementos. E a ordem inversa é o recurso de estilo que visa
especialmente enfatizar um ou outro constituinte. Via de regra, na língua portuguesa, a inversão é
apresentada pela listagem das construções em que é comum ou possível. Reúne-se, assim, um
conjunto de fatores heterogêneos, que inclui o tipo de oração (interrogativa, reduzida,
exclamativa), certas categorias verbais (verbos intransitivos, verbos dicendi) e a própria natureza
do elemento deslocado (sujeito oracional, adjunto adverbial, predicado).
É preciso ressaltar que nossas gramáticas se mostram, por vezes, distantes da
realidade lingüística, porque seu objetivo não é, em geral, descrever a língua em toda a sua
complexidade. Elas pretendem apresentar as regras que caracterizam uma das modalidades da
língua, a norma culta, ou seja, aquela variedade utilizada em contextos de maior formalidade, em
particular a escrita que, na visão tradicional, constitui a manifestação mais “correta” da língua.
Na sintaxe, há paradigmas, que podem ser estabelecidos ou identificados a partir de
um dado significado. Logo, os paradigmas de frase são, de acordo com Vilela e Koch (2001, p.
286), os seguintes:
37
CRITÉRIOS
PARADIGMAS FRÁSICOS
Intenção do discurso
Frases declarativas, interrogativas,
imperativas, etc.
Afirmação / negação
Frase afirmativa / negativa
Modalidade
Frase da possibilidade, realidade,
irrealidade, etc.
Uma mesma frase pode pertencer a mais de um destes paradigmas.
1.3.1 Frase
O termo frase tem uma abrangência muito grande. Para Carone (1986), frase é a
unidade de comunicação – quaisquer que sejam suas dimensões e sua estrutura, desde que essa
unidade “escale a pauta” em modulação adequada. Mesquita (1999, p. 392) complementa dizendo
que “frase é o enunciado ou o conjunto de uma ou mais palavras organizadas de modo que
transmitam uma informação completa”.
A frase pode ser formada por uma palavra ou por um conjunto de palavras; pode ter
verbos ou não. O que importa para que exista a frase é que o termo ou conjunto de termos faça
sentido. Muitas vezes, o sentido da frase vai depender da maneira como é falada ou da situação
em que ela aparece (FARACO & MOURA, 2003).
38
A frase é uma unidade de comunicação lingüista, caracterizada, como tal, do
ponto de vista comunicativo – por ter um propósito definido e ser suficiente para
defini-lo, e do ponto de vista fonético – por uma entoação, que lhe assinala
nitidamente o começo e o fim. É assim a divisão elementar do discurso, mas
pertence à estrutura lingüística por obedecer a padrões sintáticos vigentes da
língua (CÂMARA, 1981, p.122).
A frase configura, numa “proporção”, um dado estado de coisas e ocorre num texto
transformado em enunciado ou em parte de um enunciado. O enunciado é a unidade de
comunicação integrada num acontecimento comunicativo concreto realizado por um falante ou
escrevente. O enunciado pode ocorrer como uma palavra apenas, como uma frase, ou como um
texto composto de várias frases. A frase é a unidade que melhor corresponde, no plano
comunicativo, ao enunciado (VILELA & KOCH, 2001).
De acordo com os autores acima citados, a frase, sob o ponto de vista formal e fônico,
é uma seqüência entre dois intervalos fônicos, a menor unidade do discurso, a unidade do
discurso autônoma componente do texto, tanto no aspecto conteudístico como estrutural. Sob o
ponto de vista estrutural e gramatical, a frase é uma unidade construída de acordo com
determinadas regras, seguindo a binaridade frásica (sujeito e predicado).
Para Bechara (1999), as interjeições ou frases unimembres (apenas um elemento
nominal) são o tipo mais simples de frases, e não são, a rigor, palavras, mas equivale a um
enunciado independente ou a uma oração inteira, como por exemplo, Ah! Psiu! Ai de mim! Oh
pátria minha!
De acordo com Tesnière (1969, p.98, apud Carone, 1986), as interjeições não são um
tipo de vocábulo, porque não se constitui de morfemas, desconhecem a articulação mórfica
39
(primeira articulação)2; apresentam apenas a articulação fonológica (segunda articulação) e, por
vezes, até configurações fonemáticas insólitas na língua.
De acordo com os elementos que constituem as frases ou com o núcleo no qual está
centrado seu significado, as frases podem ser divididas, segundo Mesquita (1999), em nominais e
verbais.
Ainda de acordo com Mesquita (1999, p. 392), as “frases nominais são aquelas cujo
núcleo significativo se concentra num nome (substantivo, adjetivo, numeral ou advérbio).
Caracterizam-se por não apresentar verbos que indiquem movimentos ou ação, pois traduzem
uma visão estática da realidade”.
Carone (1986) divide a frase nominal em rese e dirrema. A primeira seria um tipo de
frase constituído de qualquer dos elementos secundários que, na oração, se organizam em torno
do verbo. E o dirrema ou também chamada de frase bimembre, consta de dois elementos
nominais que se relacionam sintaticamente à semelhança de sujeito e predicado.
As frases verbais, que também possuem sentido completo, ao contrário das nominais,
têm como núcleo significativo um verbo (MESQUITA, 1999).
As frases também podem ser classificadas a partir do seu sentido global, que, de
acordo com Nicola e Infante (1999), são: frases interrogativas (ocorrem quando o emissor da
mensagem formula uma pergunta); frases imperativas (o emissor da mensagem dá uma ordem ou
faz um pedido, utilizando o verbo no modo imperativo); frases exclamativas (o emissor
exterioriza um estado afetivo); e frases declarativas (o emissor constata um fato).
2
MARTINET, apud BORBA, 1973, p.7 leva em conta duas articulações na linguagem: a primeira, pela qual se
obtém unidades significativas, isto é, uma forma fônica dotada de sentido, e a segunda, pela qual se obtém unidades
distintas, ou seja, uma forma fônica sem significação em si, mas necessária para distinguir um significante de outro.
40
Segundo Vilela e Koch (2001), estas frases exprimem a intenção do falante, dirigindose a um destinatário. Mas pode haver frases que não se dirijam necessariamente a destinatários:
são a frase optativa e a frase exclamativa.
De acordo com os mesmos autores, na função comunicativa deve-se distinguir
nitidamente dois grupos: as frases declarativas (em que apenas se comunica algo), e as frases
imperativas (frases com que se pretende provocar uma reação no destinatário). Nessas últimas, há
para exprimir uma ordem, vários meios lingüísticos; o meio mais marcado é a forma imperativa
do verbo.
Os tipos comunicativos de frase descritos podem ainda ocorrer de forma indireta.
Assim, temos a frase declarativa indireta, a frase interrogativa indireta (=interrogativas totais) e a
frase imperativa indireta.
Graficamente, os vários tipos de frase são marcados por sinais especiais: o ponto serve
para caracterização das frases declarativas; os pontos de interrogação e de exclamação
caracterizam as frases interrogativas e imperativas, respectivamente.
As formas de frase são determinadas pelo número de predicações (ou unidades
predicativas) e segundo as relações sintáticas entre essas predicações. Assim, temos a frase com
uma única unidade predicativa – a frase simples – e uma frase total com várias unidades
predicativas (frases parciais) – a frase composta ou complexa (VILELA & KOCH, 2001).
Além das frases simples e compostas, há casos especiais de frase, como a elipse e a
frase parentética.
Para que haja uma estruturação da frase, é necessária uma conexão que, segundo
Carone (1986), é a relação de dependência que se estabelece entre dois elementos; desses, um é o
central, o outro é o marginal. O marginal pressupõe o central, mas o inverso não é verdadeiro. Na
sílaba, a consoante pressupõe a vogal; no vocábulo, afixos pressupõem um radical; no sintagma
41
nominal, artigo e adjetivo pressupõem um substantivo; na oração, o pressuposto é o verbo,
elemento central com que se articulam os demais, imediata ou mediatamente. Quando as palavras
se organizam em sintagmas, e estes em orações, fazem-no graças à conexão entre um termo
central e um termo marginal. O dirrema e a frase verbal (oração) organizam-se por subordinação.
Os componentes da semântica frásica são de dois tipos, segundo Vilela e Koch
(2001):
a) Os componentes independentes do falante, que designamos como componentes
denotativos, ontológicos ou referenciais;
b) Os componentes dependentes do falante, que designamos como comunicativos ou
acionais.
Na frase, o ponto de partida é o predicado e a sua respectiva valência. Assim, temos
no modelo frásico possível, frases com predicados de um, de dois ou mais lugares. Os portadores
de valência com os seus actantes (obrigatórios e facultativos) – também chamamos “cases”,
“casos”, “papéis semântico-funcionais” ou “arquétipos” – constituem os componentes
fundamentais da semântica frásica, a sua conceptualização em estados de coisas, o seu conteúdo
frásico: a proposição.
Preposições e conjunções não exercem na frase qualquer das funções arroladas pela
gramática tradicional, mais lógicas do que sintáticas. Mas, exercem importante função
gramatical, especificamente sintática, visto que são fatores de conexão em várias circunstâncias
articulatórias.
O que a preposição faz com o substantivo, a conjunção subordinativa faz com o verbo:
articula-se com ele, formando um verdadeiro sintagma conjuncional, que é a oração subordinada.
O pronome relativo é um termo de dupla face; na condição de nome, comporta-se
como substantivo (que, o qual) ou adjetivo (cujo), podendo exercer, dentro de sua oração, as
42
funções próprias dessas classes; como relativo, tem exatamente o comportamento das conjunções
subordinativas.
Para Vilela e Koch (2001, p. 287), os modelos semânticos de frase são construídos a
partir do significado dos autossemânticos, ou seja, com base na semântica proposicional prevista
no predicado, na semântica denotativa e funcional dos actantes (formas lingüísticas de
componentes ontológicos básicos, elementos exigidos pelo predicado). Alguns pressupostos de
tipos semânticos de frase são os seguintes:
(i) Os significados das palavras não se encontram isolados, pois as palavras juntam-se
semanticamente em grupos, inclusive em campos lexicais, em hierarquias hiponímicas, em
grupos meronímicos, etc;
(ii) Os lexemas análogos têm (em certo sentido) construções gramaticais análogas;
(iii) Os objetos da realidade encontram-se ligados entre si por determinadas relações, e
também o léxico dos autossemânticos, como configuração destes objetos;
(iv) Por força da valência do predicado originam-se as estruturas mínimas de frases,
que designamos por configurações frásicas (isto é, a preposição). Os predicados com igual
significado geral formam configurações frásicas com igual significado genérico;
(v) As estruturas básicas da realidade (=estados de coisas básicas) são configuradas
em tipos semânticos frásicos (ou proposições).
Há várias possibilidades de segmentação e descrição de frases. A segmentação linear é
quando a frase na língua falada tem uma extensão temporal e os seus elementos sucedem-se uns
após os outros. A esta linearização temporal da língua falada corresponde uma linearização
espacial na língua escrita: aos cortes e pausas da língua falada correspondem determinadas
representações gráficas, como espaços entre as palavras, pontuação, o lugar dos elementos na
frase. Há ainda a segmentação hierárquica que é a recepção e reconstrução do conteúdo da frase
43
por parte do ouvinte/leitor que se faz a partir da ordenação linear das formas lingüísticas para a
sua organização em forma de árvore. Esta arborescência, ou antes, a estrutura hierárquica das
frases é aquilo que a gramática de dependências procura compreender e descrever como um
centro sintático-semântico de que dependem os demais elementos da frase. Uma dada variante da
gramática de dependências considera o predicado como portador básico da valência. Vilela e
Koch (2001, p. 336) sugerem o seguinte esquema:
(Verbo)
(Actantes)
(Circunstantes)
X (=actante) depende de Y (=verbo) ou Y condiciona X. Em seguida, faz-se distinção
entre actantes e circunstantes.
A permutação pode servir de base para o estabelecimento de critérios. O traço
marcante de cada elemento frásico é constituído pela relação sintática. Quando não ocorre essa
relação, não é possível nomear, inventariar ou caracterizar qualquer elemento frásico.
Com as designações sujeito, predicado, objeto/complemento, caracterizam - se
determinados tipos de relações sintáticas que são recorrentes nas diferentes frases. Para a
classificação dos elementos frásicos, usa-se certos elementos de substituição (signos mínimos): as
chamadas pró-formas.
A cada elemento frásico corresponde uma unidade lingüística que possui forma e
significado. Os elementos frásicos são as funções sintáticas de constituintes da frase verbal, que
são determinados por meio das suas relações sintáticas hierárquicas na dependência da forma
conjugada do verbo.
Seguindo o que designam por gramática de dependências (=gramática de valências), e
servindo-os da substituição dos complementos por pró-formas ou pronominalização, e das
44
tradicionais formas de interrogação próprias para focalizar os diferentes elementos frásicos da
posição não marcada do complemento na frase, pode-se chegar a um esquema dos complementos
possíveis na língua portuguesa. A frase simples depende do verbo que hierarquiza os
complementos. Os elementos frásicos de um predicado não apresentam a mesma forma sintática
nem as mesmas funções proposicionais. Os elementos nucleares são: a interrogação, a
anaforização, a posição normal no quadro frásico (VILELA & KOCH, 2001).
Na descrição abaixo, “A” equivale a “actante” e o índice identifica um determinado
actante, tomando-se como ponto de partida os complementos considerados mais importantes e
mais freqüentes na língua.
Segundo Vilela e Koch (2001, p. 340 - 346), existem vários tipos de actantes,
numerados de 01 a 10 na classificação abaixo:
A1= sujeito tradicional
Posição não marcada: antes do verbo
Anaforização: eu, tu, ele, isto (forma pronominal sujeito)
Interrogação que(m) (é que) + V (+ A2)
Exemplo: Pedro escreveu uma carta ao amigo: - Quem escreveu a carta? – Ele
escreveu a carta.
A2 = complemento direto tradicional (=CD)
Posição: depois do verbo
Marca (preposicional): 0
Anaforização: me, te, se, o, a (=a forma pronominal de acusativo)
Interrogação: (o) que (é que) + A1 + V// quem (é que) + A1 + V
Passivização: possibilidade da transformação “passiva”.
Exemplo: o que é que Pedro escreveu? Pedro escreveu uma carta. Pedro escreveu-a.
45
- Nos verbos de sentimentos, se o A2 for realizado por N [+Humano] ou [+ animado],
há a possibilidade de o A2 ser acompanhado da preposição “a” (a+ N). Aliás, em Amar a Deus, o
uso da preposição é obrigatório. Nos outros casos é facultativo.
- Usa-se facultativamente a preposição “a” com pronomes: Ele não ouve/ ama (a)
ninguém.
- Com nomes próprios, como A2, é mais freqüente o uso de “a”.
- Com “quem”, como A2, quando este servir de relativo ou interrogativo, e com
pronomes pessoais oblíquos usa-se a preposição: Não posso deixar de amá-la? A quem? À Joana?
- O A2 ocorre com a preposição “a” quando este actante estiver em contraste com A1,
ou com A10 (o predicativo): Adorava o Povo de Deus a um bezerro de ouro.
- Em casos de ampliação de valência, em que o mesmo termo pode correr como A2 ou
A3: Ele ensinava dois alunos a ler.
A3 = complementos indireto tradicional (=CI)
Marca: a N (=lhe)
Anaforização: me, te, se, nos, vos, lhe, a isso (= pronome pessoal dativo).
Interrogação: a quem (é que) + A1 + V (+ A2)?
Verbos típicos: obedecer, conceder, dar, mostrar, etc.
Exemplo: O empregado obedece ao chefe. O empregado obedece-lhe. A quem
obedece o empregado? Papai Noel deu ao Pedrinho um livro pintado. O papai Noel deu-lhe um
livro. A quem deu o papai Noel um livro?
- O dativo de posse designa elementos que são uma “parte do corpo” de pessoa, ou
que são “algo” ligado a um ato ou seu resultado. A idéia de “pertença” ligada ao designatum dos
termos que o realizam é ainda instanciada pelo grupo “de + N”, o grupo nominal próprio para
46
exprimir esta relação. A ligação com o determinante possessivo mostra igualmente a idéia de
posse: Doem-lhe os olhos; Os seus olhos doem-lhe.
- O “datius (in)commodi” pode ser realizado por “a + N” ou por “para + N”: esta
última preposição aponta nitidamente para a idéia de “commodi”. Neste caso, os autênticos A3
sempre estão distantes deste dativo: Levei-lhe (a Manuela) a mala à estação.
A4: complemento preposicional (com preposição fixa)
Marca: de, a, em, por, para, com.
Anaforização: prep. + pronome (forma oblíqua)
Interrogação: de / a / por... que / quem (é que) + A1 + V?
Verbos típicos: duvidar de, depender de, abalançar-se a, atender a, pensar em, apontar
para, consitir em, contar com, optar por, procurar por, etc.
Exemplo: Paulo duvida da existência do papai Noel. Paulo duvida disso. De que
duvida Paulo?
A5: complemento locativo/situativo
Marca: em, dentro de, ...
Anaforização: aí, lá, ali, nesse lugar
Interrogação: Onde é que A1 V?
Verbos típicos: viver em, encontrar-se em, residir em, ficar em, etc.
Exemplos: Ele vive no Recife. Ele vive aí. Onde é que ele vive?
Pode ocorrer com outros complementos: tempo, modo. Um destes complementos é
obrigatório.
A6: locativo direcional
Marca: para, a, de, em, por, ...
Anaforização: prep. + lá, aí, esse lugar, ...
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Interrogação: prep. + onde (é que) A1 + V ...
Verbos típicos: ir para, vir de, dirigir-se para, deslocar-se para, chegar até, entrar em,
dentre outros.
Exemplos: Maria vai à praia (todos os fins de semana).
Maria vai para lá (todos os fins de semana).
Para onde é que Maria vai (todos os fins de semana)?
A7: temporativo (complemento de tempo)
Marca: para, de, desde, ...
Anaforização: para então / essa hora
Interrogação: para que data / hora, desde quando / que data + A1 + V (A2)?
Verbos típicos: adiar para, marcar para, datar para, protelar para...
Exemplos: Ele marcou exame para a próxima semana - Ele marcou o exame para essa
data - Para quando (é que) ele marcou o exame?
A8: Medida, duração, preço
Marca: zero
Anaforização: isto, tanto, pouco, muito, ...
Interrogação: quanto tempo / qual o preço (que) A1 + V?
Verbos típicos: durar, perdurar, pesar, medir, custar, ...
Exemplos: A festa durou uma semana - Quanto tempo demorou a festa?
A9: modativo (complemento de modo)
Marca: advérbio modal (bem, mal, assim assim, ...) ou equivalente
Anaforização: assim, deste modo, ...
Interrogação: como (é que) A1 + V ..., de que modo / maneira (é que) + A1 + V.
Verbos típicos: comportar-se bem / mal, portar-se, cheirar a rosas, ...
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Exemplos: Ele comportou-se bem (durante as férias). Como (é que) ele se comportou?
A10: predicativo: predicativos de CD e predicativos de verbos bivalentes
Marca: 0 / como / por
Anaforização: assim
Interrogação: como é que A1 V A2? Que tal A1 V A2?
Verbos e construções típicas: achar alguém / algo + adj.; considerar alguém como +
adj. / substantivo; ter alguém por adj. / subst.; eleger alguém + substantivo.
Exemplos: Ele acha Luciana inteligente. Acho Luciana mais ou menos. Como é que
achas a nossa aluna Luciana?
A forma sintática que corresponde à expressão do quadro argumental ou actancial de
um predicado revela os complementos essenciais de cada predicado. A interrogação – ou
pergunta / resposta – as marcas preposicionais, a posição, a anaforização são efetivamente
elementos essenciais na distinção entre os complementos selecionados pelo predicado e os
complementos (=adverbiais) que podem ocorrer ou não com os referidos predicados. Os
complementos actanciais correspondem a perguntas com quem, qual, que, onde, quanto, como,
regidos ou não de preposição.
Um dos critérios para distinguir actantes e circunstantes é a conversão do
complemento numa oração adverbial ou coordenada. Na coordenação, retoma-se a ação verbal
pelo pró-verbo respectivos: fazer para os verbos de ação/atividade, acontecer / passar-se com para
os verbos de processo. Se da conversão resultar uma seqüência com sentido, estamos em
presença de um circunstante, de contrário, há um actante.
De acordo com Vilela e Koch (2001, p. 350), pode-se sintetizar e caracterizar os
actantes / circunstantes no seguinte quadro sugerido por Fátima Silva:
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ACTANTES
CIRCUNSTANTES
Obrigatoridade,
Não obrigatoridade,
Latência (facultativos),
Não latência,
Restrição estrita.
Livre co-ocorrência com qualquer
predicado.
Substituição por pós-verbo,
Co-ocorrência com pós-verbo,
Argumento
Especificação de argumento / de frase.
Específico de classe,
Não específico de classe,
Valor proporcional
Caráter não proposional.
As estruturas possíveis que realizam os actantes são, mais ou menos, as seguintes:
Prep + SN; (Prep) + frase; (Prep) + Infinitivo; Interrogativa direta, e a distribuição dessas
estruturas pelos actantes mais freqüentes é, mais ou menos, a seguinte (VILELA & KOCH, 2001,
p. 352):
A1
A2
A4
SN
SN
Prep + SN
Frase
Frase
Prep + Frase
Infinito
Infinito
Prep + Infinito
Interrogação indireta
Interrogação indireta
Prep + Infinito
Os tipos de elementos frásicos são predicado e predicativo, sujeito, objeto(s),
adverbial e atributo predicativo.
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a) Predicado e predicativo
De acordo com Vilela e Koch (2001), o predicado é a expressão lingüística de uma
função assertiva no sentido de que ele configura a propriedade de um indivíduo (ou de uma classe
de indivíduo), ou a relação de dois ou mais indivíduos (ou classe de indivíduos). O predicado
compõe-se de um lexema e dos morfemas gramaticais que estão ligados à forma do verbo
conjugado, e exprimem pessoa, número, tempo, modo e gênero do verbo. O lexema do predicado
configura um acontecer, um estado, uma relação ou a propriedade de um acontecimento. O
predicado ocorre nas seguintes formas: predicado verbal (forma simples do verbo; formas
compostas do verbo; fraseologia verbal; e forma verbal + predicativo); e o predicativo pode ser
substantivo, adjetivo, pronome e um grupo preposicional.
Para Mesquita (1999), a classificação dos tipos de predicado é dada de acordo com a
classe de palavras a que pertence o núcleo do predicado, que pode ser: predicado verbal (o núcleo
será um verbo), predicado nominal (o núcleo será um nome), e o predicado verbo-nominal
(haverá dois núcleos: um verbo e um nome).
No predicativo, a valência encontra-se dividida: a cópula exige sintaticamente o
predicativo. Em oposição ao predicativo, o sujeito é sintática e semanticamente necessário. No
caso de o predicativo conter propriedades relacionais, então ele torna-se também portador de
valência para o adverbial e para os objetos é, contudo, exigido sintaticamente pelo verbo cópula
(VILELA & KOCH, 2001).
b) Sujeito
Segundo os autores supracitados, o sujeito é o elemento frásico sintaticamente
obrigatório e, conjuntamente com o predicado, constitui a frase mínima e estabelece a
concordância, em pessoa e número, com a forma verbal. O sujeito ocupa normalmente o primeiro
lugar e pode ser substituído pela forma pronominal sujeito (=ele / eu / tu). Com determinados
51
verbos, como os designados “verbos de entrada ou saída de cena” (começar, entrar, surgir), ou os
“verbos de acontecer”, etc., se o sujeito não tiver sido anunciado anteriormente, é posposto ao
predicado.
O sujeito de uma oração pode ser classificado de acordo com o número de núcleos que
apresenta (simples ou composto), de acordo com sua determinação ou indeterminação dentro da
oração e, ainda, através das orações sem sujeito, sujeito inexistente (MESQUITA, 1999).
O sujeito denominado “indeterminado” ocorre em construções em que se pressupõe
um “sujeito humano”, nas reflexivas de terceira pessoa. Mas se houver OD, há reflexiva normal
(a passiva reflexa).
Segundo Vilela e Koch (2001), o sujeito designa o portador do acontecimento ou do
existir que é configurado pela semântica do lexema predicado. Na dependência direta da
semântica do predicado, o sujeito pode desempenhar os seguintes papéis: autor (agente),
destinatário, alvo da ação, afetado, posicionador, instrumento, lugar e experienciador.
c) Complemento / objeto
De acordo com os mesmos autores supracitados, o objeto é um complemento da
combinação predicativa, sendo determinado, quanto à forma, - direto, indireto, preposicional,
adverbial -, pela regência do lexema do predicado. Os objetos especificam ou modificam a
semântica da expressão predicativa e designam um objeto ou estado de coisas. De acordo com a
regência do verbo ou adjetivo predicativo, distingue-se o complemento direto, indireto,
preposicional ou adverbial; além disso, pode ainda o objeto ocorrer na forma de uma frase
subordinada ou de um infinitivo (expandido ou não). De acordo com a valência do lexema
predicativo, podem os complementos ocorrer sozinhos ou acompanhados de outros objetos (CD +
CI, CD + CPrep, etc.).
52
Os complementos verbais, segundo Mesquita (1999), integram o sentido dos verbos
transitivos e, ao ligar-se ao verbo diretamente, sem o auxílio de preposição, é chamado de objeto
direto, e os que se ligam indiretamente, com o auxílio de preposição, são os chamados objetos
indiretos. O complemento nominal, de acordo com Faraco e Moura (2003), é aquele que
complementa o sentido de um nome. Esse nome pode ser um substantivo, um adjetivo ou um
advérbio; e o agente da passiva, segundo Bechara (1999), é o termo que, na voz passiva, pratica a
ação do verbo, e em geral vem acompanhado da preposição por ou, mais raramente, da
preposição de.
Segundo Vilela e Koch (2001), o complemento direto ocorre normalmente sem
preposição, mas há casos em que a preposição pode ser obrigatória ou facultativa. É obrigatória:
antes do pronome átono; antes de quem; antes do nome Deus; quando houver a coordenação entre
um OD pronome átono e um grupo nominal; para desfazer a ambigüidade ou tematizar o OD; se
o predicativo ocorrer antes do OD; nas frases comparativas reduzidas à OD. A preposição é usada
facultativamente com pronomes indefinidos designados de pessoa.
Eis ainda alguns dos papéis semânticos do OD: objeto afetado, objeto efetuado,
destinatário / beneficiário, conteúdo de um enunciado, locativo, etc.
O complemento indireto é regido pela preposição e ocorre com alguns verbos
transitivos indiretos (obedecer, agradar, etc.), transitivos diretos e indiretos (dar, responder,
perguntar, etc.), alguns adjetivos (obediente, agradável, etc.). Neste último caso – se o CI
depende de adjetivos – é designado tradicionalmente como complemento nominal. A posição do
CI é normalmente após o verbo e complemento direto, a menos que seja realizado por pronome
pessoal (VILELA & KOCH, 2001).
53
De acordo com esses mesmos autores, os chamados complementos preposicionais
dependem dos verbos, adjetivos e substantivos. Estes complementos ocupam normalmente uma
posição após o verbo e uma posição variável aos demais possíveis complementos.
d) Determinação adverbial
Determinação adverbial são os elementos frásicos que podem ser permitidos ou
exigidos pela valência dos autossemânticos (verbo, adjetivo, substantivo), que equivalem a um
advérbio. As determinações adverbiais constituem uma classe não unitária de elementos frásicos
(VILELA & KOCH, 2001).
Os adverbiais temporais e causais são normalmente referentes a toda a configuração
frásica.
e) Atributo predicativo
O atributo predicativo, segundo Vilela e Koch (2001), é um complemento de
qualidade, livre em relação ao sujeito ou ao objeto da frase. Essa qualidade indica apenas uma
qualidade existente durante o espaço de tempo do acontecer expresso pelo significado do verbo.
O atributo predicativo é caracterizado por uma dupla referência sintático – semântico: atributo
predicativo do sujeito e atributo predicativo do objeto.
Ainda de acordo com os mesmos autores, o atributo predicativo (predicado
secundário) distingue-se do predicativo propriamente dito: o atributo predicativo é um elemento
posicional, um segmento permutável na frase, e designa não uma qualidade durável, mas uma
qualidade válida apenas num tempo limitado. Distingue-se do adverbial modal, pois não designa
qualquer qualidade do acontecer ou do existir que o predicado exprime, mas designa a qualidade
de um objeto ou ser que é nomeado pelo sujeito ou objeto da frase. Distingue-se do predicativo
por não ser portador de valência e não ser constituinte obrigatório do predicado.
54
Um outro tipo de atributo é o aposto. Segundo Faraco e Moura (2003, p.317), “o
aposto é o termo que se refere a um substantivo ou a um pronome, dando-lhe uma explicação. O
aposto pode vir separado por vírgula, travessões ou depois de dois pontos”.
O aposto, em sentido estrito, compõe-se de uma palavra ou grupo de palavras; o
aposto, em sentido amplo, corresponde ao que chamamos “aposição frásica”, em que o
substantivo nuclear ou a construção equivalente se reporta a um estado de coisas (VILELA &
KOCH, 2001).
1.3.1.1 Frases compostas
Vilela e Koch (2001) afirmam que a combinação de duas ou mais frases parciais
(frases elementares) dá origem a uma frase composta e podem ser classificadas segundo a sua
semântica e a sua estrutura sintática. Segundo o critério sintático, temos a ligação coordenativa e
a subordinativa.
Segundo os mesmos autores, a coordenação é um princípio sintático por meio do qual
se podem exprimir diversas conexões entre estados de coisas. Os elementos de uma ligação
coordenativa, de uma série, são chamados conjuntos. Podem ocorrer, sequencialmente, sem
qualquer ligação, ou estar ligados por um ou mais de um conjuntor: temos assim, assíndeto,
monossíndeto e polissíndeto. Os elementos de ligação entre os conjuntos podem ser conjunções
ou advérbios.
55
Nos casos da combinação (hipotaxe) existem, entre frases parciais de uma frase
composta, relações sintáticas de dependência. Todas as frases dependentes são chamadas frases
subordinadas e a frase dominante, superior às subordinadas, é a subordinante.
Segundo o valor da estrutura sintática da frase subordinada como frase parcial da frase
total, temos frase-sujeito, frase-objeto (+OD), frase adverbial ou predicativa, ou, como frase
parcial de elemento frásico, temos frase atributiva ou frase subordinada continuativa. A relação
sintática entre uma frase subordinada e uma subordinante é determinada pela função que a
subordinada ocupa em relação ao predicado da subordinante, a frase portadora da relação de
dependência.
Existem três tipos principais de frases subordinadas, de acordo com Vilela e Koch
(2001, p. 392):
1.
As frases complemento: as frases dependentes que, como os demais actantes,
ocupam os lugares vazios dos portadores de valência.
2.
As frases relacionais, as que relacionam dois estados de coisas, mas em que um
deles está subordinado a outro.
3.
As frases relativas, as frases introduzidas por pronomes relativos ou advérbios
relativos.
56
1.3.2 Oração
A oração é uma palavra ou um conjunto de palavras que se organizam em torno de um
verbo ou de uma locução verbal, podendo constituir-se numa frase ou fazer parte dela (FARACO
& MOURA, 2003).
De acordo com Bechara (1999), a oração representa o objeto mais propício à análise
gramatical, por melhor revelar as relações que seus componentes mantêm entre si, sem apelar
fundamentalmente para situação e outros elementos extralingüísticos em que se acha inserido.
É em Hjelmslev (1971, p. 174-200 apud Carone, 1986) que vamos encontrar reflexões
de ordem exclusivamente gramatical, com as quais é possível comprovar a hipótese de ser o
verbo o centro gramatical da oração, podendo-se ser estabelecida uma relação entre verbo e
realidade dinâmica e substantivo e realidade estática; é no verbo que se localizam os morfemas
frasais3.
Os morfemas tradicionalmente considerados verbais por Hjelmslev são primeiramente
as categorias de número e pessoa, que se encontram cumulativamente em um só morfema, não
pertencem ao verbo, mas ao sujeito; repetem-se no verbo por empréstimo, gerando a
concordância. Em segundo lugar, as categorias de modo, tempo e aspecto que também se abrigam
cumulativamente em um morfema único, são, na verdade, frasais: a frase nominal bimembre, que
não possui verbo, apresenta como morfema zero, todos aqueles que são tradicionalmente ditos
verbais (CARONE, 1986).
3
BORBA (1973, p.117) apresenta a distinção entre tema e rema. O primeiro é um ponto de apoio, o elemento a partir
do qual se formula a mensagem, e a novidade da comunicação ou comentário do tema, é o rema.
57
Bechara (1999) afirma que, se a oração se caracteriza por ter uma palavra fundamental
que é o verbo (ou sintagma verbal), reúne, na maioria das vezes, duas unidades predicativas – o
sujeito e o predicado.
Tesnière (apud Carone, 1986) estabelece uma hierarquia das relações sintáticas, em
que o verbo ocupa o posto mais alto da oração. Em conexão imediata com ele estão os actantes,
valores substantivos, e os circunstantes, valores adverbiais: aqueles, em número limitado (de zero
a três). O número de actantes que se articula com verbo vai definir sua valência; monovalente só
tem um actante; divalentes, trivalentes, ou valentes são os que não se relacionam com nenhum
valor substantivo. Com os substantivos podem articular-se valores adjetivos, os epítetos, que se
situam, portanto, em um terceiro nível.
O quadro de hierarquia sintática segue abaixo:
VERBO
Substantivo
Advérbio
Adjetivo
Advérbio
Para facilitar o estudo da oração, Faraco e Moura (2003) dividem-na em três partes:
termos essenciais que são aqueles indispensáveis, isto é, não podem faltar; termos integrantes que
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são aqueles que completam o sentido do outro; e termos acessórios, aqueles que são dispensáveis,
podem até ser retirados sem que o sentido da oração seja prejudicado.
Mesquita (1999, p. 398) afirma que “a expressão termos essenciais, adotada pela
NGB (Nomenclatura Gramatical Brasileira), pressupõe que sem sujeito ou
predicado não há possibilidade de existir oração, já que ambos lhe são
essenciais. Todavia, isso não é de todo verdade, pois existem as orações sem
sujeito, estruturadas só com o predicado”.
Para Bechara (1999, p. 409), “sujeito é a unidade ou sintagma nominal que estabelece
uma relação predicativa com o núcleo verbal para constituir uma oração”.
Em uma oração, existe o núcleo do sujeito que, segundo Mesquita (1999), pode ser
representado por pronomes pessoais; substantivo ou palavra com função de substantivo;
pronomes demonstrativos, indefinidos, relativos ou interrogativos; numeral ou oração com valor
de substantivo.
Existem contradições a respeito do sujeito: quando substantivo ou pronome, ele é dito
termo essencial da oração. Somos levados a crer que o sujeito e o predicado têm o mesmo status,
o mesmo nível. No entanto, quando ele assume forma oracional, classifica-se como oração
subordinada substantiva subjetiva, tão subordinada ao verbo quanto à objetiva direta ou a objetiva
indireta. Se o sujeito substantivo pode comutar com a oração subordinada substantiva, ele é tão
subordinado quanto ela, pois são eqüipolentes. O sujeito realmente não é um termo essencial, mas
um termo integrante da oração, subordinado ao verbo, com o qual se articula em uma relação de
dependência. Em outras palavras, o sujeito é, sintaticamente, um complemento do verbo
(CARONE, 1986).
O sujeito de uma oração pode ser classificado de acordo com o número de núcleos que
apresenta (simples ou composto), de acordo com sua determinação ou indeterminação dentro da
oração e, ainda, através das orações sem sujeito, sujeito inexistente.
59
Como já exposto anteriormente, o sujeito é formado por núcleos. Portanto, aquele
sujeito, segundo Faraco e Moura (2003), que possui apenas um núcleo é chamado sujeito simples.
E, às vezes, o sujeito simples não aparece claramente na oração, sendo chamado de sujeito oculto.
Já o sujeito composto, é aquele que tem dois ou mais núcleos.
De acordo com a determinação ou não do sujeito na oração, o sujeito pode ser
indefinido, que, segundo Mesquita (1999), é quando não se pode ou não se quer identificar o
autor da oração indicada na oração, ou seja, é aquele que existe, mas não aparece claramente na
oração, nem pode ser identificado pela terminação do verbo.
Diz-se que o sujeito é inexistente quando os verbos são impregados impessoalmente
nas orações, ou seja, não se refere a nenhuma pessoa gramatical, não há nenhum elemento ao
qual o predicado se refira.
Além do sujeito, outro termo dito essencial da oração é o predicado, que, segundo
Faraco e Moura (2003), é a parte da oração que expressa a idéia que se quer transmitir,
geralmente sobre o sujeito. Quando o sujeito é indeterminado, inexistente ou está oculto, o
predicado é a oração inteira.
A classificação dos tipos de predicado é dada de acordo com a classe de palavras a
que pertence o núcleo do predicado, que pode ser: predicado verbal (o núcleo será um verbo),
predicado nominal (o núcleo será um nome), e o predicado verbo-nominal (haverá dois núcleos:
um verbo e um nome) (MESQUITA, 1999).
Os complementos verbais, o complemento nominal e o agente da passiva são
considerados termos integrantes da oração, ou seja, são os termos que completam o sentido de
outros termos da oração. Os complementos verbais, segundo Mesquita (1999) integram o sentido
dos verbos transitivos e ao ligar-se ao verbo diretamente, sem o auxílio de preposição, é chamado
de objeto direto, e os que se ligam indiretamente, com o auxílio de preposição, são os chamados
60
objetos indiretos. O complemento nominal, de acordo com Faraco e Moura (2003), é aquele que
complementa o sentido de um nome. Esse nome pode ser um substantivo, um adjetivo ou um
advérbio; e o agente da passiva, segundo Bechara (1999), é o termo que, na voz passiva, pratica a
ação do verbo, e em geral vem acompanhado da preposição por ou, mais raramente, da
preposição de.
Os termos acessórios da oração são o termo que não é fundamental para o
entendimento geral da oração. De acordo com Mesquita (1999) são considerados termos
acessórios o adjunto nominal, termo que caracteriza ou determina os substantivos; o adjunto
adverbial, termo da oração que indica uma circunstância ao fato expresso pelo verbo ou
intensifica o sentido do verbo do adjunto ou do próprio advérbio; e o aposto, termo que se refere
a um substantivo ou a um pronome, dando-lhes uma explicação.
1.3.3 Período
O período, pela gramática tradicional, é o enunciado que é contido entre dois
momentos de silêncio, entre os quais se desenrola a linha melódica da frase. Em língua escrita, a
norma é que ele se inicie com maiúscula e se feche com ponto final – ou outro sinal que lhe faça
às vezes, em frases interrogativas, imperativas ou exclamativas (CARONE, 1986).
O período classifica-se em dois tipos, o período simples, que segundo Mesquita
(1999) é quando o enunciado é estruturado em torno de uma única oração; e período composto
quando o enunciado é estruturado em torno de duas ou mais orações.
61
As orações de um período podem ter independência sintática, são as chamadas
coordenadas, ou pode haver entre elas uma dependência, o que determina a subordinação.
O período formado por uma oração principal e uma ou mais orações subordinadas
chama-se período composto por subordinação. Nesse período, Carone (1986) afirma que as
palavras se organizam na frase em relações de subordinação, que devem ser o ponto inicial para a
compreensão de uma estrutura. Nenhuma língua, viva ou morta, conhece uma frase organizada
por coordenação.
De acordo com as funções que exercem em relação à principal, as orações
subordinadas classificam-se em substantivas, adjetivas e adverbiais. As primeiras, segundo
Nicola e Infante (1999), exercem funções substantivas no interior da oração principal de que
fazem parte e podem desempenhar funções de sujeito, objeto direto, objeto indireto,
complemento nominal, predicativo do sujeito e aposto. As adverbiais são orações que atuam
como adjuntos adnominais de termos pertencentes a outras orações, exercendo uma função que é
subordinada e adjetiva. Essas orações classificam-se em restritivas (funcionam como um
adjetivo; restringem a significação de um substantivo ou pronome da oração principal) e
explicativas (também funcionam como um adjetivo, porém, não limitam a significação de um
substantivo ou pronome da oração principal). E por último temos as orações subordinadas
adverbiais que são aquelas que exercem a função de adjunto adverbial. Elas podem ser
classificadas como condicionais, causais, comparativas, finais, concessivas, conformativas,
consecutivas, proporcionais e temporais.
Segundo Carone (1986), a coordenação de orações é o processo em que duas orações
se relacionam entre si. Só por coordenação é que temos, na realidade, uma relação entre orações,
portanto o período composto por coordenação é aquele formado por orações coordenadas. Essas
orações podem vir ligadas por conjunções ou não. Faraco e Moura (2003) complementam
62
dizendo que quando as orações não vêm ligadas por conjunções, isto é, estão apenas justapostas,
elas se chamam assindéticas; e quando vêm ligadas por conjunção são chamadas de sindéticas.
A coordenação de termos da oração é algo que se instala sobre a frase já organizada
por subordinação. É o processo em que Tesnière (1969, p. 325) vê o desdobramento de um
núcleo: coordenam-se dois ou mais sujeitos, dois objetos diretos, dois adjuntos adnominais, e
assim por diante. E quando esse desdobramento atinge o centro da oração, o verbo, temos duas
orações coordenadas entre si (CARONE, 1986).
Quando o período apresenta, simultaneamente, oração coordenada e subordinada,
chama-se período composto por coordenação e subordinação.
De acordo com o autor supra-citado, em uma construção formada por duas orações,
em relação de subordinação ou coordenação, pode ocorrer a fusão da segunda na primeira. Para
que esse fenômeno se torne possível, certas condições são necessárias, entre as quais a de que o
predicado da segunda seja nominal. Nessa fusão, eliminam-se da segunda as palavras
instrumentais e aquelas que reiteram palavras plenas já constantes na primeira. Incorpora-se a
esta um resíduo da segunda: o que nela foi um predicativo do sujeito. Na fase híbrida resultante,
ele vai ser: um aposto a qualquer de seus termos substantivos; predicativo do objeto, integrando
um predicado verbo-nominal; e predicativo do objeto integrando também um predicado verbonominal.
63
1.4 A gramática na perspectiva interacionista: o modelo de Koch
A linguagem como ação intersubjetiva deriva de duas grandes teorias: a Teoria da
Enunciação e a Teoria dos Atos de Fala.
Para a lingüística do discurso, o termo frase é a unidade formal do sistema da língua,
estruturada de acordo com os princípios da gramática, passível de um sem-número de
realizações; e o termo enunciado é a manifestação concreta de uma frase, em situações de
interlocução.
Portanto, a Teoria da Enunciação teve como precursor o pensador russo M. Baktin
com o postulado básico que não basta ao lingüista, preocupado com questões de sentido,
descrever os enunciados efetivamente produzidos pelos falantes de uma língua: é preciso levar
em conta, simultaneamente, a enunciação – ou seja, o evento único e jamais repetido de produção
do enunciado.
Segundo Koch (2003, p.14), a enunciação vai determinar a que título aquilo que se diz
é dito.
Por outro lado, a Teoria dos Atos de Fala teve como pioneiro J.L. Austin entendendo a
linguagem como forma de ação (“todo dizer é um fazer”) e passa a refletir sobre os diversos tipos
de ações humanas que se realizam através da linguagem: os atos de fala, atos de discurso ou atos
de linguagem.
De acordo com Koch (2003, p.19), Austin estabelece distinção entre três tipos de atos:
locucionários, ilocucionários e perlocucionários.
O ato locucionário consiste na emissão de um conjunto de sons, organizados de
acordo com as regras da língua. Segundo Searle, o ato locucionário constitui-se de um ato de
64
referência e um ato de predicação. Através do ato de referência, designa-se uma entidade do
mundo extralingüístico e, por meio do ato de predicação, atribui-se a essa entidade certa
propriedade, característica, estado ou comportamento.
O ato ilocucionário atribui ao conjunto proposição ou conteúdo proposicional uma
determinada força: de pergunta, de asserção, de ordem, de promessa, etc. Esse tipo de ato pode
ser realizado de forma explícita, isto é, através do uso de performativos ou de forma implícita,
sem uso do performativo.
Ato perlocucionário é aquele destinado a exercer certos efeitos sobre o interlocutor:
convencê-lo, assustá-lo, agradá-lo, etc., efeitos que podem realizar-se ou não. Uma das diferenças
freqüentemente entre atos ilocucionários e perlocucionários, é que, nos primeiros, ao contrário
dos segundos, a força ilocucionária poderia sempre ser explicitada por meio de um performativo.
Todo ato de fala é, ao mesmo tempo, locucionário, ilocucionário e perlocucionário,
pois sempre que se interage através da língua, profere-se um enunciado lingüístico dotado de
certa força que irá produzir no interlocutor determinado(s) efeitos(s), ainda que não aqueles que o
locutor tinha em mira.
A teoria dos atos de fala distingue os atos de fala diretos e indiretos. O ato de fala é
direto quando é realizado através de formas lingüísticas especializadas para tal fim: certos tempos
ou modos verbais, dadas expressões estereotipadas, determinados tipos de entonação, etc. Já o ato
de fala indireto ou derivado é aquele realizado através do recurso a formas típicas de outro tipo de
ato. Nesse caso, é nosso conhecimento de mundo ou o trajeto social que vão nos permitir a
verdadeira força ilocucionária.
Para que um ato de fala alcance os objetivos visados pelo locutor, é necessário que o
interlocutor seja capaz de captar a sua intenção; caso contrário, o ato será inócuo.
65
A teoria dos atos de fala tem sido alvo de várias críticas. Uma delas é que a teoria é
unilateral, colocando uma ênfase quase exclusiva no locutor – isto é, que trata da ação, mas não
da interação. Critica-se, também, o fato de se levarem em conta basicamente enunciados isolados,
examinados fora de um contexto real de uso.
Koch (2003) também aborda a Teoria da Atividade Verbal, teoria esta que se baseia
nas idéias de Leontev e Luria. Ela parte do princípio de que a linguagem é uma atividade social
realizada com vistas à realização de determinados fins.
Assim sendo, toda atividade lingüística seria composta por um enunciado, produzido
com dada intenção (propósito), sob certas condições necessárias para o atingimento do objetivo
visado e as conseqüências decorrentes da realização do objetivo.
Na Teoria da Atividade Verbal, o foco de suas pesquisas tem recaído sobre as
atividades do locutor, na produção de textos (escritos ou orais), sem maior atenção ao papel do
interlocutor. O sentido é constituído na interlocução, no interior da qual os interlocutores se
constituem e são constituídos.
A mera decodificação dos sinais emitidos pelo locutor não é de modo algum
suficiente: cabe ao ouvinte/leitor estabelecer, entre os elementos do texto e todo o contexto,
relações dos mais diversos tipos, para ser capaz de compreendê-lo em seu conjunto e interpretálos de forma adequada à situação.
De acordo com os postulados conversacionais de Grice (1975 apud Koch, 2003), o
princípio básico que rege a comunicação humana é o Princípio da Cooperação (“seja
cooperativo”). Isto é, quando duas ou mais pessoas se propõem a interagir verbalmente, elas
normalmente irão cooperar para que a interlocução transcorra de maneira adequada. Esse
princípio subsume quatro “máximas”: máxima da quantidade, ou seja, não diga nem mais nem
menos do que o necessário; máxima de qualidade, só diga coisas para as quais tem evidência
66
adequada, não diga o que sabe não ser verdadeiro; máxima da relação (relevância), diga somente
o que é relevante; e máxima do modo, seja claro e conciso, evite a obscuridade, a prolixidade,
etc. Pode ocorrer que o locutor infrinja intencionalmente uma das máximas.
Para Koch (2003), o uso da linguagem é essencialmente argumentativo, ou seja,
procura-se dotar nossos enunciados de determinada força argumentativa.
Os operadores argumentativos foram descritos por O. Ducrot (1976) para designar
certos elementos da gramática de uma língua que têm por função indicar a força argumentativa
dos enunciados, a direção (sentido) para o qual apontam.
Para explicar seu funcionamento, utilizam-se duas noções básicas: as de classe e as de
escala argumentativas. A classe argumentativa é constituída de um conjunto de enunciados que
podem igualmente servir de argumento para uma mesma conclusão; e a escala argumentativa é
quando dois ou mais enunciados de uma classe se apresentam em gradação de força crescente no
sentido de uma mesma conclusão.
Além dos operadores argumentativos, existem outros elementos lingüísticos
introdutores de pressupostos, entre os quais se podem citar: verbos que indicam mudanças ou
permanência de estado; verbos denominados “factivos”; e certos conectivos circunstanciais.
Um ato de linguagem não é apenas um ato de dizer e de querer dizer, mas,
sobretudo, essencialmente um ato social pelo qual os membros de uma
comunidade “inter-agem” (P. Bange, 1983, apud Koch, 2003, p. 66).
Koch (2003) afirma que todos os tipos de interação vêm constituindo o objeto de
estudo da Análise da Conversação.
A análise da conversação é uma disciplina que se originou no interior da sociologia
interacionista (etnometodológica) americana, e tem por princípio trabalhar somente com dados
reais, analisados em seu contexto natural de ocorrência. Seu conceito fundamental é, portanto, o
67
de interação, o que lhe dá um caráter globalizante e dinâmico; além disso, para ela, a realidade
social é constantemente fabricada pelos atores sociais em suas interações.
O texto falado apresenta-se “em se fazendo”, isto é, em sua própria gênese, tendendo,
pois, a “pôr a nu” o processo de sua construção. O texto falado apresenta, assim, uma sintaxe
característica, sem deixar de ter, como fundo, a sintaxe geral da língua.
O texto falado emerge no próprio momento da interação: ele é o seu próprio rascunho.
Em situações de interação face a face, o locutor não é o único responsável pela produção do seu
discurso: trata-se, como diz Marcuschi (1986), de uma atividade de co-produção discursiva, visto
que os interlocutores estão juntamente empenhados na produção do texto: eles não só colaboram
um com o outro, como “co-negociam”, “co-argumentam”, a tal ponto que não teria sentido
analisar separadamente as produções individuais.
O locutor, freqüentemente, vê-se obrigado a “sacrificar” a sintaxe em favor das
necessidades da interação, fato que se traduz pela presença, no texto falado, de falsos começos,
anacolutos, orações truncadas, etc, bem como a recorrer com freqüência a inserções de vários
tipos, a repetições e a paráfrases, com o intuito, entre outros, de garantir a compreensão de seus
enunciados pelo parceiro.
A conversação organiza-se em turnos, que consistem em cada intervenção de um dos
participantes no decorrer da interação. Há interações simétricas, como as conversas do dia-a-dia,
em que todos os participantes têm igual direito ao uso da palavra; e interações assimétricas, como
entrevistas, consultas, palestras, em que um dos parceiros detém o poder da palavra e a distribui
de acordo com a sua vontade.
Mesmo, nas interações simétricas, não é possível tomar a palavra a qualquer momento
(vale a regra: “fale um de cada vez”). Os interlocutores podem assumir o turno nos chamados
espaços de transição, que se caracterizam por determinadas marcas como: silêncio ou pausas
68
mais longas do detentor do turno, entonação característica, gestos, olhar, sinais de entrega de
turno.
Quando um participante tenta tomar o turno fora do momento adequado, fala-se em
assalto ao turno, que pode ser eficaz ou não.
De acordo com Koch (2003), a conversação é, antes de tudo, um ato social, no interior
de situações que são modificadas ou mesmo constituídas através desses atos.
Em uma interação, tem os processos de figuração são processos por meio dos quais os
interlocutores se representam uns diante dos outros de determinada maneira. Em nossa vida
cotidiana, as pessoas representam diante dos outros de formas bastante variadas, ou seja, uma
mulher, por exemplo, representa-se como mãe, esposa, amiga, profissional, etc. Em cada uma
dessa situação, age-se de modo diferente, inclusive ou, sobretudo, em termos de linguagem.
Em uma interação existe o princípio da preservação das faces, formulado por Goffman
(apud Koch, 2003), onde numa interação, os interlocutores estão constantemente preocupados em
“resguardar” a sua face e em “não arranhar” a face do outro. Isto fica patente no caso das
“preferências” e “despreferências” socialmente estabelecidas para determinados atos. Quando o
interlocutor dá a resposta preferida, ele não precisa explicar ou justificar nada; caso contrário a
explicação ou justificativa se faz necessária para não arranhar a face do parceiro.
Outra noção importante introduzida por Goffman (apud Koch, 2003) é a de footing, ou
seja, numa interação face a face, os participantes precisam, a cada mudança na situação, “ajustarse”, “alinhar-se”. Por isso, é que a conversação tem de ser localmente planejada: as mudanças de
posição e as negociações se sucedem ininterruptamente e os parceiros precisam ter “jogo de
cintura” para levar a interação a bom termo. A cada mudança de “cena” ou de posição, exigem-se
mudanças correspondentes na linguagem. As marcas que indicam tais mudanças são
denominadas de pistas de contextualização.
69
É preciso pensar a linguagem humana como lugar de interação, de constituição das
identidades, de representação de papéis, de negociação de sentidos. Em outras palavras, é preciso
encarar a linguagem não apenas como representação do mundo e do pensamento ou como
instrumento de comunicação, mas sim, acima de tudo, como forma de inter-ação social.
70
2 METODOLOGIA
2.1 Amostra
Participou deste estudo de caso uma criança com atraso de linguagem, sem distúrbios,
do sexo masculino, com 5 anos de idade, atendida na Clínica-Escola de Fonoaudiologia da
Universidade de João Pessoa (UNIPÊ), da cidade de João Pessoa – PB.
2.2 Instrumentos e materiais
Para a realização deste estudo, foram utilizados como instrumentos: entrevista semiestruturada (apêndice 1) a ser aplicada com o responsável com intuito de obter dados mais
detalhados sobre a história de vida da criança e o desenvolvimento de sua linguagem oral, onde
foi gravada em fita cassete para posterior transcrição e análise; protocolo de avaliação de
linguagem, com o objetivo de identificar as dificuldades específicas relacionadas com a
linguagem da criança; protocolo de evolução que serviu para registro diário dos dados das
sessões terapêuticas realizadas com a criança e planejamento terapêutico com indicativos da
metodologia verbotonal. Uma Carta de Apresentação com o objetivo da pesquisa à Clínica –
Escola de Fonoaudiologia da UNIPÊ, onde foi realizada a pesquisa, e um Termo de
Consentimento apresentado ao responsável pela criança.
71
Como material, foram utilizados: gravador, fita cassete, filmadora, fita de vídeo,
instrumentos musicais, livros contendo histórias infantis e objetos representantes de categorias
semânticas, como, por exemplo, frutas, animais, vestuários, dentre outras.
O projeto foi apresentado ao Comitê de Ética, sendo aprovado para execução.
2.3 Procedimentos
Inicialmente, foi mantido contato pessoal com a direção da Clínica - Escola de
Fonoaudiologia da Universidade de João Pessoa, da cidade de João Pessoa - PB, para
esclarecimentos sobre a pesquisa e entrega da Carta de Apresentação e do Termo de
Consentimento.
A construção desta pesquisa ocorreu em quatro etapas de coleta de dados. A primeira
foi realizada uma entrevista semi-estruturada com a mãe da criança, baseada nos postulados de
Jakubovicz (1997), com o intuito de colher dados mais detalhados sobre o desenvolvimento da
linguagem oral e neuropsicomotor da criança. A entrevista foi realizada individualmente sem a
presença da criança.
A segunda etapa foi realizada com a criança para aplicação da avaliação
fonoaudiológica de linguagem baseada nos postulados de Jakubovicz (1997).
Para a realização da terceira etapa, foram agendados dias e horários para realização do
processo terapêutico com base na metodologia verbotonal. As sessões terapêuticas foram
realizadas individualmente com a criança, com duração de trinta minutos cada, duas vezes por
72
semana, durante seis meses consecutivos. Cada sessão foi registrada no protocolo de evolução e
gravada em fita de vídeo para a transcrição e a análise.
Ao analisar os objetivos individuais de cada técnica da metodologia verbotonal, as que
mais se identificaram com o objetivo principal desse trabalho, analisar o desenvolvimento
sintático da criança, foram as técnicas audiovisual, conjunto e individual. Portanto, das cinco
técnicas da metodologia verbotonal, foram aplicadas apenas parte das três já mencionadas.
A proposta da metodologia verbotonal é a exploração das quatro técnicas
(audiovisual, conjunto, ritmo musical e ritmo corporal) em grupos de crianças, e a técnica
individual ser trabalhada individualmente. Como a população desse estudo é uma criança de 5
anos de idade, as técnicas utilizadas (audiovisual e conjunto) foram adaptadas para um indivíduo,
utilizando-se, para isso, um dos objetivos da técnica individual, a de trabalhar as necessidades
específicas de cada criança, dando ênfase as dificuldades encontradas nas outras técnicas.
Antes de iniciar a aplicação da técnica audiovisual, foram escolhidos dois
audiovisuais para serem trabalhados com a criança. O primeiro (anexo A) contendo história sobre
a categoria semântica de higiene pessoal, e o segundo (anexo B), contendo a categoria
guloseimas. De todas as etapas da técnica audiovisual como proposto por ARPEF (1996, apud
Goldfeld, 1998) apenas o treino auditivo não foi levado em consideração, pois a criança em
estudo não apresenta deficiência auditiva.
Para a exploração da técnica conjunto, das seis fases que ARPEF (2004) propõe,
foram utilizadas três, principalmente, o calendário, contendo os dias das semanas, datas e meses
do ano; o vocabulário, explorado através das categorias semânticas de higiene pessoal, parte do
corpo, vestuário, cores, guloseimas e frutas; e as histórias, usadas para o desenvolvimento do
vocabulário bem como de conceitos.
73
Ao término do sexto mês de aplicação de parte da metodologia verbotonal, foi
realizada a quarta etapa com a aplicação de uma avaliação fonoaudiológica de linguagem com o
intuito de comparar esses resultados com os resultados da avaliação do desenvolvimento sintático
aplicada no início do processo terapêutico.
2.4 Procedimento para análise dos resultados
O presente estudo, na busca de focalizar o desenvolvimento sintático da criança
através dos aspectos lingüísticos e pragmáticos, apresenta uma análise qualitativa, adotada pelo
método lingüístico de Vilela e Kock (2001). Para esses autores, a frase, sob o ponto de vista
formal e fônico, é uma seqüência entre dois intervalos fônicos, a menor unidade do discurso, a
unidade do discurso autônoma componente do texto, tanto no aspecto conteudístico como
estrutural. Sob o ponto de vista estrutural e gramatical, a frase é uma unidade construída de
acordo com determinadas regras, seguindo a binaridade frásica - sujeito e predicado.
Os modelos semânticos de frase são construídos com base na semântica proposicional
prevista no predicado, na semântica denotativa e funcional dos actantes.
A análise foi dividida em três etapas: a primeira parte analisa a avaliação
fonoaudiológica de linguagem da criança com o objetivo de avaliar a estruturação sintática inicial
que a criança apresentava. A segunda, composta pela aplicação de parte da metodologia
verbotonal, foi analisada nas sessões fonoterápicas, com o objetivo de mostrar o desenvolvimento
da estruturação sintática da criança com a aplicação das técnicas audiovisual e conjunto. E por
74
último, a terceira etapa analisa a avaliação fonoaudiológica final de linguagem com intuito de
descrever os resultados da sintaxe final com o diagnóstico fonoaudiológico inicial.
Neste trabalho, buscou-se, portanto, numa perspectiva de análise qualitativa em
interações adulto–criança-personagens, investigar o desenvolvimento sintático em uma criança
com atraso simples de linguagem.
75
3 RELATO DO CASO CLÍNICO
3.1 Anamnese
A anamnese foi realizada com a mãe da criança em março de 2005 e fundamentada,
segundo Jakubovicz (1997), abordando aspectos relativos à gestação, parto, estado de saúde,
alimentação, desenvolvimento neuropsicomotor, desenvolvimento de linguagem, socialização e
dados de comportamento. A genitora procurou a Clínica - Escola de Fonoaudiologia da UNIPÊ
com queixa do seu filho ter dificuldade na fala.
Segundo relato da mãe, a gestação ocorreu normalmente, não havendo presença de
doenças, nem aborrecimentos. A gravidez foi desejada, realizando o pré-natal adequadamente. O
parto foi cesário, a termo e sem intercorrências.
Com relação à saúde em geral, foi relatado que a criança não apresentou nenhum
problema sério, tendo apenas doenças consideradas infantis, como sarampo e catapora. A mesma
não apresenta sintomas de problemas auditivos.
Em relação à alimentação da criança, o menor mamou até os seis meses de idade e,
com sete meses, começou a tomar mingau na mamadeira com furo aumentado. Atualmente, se
alimenta de todas as consistências, porém em pouca quantidade (sic).
O desenvolvimento neuropsicomotor, no que diz respeito a sentar, engatinhar e andar,
ocorreu dentro dos padrões de normalidade. Quanto ao desenvolvimento de linguagem, a genitora
relatou que a criança balbuciou, aproximadamente, aos quatro meses de idade e suas primeiras
palavras só foram emitidas com dois anos de idade. Aos três anos e meio de idade, a criança
76
apresentou, algumas vezes, frases curtas. Atualmente, a criança se comunica através de palavras
isoladas, em determinados momentos por gestos e frases muito curtas. Porém, apresenta ausência
de consoantes inicias e mediais em sua fala e, em algumas ocasiões, repete o final das palavras.
Segundo o relato da mãe, o menor não é estimulado em casa por parte das pessoas que
convivem com ele, porém quando quer algo e erra a palavra ao falar sua família o corrige
repetindo a palavra e pede que ele a fale corretamente.
A criança é filho único e mora com os pais. Em relação à escolarização, a mesma
cursa, atualmente, a alfabetização na Escola Municipal Funcionários I, na cidade de João Pessoa
– PB. Mas, segundo relato da mãe, o mesmo só reconhece algumas vogais e números, tem boa
relação com os colegas da escola, apesar de ter vergonha da forma como fala.
A genitora afirma que tem muito cuidado com o seu filho e procura satisfazer todos os
seus desejos.
3.2 Avaliação
A avaliação de linguagem oral foi baseada nos fundamentos de Jakubovicz (1997)
com os objetivos de verificar a linguagem expressiva (morfossintaxe, pragmática e semântica), a
linguagem receptiva (ordens simples, semi-complexas e complexas) e os aspectos cognitivos
como atenção, concentração, memória, seqüência lógica e noção temporal.
Para a realização desta avaliação foram utilizados recursos lúdicos, tais como: jogo de
memória, seqüência lógica, jogos de encaixe, boneco, carro, fichas ilustrativas, além de conversa
espontânea e execução de ordens simples, semi-complexas e complexas.
77
Ao avaliar a linguagem expressiva, através de conversas espontâneas e durante jogos,
pôde-se observar que a criança apresenta vocabulário reduzido, frases telegráficas como “aua”
para quero água; “tabão, apu” para ele usa sabão e xampu; e dificuldade na construção e
organização estrutural das frases. Verificou-se quanto à avaliação fonética, omissões de alguns
fonemas no início, meio e fim das palavras. Pôde-se observar também uma linguagem
infantilizada para a idade. No que se refere à categoria de cores, o menor identificou com muita
precisão, mas em relação às formas geométricas a criança apresentou dificuldades.
Na avaliação de linguagem receptiva, foi verificado que a criança compreende muito
bem a linguagem falada, sendo observado através de ordens simples, semi-complexas e
complexas, não apresentando nenhuma dificuldade neste aspecto durante toda a avaliação.
No que se refere aos aspectos cognitivos, foi possível constatar um bom desempenho
quando o avaliado manipulava os objetos, mostrando boa concentração, atenção e memória,
como também nas fichas ilustrativas onde o mesmo atribuiu significados convencionais e
simbólicos. Na seqüência lógica, o menor apresentou um pouco de dificuldade, o que necessitará
de estimulação nos momentos de terapia. Em relação à noção temporal, a criança apresenta
muitas dificuldades, não sabendo os dias da semana, as datas, como também os meses.
A criança é de fácil interação e participativa, mas pôde-se observar durante a
avaliação que a criança é superprotegida por parte dos pais, pois sempre se referia a mãe ao
realizar as atividades propostas, o que não é bom para o desenvolvimento de sua linguagem.
78
4 ANÁLISE E DISCUSSÃO
A análise do corpus desse trabalho foi realizada baseada no repertório verbal da
criança, pautando-se nos postulados teóricos de Vilela e Koch (2001) e dividida em três etapas:
avaliação fonoaudiológica inicial, aplicação de parte da metodologia verbotonal e avaliação final,
respectivamente. Ressalta-se o fato de que, além das análises das avaliações fonoaudiológicas de
linguagem, serão descritos fragmentos de diálogos entre a terapeuta e a criança durante o
processo terapêutico. Nesses diálogos, respeitaram-se as interações simétricas, que, segundo
Koch (2003), não é possível tomar a palavra a qualquer momento, valendo a regra fala um de
cada vez. Esses fragmentos serão enumerados de 01 a 14, utilizando-se a letra “C” (criança) para
representar a fala da criança e “T” (terapeuta) para a fala da terapeuta. As sessões foram
numeradas de 01 a 39 e representadas pela letra “S”, como, por exemplo, (S1) para representar a
primeira sessão, e assim por diante.
Sempre que necessário um comentário no processo de análise, serão utilizadas
parênteses duplos (( )) para incluir as observações do analista4.
Na avaliação inicial de linguagem realizada com a criança, sessão um (S1), como
descrita no capítulo 4, será dada ênfase, nesta primeira etapa da análise, à linguagem expressiva e
à noção temporal. Com relação à linguagem expressiva, pôde-se observar, no fragmento 01,
através de uma seqüência lógica, que a criança apresentava uma linguagem entrecortada com
estruturação de frases telegráficas.
4
A criança desta análise apresenta várias alterações fonêmicas, sendo desconsideradas pelo analista, pois a mesma
tem como hipótese diagnóstica atraso simples de linguagem.
79
______________________________________Fragmento 01_____________________________
1. T: Vamos montar uma história?
2. C: Sim ((a criança soube montar a seqüência da história sozinha)).
3. T: Muito bem. Mas nessa cena, o que o menino está fazendo?
4. C: Aendo baão (fazendo um balão).
5. T: E como é que o menino está fazendo o balão?
6. C: Baão ((a imagem mostra o menino utilizando linha, tesoura e cola para fazer o balão)).
7. T: E depois, o que aconteceu com o balão?
8. C: Vuo, caiu (o balão voou e caiu).
9. T: E depois o que aconteceu?
10. C: Fogo (a casa pegou fogo).
11. T: Aonde?
12. C: Aqui ((apontou para a casa na figura)).
13. T: Na casa de quem?
14. C: Mãe.
______________________________________________________________________________
Neste fragmento, a criança com cinco anos e um mês, ainda apresenta uma fala
telegráfica, contradizendo a afirmação de Nicolosi (1996) de que entre os vinte e quatro e os
trinta meses de idade, as crianças iniciam a seqüência de três elementos com a estruturação
principal S-V-S (substantivo-verbo-substantivo). O autor denomina este período de fala
telegráfica, por não aparecerem no discurso as primeiras palavras-função, como artigo,
preposição, flexões do gênero, número, pessoa e tempos verbais. Segundo Zorzi (1993), as
crianças com atraso simples de linguagem correspondem a um grupo de crianças que, embora já
possam estar revelando um desenvolvimento mais avançado em condições simbólicas, não
apresentam uma evolução correspondente no plano de linguagem.
Vilela e Koch (2001) também sugerem um esquema para os elementos frásicos:
actante – verbo – circunstante, onde o actante depende do verbo ou o verbo condiciona o actante,
80
estabelecendo, posteriormente, distinção entre actantes e circunstantes. Esses autores
complementam afirmando que o sujeito (actante) é o elemento frásico sintaticamente obrigatório
e, conjuntamente com o predicado, constitui a frase mínima e estabelece a concordância entre
pessoa e número, com a forma verbal. Porém, nas linhas seis e dez encontramos no diálogo a
presença apenas do predicado na resposta da criança, como demonstra o Quadro A.
______________________________________Quadro A _______________________________
Linha
Actante
Verbo
Circunstante
06
____
____
baão
10
____
____
fogo
Por outro lado, o fragmento 01 está de acordo com a afirmação de Faraco e Moura
(2003) de que a frase pode ser formada por uma palavra ou por um conjunto de palavras; pode ter
verbo ou não. O que importa para que exista a frase é que o termo ou conjunto de termos faça
sentido. Muitas vezes, o sentido da frase vai depender da maneira como é falada ou da situação
em que ela aparece.
No fragmento 02, nas linhas quinze, dezesseis, vinte e um e vinte e dois, pode-se
observar que, durante uma conversa espontânea entre a terapeuta e a criança, não houve
coerência nas respostas por parte da criança, que foge do contexto proposto pela terapeuta. Como
afirma Goffman (apud Koch, 2003), em uma interação face a face, os participantes precisam, a
cada mudança na situação, ajustar-se e alinhar-se. Os parceiros nos diálogos precisam ter jogo de
cintura para levar a interação a bom termo, como se observa nas linhas dezessete, dezoito e
dezenove do fragmento 2, em que a terapeuta realiza a mudança da conversa para dar
continuidade ao diálogo.
81
______________________________________Fragmento 02_____________________________
15. T: O que você fez hoje pela manhã?
16. C: Tenho olo (tenho um louro – papagaio).
17. T: Que bom! Você tem um louro.
18. C: E pete (e um peixe).
19. T: Quem deu o peixe para você?
20. C: Papai.
21. T: Muito bem! Seu pai deu o peixe para você. Mas, você lembra o que fez hoje pela manhã?
22. C: ... ((a criança ficou calada por um determinado tempo, não respondeu a terapeuta e
continuou falando sobre os animais)).
______________________________________________________________________________
Com relação à noção temporal, observa-se, no fragmento 03, que a criança não soube
nomear os dias da semana, as datas e os meses, ficando calada ao ser mostrado o calendário ou
quando foi solicitada a verbalizar a seqüência dos dias da semana.
______________________________________Fragmento 03____________________________
23. T: Olha, eu trouxe um calendário. Você sabe que dia é hoje?
24. C: Tegunda (segunda) ((na verdade, o dia da semana era terça-feira)).
25. T: Você sabe quais são os dias da semana?
26. C: ... ((a criança ficou calada)).
27. T: Presta atenção que eu vou falar... Domingo, segunda, terça, quarta, quinta, sexta e sábado.
Vamos, fala comigo...
28. C: Teta (terça).
29. T: Não! Vamos começar pelo domingo, certo? Domingo,...
30. C: Tegunda, (segunda)...
31. T: E depois?
32. C: Quata, umingo (quarta, domingo).
33. T: Você sabe em que mês do ano estamos?
34. C: Não.
______________________________________________________________________________
82
A segunda parte da análise, após a obtenção dos dados na avaliação inicial, como
observados nos fragmentos 1, 2 e 3, com a aplicação de parte da metodologia verbotonal,
evidencia-se o processo de evolução da sintaxe da criança com atraso simples de linguagem. A
análise do corpus foi dividida com base nas técnicas audiovisual e conjunto, considerando
fragmentos das sessões fonoterápicas.
A técnica audiovisual foi a que iniciou a estimulação da linguagem oral da criança,
pois como Goldfeld (1998) afirma, essa deve ser a primeira técnica a ser trabalhada, visto que
será em torno do tema escolhido do audiovisual que se estruturará o trabalho desenvolvido nas
demais técnicas. Vial (1972) complementa, afirmando que essa técnica tem como objetivos: a
estruturação da língua ao nível morfossintático; o desenvolvimento da estruturação frasal com
todos os elementos prosódicos, sintáticos e semânticos; a ampliação da capacidade de
concentração, compreensão, atenção, memória e abstração; a estimulação do diálogo-emissão
espontâneo; a criação de condução para elaboração lógica do pensamento e a utilização, por parte
da criança, de conceitos dos audiovisuais nas situações de vida diária.
Na primeira sessão terapêutica com a aplicação de parte da metodologia verbotonal
(S2), no fragmento 04, a terapeuta apresentou a história do audiovisual de higiene pessoal para a
criança, explorando a sua seqüência e o diálogo entre os personagens, utilizando, para isso, a
linguagem espontânea e as falas dos personagens, como propõe ARPEF (apud Goldfeld, 1998).
______________________________________Fragmento 04_____________________________
35. T: Olha o que eu trouxe para você: uma história. O nome desse menino é Juca, e essa é a sua
mãe. Juca está dormindo.
Mãe: - Bom dia Juca, acorda.
Juca: Bom dia.
Mãe: - Vá tomar banho Juca. E use o... ((a criança tomou a fala e disse: ))
36. C: Tabão, ampu (sabão e xampu).
83
37. T: Isso mesmo, a mãe disse: - Use o sabonete e o xampu. Depois ele se enxugou com a
toalha e foi fazer o que?
38. C: Icova dente (escovar os dentes).
39. T: Muito bem!
Mãe: - Toma Juca a escova e a pasta para escovar os dentes.
Juca: - Obrigado, mamãe.
Depois Juca pegou o pente e foi pentear o cabelo para ficar bonito, não foi?
40. C: Abelo ((a criança fez o movimento como estivesse penteando o cabelo)).
41. T: É, ele está penteando o cabelo.
Olha, ele saiu do banheiro e foi para o quarto vestir a roupa e o sapato para ir ao colégio.
42. C: Aato boito (o sapato é bonito).
43. T: Você achou o sapato dele bonito?
44. C: ... ((a criança balançou a cabeça afirmando que sim)).
45. T: Juca foi embora para a escola e disse: - Tchau mãe.
A mãe disse: - Tchau Juca, boa aula.
46. C: Foi oegio (foi ao colégio).
______________________________________________________________________________
Neste fragmento, apesar do objetivo maior ser a apresentação da história por parte da
terapeuta, observou-se a necessidade da criança verbalizar durante a história, como demonstram
as linhas trinta e seis, quarenta e dois e quarenta e seis, estando de acordo com Vial (1972) ao
afirmar que um dos objetivos do audiovisual é a estimulação do diálogo-emissão espontâneo.
Nesse primeiro momento da terapia, notou-se o interesse da criança pela situação proposta,
história infantil, mais concentrada e atenta, participando mais ativamente pela linguagem oral.
Como demonstra o Quadro B, a fala da criança apresenta uma estrutura frasal incompleta, de
acordo com o esquema estrutural dos elementos frásicos de Vilela e Koch (2001), ocorrendo, na
maioria das frases, os circunstantes. Porém, na linha quarenta e dois, a criança apresentou o que
Nicolose (1996) chama uma pausa entre as palavras, ou seja, a utilização do sujeito e
complemento. Esse autor afirma que esse tipo de frase surge na criança entre dezoito e vinte e
84
quatro meses. Nesta mesma linha (42), a criança apresentou a frase nominal em dirrema, também
chamada de bimembre, que, de acordo com Carone (1986), é uma frase que consta de dois
elementos nominais que se relacionam sintaticamente à semelhança de sujeito e predicado.
______________________________________Quadro B ________________________________
Linha
Actante
Verbo
Circunstante
Tabão, ampu
36
____
____
38
____
Icova
dente
40
____
____
Abelo
42
Aato
____
boito
46
____
Foi
oegio
No decorrer das sessões terapêuticas com a aplicação da técnica audiovisual na fase de
exploração das seqüências da história, utilizando-se da linguagem espontânea, observou-se,
assistematicamente, uma evolução na construção frasal da criança, como demonstra o fragmento
05, sessão oito (S8), linhas quarenta e oito e cinqüenta. De acordo com Casanova (2002), a
estruturação frasal torna-se mais complexa, chegando à combinação de quatro elementos, entre os
trinta e trinta e seis meses de idade, quando começam a aparecer, também, as primeiras frases
coordenadas e um aumento do uso das principais flexões de gênero e de número.
_____________________________________Fragmento 05 _____________________________
47. T: O que a mãe falou para Juca?
48. C: Bom dia Juca. Foi bobar banho (bom dia Juca, vá tomar banho).
49. T: Você lembra o que tem no banheiro de Juca?
85
50. C: Tem aua, babão, ipeio, tabonete baba banho ca impo (tem água, sabão, espelho, sabonete
para tomar banho e ficar limpo).
51. T: Você lembra quem deu a escova para Juca?
52. C: Foi mãe (foi a mãe de Juca).
53. T: E depois, o que Juca fez?
54. C: Foi veti ropa (foi vestir a roupa).
______________________________________________________________________________
Neste fragmento, na linha quarenta e oito, observa-se, na fala da criança, uma
interjeição: Bom dia Juca. Segundo Bechara (1999), as interjeições ou frases unimembres são o
tipo mais simples de frases, e não são, a rigor, palavras, mas equivale a um enunciado
independente ou a uma oração inteira.
Como demonstra o Quadro C, a criança, ainda assistematicamente, começa a
estruturar sua linguagem, de acordo com o que Vilela e Koch (2001) propõem para a estruturação
frasal, dando início, mais sistematicamente, à utilização dos verbos nas frases. Segundo Nicolosi
(1996), é por volta dos vinte e quatro meses que surgem as formas verbais simples.
______________________________________Quadro C ________________________________
Linha
Actante
Verbo
Circunstante
48
____
Foi bobar
50 a
____
tem
50 b
Tabonete
baba
banho
Mãe
foi
____
Foi/ veti
ropa
52
54
____
banho
aua, babão, ipeio
86
Paralelamente à aplicação da técnica audiovisual, foi explorada a técnica conjunto,
nesta primeira etapa, através do uso do calendário com o objetivo, de acordo com ARPEF (2004),
de desenvolver a aquisição de conceitos relativos ao tempo, como demonstra o fragmento 06,
sessão quatro (S4). Com a utilização do calendário, a criança marcava um “X” nos dias em que
ela ia à terapia, além de explorar, verbalmente, todos os dias da semana.
______________________________________Fragmento 06 ____________________________
55. T: Olha como esse calendário é grande e bonito. Vamos apontar quais são os dias da
semana?
56. C: ... ((a criança ficou calada)).
57. T: Então eu vou falar primeiro e depois você fala. Domingo, segunda, terça, quarta, quinta,
sexta e sábado. Vamos, agora é você.
58. C: Teta, quata, umingo (terça, quarta, domingo).
59. T: Você sabe quais são os dias que você vem para a sessão?
60. C: Não.
61. T: São terça e sexta.
62. C: Teta e ... (terça e ...)
63. T: Terça e sexta. Hoje é terça-feira. Vamos marcar aqui no calendário. Mostra que dia é
Hoje.
64. C: ... ((apontou corretamente no calendário)).
65. T: Muito bem, agora marca um “X” nesse dia.
______________________________________________________________________________
Com a aplicação da técnica conjunto, buscou-se, nas terapias, através da exploração
do vocabulário, ampliar o universo lingüístico e cognitivo da criança nas categorias semânticas
do audiovisual, como higiene pessoal, vestuários e partes do corpo. Como cita Goldfeld (1998), é
de acordo com o trabalho realizado com a técnica audiovisual que esta segunda técnica irá utilizar
um diálogo mais direcionado, como se pode observar no fragmento 07, sessão treze (S13).
87
______________________________________Fragmento 07_____________________________
66. T: Você lembra o que tem no banheiro de Juca?
67. C: Uveio (chuveiro).
68. T: E o que sai de dentro do chuveiro?
69. C: A aua (a água).
70. T: E agora o que Juca vai usar?
71. C: Ampu... pata abelo (xampu para passar no cabelo).
72. T: Pra que?
73. C: Pa que? Ica impo (pra quê? Ficar limpo).
74. T: Você lembra o que Juca vestiu?
75. C: Aapo (sapato).
76. T: Só o sapato? Teve outra coisa?
77. C: Ropa (roupa).
78. T: Muito bem, vestiu a roupa e o sapato.
______________________________________________________________________________
Neste fragmento, a terapeuta, através do diálogo, tenta buscar da memória da criança
as categorias trabalhadas na história. Apesar das respostas serem diretas, a criança já começa a
apresentar nomeação e memorização das cenas do audiovisual.
A linha setenta e três demonstra que a criança começa a apresentar, no diálogo com a
terapeuta, frases interrogativas. Segundo Nicolosi (1996), as primeiras orações interrogativas
começam por volta dos vinte e quatro meses de idade, e a criança da pesquisa apresenta setenta e
cinco meses (5 anos e 1 mês).
Após a exploração do primeiro audiovisual, a terapeuta deu início a uma outra
história, explorando guloseimas. Para realizar a apresentação, a repetição e a exploração da
história desse novo audiovisual, utilizaram-se cinco sessões (S17 a S21). A apresentação da
história foi realizada na sessão dezessete (S17), fragmento 08.
88
______________________________________Fragmento 08_____________________________
79. T: Olha o que eu trouxe: uma história. O nome desse urso é Pompom. Essa menina é Ana e o
menino é João. O urso vende chocolate, bombom e pirulito.
Urso Pompom: - Oi, bom dia Ana; bom dia João.
Ana e João: - Bom dia, urso Pompom.
Urso Pompom: - O que vocês estão querendo?
Ana e João: - Estamos querendo comprar doces.
Urso Pompom: - Vocês estavam aonde antes?
Ana e João: - Ah! Estávamos na escola.
Urso Pompom: - Olha, eu vendo muitas coisas: chocolate, bombom, pirulito,... Mas cuidado para
não comer demais e estragar os dentes.
80. C: Tem dente (tenho dentes).
81. T: Você tem dentes?
82. C: Dente assim... ((a criança fez gestos como se estivesse arrancando os dentes)).
83. T: Você arrancou o dente?
84. C: ... ((a criança balançou a cabeça dizendo que sim)).
85. T: Muito bem. Mas vamos voltar a história.
Ana e João: - Não se preocupe, não vamos comer muito doces, e também escovamos os dentes
bem direitinhos.
Urso Pompom: - Assim está bom.
João: - Quanto custa o chocolate?
Urso Pompom: - Um real.
João: - Eu vou levar o chocolate.
Ana: - Quanto é o pirulito?
Urso Pompom: - Cinqüenta centavos.
Ana: - Tem de quê?
Urso Pompom: - Tem de morango, limão, tuti-fruti e chocolate.
Ana: - Eu quero de limão.
Os meninos pegaram o dinheiro para pagar o que eles compraram.
Ana e João: - Toma o dinheiro urso Pompom.
Urso Pompom: - Não, eu não quero. Eu sou amigo de vocês e vou dar de graça.
89
Ana e João: - Oba!
Urso Pompom: - Hei meninos, vocês vão para onde?
Ana e João: - Vamos para casa.
Urso Pompom: - Voltem sempre, tchau.
______________________________________________________________________________
Nesse fragmento, a criança demonstra uma ampliação da capacidade de concentração,
compreensão, atenção e memória, pois raras vezes se pronunciou durante a apresentação do novo
audiovisual.
Nas sessões vinte e dois, vinte e três e vinte e quatro (S22 a S24), como demonstra o
fragmento 09, foi explorada a dramatização da história, onde a criança e a terapeuta foram os
personagens. Em determinados momentos, (linha oitenta e oito, noventa e dois, noventa e seis,
cento e dois e cento e oito), a terapeuta necessitou dar apoio da cena e da fala dos personagens
para que a criança lembrasse de suas falas. Nas linhas noventa e três e cento e três, também se
observa, por parte da criança, a utilização mais sistemática de frases interrogativas para manter o
diálogo.
______________________________________Fragmento 09_____________________________
86. T: Você quer ser quem?
87. C: Uto Pompom (urso Pompom).
88. T: Eu vou ser Ana e João. Olha a primeira cena, o que vamos fazer? Vou deixar aqui para dar
a dica.
89. C: Bom dia.
90. T: Bom dia, urso Pompom.
91. C: ... ((a criança ficou calada)).
92. T: Pergunta o que Ana e João estão querendo.
93. C: Como tu vai heim? (como vocês vão heim?).
94. T: Vamos bem. E o senhor?
90
95. C: Eu tenho cocoate, bombonsim, pesente, tudinho (eu tenho chocolate, bombonsinho,
presente, tudinho).
96. T: Veja aqui, o que o urso falou?
97. C: Tem comer muito não (não podem comer muito doces não).
98. T: Por quê?
99. C: Porque estaga dente (porque estraga os dentes).
100.
T: Não vamos comer muito e também escovamos os dentes bem direitinhos.
101.
C: ... ((a criança ficou calada)).
102. T: Pergunta onde estávamos antes.
103. C: Onde tu tava, heim?
104. T: Estávamos no colégio. Olha o que João falou: - Ah urso, não sei se levo o chocolate ou o
bombom?
105. C: Leva esse ((apontou para o chocolate)).
106. T: Quanto custa o chocolate?
107. C: Um real.
108. T: Agora vai ser essa cena. Ana: - Quanto custa o pirulito?
109. C: Cinqüenta centavos.
110. T: E tem de que?
111. C: Tem é... azul, vermelho. É.... (tem azul, vermelho) ((a criança não soube dizer os
sabores)).
112. T: Morango, tuti-fruti, limão,... Me dá o de limão.
113. C: Toma (toma).
114. T: Toma o dinheiro.
115. C: Não, não, é de graça (não, não, é de graça).
116. T: Por que é de graça?
117. C: É amigo (vocês são meus amigos).
118. T: Ah, obrigado.
119. C: Nada, tchau (que nada, tchau).
______________________________________________________________________________
Neste fragmento, apesar da criança necessitar da ajuda da terapeuta para lembrar as
falas dos personagens, como descrito anteriormente, percebe-se uma evolução da estruturação
91
frasal com a utilização do sujeito, verbo e complemento, como propõem Vilela e Koch (2001),
como demonstra o Quadro D. Observa-se, também, a segmentação linear das frases que, segundo
esses mesmos autores, é quando a frase na língua falada tem uma extensão temporal e os seus
elementos sucedem-se uns após os outros.
Nas linhas noventa e três, noventa e cinco e cento e três, ao analisar os quadros
sistemáticos dos actantes propostos por Vilela e Koch (2001), observou-se as presenças do sujeito
tradicional (A1) e do complemento direto tradicional (A2).
______________________________________Quadro D _______________________________
Linha
Actante
Verbo
Circunstante
93
tu
vai
95
eu
tenho
cocoate, bombonsim
103
tu
tava
onde
como
Para a exploração total desse audiovisual, foram utilizadas dez sessões terapêuticas
(S17 a S26), sendo explorados além dos diálogos, as categorias semânticas de guloseimas.
Durante essas sessões, também foi trabalhado o uso do calendário, onde se observou uma
memorização seqüencial dos dias da semana, com apoio visual do calendário. Em relação à noção
de ontem, hoje e amanhã, a criança ainda não apresenta domínio, como demonstra o fragmento
10.
______________________________________Fragmento 10_____________________________
120.
T: Hoje é que dia?
121.
C: Teta (terça).
122.
T: Terça? Isso aqui é terça? ((a terapeuta apontou para o calendário)).
123.
C: É.
92
124.
T: Não, é sexta. Vamos dizer os dias da semana.
125.
C: Teta (terça).
126.
T: Não, todos os dias. Vamos começar pelo domingo.
127.
C: Domingo, teta,... (domingo, terça).
128.
T: Não. Olha aqui no calendário e aponta para mim.
129.
C: Domingo, tegunda, teta, quata, quinta, seta, sabo (domingo, segunda, terça, quarta,
quinta, sexta e sábado) ((a criança ao apontar no calendário, verbalizou todos os dias)).
130.
T: Muito bem! Agora só falta dizer os dias em que você vem aqui.
131.
C: Têta e seta (terça e sexta).
132.
T: Certo! Marca o dia de hoje.
133.
C: ... ((a criança marcou corretamente)).
134.
T: Que dia é hoje?
135.
C: Teta (terça).
136.
T: Não, hoje é sexta-feira.
______________________________________________________________________________
Para a ampliação do universo lingüístico da criança, como apresenta ARPEF (2004),
na fase de histórias da técnica conjunto, foi utilizado a mesma história do urso Pompom, porém
iniciando novas categorias semânticas, como: líquidos (suco e refrigerante) e frutas (uva, cajú,
banana, mamão, limão, melancia, maçã, laranja, pêra, carambola), como demonstra o fragmento
11, sessão vinte e sete (S27).
______________________________________Fragmento 11_____________________________
137.
T: Você está notando que o urso Pompom está vendendo coisas diferentes? O que é?
138.
C: Futa (frutas).
139.
T: Antes do urso Pompom vender as frutas ele precisa saber os nomes das frutas. Fala
para ele.
140.
C: É... uva, cajú, manana, imão, meancia, baça, daanja (é... uva, cajú, banana, limão,
melancia, maçã e laranja).
141.
T: Sabe essa?
142.
C: Não.
93
143.
T: Pêra. E essa?
144.
C: ... ((a criança ficou calada)).
145.
T: Mamão. Agora vamos começar a história.
Quais as frutas que você tem urso Pompom?
146.
C: Tem é pêa, uva, manana, meancia... (tenho pêra, uva, banana e melancia).
147.
T: Quais são essas?
148.
C: Sei não.
149.
T: É o mamão e a carambola. Eu quero uma carambola. Quanto custa?
150.
C: Um real.
151.
T: Mas também estou com sede. O que você tem?
152.
C: Toma.
153.
T: O que é isso?
154.
C: Aante (refrigerante).
155.
T: Ah, refrigerante. Mas o que é isso aqui?
156.
C: Suco.
157.
T: Suco de que?
158.
C: Cajú (cajú).
159.
T: Vou levar o suco também. Toma o dinheiro.
160.
C: Não, é de graça amigo (não, é de graça amigo).
161.
T: Muito obrigado, urso Pompom.
162.
C: De nada (de nada).
______________________________________________________________________________
No fragmento 11, apesar de ser o primeiro dia em que foi apresentado às novas
categorias, a criança apresentou um domínio bom das frutas e líquidos, não sabendo nomear
poucas frutas, provavelmente àquelas que não fazem parte do seu cotidiano. É bom frisar que a
categoria frutas foi iniciada devido à solicitação dos pais da criança, pois afirmou que a criança
não sabia nomeá-las. No decorrer das sessões terapêuticas, a criança demonstrou uma evolução
significativa quanto à nomeação das frutas, sendo iniciado a exploração das categorias vestuários
e cores, como demonstra o fragmento 12. Como a criança se identificou muito com o personagem
94
do urso Pompom, essas categorias também foram trabalhadas em forma de história, utilizando
oito sessões fonoterápicas (S28 a S35). Nas primeiras sessões, foram exploradas a apresentação, a
repetição e o diálogo. Nas outras, deu-se maior ênfase à nomeação e à memorização dessas
categorias, através do diálogo entre a criança e a terapeuta. Ao final das oito sessões previstas,
observou-se a memorização e a nomeação das categorias trabalhadas.
______________________________________Fragmento 12_____________________________
163.
T: A loja do urso Pompom vai ser no centro da cidade ou no shopping?
164.
C: No shopi (no shopping).
165.
T: Você gosta mais do centro ou do shopping?
166.
C: Shopi eu goto, tem biquedo, tem comida (eu gosto do shopping porque tem brinquedo
e comida).
167.
T: Certo. Essa é a loja do urso Pompom. O que ele está vendendo agora?
168.
C: A roupa (a roupa).
169.
T: O que tem na loja de roupa?
170.
C: Tem é... camisa (tem camisa).
171.
T: Camiseta, calça comprida, bermuda. Você vai ser o urso. Oi urso, você tem calça?
172.
C: Sim (sim).
173.
T: Sua calça é azul ou preta?
174.
C: É peta (é preta).
175.
T: Isso aqui é o que?
176.
C: Calcinha (calcinha).
177.
T: Calcinha? Isso é uma ber...
178.
C: Uda ((a criança completou a palavra)).
179.
T: E esse aqui mais curto?
180.
C: Beuda (bermuda).
181.
T: É um short.
182.
C: Um short numir (um short de dormir).
183.
T: Muito bem, short de dormir. Você tem um short de dormir?
184.
C: Não, painho tem (não, painho tem).
95
185.
T: Teu pai tem calça?
186.
C: Sim, tem calça (sim, tem calça).
187.
T: E o que mais ele tem?
188.
C: Tapeu, oçu (chapéu e óculos).
______________________________________________________________________________
A terceira etapa da análise, realizada a partir dos dados obtidos na avaliação
fonoaudiológica final, vem cumprir com o último objetivo desta pesquisa que é descrever os
resultados da sintaxe final com o diagnóstico fonoaudiológico inicial.
Nesta etapa, a criança, após seis meses consecutivos de terapia fonoaudiológica, foi
submetida a uma nova avaliação de linguagem. Esta análise foi dividida e analisada em duas
situações distintas: linguagem expressiva, com apoio da seqüência lógica e da conversa
espontânea; e noção temporal, através do calendário.
Com relação à linguagem expressiva, foi mostrada à criança a mesma seqüência
lógica da avaliação inicial. A criança apresentou uma estrutura frasal dentro do que propõem
Vilela e Koch (2001), como demonstra o fragmento 13, sessão trinta e seis (S36). Durante a
narração da seqüência lógica, observou-se que a criança em diversas situações, linhas cento e
noventa e seis, cento e noventa e oito, duzentos e duzentos e dois, utiliza a subordinada “porque”.
De acordo com Casanova (1997), esse tipo de estrutura aparece por volta dos trinta e seis aos
quarenta e dois meses. Na linha cento e noventa e oito quando a criança fala “O homem tá
chorando tabém, o menino tabém”, observa-se a introdução de frase nominal utilizando a
expressão também. Para Casanova (1997), esse tipo de expressão ocorre por volta dos quarenta e
cinco meses aos cinqüenta e quatro meses.
96
______________________________________Fragmento 13_____________________________
189.
T: Coloca essa seqüência na ordem certa. E depois conta a história pra mim.
190.
C: Ele fez um baão com linha, tesoula, cola. Que isso aqui? (ele fez um balão com linha,
tesoura e cola. O que é isso aqui?).
191.
T: Isso é outra cola. E depois o que aconteceu?
192.
C: A linha sotou (a linha soltou).
193.
T: Foi, a linha soltou. E aconteceu o quê?
194.
C: E aí, a casa tem fogo. Aí na têa caiu. E aí, a mãe dele está chorando. (aí, a casa pegou
fogo e a telha caiu. A mãe dele está chorando).
195.
T: Por que a mãe dele está chorando?
196.
C: Poque, poque, poque a casa é dela. Poque o fogo tá queimando a casa (porque a casa é
dela e o fogo está queimando).
197.
T: Por que a casa está pegando fogo?
198.
C: Poque ele fez baão aí caiu (porque ele fez o balão e caiu).
O homem tá chorando tabém, o menino tabém (o homem está chorando também e o menino
também).
199.
T: E agora eles vão morar aonde?
200.
C: Eles vai ficar na árvore. Poque, poque quimou. E agora tem comida não (eles vão ficar
na árvore porque a casa queimou e não tem mais comida).
201.
T: Por que não pode soltar balão?
202.
C: Poque sai fogo (porque sai fogo).
______________________________________________________________________________
O quadro E mostra a fala da criança com a presença do actante, verbo e circunstante
de forma sistemática, como propõe o esquema da estrutura frasal de Vilela e Koch (2001). Nas
frases desse quadro, ocorre a presença do sujeito tradicional (A1) e do complemento direto
tradicional (A2), quando analisadas através dos quadros sistemáticos dos actantes propostos pelos
mesmos autores.
97
_________________________________Quadro E_____________________________________
Linha
Actante
Verbo
Circunstante
190
Ele
fez
um baão
192
Linha
soltou
____
194 a
Casa
tem
fogo
Caiu
têa
194 b
____
194 c
Mãe
196 a
Casa
196 b
Fogo
198
Ele
200
Eles
tá/chorando
é
tá/queimando
fez
vai/ficar
dele
dela
casa
baão
árvore
Casanova (1997) afirma que as últimas aquisições das crianças ocorrem por volta dos
cinqüenta e quatro meses, pois elas aprendem estruturas sintáticas mais complexas, porém só
haverá uma complexa aquisição por volta dos sete ou oito anos de idade, aproximadamente. As
crianças começam a apreciar os diferentes efeitos de uma língua ao usá-la e julgar a correta
utilização da sua própria linguagem.
Com relação à noção temporal, a criança apresentou uma evolução significativa em
relação aos conceitos relativos ao tempo (ontem, hoje e amanhã) e aos dias da semana,
nomeando-os tanto de forma seqüencial quanto aleatoriamente, como demonstra o fragmento 14.
______________________________________Fragmento 14_____________________________
203.
T: Que dia é esse que vamos marcar?
204.
C: Teta (terça-feira).
205.
T: Muito bem, terça-feira. E amanhã será que dia?
206.
C: Quata (quarta-feira).
207.
T: Você vem para terapia na quarta?
208.
C: Não, só seta. (Não, só na sexta-feira).
209.
T: Você lembra os dias da semana? Diz pra mim.
98
210.
C: Umingo, segunda, teta, quarta, quinta, sêta, sabo (domingo, segunda, terça, quarta,
quinta, sexta, sábado).
211.
T: Muito bem! E ontem foi que dia?
212.
C: Segunda, fui oégio (segunda, fui ao colégio).
______________________________________________________________________________
Ao final dessa análise, observou-se uma evolução quanto à hipótese diagnóstica
fonoaudiológica da criança. A criança apresentava uma fala telegráfica, caracterizando um atraso
simples de linguagem (ZORZI, 1993), revela uma boa compreensão embora a capacidade
expressiva pudesse estar ausente ou em fase mais elementar do que a esperada para a sua idade
cronológica. Além disso, não apresentava uma organização morfossintática na sua fala. Após a
aplicação de parte da metodologia verbotonal, observou-se que a criança agora apresenta uma
estruturação frasal bem organizada, porém apresenta alterações fonêmicas na fala, sendo
chamada, na Fonoaudiologia, de distúrbio articulatório. Segundo Piccolotto (2002), esse distúrbio
é uma inadequação dos sons da fala devido às falhas na colocação, no tempo, na direção, na
pressão, na programação e na integração dos movimentos articulatórios.
Em alguns casos de atraso simples de linguagem, a superação dos problemas é total. Em
outros, perduram alguns desses problemas, que podem ir de uma linguagem pobre até alterações
da fala, como é o caso da criança acompanhada neste trabalho, cuja produção apresenta evidência
de distúrbio articulatório (AIMARD, 1998).
99
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As crianças começam a desenvolver a linguagem oral desde o nascimento, no âmbito
doméstico, com seus pais e familiares. Elas adquirem e desenvolvem sua linguagem em marcos
cronológicos muito semelhantes, porém, em alguns casos, pode ocorrer um atraso nesses
processos devido a fatores orgânicos, sociais e/ou culturais. Necessitam, assim, de uma
intervenção fonoaudiológica, com aplicação de um determinado procedimento.
Neste estudo, foi investigado o desenvolvimento sintático e lexical em um paciente
com atraso simples de linguagem com a aplicação da metodologia verbotonal. Para isso, foram
aplicadas três técnicas da metodologia verbotonal: audiovisual, conjunto e individual. Verificouse uma aceitação excelente da metodologia por parte da criança, além de uma evolução
significativa em sua estruturação frasal. No início, a fala da criança era telegráfica, mas após seis
meses consecutivos de exposição às técnicas citadas, começou a apresentar uma organização
estrutural de frases do tipo actante – verbo - circunstante, como propõem Vilela e Koch (2001).
Nas primeiras sessões, quando a criança apresentava fala telegráfica, observou-se a
prevalência dos circunstantes, como por exemplo, fogo para a estruturação frasal a casa pegou
fogo. Com a aplicação da metodologia verbotonal, especificamente a técnica audiovisual,
verificou-se, no decorrer das sessões, a presença, inicialmente assistemática, dos verbos nas
frases e, posteriormente, sistemática dos verbos e actantes, além de interjeições e frases
interrogativas. Após o processo terapêutico, na avaliação fonoaudiológica final, foi observado, na
estruturação frasal da criança, a presença sistemática do actante – verbo – circunstante, de forma
linearizada. Esses dados vêm confirmar que os resultados obtidos atendem ao que buscam os
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pesquisadores como um dos objetivos da técnica audiovisual, a organização da estrutura frasal da
criança, através de diálogo entre personagens de histórias infantis.
Outros dados relevantes observados, no decorrer das sessões fonoterápicas, com a
aplicação da técnica audiovisual foram: a) o aumento da capacidade de atenção, concentração,
compreensão e memória; b) a facilidade em iniciar e/ou dar continuidade ao diálogo-emissão; c)
a utilização dos conceitos aprendidos pelos audiovisuais na conversa espontânea, tanto em âmbito
clínico como domiciliar (dados informados pelos pais do menor).
Além da evolução sintática na fala da criança, com a aplicação da técnica conjunto da
metodologia verbotonal, deu-se a ampliação do seu universo lingüístico e cognitivo, através da
exploração das categorias semânticas de higiene pessoal, partes do corpo, guloseimas, vestuários,
líquidos e cores; e ampliação da noção temporal com a apropriação dos conceitos de dias da
semana, e de ontem, hoje e amanhã.
Neste estudo, foi possível perceber que o papel desempenhado pela metodologia
verbotonal, técnicas audiovisual, conjunto e individual, no desenvolvimento sintático em um
paciente com atraso simples de linguagem foi bastante relevante para a organização da linguagem
oral.
Com relação ao distúrbio articulatório, será elaborado, de imediato, um programa de
acompanhamento para a superação das alterações fonêmicas apresentadas pela criança, dando
prosseguimento à terapia fonoaudiológica. Acredita-se que este é o procedimento mais
aconselhável para obtenção de resultados mais eficazes e consistentes, tomando-se a organização
discursiva como essencial no desenvolvimento lingüístico-cognitivo da criança.
Para alcançar os objetivos deste trabalho, foram utilizadas apenas algumas técnicas da
metodologia verbotonal. Sugere-se, para os próximos procedimentos fonoaudiológicos, a
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utilização das técnicas ritmo musical e corporal, as quais poderão contribuir para as atividades
terapêuticas no tratamento das alterações fonêmicas da criança.
Espera-se, com este trabalho, ter levantado alguns questionamentos para que novas
pesquisas sejam realizadas com uma amostra composta por um maior número de sujeitos, bem
como ampliar a visão do fonoaudiólogo em relação ao tratamento em crianças com atraso simples
de linguagem.
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