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PERFIL DE CONSUMIDORES E A REPRESENTAÇÃO SOCIAL
SOBRE ALIMENTOS ORGÂNICOS, EM FEIRAS LIVRES DOS
MUNICÍPIOS DE VILA VELHA E VITÓRIA, ES.
Evandro Gomes DORIQUETTO1
Maslowa Matos Gama CURTO1
Ana Maria Bartels REZENDE2
Resumo
Introdução
Em consonância com a busca por uma alimentação cada vez mais saudável e segura,
bem como pela preocupação sobre o impacto da atividade produtiva sobre o meio
ambiente, o consumo de alimentos orgânicos vem assumindo novas dimensões. No
entanto, persistem dificuldades em se dimensionar o tamanho e a evolução do mercado
destes produtos, o que demanda estudos para conhecer melhor o seu consumidor, centro
e elo para as estratégias de ampliação e diversificação da produção.
Objetivo
Identificar e analisar o perfil dos consumidores e o perfil de consumo de alimentos
orgânicos, em feiras livres dos Municípios de Vila Velha e Vitória/ES e sua
representação social sobre o consumo destes produtos.
Metodologia
Estudo exploratório de orientação analítico-descritiva, e caráter quali-quantitativo, que
utilizou a abordagem teórica das representações sociais para descrever a percepção dos
participantes sobre o objeto de estudo. População composta por 42 consumidores de
duas feiras de produtos orgânicos (Vila Velha e Vitória, ES), que responderam a uma
entrevista semi-estruturada, gravada eletronicamente para posterior transcrição. O perfil
dos entrevistados foi descrito por variáveis de gênero, idade, sócio-econômicas e o
perfil do consumo pela freqüência, tempo e produtos mais consumidos. A percepção
dos indivíduos sobre alimentação saudável, alimentação orgânica, motivos e
dificuldades para o consumo foram acessadas e analisadas pela técnica do Discurso do
Sujeito Coletivo (DSC).
Resultado
Entre os sujeitos do estudo 56% eram do sexo feminino e 44% masculino, com idade
entre 19 e 80 anos (média 51 anos), moradores em sua maioria dos bairros próximos às
feiras pesquisadas. A maioria possuía renda familiar mensal acima de 10 SM, curso
superior completo ou mais e famílias com até três membros (69%, 74% e 67% dos
entrevistados, respectivamente). Cerca de 1/3 (30,9%) se declarou aposentado. Quanto
às características do consumo, 71,4% adquirem os produtos orgânicos nas feiras uma
vez por semana, 58% faz uso destes há mais de três anos e os alimentos mais
consumidos são verduras e legumes. Os DSC revelaram: uma forte associação da
alimentação saudável, com o consumo de frutas, hortaliças e grãos com uma dieta
considerada “equilibrada”; representação dos alimentos orgânicos como aquele livre de
agrotóxicos, que apresenta melhores características sensoriais e que produz saúde e bem
estar. As dificuldades para o consumo foram mais atribuídas à falta de divulgação das
feiras, a pouca diversidade e ao maior preço dos produtos orgânicos.
2
Conclusão
Os resultados apontam para necessidade de se incentivar uma produção mais
diversificada, estratégias de marketing que estimulem demanda-oferta e diminuam
preços e, assim, ampliem o acesso aos produtos orgânico para parcela maior da
população, já que o seu consumo está associado, na representação dos sujeitos, à
promoção da saúde e a práticas alimentares saudáveis.
Descritores: Alimentos Orgânicos, Perfil de Consumidor; Representações Sociais,
Discurso do Sujeito Coletivo.
1
2
Acadêmicos de Nutrição do Centro Universitário Vila Velha.
Professora Adjunta do Curso de Nutrição do Centro Universitário Vila Velha.
PROFILE OF CONSUMERS AND THE SOCIAL REPRESENTATION
ABOUT ORGANIC FOODS IN PUBLIC FAIRS OF THE MUNICIPALS
OF VILA VELHA AND VITÓRIA, ES.
Abstract
Introduction
In consonance to the search for a health and secure alimentation, as the concern about
the impact of this productive activity on the environment, the consumption of organic
foods is assuming news dimensions. However, the difficulties in dimensioning the
proportion and the evolution of this products market persist, which lawsuit studies to
know better your consumer, core and link to the strategy of amplification and
diversifying of production.
Objective
Identify and analyse the profile of consumers and the profile of organic foods
consumers, in public fairs on the Municipal of Vila Velha and Vitória, Espírito Santo
(ES) and their social representation about the consumption of this products.
Methodology
Exploration study of orientation analytic-specification, and character quality-quantity,
which use theoretical approach of the social representations to describe the perceptions
of the participants about the study objective. Population compound of 42 consumers of
two fairs of organic foods (Vila Velha e Vitória, ES), which answered a interview halfstructured, taped record for later transcription. The profile of the interviewed people was
report for humankind, age, social-economic variables and the profile of consumptions
for the frequency, time and products more consumed. The perception of individuals
about the healthy alimentation, organic food, reasons and hardness for consume were
accessed and analyzed for the technic of Discourse of Collective Individuals (DCI).
Results
Between the individuals of the study, 56% were from female sex and 44% from male
sex, with age between 19 and 80 years old (average 51 years old), the greater number
residents in district next to the study fairs. The majority have monthly gains up to 10
minimum salary, university study complete or more and families with three members
(69%, 74% e 67% of the interviewed, respective). About 1/3 (30,9%) declare
themselves as retired. For the consumption characteristics, 71,4% acquire they organic
products on the fair ones in a week, 58% use this products more than three years and the
most consumed products are vegetables. The DSC revealed that a strong association of
3
health alimentation, with the consumption of fruits, vegetables and grains with a diet
considered “equilibrate”; representation of organic foods as foods free of agrotoxic,
which present better sensorial characteristics and cause health and well-being. The
hardness for the consume were attributed to the failure of divulgation of the fairs, a few
diversity and bigger cost of the organic foods.
Conclusion
The results point to the need of stimulate a production more diversifying, marketing
strategics in order to stimulated the prosecution-offer and reduce the price and, in this
manner, amplify the access to the organic products to bigger portion of the population,
ones that the consumption it’s associated, in individuals representations, to health
promotion representations and health alimentary practice.
Key-words: Organic foods, Consumers Profile, Social Representations, Discourse of
Collective Individuals (DCI).
INTRODUÇÃO
O homem antigo passou de uma vida nômade a viver em comunidade, onde a
caça, as ingestões aleatórias de frutos selvagens e grãos se transformaram em pecuária e
agricultura. Estes homens tinham uma relação instintiva e harmoniosa com o ambiente,
escolhendo o alimento que era apto para responder suas necessidades de vida. As
diferentes formas de nutrição desses povos deram bons resultados porque quase sempre
conservava a forma natural do alimento, a biodiversidade e estavam enquadradas dentro
da cultura local (DAROLT, 2002).
É possível acompanhar o início das primeiras civilizações até o início do
Império Romano e perceber que à medida que o homem foi se agrupando em sociedades
e se desenvolvendo sua alimentação foi se modificando, e ele foi se distanciando da
natureza e do modo instintivo e empírico de obtenção de conhecimento. Sendo que na
época da Renascença houve várias transformações levando o homem a Revolução
Científica, na qual os pilares da ciência moderna foram implantados (ORMOND et al.,
2002).
O século XVIII e a Revolução Industrial trouxeram grandes avanços dentro da
pesquisa científica e também dentro da ciência da Nutrição e Agronomia, ou seja, a
situação atual da dietética é um reflexo da evolução científica da humanidade, que ao se
4
distanciar da natureza, foi perdendo seu instinto natural de se alimentar e desenvolvendo
teorias científicas do que e como comer (FREITAG, 1990).
A busca por qualidade em produtos agroindustriais está mostrando um
crescimento constante desde a última década, fruto de mudanças nas preferências dos
consumidores, motivados principalmente por preocupações com a saúde pessoal e da
família (NEVES et al., 2000).
É cada vez maior o número de pessoas que estão em busca de uma alimentação
mais saudável, na tentativa de resgatar um tempo que ainda era possível ter á mesa
mantimentos de boa qualidade e livre de agrotóxicos, sendo que, atualmente os
alimentos passam por uma série de processos até chegarem ao consumidor, que acabam
provocando uma mudança de hábitos alimentares e um distanciamento entre ele e o
agricultor (DAROLT, 2003).
Nos últimos anos, com a polêmica dos alimentos transgênicos e o mal da ‘‘vaca
louca’’, os temas relacionados com a questão agroambiental têm obtido espaço na
mídia. Apesar de crescente, este espaço ainda é insuficiente para sensibilizar o
consumidor sobre os problemas relacionados ao agrotóxico (DAROLT, 2002).
Concebidos a partir da década de 20 do século passado, ganhando espaço, apesar
de ainda marginalizados, a partir dos anos 70, diversos movimentos reuniam-se sob a
denominação genérica de agricultura alternativa, que apesar das especificidades,
ficaram conhecidas no mercado Brasileiro, como sinônimos de agricultura orgânica, na
medida em que esta se tornou a corrente mais difundida (NEVES, et.al., 2000).
Entre a década de 80 e 90 esse movimento cresce e explode, onde cada vez mais
surgem produtores orgânicos (GUIVANT, 1995).
Assim, de acordo com a Instrução Normativa de 07/99 do Ministério da
Agricultura e do Abastecimento (MAPA), publicada pelo Diário Oficial da União em 17
5
de maio de 1999, a agricultura orgânica passa a ser definida como (BRASIL, 1999,
p.11-14).
[...] sistema agropecuário em que se adotam técnicas específicas, mediante a
otimização do uso dos recursos naturais e socioeconômicos disponíveis e o
respeito à integridade cultural das comunidades rurais, tendo por objetivo à
sustentabilidade econômica e ecológica, a maximização dos benefícios
sociais, a minimização da dependência de energia não-renovável,
empregando, sempre que possível, métodos culturais, biológicos e
mecânicos, em contraposição ao uso de materiais sintéticos, a eliminação do
uso de organismos geneticamente modificados e radiações ionizantes, em
qualquer fase do processo de produção, processamento, armazenamento,
distribuição e comercialização, e a proteção do meio ambiente [...]
Esta definição contempla alguns elementos do conceito de Segurança Alimentar
e Nutricional:
Todo mundo tem direito a uma alimentação saudável, acessível, de
qualidade, em quantidade suficiente e de modo permanente. Isso é que
chamamos de Segurança Alimentar e Nutricional. Ela deve ser totalmente
baseada em práticas alimentares promotoras da saúde, sem nunca
comprometer o acesso a outras necessidades essenciais (CONSEA, 2004, p.410).
Embora Shiarinelli (2006) e outros autores considerem o alimento orgânico
como mais nutritivo, com teores de vitaminas e antioxidantes maiores, não há nenhuma
evidência conclusiva de que os produtos orgânicos sejam mais nutritivos que os
convencionais. No estudo de Foster e Lampkin, (apud VILELA, 2002), realizado na
Itália encontrou-se controvérsias como: em pêssegos orgânicos o teor de beta caroteno
maior do que nos convencionais; de outra forma, a análise da ameixa evidenciou
diferença de 50% a menos deste componente quando comparados à convencional.
A produção orgânica, ao contrário do que afirmam seus opositores, não é uma
simples volta ao passado, mas a experiência daqueles que trabalham em ecossistemas
tratando o solo como um elemento viável e não apenas como substrato. A agricultura
familiar apresenta-se como elemento insubstituível na promoção desta produção, pois
mesmo com o processo de Revolução Verde, conseguiu sobreviver à transição
tecnológica do campo (CONTAG, 1999; FARIA et al., 2000).
6
Esse tipo de produção é um segmento de reconhecida importância no mundo
inteiro. No caso do Brasil, a agricultura familiar é responsável por 37,9% da produção
nacional de agricultura (PIRES, et al., 2002).
Considerando o mercado interno, apesar da baixa renda per capita, um número
crescente de consumidores tem se preocupado cada vez mais com temas como:
segurança alimentar, meio ambiente, bem-estar social e saúde, mostrando-se dispostos a
pagar mais caro por ‘‘alimentos naturais’’, que não contêm produtos químicos e outras
fontes de contaminação (NASCIMENTO, et al., 2006).
À medida que a produção e o mercado de alimentos orgânicos foram se
expandindo durante os anos 90, tanto no contexto internacional quanto no Brasil, as
feiras passaram a ter um papel dominante de comercialização (GUIVANT, 2003).
As feiras livres existem no Brasil desde o tempo da colônia. Apesar dos tempos
modernos, elas não desapareceram, sendo que desempenham funções muito importantes
na consolidação econômica e social, sendo capaz de provocar mudanças e reconversão
no setor de pequenos e médios agricultores (GODOY; ANJOS, 2007).
De acordo com Guivant (2003), a presença destacada das feiras livres ecológicas
no segmento de orgânicos insere-se dentro do processo de transformação que aquelas
têm ocasionado na esfera do consumo alimentar, ao fornecer novas opções com
iniciativas no que diz respeito às inovações e a qualidade dos alimentos.
O produto orgânico, por ser, obtido em sistema alternativo ao dominante,
necessita ser diferenciado, e de forma positiva. Justifica-se, assim, a inclusão de um selo
em sua embalagem que dê garantia ao consumidor das suas características (DIAS,
2001).
Quando se fala de orgânico, já vem em mente alimentos livres de insumos
químicos. Porém, o Brasil encontra-se entre os maiores consumidores mundiais de
7
agrotóxicos. Segundo dados do Sindicato Nacional da Indústria de Defensivos
Agrícolas (Sindag), o país consome um quinto do total utilizado no Terceiro Mundo
(GUIVANT, 2000).
Por outro lado, o Estado do Espírito Santo é um dos maiores produtores de
orgânicos do Brasil, sendo as cidades de Domingos Martins, Venda Nova do Imigrante,
Irupi, Santa Maria de Jetibá, Piúma e Santa Tereza as maiores produtoras. Dentre os
alimentos produzidos se destacam: hortaliças, frutas, café e avicultura (BELLO, 2006).
A produção orgânica corresponde a cerca de 5% do total no mercado capixaba
de alimentos, porém, a comercialização tem se mostrado como um desafio para os
agricultores familiares e para as associações destes produtos no Brasil. O confronto
entre o grande circuito (o de supermercados) e os circuitos curtos (o de feiras e vendas
livres) ainda é um problema, necessitando então, da diversificação dos circuitos, visto
que, nas feiras livres o consumidor já vai sensibilizado para a compra desses alimentos.
(GUIVANT, 2003).
Existem nos Municípios de Vila Velha e Vitória /ES uma variedade de feiras,
porém, as que comercializam exclusivamente produtos orgânicos, são apenas duas, uma
em cada município supracitado (BELLO, 2006).
Neste mesmo Estado, quem realiza a certificação destes produtos é a empresa
Chão Vivo, localizada no Município de Santa Maria de Jetibá. Segundo dados desta
empresa, quase 400 produtores estão em busca do selo de certificação no Estado, e a
empresa Bom Fruto é considerada a principal distribuidora nesta região (AZEVEDO,
2005).
No entanto, nas feiras livres não é exigida a certificação. A legislação brasileira
de 2007, que regulamenta a Lei nº. 10.831 de 2003 permite que o produtor ofereça seu
produto como orgânico, com base em critérios próprios. No final, vale mesmo é a
8
relação de confiança entre o consumidor e o feirante. Uma alternativa encontrada pelos
moradores de Vila Velha e Vitória /ES (AZEVEDO, 2008).
Observa-se que o consumo de alimentos orgânicos tem crescido em diversas
partes do mundo. Segundo o MAPA (BRASIL, 2008), existem hoje 15 mil produtores
atuando na agricultura orgânica brasileira, sendo que esse número deve evoluir seguindo
as mudanças no perfil do consumidor e o aumento crescente da demanda por produtos
‘‘saudáveis’’. Apesar da importância de consumo no mercado regional, ainda há uma
grande dificuldade de dimensionar o tamanho e a evolução desse mercado, bem como
conhecer seu consumidor (GUIVANT, 2003; SOARES et al., 2007).
Desta forma, o conhecimento do perfil dos consumidores é importante, pois
permite orientar trabalho de produção, direcionar o processo de marketing e
comercialização destes produtos.
Neste sentido, o objetivo deste estudo foi conhecer o perfil dos consumidores e o
perfil de consumo de produtos orgânicos, em feiras livres dos municípios de Vila Velha
e Vitória/ES e a representação social dos mesmos sobre o consumo destes produtos.
Estudos semelhantes a este foram realizados no Rio de Janeiro, São Paulo,
Pelotas, Florianópolis, Recife, Rio Grande Norte, Curitiba, entre outros, sendo então de
grande importância, identificar o perfil dos consumidores orgânicos dos Municípios
analisados (SOARES et al., 2007; CERVEIRA e CASTRO, 1998; BRAUCH, LOPEZ e
RUTZ, 2006; CUENCA et al., 2007; RUCINSKI e BRANDENBURGUER, 2005).
METODOLOGIA
Realizou-se um estudo exploratório, de orientação analítico-descritiva e caráter
quali-quantitativo, com 42 consumidores de duas feiras de produtos orgânicos, uma no
município de Vila Velha e outra no município de Vitória, ES.
9
Os critérios de inclusão foram indivíduos de ambos os sexos, idade superior a 18
anos, sendo esses compradores e/ou consumidores dos produtos orgânicos nas citadas
feiras, que concordassem voluntariamente a participar do estudo e os de exclusão,
menores de 18 anos e indivíduos que, quando abordados, não se mostrassem receptivo a
responder à entrevista.
Os dados foram coletados nos dias 05, 12 e 19 de setembro de 2008, por meio de
entrevistas semi-estruturadas, gravadas eletronicamente, pelas quais se obteve um
registro integral das falas dos participantes para posterior transcrição.
Foram utilizadas como variáveis descritivas do Perfil dos Consumidores:
gênero; idade (em anos completos); bairro de residência; renda familiar mensal do
respondente (coletada em reais/mês e posteriormente distribuída em salários mínimos,
utilizando-se como referência o salário vigente de R$ 415,00); grau de escolaridade
(nenhum a superior completo ou mais); tamanho da família (expresso em número de
membros da família residentes no domicílio), ocupação e percepção sobre o seu estado
de saúde (muito saudável, saudável ou pouco saudável).
Para traçar o perfil do consumo foram levantados a freqüência de compra; o
tempo de consumo ( em anos) e os produtos mais adquiridos/consumidos.
As variáveis descritivas do perfil dos consumidores e do consumo foram
tabuladas e processadas no Microsoft Office Excel 2007 e apresentadas na forma de
gráficos para ilustrar a descrição e discussão dos resultados.
Para acessar a representação social dos consumidores de produtos orgânicos
foram elaboradas quatro questões amplas de estudo: representação do consumidor (1)
sobre alimentação saudável, (2) sobre alimentos orgânicos, (3) sobre motivos para o
consumo e (4) sobre dificuldades encontradas para o consumo. Estas questões foram
incorporadas às perguntas da entrevista semi-estruturada. Para tanto, utilizou-se como
10
referência a técnica do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC), preconizada por
LÉFREVE; LÉFREVE (2003), como um recurso destinado a favorecer a fala direta dos
sujeitos sobre o objeto do estudo, ou seja, quando se deseja saber o que um conjunto de
indivíduos pensa sobre um determinado tema.
Para estes autores isto só é possível de se realizar por uma pesquisa qualitativa,
de base indutiva, na qual se pergunta (em entrevista semi-estruturada): o que o senhor
(a) pensa ou acha ou tem a dizer sobre (o tema)? Fale sobre (tal assunto). As respostas
que se obtém vão gerar um número variado de discursos individuais, que após
literalmente transcritos serão processados a partir da construção das seguintes figuras
metodológicas: expressões chaves (ECH), idéias centrais (IC) e ancoragem (A). Nesta
técnica, as ECH são pedaços, trechos ou transcrições literais do discurso que devem ser
destacados pelo pesquisador para revelar a essência do depoimento. As IC são nomes ou
expressões lingüísticas que mostram e descrevem da maneira mais sintética, precisa e
fidedigna possível o sentido de cada um dos discursos analisados. Na seqüência para se
constituir o DSC as ECH semelhantes são agrupadas, e redige-se uma síntese das
mesmas, na primeira pessoa do singular, de tal forma a produzir um DSC composto
pelas ECH que tem a mesma idéia central (LEFEVRE e LEFEVRE 2003).
ASPECTOS ÉTICOS
O presente Projeto de Pesquisa, embora não tenha sido submetido ao Comitê de
Ética em Pesquisa do Centro Universitário Vila Velha – UVV, procurou observar o
estabelecido na Resolução CONEP Nº. 196/96 e suas complementares, no que se refere
à participação livre e esclarecida na pesquisa, condicionada à autorização dos sujeitos
no Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
Antes de se iniciar a pesquisa, os indivíduos recebiam todas as informações a
respeito dos objetivos e procedimentos do estudo, em abordagem e linguagem de fácil
11
compreensão, além da leitura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE),
de tal forma que a divulgação dos dados desta pesquisa foram autorizados por seus
respondentes pela assinatura do TCLE.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A partir dos dados adquiridos pelas entrevistas, tornou-se possível conhecer o
consumidor de alimentos orgânicos, cujos dados levantados estão dispostos a seguir:
Nem todos os sujeitos abordados se dispuseram a responder as entrevistas de tal
forma que, ao final de processo de coleta de dados acessou-se o discurso de 42 dos 60
sujeitos pretendidos. Destes, 13 eram consumidores da feira de Vitória e 29 da de Vila
Velha. O menor número de respondentes naquele município foi devido a uma
resistência maior, demonstrada pelas pessoas, em participar da pesquisa.
PERFIL DOS CONSUMIDORES DE ALIMENTOS ORGÂNICOS
Gênero
Em relação ao gênero, entre os consumidores pesquisados, percebeu-se que as
mulheres predominaram tanto no município de Vila Velha (51%), quanto no de Vitória
(61%). Percentagens similares foram verificadas por Cerveira e Castro (1998) para São
Paulo, por Darolt (2004) para Curitiba e por Cunningham, 2001 (apud Vilela 2002),
para o Canadá.
O ato de fazer compras para a família sempre foi mais freqüente entre mulheres,
no entanto, nas sociedades modernas cada vez mais se observa o público masculino
assumindo esta função. Isto ficou mais evidente em Vila Velha, onde a diferença entre
homens e mulheres foi menos expressiva.
12
Idade
A idade média dos participantes do estudo foi de 51 anos, variando entre 19 e 80
anos. Quando distribuídos por faixa etária percebeu-se que 19 (30,95%) encontravam-se
entre 50 a 59 anos.
Faixa - Etária
Gráfico 1 - Distribuição dos consumidores entrevistados em relação à idade, 2008.
Este resultado é semelhante ao do estudo de Cunningham, 2001 (apud Vilela
2002), que registrou 38,2% nesta faixa (idade acima de 55 anos). Por outro lado
Rucinski e Brandenburg, (2005), identificaram que os consumidores orgânicos em
Curitiba encontravam-se mais concentrados na faixa etária de 31 a 40 anos.
O fato da freqüência de consumidores com menos de 30 anos ter sido menor que
daqueles com idade mais avançada (9,52% para menos de 30 anos contra 26,2% para os
maiores de 60 anos) sugere que, quanto maior a idade há uma modificação das
perspectivas do consumidor em relação a uma alimentação mais saudável, constituindo
uma opção pelo produto orgânico.
Para os autores supracitados esta perspectiva,
possivelmente esteja vinculada ao que ‘‘costumeiramente’’ ocorre nas idades mais
avançadas em termos das manifestações de doenças e agravo como as dislipidemias, o
diabetes, a hipertensão, dentre outros, e que quando identificados clinicamente motiva
13
os indivíduos a optarem por práticas alimentares mais saudáveis, muitas vezes
alternativas (RUCINSKI; BRANDENBURG, 2005).
Bairro de residência
No que diz respeito ao local onde os consumidores residem, o bairro Praia da
Costa foi o mais citado em Vila Velha (por 23 dos 29 entrevistados), enquanto em
Vitória foram os bairros Barro Vermelho e Jardim da Penha (5 dos 13 entrevistados).
No total da população 28 (69,7%) dos 42 consumidores entrevistados moravam no
mesmo bairro ou em bairros próximos aos locais das feiras, fato este análogo ao
relatado por Brauch, Lopes e Rutz (2006), no estudo realizado em Pelotas.
A proximidade do local de venda dos produtos parece ser um dos fatores
facilitadores e de estímulo para seu consumo, sendo esta condição relatada na fala de
alguns entrevistados.
Outra consideração que se pode fazer sobre esta característica é que estes são
bairros de classe média alta, o que vincula o maior poder aquisitivo a um acesso maior
aos produtos orgânicos.
Tamanho da família
O número de membros das famílias variou entre 1 a 6 indivíduos, sendo que
famílias com até 3 indivíduos somaram 67% da população estudada (Gráfico 2). Os
pesquisados relataram o consumo de alimentos orgânicos por todos os membros da
família, embora não de forma exclusiva.
14
7%
2%
10%
1 Membro
2 Membros
24%
31%
3 Membros
4 membros
5 Membros
6 Membros
26%
Gráfico 2 - Distribuição dos consumidores de produtos orgânicos entrevistados em relação ao
número de membros da família, 2008.
(Renda Familiar)
A renda familiar informada pelos entrevistados variou de oitocentos a quinze mil
reais entre os consumidores de Vila Velha e de três a doze mil reais entre os de Vitória.
O Gráfico 3 demonstra que cerca de um terço (31%) da população do estudo relatou
renda familiar mensal acima de 20 SM, sendo que a maioria (69%) tinham renda acima
de 10 SM por mês.
14%
31%
< 5 Salários
17%
> 5 e < 10
> 10 e < 15
> 15 e < 20
> 20
14%
24%
Gráfico 3 - Distribuição dos consumidores entrevistados em relação à renda familiar,
2008.
15
A constatação de que os consumidores de alimentos orgânicos geralmente
possuem renda mais elevada foi apontada por vários outros estudos, como o de Rucinski
e Brandenburg, (2005), em Curitiba, em que 45,1% relataram renda familiar acima de
12 SM; o de Cerveira e Castro, (1998), de São Paulo, em que 52% relataram renda
superior a 10 SM e o de Guivant e Moro, (2005), de Florianópolis, em que 50%
relataram rendas superiores a 11 SM.
Escolaridade
Quanto ao grau de escolaridade como, apresentado no Gráfico 4, a maior parte
dos entrevistados (74%) declarou escolaridade elevada: ensino superior completo e/ou
mais, incluindo os que têm pós-graduação.
Nenhum
0% 7%
7%
Fundamental Incompleto
7%
5%
Fundamental completo
Médio Completo
Superior Incompleto
74%
Superior Completo e mais
Gráfico 4 - Distribuição dos consumidores entrevistados em relação ao grau de escolaridade,
2008
Este perfil se assemelha ao de outros estudos, como o realizado em São Paulo,
por Cerveira e Castro, (1998), em que 60% dos consumidores ecológicos (termo
utilizado pelo autor para se referir aos consumidores orgânicos) possuíam curso superior
e ao de Guivant e Moro, (2005), em Florianópolis, em que 53,3% também possuíam o
ensino superior completo.
16
Ocupação
Cerca de 1/3 (30,9%) dos entrevistados se declararam aposentados, 14,3% do lar
9,52% administradores e 7,14% engenheiros. Advogados, funcionários públicos e
comerciantes somaram 4,76% dos entrevistados.
Percepção sobre o estado de saúde
Identificou-se que 27 (67%) dos consumidores entrevistados percebiam-se
saudáveis, enquanto 19 (30%) consideravam-se muito saudáveis, ou seja, apenas 3%
manifestaram uma percepção negativa sobre sua saúde (Gráfico 5).
3%
30%
Muito Saudável
Saudável
Pouco Saudável
67%
Gráfico 5 - Distribuição dos consumidores entrevistados quanto a percepção sobre seu estado
de saúde, 2008.
PERFIL DO CONSUMO DE ALIMENTOS ORGÂNICOS
(Freqüência de compra)
A maioria (72,4%) dos consumidores obtém esses alimentos todos os sábados
(uma vez por semana, devido ao fato das feiras só funcionarem aos sábados) dados
esses compatíveis com o de Guivant e Moro, (2005), em Florianópolis, que obtiveram
73% de freqüência de compra uma vez por semana nos supermercados. Em
contrapartida, 19,6% compram esses produtos três vezes por semana tanto em feiras
17
quanto nos supermercados/hortifrutis, e em menor freqüência (8%) relataram adquirir
produtos orgânicos todos os dias.
Tempo de Consumo
No Gráfico 6 é demonstrado o tempo de consumo de alimentos orgânicos entre
os entrevistados. A maioria (58%) afirmou consumir estes produtos há mais de três
anos, enquanto o restante não se recordava do tempo ou consumiam a menos de três
anos (ambos com 21% dos entrevistados).
21%
21%
Não Sabe
< 3 anos
> 3 - 6 anos
10%
> 6 - 8 anos
21%
> 8 anos
27%
Gráfico 6 - Distribuição dos consumidores entrevistados em relação ao tempo de consumo de
orgânicos, 2008.
Produtos mais consumidos
No que se diz respeito aos produtos apontados como mais consumidos, as
verduras estão entre as preferidas desta população (para 59%), realçando-se a alface
cujo consumo foi apontado por quase todos os consumidores. Em seguida o vieram os
legumes (para 37%) e as frutas (para 15%). Esse último com índice pequeno devido à
falta de diversificação das mesmas no local, segundo comentários de alguns
consumidores (Gráfico 7).
18
4% 3%
5% 3%
15%
Frutas
Verduras
Legumes, raizes
37%
Cereais
Carnes
Leguminosas
Outros
59%
Gráfico 7 - Distribuição dos consumidores entrevistados em relação aos produtos
mais consumidos, 2008.
Além dos entrevistados indicarem o consumo de frutas, verduras e legumes
(FLV), também o fizeram acerca dos produtos orgânicos de outros grupos alimentares.
Embora os números não sejam tão elevados, 15% dos entrevistados afirmaram comprar
outros tipos de alimentos orgânicos nas feiras pesquisadas, tendo ressaltado itens como
arroz, azeite, mel, feijão, carnes, ovos, entre outros (Gráfico 7).
REPRESENTAÇÃO
SOCIAL
SOBRE
O
CONSUMO
DE
ALIMENTOS
ORGÂNICOS
Para obter a representação social da população do estudo sobre alimentos
orgânicos as quatro questões de estudo foram processadas como categorias de análise,
obtendo-se a percepção que os sujeitos revelaram sobre a alimentação saudável, sobre o
conceito de alimento orgânico (o que este representava para ele/ela), os motivos
manifestados para o consumo destes produtos e as dificuldades para aquisição e
consumo dos mesmos.
Para cada uma destas categorias processou-se os DSC das IC mais prevalentes,
apresentadas a seguir.
19
Representação social sobre alimentação saudável
Sobre a percepção dos sujeitos em relação à alimentação saudável, apresentou-se
no Quadro 1 as idéias centrais mais prevalentes, que foram as associadas ao maior
consumo de frutas, hortaliças e grãos (por 66,6% dos respondentes) e a uma
alimentação equilibrada (por 57,1% deles). Apenas entre os respondentes de Vitória, a
associação da alimentação saudável com a ausência de agrotóxico foi mais prevalente
que as demais (para 53,8%).
QUADRO 1 - Freqüência absoluta (FA) e relativa (FR) de idéias centrais sobre a
representação da alimentação saudável.
IDÉIAS CENTRAIS:
“alimentação saudável é...”
FA
Vitória
... rica em frutas, hortaliças e
grãos.
...equilibrada.
FA
Vila Velha
4:13
FR
Vitoria
(%)
30,8
FR
Total
24:29
FR
Vila Velha
(%)
82,7
28:42
FA
Total
(%)
66,6
6:13
46,1
18:29
62,1
24:42
57,1
... sem agrotóxicos.
7:13
53,8
7:29
24,1
14:42
33,3
...“natural” (não
industrializado).
... que promove bem estar e
saúde.
... não ingerir carnes.
... ingerir peixes.
6:13
46,1
4:29
13,8
10:42
23,8
4:13
30,8
3:29
10,3
7:42
16,6
1: 13
-
7,7
-
1:29
3,4
1:42
1:42
2,3
2,38
DSC: Alimentação saudável é alimentação rica em frutas e hortaliças e grãos.
“Tem que ter um pouquinho de tudo, mais com uma
alimentação rica em muitas verduras e frutas e pouco
carboidrato e carne vermelha. Eu sou do interior e lá sempre é
de costume ter produtos que tem bastante qualidade, pra ficar
nutrido. Tem que ter variedades na mesa, prato colorido, com
amarelo, verde, laranja, comer muitas frutas, folhas, verduras
e legume e grãos. É, uma alimentação que não vai prejudicar a
saúde da gente.”
DSC: Alimentação saudável é ter uma alimentação equilibrada.
“Eu acredito que seja na parte de uma alimentação
equilibrada, balanceada, tem que ter um pouquinho de tudo,
fazendo uma reeducação alimentar. Rica em vitaminas
20
essenciais, cereais integrais, minerais, pouca gordura,
porcarias, colesterol e açúcar. É comer pouca fritura
utilizando pouco óleo e sal, sem carne gordurosa. É uma
alimentação sem produto que vai prejudicar a saúde da gente.”
DSC: Alimentação saudável é sem agrotóxicos
“Procuro alimentação sem remédio, que não tenha resíduos de
venenos e nem adubo, que é acumulativo. Tento fazer o máximo
pra comprar só orgânico, venho aqui à feira orgânica, aonde
não tem agrotóxicos e loto a geladeira. A banana você vê que
não tem remédio porque a casca dela é fininha, você vai ao
supermercado e vê a diferença. Não adianta comprar um
tomate e lavar com cloro para tirar o agrotóxico que não sai.”
Os discursos coletivos revelaram que a percepção dos consumidores de
orgânicos sobre a alimentação saudável coincide com alguns dos preconizados pela
OMS e pelo Ministério da Saúde como fundamentais para a promoção da saúde. No
Guia Alimentar da População Brasileira, entre os Dez Passos para Alimentação
Saudável encontra-se o que incentiva o incremento no consumo de frutas, hortaliças e
grãos integrais (BRASIL, 2006). Esta é também considerada uma prática alimentar
fundamental para a prevenção de doenças e agravos não transmissíveis.
Importante perceber que a fala dos sujeitos sobre alimentação equilibrada ou
balanceada identifica-se com o conceito que os estudiosos utilizam que é aquela que
fornece todos os nutrientes, em quantidades suficientes e harmônicas, adequada para
cada ser humano, tanto em relação às exigências fisiológicas das diferentes etapas do
ciclo vital,
quanto
às
suas
peculiaridades
sócio-psico-culturais
(MARTINS;
CAVALCANTI; MAZILLI, 1997).
Representação social sobre alimento orgânico e os motivos de seu consumo
Quando perguntado aos sujeitos “o que representa para você o alimento
orgânico?”, a representação mais freqüente foi a que relacionou alimento orgânico
21
como aquele livre de agrotóxicos (61,9% da população total), conforme demonstrado no
Quadro 2.
QUADRO 2 - Freqüência absoluta (FA) e relativa (FR) de idéias centrais sobre o
conceito do que é alimentação orgânica.
IDÉIAS CENTRAIS:
“alimento orgânico é ...”
FA
Vitória
FA
Vila Velha
6:13
FR
Vitoria
(%)
46,1
FR
Total
20:29
FR
Vila Velha
(%)
69
26:42
FA
Total
(%)
61,9
... sem agrotóxicos, livre de
qualquer produto químico.
...“natural”(não
industrializado).
... que não agride o meio
6:13
46,1
6:29
20,7
12:42
28,6
3:13
23,1
8:29
27,6
11:42
26,2
-
-
1:29
3,4
1:42
2,4
ambiente.
... produto de qualidade.
DSC: Alimento orgânico é aquele livre de agrotóxicos, ou qualquer produto químico.
“Alimento orgânico é tudo, é aquele livre de toxinas. É o
alimento saudável, que faz bem pra saúde, porque a química
não faz bem pro corpo. É aquele cultivado na própria terra, ele
não tem remédio nenhum, não tem nenhum produto químico e
não utiliza agrotóxico, nem artifício, não tem resíduos de
venenos e nem adubo, que é acumulativo. A banana você vê
que não tem remédio porque a casca dela é fininha, você vai ao
supermercado e vê a diferença. Não adianta comprar um
tomate e lavar com cloro, para tirar o agrotóxico, que não sai.
Tento fazer o máximo pra comprar só orgânico!”
Percepção semelhante foi encontrada por Vilela (2002), em estudo realizado no
Canadá, que identificou que 83% dos consumidores pesquisados relacionaram
alimentos orgânicos com o uso de agrotóxicos.
Segundo Cerveira e Castro, (1998), o fato do alimento orgânico ser relacionado
à ausência de agrotóxicos é uma reação às informações passadas pela mídia e pelos
meios informais de comunicação de que o produto orgânico tem essas características.
Desse modo, um dos pilares que justificam a agricultura orgânica, que é o mínimo
impacto sobre o meio ambiente, não apareceu de forma significante nos DSC.
22
Por outro lado, os consumidores de produtos orgânicos entrevistados percebem a
relação que estes produtos têm com a promoção da saúde. Quando perguntados “qual
motivo para o consumo dos orgânicos?”, as representações mais freqüentes foram as
que relacionaram o alimento orgânico com as características sensorias (66,7%) e com a
promoção de saúde/bem estar (52,4%), conforme descrito no Quadro 3.
QUADRO 3 - Freqüência absoluta (FA) e relativa (FR) de idéias centrais sobre o
motivo que levaram a consumir orgânicos.
IDÉIAS CENTRAIS:
“consumo orgânico
devido...”
FA
Vitória
FA
Vila Velha
9:13
FR
Vitoria
(%)
69,2
...características sensoriais.
...promoção de saúde/bem
4:13
estar.
... por influência da mídia.
... a maior durabilidade.
... por escolha própria.
... por ter problemas de
saúde.
...pelo acesso a feira.
... por hábito familiar.
FR
Total
29:29
FR
Vila Velha
(%)
100
28:42
FA
Total
(%)
66,7
30,8
18:29
62,1
22:42
52,4
6:13
46,1
9:29
31
15:42
35,7
3:13
2:13
23,1
15,4
10:29
6:29
2:29
34,5
20,7
6,9
13:42
6:42
4:42
30,9
14,3
9,5
2:13
-
15,4
-
1:29
3,4
2:42
1:42
4,8
2,4
DSC: As características sensoriais me fizeram optar pelos orgânicos.
“Sou muito fascinada por essa questão de alimentação e
comendo alimento orgânico eu como mais. Sempre observo a
aparência, se tá fresco, a consistência, se o alimento tá murcho.
Olho muito a cor, porque sempre sai no jornal que produto de
tal cor é bom pra isso. Além da questão saborosa incomparável
do dia a dia, eu acho que ele me traz saúde, isso ao longo prazo,
de imediato é o sabor. O gostoso é você chupar uma fruta
diretamente do pé e sentir o seu sabor bem mais adocicado,
comparo isso aos alimentos orgânicos. Experimenta o morango
orgânico! É bem melhor. O alface tem gostinho de terra, de
natureza, a cebolinha é mais saborosa, a cenoura é mais doce, a
beterraba então é excelente. Eu gosto muito de olhar o alimento
bem verdinho, a qualidade em ver o produto é demais.”
23
DSC: A promoção de saúde/bem estar fizeram optar pelos orgânicos
Consumo orgânico pensando no futuro, ele traz saúde, por isso
consumo freqüentemente: verdura, alface, repolho, taioba,
chicória, banana. A qualidade do orgânico é bem maior em
relação às vitaminas. Consumo orgânicos há quatro anos a
procura de uma alimentação saudável e eu tenho certeza que tô
comendo um produto que não vai me fazer mal, esses alimentos
trazem saúde, porque quando eu como eu me sinto bem, sinto
que tenho uma melhor qualidade de vida.”
Associando as representações sobre alimentação saudável e motivos para o
consumo de orgânicos, pode-se supor que exista uma vinculação direta entre as idéias:
alimentos saudáveis-alimentos sem agrotóxicos-promoção da saúde.
No estudo de Rucinski e Brandenburguer, (2005), em Curitiba e no de Cuenca et
al., (2007), em feiras de municípios do Rio Grande do Norte, demonstraram que 94% e
77,7% dos consumidores entrevistados indicaram a saúde e a ausência de agrotóxicos,
respectivamente, como os motivos principais para o consumo de produtos orgânicos.
Estes mesmos estudos revelaram uma freqüência bem mais baixa das características
sensoriais como motivo pra o consumo (5,9% e 4,5% dos entrevistados,
respectivamente), diferentemente dos consumidores do presente estudo em que o
motivo de consumo mais evidenciado nas falas foi o das características de aparência,
consistência, frescor, cor e sabor.
Importante ainda comentar duas idéias centrais menos prevalentes, porém não
menos importantes, relacionadas aos motivos do consumo: 30,9% alegaram consumir
orgânicos devido a uma durabilidade maior destes alimentos em relação aos
convencionais, o que confere com a literatura técnico-científica sobre o assunto. Este é
um aspecto que merece ser melhor esclarecido à população tendo em vista que a idéia
normalmente veiculada pela mídia dos defensivos agrícolas de que o uso do agrotóxico
24
confere maior “resistência” e, portanto, maior “durabilidade” aos produtos ainda é
muito prevalente.
A percepção de que a mídia influenciou a opção pelos alimentos orgânicos foi
acessada na fala de 35,7% dos sujeitos. Neste caso a mídia representaria um recurso
positivo e bastante estratégico para uma maior divulgação dos produtos orgânicos.
Representação social sobre os dificultadores do consumo de orgânicos
Quando perguntado “quais as dificuldades percebidas para o consumo de
orgânicos”, as respostas mais freqüentes foram: a falta de divulgação sobre as feiras, a
falta de variedade de produtos e o preço elevado, para 52,4%, 50% e 40,5% dos
entrevistados, respectivamente (Quadro 4 e DSC associados).
QUADRO 4 - Freqüência absoluta (FA) e relativa (FR) de idéias centrais sobre as
dificuldades percebidas para o consumo.
IDÉIAS CENTRAIS:
“ as dificuldades
FA
Vitória
FR
Vitoria
(%)
FA
Vila Velha
FR
Vila Velha
(%)
FR
Total
FA
Total
(%)
... a falta divulgação sobre
11:13
84,6
11:29
38
22:42
52,4
feira.
... a falta variedade de
produtos.
10:13
7,7
11:29
38
21:42
50
... os preços mais elevados
7:13
53,8
10:29
34,5
17:42
40,5
2:13
15,4
5:29
17,2
7:42
16,7
2:13
3:13
1:13
15,4
23,1
7,7
6:29
1:29
-
20,7
3,4
-
6:42
3:42
3:42
1:42
14,3
7,1
7,1
2,4
encontradas para
consumo são:”
dos produtos.
... ter a feira somente aos
sábados.
...características sensoriais
... o difícil acesso à feira.
... a mídia que atrapalha.
... a durabilidade menor.
DSC: Falta divulgação da feira
“Comecei a utilizar orgânico quando tive acesso a essa feira,
mais tem muita gente que ainda não sabe dessa feira. Pra mim
essa feira é conhecida só pra quem mora aos arredores, pra
quem conhece alimento orgânico e consome. Como eu moro
25
perto eu já sabia, venho aqui todos os sábados e muitas
pessoas no próprio bairro mesmo, não acreditam quando eu
falo que comprei alimentos orgânicos. Tem gente aqui de
bairros próximos que nem sabem que existe essa feira, que
ainda não conhece, e a culpa disso é da prefeitura e dos órgãos
públicos. Ainda falta divulgação, nunca vi a mídia divulgar
sobre as frutas, legumes orgânicos e, quando tem divulgação, é
só pra falar que o alimento orgânico é caro e só serve pra
afastar o consumidor. Olha só isso: tem pouca gente hoje, a
feira tinha que tomar a rua toda, dos dois lados. Se a feira
estivesse mais cheia os produtos seriam mais baratos. Acredito
que poderia estar divulgando mais em relação a orgânicos,
acho que muitas pessoas conhecem essa feira porque passam
de carro, mais não sabem que ela é orgânica.”
DSC: Falta variedade dos produtos
“Gosto muito das verduras e das frutas orgânicas, mas faltam
mercadorias variadas. Todos os sábados estou aqui, e às vezes
devido a falta de variedade dos produtos orgânicos, consumo
também o convencional, porque no supermercado quando não
tem, eles dão um jeito de adquirir de outros estados. Já os
orgânicos, eu sei que há uma dificuldade enorme de transporte,
incentivo das prefeituras e ainda falta muitos produtos aqui,
pois só tem aquilo que eles conseguem produzir, faltam
alimentos fora da estação. O tomate se você observar é difícil
de achar um bonito e grande e a carne é difícil de encontrar,
falta opção. Só encontramos verduras e ainda falta muitos
produtos como pêra, abacate, tomate grande e frutas em
geral.”
DSC: Preços mais elevados dos produtos
“O preço é caro, e só comecei a utilizar orgânico quando tive
acesso a essa feira, porque o alimento no supermercado é mais
caro ainda. Às vezes o custo alto afasta o consumidor, você
pode ver que a feira é vazia, se a feira estivesse mais cheia os
produtos seriam mais baratos. Procuro utilizar o mínimo
possível do convencional, mais é difícil, porque o preço dos
orgânicos é muito mais caro e o aspecto visual é muito inferior.
Como a feira é só sábado e no supermercado é muito mais
caro, quando falta algum alimento, eu tenho que recorrer ao
convencional.”
26
Associando as representações sobre as dificuldades encontradas para o consumo
de orgânicos, pode-se supor que exista uma vinculação direta entre as idéias: falta
divulgação da feira- falta variedade dos produtos – preços mais elevados.
Quando comparado ao estudo de Cerveira e Castro, (1998), em São Paulo,
Soares et al., (2007), no Rio de Janeiro, demonstraram que 57,9% e 65,8% dos
consumidores, respectivamente, entrevistados também indicaram que a falta de
variedade é uma das principais dificuldades encontradas, dados esses que comprovam a
percepção dos consumidores do presente estudo.
Em relação à falta de variedade dos produtos, os estudos supracitados, revelaram
que 61% e 75,2% encontraram dificuldades em adquirir exclusivamente produtos
orgânicos, pois, a maioria destes consumidores rendem-se ao alimento convencional
devido a falta de opção destes produtos, não atendendo a demanda como observado no
DSC.
Segundo Cuenca et al., (2007), o fator preço é um dos outros agravantes
apresentados no setor orgânico, que dificulta o seu crescimento, fazendo com que
grande parte da população, em especial nos países em desenvolvimento, opte
novamente pela agricultura convencional, dados esses que confirmam a percepção dos
consumidores abordados.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conhecer o perfil dos consumidores e do consumo e a representação social de
alimentos orgânicos pode contribuir na orientação da cadeia produtiva, desde a
produção à elaboração de estratégias de marketing e comercialização que potencializem
o consumo destes produtos.
27
A população deste estudo distribuiu-se quanto ao gênero em 56% de mulheres e
44% de homens. A maioria dos sujeitos do estudo tinha mais de 30 anos de idade, (faixa
etária mais incidente entre 50 e 59 anos) e residiam em bairros próximos as feiras
pesquisadas, sendo este um dos motivos alegados para preferirem equipamento para
compra de orgânicos.
O padrão sócio-econômico pode ser caracterizado como de médio a alto,
representado por rendas mensais superiores a 10 SM para quase 70% e superiores a 20
SM para um terço da mesma, por famílias na sua maioria (67%) pequenas, com até 3
membros, e por grau de escolaridade de superior completo a mais para 74% da
população. Quanto à ocupação, uma parcela significativa (30,9%) se declarou
aposentado.
A compra dos alimentos orgânicos geralmente é realizada uma vez na semana,
na própria feira, sendo que 58% fazem uso destes há mais de três anos sendo as
verduras e os legumes os alimentos mais consumidos.
Os DSC revelaram uma forte associação da alimentação saudável com o
consumo de hortaliças, frutas e grãos e de uma dieta considerada “equilibrada” e as
representações sobre o alimento orgânico se aproximaram bastante da percepção que
demonstraram sobre alimentação saudável.
Para a maioria dos sujeitos, os orgânicos são alimentos livres de agrotóxicos ou
de outras substâncias químicas (para 61,9%). Parte deles (28,6%) ainda conceituou os
orgânicos como alimentos “naturais”, sendo que este termo foi utilizado para se
contrapor aos alimentos industrializados, em que se utiliza de aditivos químicos no
processamento. As falas destes sujeitos sugerem novamente que, para este consumidor,
a não adição de compostos químicos aos alimentos, seja na produção (agrotóxicos) ou
28
no processamento industrial (conservantes) é um importante motivo para sua escolha
em relação aos alimentos convencionais.
Quando perguntados sobre os motivos que os levavam a optar pelos alimentos
orgânicos as IC mais prevalentes foram às relacionadas às características sensoriais de
sabor, cor e frescor (66,7%) das hortaliças e frutas e a busca por saúde e bem estar
(52,4%), o que mais uma vez remete às IC reveladas na representação que têm da
alimentação saudável.
A percepção da agricultura orgânica como não agressora ao meio ambiente,
idéia explícita na conceituação formal e técnico-científica foi manifestada apenas por
26,2% dos participantes, sugerindo que este também deva ser um aspecto precisa ser
mais explorado na divulgação destes produtos.
A falta de divulgação maior sobre o produto e principalmente sobre as feiras que
os comercializam, somada à falta de variedade e aos preços maiores dos produtos foram
ás idéias centrais mais prevalentes para as dificuldades encontradas para o consumo.
Esse consumidor consome freqüentemente produtos convencionais por falta de uma
oferta mais diversificada de produtos orgânicos. Essa deficiência é mais aguda no caso
das frutas, de produtos minimamente processados e industrializados, o que acaba
influenciando no preço das mercadorias.
O perfil do consumidor e do consumo de alimentos orgânicos e as
representações sociais destes produtos, descritas neste estudo, podem ser úteis para
orientar produtores a se aprimorem no atendimento à demanda por estes produtos,
aumentando sua receita e possibilitando que o nível de satisfação do consumidor
alcance patamares ainda mais elevados.
Sugere-se que os benefícios destes produtos para a saúde e para a
sustentabilidade do ambiente, bem como os equipamentos de comércio (feiras,
29
mercados, supermercados, entre outros) disponíveis em cada município ou região
devam ser mais divulgados, melhorando a acessibilidade aos produtos.
Como a associação dos alimentos orgânicos com a promoção da saúde e bem
estar e com práticas alimentares saudáveis foi bastante significante neste estudo,
percebe-se a importância que este tema deva ter na formação e atuação do Nutricionista.
Este pode contribuir, de forma crítica, não só na propagação desta “idéia”, como
também no desenvolvimento de condutas dietéticas e sanitárias necessárias ao processo
de certificação destes produtos e na elaboração de Boas Práticas, principalmente para as
fases de processamento, acondicionamento e comercialização.
Vinculados ao conceito dos produtos orgânicos já se encontram vários dos
preceitos da Segurança Alimentar e Nutricional (alimentação adequada, promoção da
saúde, sustentabilidade do ambiente), o que justifica investir em estratégias e políticas
que aumentem e diversifique esta produção, diminuindo os preços destes produtos para,
assim, ampliar o acesso a maior parcela da população.
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