Revista Brasileira de Geografia Física 01 (2011) 033-044 Revista Brasileira de Geografia Física ISSN:1984-2295 Homepage: www.ufpe.br/rbgfe Dispersão de espécie exótica no Parque Nacional da Lagoa do Peixe e seu entorno Luana Portz1, Rogério Portantiollo Manzolli2, Dejanira Luderitz Saldanha3, Iran Carlos Stalliviere Correa4 1 Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Geociências da UFRGS, área de concentração em Geologia Marinha. Instituto de Geociência, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Av. Bento Gonçalves, 9500, Porto Alegre, RS, Brasil. CEP: 91509-900. 2 Doutorado do Programa de Pós-Graduação em Geociências da UFRGS, área de concentração em Geologia Marinha. Instituto de Geociência, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Av. Bento Gonçalves, 9500, Porto Alegre, RS, Brasil. CEP: 91509-900. 3 Professora do departamento de Geodésica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Instituto de Geociência, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Av. Bento Gonçalves, 9500, Porto Alegre, RS, Brasil. CEP: 91509-900. 4 Professor do departamento de Geodésica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Centro de Estudos de Geologia Costeira e Oceânica, Instituto de Geociência, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Av. Bento Gonçalves, 9500, Porto Alegre, RS, Brasil. CEP: 91509-900. Artigo recebido em 15/04/2011 e aceito em 20/06/2011 RESUMO O Parque Nacional da Lagoa do Peixe está localizado no litoral sul do estado do Rio Grande do Sul. Dentre os conflitos existentes dentro da área do parque e no seu entorno, o aumento e a dispersão da vegetação exótica, vem gerando inúmeras discussões. Neste contexto o objetivo do presente trabalho foi identificar a distribuição espacial, ao longo do tempo, das áreas de plantações de Pinus sp. Para tanto foram utilizadas imagens multiespectrais de sensoriamento remoto (TM-Landsat 5), com datas entre 1986 e 2009, sendo realizada a classificação manual por meio da vetorização, verificação de campo e análise quantitativa e qualitativa dos resultados obtidos. O problema principal da dispersão natural de Pinus sp. é encontrado na margem da lagoa principal, margeada por banhados e por pinus, cuja dispersão espontânea está competindo com o crescimento da vegetação natural e alterando o cenário típico da região. De 1986, data de criação do parque, até hoje a área de pinus, no entorno desta lagoa, cresceu de 61 para 252 ha. Este aumento da área de ocorrência de Pinus sp, em mais de 4 vezes, torna necessária a sua extração, a fim de preservar as espécies nativas da região, bem como a diversidade biológica a ela associada. A expansão da silvicultura é preocupante, pois assumiu uma grande proporção em área, não se encontrando ações que indiquem uma desaceleração deste processo. Além de diminuir o valor estético da paisagem natural esta invasão poderá comprometer o potencial turístico e principalmente de preservação ambiental ao qual o título de Parque Nacional exige. Palavras chaves: Pinus sp., Landsat, impactos. Dispersion of exotic vegetation into and around the Lagoa do Peixe National Park ABSTRACT Lagoa do Peixe National Park presents a great variety of fragile ecosystems. Among the conflicts present into and around the Park is the increase and dispersion of exotic vegetation, that is generating several discussions. In this context, the objective of this paper was identifying the spatial distribution, over time, of the Pinus sp. plantations in this area. For both researches, it was used multispectral images (Landsat), with dates between 1986 and 2009, and performed the manual classification, field verification and analysis of quantitative and qualitative results. The main problem related to the natural dispersal of Pinus sp. is found on the shore of the park’s main lagoon. This area is bordered by marshes and Pinus sp. whose spontaneous dispersion is competing with the natural vegetation and altering the typical scenery of this region. Since the creation of the park (1986) until today, the area of pinus, around the lagoon, has grown from 61 to 252 ha. This increase, more than four times, makes it necessary its extraction in order to preserve the native species and the biodiversity associated. The expansion of forestry in the Lagoa do Peixe National Park is worrisome because it has been taking a great extent of the area, and there are no actions that indicate a slowdown of this process. Keyword: Pinus sp., Landsat, impact. * E-mail para correspondência: [email protected] (Portz, L.). Portz, L.; Manzolli, R. P.; Saldanha, D. L.; Correa, I. C. S. 33 Revista Brasileira de Geografia Física 01 (2011) 033-044 1. Introdução desde a sua implantação, diversos conflitos O Parque Nacional da Lagoa do Peixe como a ocupação humana, a pesca, a (PNLP) foi criado o através do Decreto Nº agricultura, a pecuária, a caça e o plantio de 93.546/86 no ano de 1986, com área de vegetação exótica. 34.400 hectares, correspondendo a uma região Dentre estes conflitos o aumento e a com ecossistemas frágeis (banhados, campos dispersão da vegetação exótica dentro da área de dunas, matas de restinga e lagoas de água do Parque e no seu entorno, vem gerando doce e salobra), inseridos na planície costeira inúmeras discussões. Dentre as formas de do Rio Grande do Sul, Brasil. A criação do preservação deste ecossistema, encontram-se Parque teve como objetivo a proteção de as medidas que tendem à erradicação e espécies animais, particularmente das aves controle da presença desta face devido aos migratórias, que encontram nesta região graves prejuízos e danos que causam ao condições propícias para sua alimentação e ecossistema nativo. repouso, durante seus voos anuais, assim como a preservação das áreas úmidas. De acordo com Zalba (2009), a espécie exótica ou introduzida pode ser qualquer A denominação do parque vem de seu espécie proveniente de um ambiente ou de principal corpo d’água (lagoa do Peixe) que uma região diferente, encontrando-se fora de efetivamente se constitui em uma laguna por sua área de distribuição natural. O termo apresentar uma ligação direta e sazonal com o “espécie Exótica Invasora” designa uma oceano, através de uma barra. Com a espécie introduzida, que de acordo com a ocorrência intensificada desta abertura nos Convenção meses de junho a dezembro, a mistura das (Brasil, 1998), torna-se apta e avança sobre o águas doce e salgada, aliada a constante ação ambiente natural e alterado, sem a assistência de fortes ventos, permite a concentração de humana, ameaçando os ecossistemas, os nutrientes que garante o ciclo reprodutivo e a habitats naturais ou as espécies nativas. Essas sobrevivência de diversas espécies. espécies possuem vantagens competitivas e sobre Diversidade Biológica Tais características específicas fazem do são favorecidas pela ausência de predadores e local um reservatório natural de fauna e flora pela degradação dos ambientes naturais, específicas como, camarões, caranguejos, dominando os nichos anteriormente ocupados moluscos, algas, plânctons e pequenos peixes pelas espécies nativas. Espécies exóticas que atraem aves, répteis e mamíferos (FNMA, invasoras não apenas sobrevivem e se 1999). adaptam ao novo meio, mas passam a exercer O grau concedido à área, como o de processos de dominância sobre a Parque Nacional, acarreta um alto grau de biodiversidade nativa. Em função do grau de restrição de uso e ocupação, que tem gerado, impacto registrado em todo o mundo, as Portz, L.; Manzolli, R. P.; Saldanha, D. L.; Correa, I. C. S. 34 Revista Brasileira de Geografia Física 01 (2011) 033-044 espécies exóticas invasoras se constituem em seu desaparecimento nessas áreas alteradas, significativa causa mundial de perda de por vezes de grandes extensões. O sucesso das espécies de Pinus sp. no diversidade biológica. Plantas exóticas invasoras tendem a processo de invasão, no hemisfério sul, está produzir alterações em processos ecológicos relacionado com sua habilidade de colonizar essenciais como ciclagem de nutrientes, habitats marginais e pobres em nutrientes produtividade tróficas, (Moran et al., 2000). O crescimento rápido, estrutura, dominância, distribuição e funções alta competitividade em relação às gramíneas de ecossistema, e aos arbustos lenhosos (Lamprecht, 1990), e densidade de o grande reservatório de sementes advindos espécies, porte da vegetação, acúmulo de das lavouras de Pinus sp. implantadas podem serrapilheira e de biomassa (aumentando o estar explicando a extensão da invasão. Na risco de incêndios), taxas de decomposição, área de estudo o Pinus sp. encontra terreno processos fértil e tem sua colonização facilitada nas vegetal, espécies distribuição num cadeias dado de biomassa, evolutivos e relações entre polinizadores e plantas. Podem também áreas baixas interdunas. alterar o ciclo hidrológico e o regime de Sobre os danos ambientais causados por incêndios, levando a uma seleção das espécies esta espécie vegetal exótica invasora, nos existentes ao limites do Parque Nacional da Lagoa do empobrecimento dos ecossistemas. Existe Peixe, segundo o IBAMA, através do Ofício também o risco para a geração de híbridos a n.º 001/06- PNLP-Ibama, datado de 09 de partir de espécies nativas, que podem ter janeiro de 2006, informa: e, de modo geral, ainda maior potencial invasor (Ziller, 2001). “O Pinus sp. no Brasil é uma espécie Os Pinus SP., existente nesta região exótica invasora, sendo, via de regra, como uma planta exótica, proliferam-se com maléfica ao meio ambiente. Podemos citar a grande em Austrália, Nova Zelândia e África do Sul ambientes abertos de elevada insolação, como exemplos de contaminação biológica independente da fertilidade do solo. À medida pela introdução do Pinus sp., obrigando esses que se desenvolvem formam agrupamentos países a criar programas permanentes para gradativamente mais densos que produzem, tentar reduzir os danos ambientais, que vão, em primeira instância, o sombreamento das desde a modificação da paisagem, com a plantas nativas de menor porte e, a médio e inevitável perda da diversidade biológica dos longo prazo, alterações químicas no solo que ambientes alterados, à redução drástica no podem inibir o crescimento de espécies regime hídrico (redução do lençol freático, sensíveis. Por consequência, há redução das diminuição da umidade do ar e consequente populações de espécies nativas e o risco do alteração facilidade e agressividade Portz, L.; Manzolli, R. P.; Saldanha, D. L.; Correa, I. C. S. nos índices pluviométricos), 35 Revista Brasileira de Geografia Física 01 (2011) 033-044 causando-lhes problemas sociais e longo do tempo, das áreas de plantações de Pinus sp. no Parque Nacional da Lagoa do ambientais irreparáveis”. O IBAMA também reconhece os graves Peixe e em seu entorno. danos ambientais advindos desta vegetação no 1.1 Área de estudo interior e na área de entorno do PNLP. “É incontestável que a silvicultura de A área de estudo localiza-se no Pinus sp mudou drasticamente a fisionomia segmento médio da Planície Costeira do Rio da região de Mostardas/Tavares, não só no Grande do Sul, entre a Laguna dos Patos e o aspecto cênico da paisagem original, mas nas Oceano Atlântico, abrangendo áreas dos condições bióticas (vegetação e fauna) e municípios de Mostardas e Tavares. A lagoa abióticas (hidrologia, vento, etc) refletindo, do Peixe especificamente apresenta 40 km de provavelmente, na situação atual de escassez extensão e 1 km de largura, tendo de 10 a 60 de água que recorrentemente vem afetando a cm de profundidade em quase toda sua região”. extensão. Neste contexto o objetivo do presente trabalho foi sensoriamento identificar remoto e Para este estudo a área de avaliação através do abrange a totalidade do Parque Nacional da técnicas de Lagoa do Peixe e seu entorno conforme geoprocessamento a distribuição espacial, ao Figura 1. Figura 1. Mapa de localização da área de estudo. Portz, L.; Manzolli, R. P.; Saldanha, D. L.; Correa, I. C. S. 36 Revista Brasileira de Geografia Física 01 (2011) 033-044 A escolha da área de estudo foi de 1997; órbita/ponto: 221/81, 221/82 de 26 motivada pelos graves prejuízos e danos ao de maio de 2007; órbita/ponto: 221/81, ambiente natural que podem ter sido causados 221/82 de 29 de abril de 2009. pela presença das plantações de Pinus sp., não Estas datas foram escolhidas tendo em só na área do Parque, mas também no seu vista a execução de mosaico que abrange toda entorno. Este fato se justifica porque estas a área de estudo além da inexistência de espécies vegetais exóticas se propagam com nuvens nestes períodos. facilidade e ampliam sua área de abrangência Foi realizada a fusão de duas cenas ao para além das áreas dos plantios comerciais, longo da órbita do satélite gerando-se os aumentando sua área de concentração e mosaicos cobrindo a totalidade da área de competindo com a flora nativa. estudo. Tendo como base a imagem de abril de 2009, foi realizado o ajuste das cenas ao 2. Material e Métodos Para alcançar os objetivos propostos, sistema cartográfico UTM, Fuso 22, Datum: foram utilizadas imagens multiespectrais do WGS84. A partir desta imagem, as outras sensor TM do satélite Landsat 5, adquiridas cenas acima citadas, foram ajustadas ao em diferentes datas, visando identificar a mesmo localização e a extensão da vegetação exótica processo de co-registro, ou registro de inserida no Parque. A pesquisa compõe-se das imagem para imagem. A seguintes etapas: georreferenciamento das sistema cartográfico interpretação visual através do permitiu a imagens das diversas datas; classificação definição de polígonos nas áreas definidas manual por meio da vetorização com a como finalidade de delimitar as áreas ocupadas pela interpretação vegetação exótica; verificação de campo; composição colorida falsa cor RGB 453 com geração análise aplicação de contraste através do Stretch quantitativa e qualitativa dos resultados Interativo (Figura 2A e 2C) e do índice de obtidos. vegetação por diferença normalizada (NDVI) dos mapas finais e Para a análise da evolução da vegetação de uso foi da silvicultura. realizada através Esta da (Figura 2B). exótica na área foram adquiridas dez cenas de A aplicação de contraste, composições imagens de satélite do sensor TM/Lansat-5 coloridas e correlação de bandas foram junto ao Instituto de Pesquisas Espaciais executadas em diferentes etapas da confecção (INPE/BR): órbita/ponto: 221/81, 221/82 de dos mapas utilizando-se o software Envi® 4.0. 01 de junho de 1986; órbita/ponto: 221/81, Para a interpretação visual das imagens, 221/82 de 08 de setembro de 1993; órbita/ponto: 221/81, 221/82 de 01 de julho Portz, L.; Manzolli, R. P.; Saldanha, D. L.; Correa, I. C. S. diversas combinações de bandas foram testadas para a caracterização multitemporal e 37 Revista Brasileira de Geografia Física 01 (2011) 033-044 dentre elas, a que forneceu condições para imagem NDVI. uma melhor interpretação foi a R4G5B3 e a Figura 2. Exemplos de composições utilizadas para a classificação manual; A e C: colorida RGB 453, com aplicação de contraste através do Stretch interativo; B: NDVI. Imagem TM/Landsat-5 de 08 de setembro de 1993. Nesta imagem, R4G5B3, a mata nativa através do software ARGIS® 9.3, onde foram aparece em tons de marrom, enquanto as realizados os procedimentos de análise, áreas de Pinus sp. e eucaliptos aparecem em interpretação, e quantificação. tons de vermelho. Para discernir algumas Saída de campo - foi realizada saída de campo dúvidas, quanto à cobertura vegetal, foi para verificação e documentação das áreas gerado o NDVI, utilizando-se como base as analisadas. bandas 3 e 4 (vermelho e infravermelho próximo, respectivamente). 3. Resultados e Discussão O procedimento de delimitação das Como resultado da pesquisa pode-se áreas identificadas como de silvicultura foi observar, a partir das cartas-imagem (Figura realizado através de vetorização manual. Esse 3), que a área de estudo apresenta uma método exige uma maior capacidade de superfície interpretação por parte do intérprete e silvicultura (predominantemente Pinus sp.). demanda maior tempo, posto que cada A significativa delimitação dos ocupada polígonos por de polígono deve ser trabalhado individualmente. silvicultura, através da combinação das Todavia, acredita-se que esta seja a melhor bandas espectrais em composições coloridas forma de trabalho, posto que as classificações RGB, utilizando principalmente o NDVI, foi automáticas e semi-automáticas incorrem satisfatória, sendo facilitada pelo contraste frequentemente, em erros de confusão de espectral entre as áreas de campo, a mata classes. Este procedimento foi executado nativa em regiões bem definidas e as Portz, L.; Manzolli, R. P.; Saldanha, D. L.; Correa, I. C. S. 38 Revista Brasileira de Geografia Física 01 (2011) 033-044 plantações de Pinus sp.. dispersão descontrolada dessa espécie, não A estimativa da intensificação do detectável através das imagens TM-Lansat 5, plantio de Pinus sp. é atualmente de 17.237 em virtude da resolução espacial – tamanho ha de silvicultura, não sendo contabilizadas as do pixel, porém constatado em campo. áreas de contaminação recente, fruto da Figura 3. Distribuição dos polígonos de silvicultura em 1986 e 2009. No detalhe a seta 1: indicando a área de Pinus sp. no entorno da lagoa do Peixe e a seta 2: indicando a área de Pinus sp. no entorno da lagoa Pai João. De acordo com o Ofício n.º 001/06- quantificada, que invade propriedades e PNLP-IBAMA, a região do litoral médio do diversos sistemas Rio Grande do Sul, em especial Mostardas, responsabilidade Tavares e São José do Norte, apresenta conhecidos malefícios como o rebaixamento atividades de silvicultura, em especial com o do lençol freático e o sistema de monocultura, cultivo de Pinus sp., desde 1973, sendo hoje que uma atividade econômica consolidada na biodiversidade região. empobrecimento do solo. ocasiona naturais legal, a além redução e sem dos drástica já da consequente Na data de criação do parque, em 1986, É indiscutível que a silvicultura, foi possível estimar uma concentração de principalmente o plantio de Pinus sp., tenha 9.315 ha de área plantada, sendo que este mudado valor em 2009 ultrapassou 17.000 ha. A Mostardas/Tavares no aspecto cênico da grande preocupação quanto a esse plantio, é a paisagem original (Figura 4). disseminação espontânea, ainda a fisionomia da região de não Portz, L.; Manzolli, R. P.; Saldanha, D. L.; Correa, I. C. S. 39 Revista Brasileira de Geografia Física 01 (2011) 033-044 Figura 4. Fotografia do Parque Nacional da Lagoa do Peixe com áreas reflorestadas. Observa-se que entre os anos de 1986 e plantado em 1993 se disseminou lateralmente 2009, a expansão de polígonos isolados foi podendo ser observado nas imagens de 2007 e pouco uma 2009, após o corte de uma parte da área, a expansão lateral das áreas de plantio já porção remanescente. Neste sentido, entende- existentes (Figuras 3 e 5). Esta expansão se que os responsáveis pela silvicultura, ocorre de duas formas: 1) pelo aumento de deveriam ser responsáveis pela prevenção de polígonos próximos ocasionando a conexão sua expansão, evitando que as espécies dos mesmos; e 2) pela dispersão espontânea cultivadas da espécie. Um exemplo desta segunda forma descontrolada. expressiva, porém houve se dispersem de forma pode ser observado na Figura 5: um polígono Figura 5. Expansão lateral nas plantações de Pinus sp. O problema principal da dispersão o cenário típico da região. De 1986, data de natural de Pinus sp. é encontrado na margem criação do Parque, até hoje a área de Pinus da lagoa principal do Parque. Esta lagoa é sp., no entorno desta lagoa, cresceu de 61 para margeada por banhados e por Pinus sp. cuja 252 ha (Tabela 1; Figura 3). Este aumento da dispersão espontânea está competindo com o área de ocorrência de Pinus sp., em mais de 4 crescimento da vegetação natural e alterando vezes, torna necessária a sua extração, a fim Portz, L.; Manzolli, R. P.; Saldanha, D. L.; Correa, I. C. S. 40 Revista Brasileira de Geografia Física 01 (2011) 033-044 de preservar as espécies nativas da região, Estas duas lagoas foram classificadas, bem como a diversidade biológica a ela no Plano de Manejo do Parque, como sendo associada. A proposta de corte dos Pinus sp. zonas primitivas, ou seja, aquelas onde tenha em área de propriedade da União, dentro do ocorrido pequena ou mínima intervenção Parque, está sendo analisada pelo IBAMA- humana, contendo espécies da flora e da RS, quanto às questões técnicas e jurídicas. fauna ou fenômenos naturais de grande valor Assim como ocorre na lagoa do Peixe, científico. Portanto, devem possuir as na área de entorno da lagoa Pai João (Tabela características de Área de Transição entre a 1; Figura 3), também está ocorrendo o mesmo Zona Intangível e a Zona de Uso Extensivo, problema. As suas margens estão ocupadas merecendo por mata nativa e por Pinus sp., que em preservação. determinados locais se misturam. Esta lagoa, Como destaque os na resultados conservação e mostram, as juntamente com a lagoa Veiana (lagoas de consequências das invasões biológicas são, ao água doce), são importantes locais para a contrário de outros problemas ambientais, manutenção das características hidrológicas crescentes com o passar do tempo. Elas deste sistema bem como, são locais de tendem a se multiplicar e se espalhar, ocorrência de Lutra longicaudis (lontra), impedindo a recuperação dos ecossistemas espécie ameaçada de extinção (FNMA, 1999). afetados (Ziller, 2000). Tabela 1. Dados de área de silvicultura. ha: hectares. Área (ha) Área de Silvicultura 1986 1993 1997 2007 2009 9315 11202 11954 14913 17237 Situação semelhante a do Área no entorno da Lagoa do Peixe 61 152 178 222 252 Área no entorno da Lagoa Pai João 134 305 360 440 502 Parque de Itapuã enfrentam atualmente uma situação Nacional da Lagoa do Peixe, ocorre no de Risco Ecológico, originada pela invasão da Parque Estadual de Itapuã / Município de espécie Pinus sp. Esta espécie encontra Viamão – RS, onde foram realizados estudos terreno fértil e tem sua colonização facilitada acerca do Risco Ecológico decorrente da nas áreas do complexo entre dunas da praia e invasão de Pinus sp., de forma a exemplificar por sobre os campos úmidos e secos da o grave problema da presença de exóticas margem da lagoa Negra. Como conclusão este junto às ambientes nativos no Estado. Este estudo estabelece, como prioridade, o controle estudo mostra que as dunas e os ecossistemas desta associados à Praia de Fora do Parque Estadual competição; Portz, L.; Manzolli, R. P.; Saldanha, D. L.; Correa, I. C. S. espécie devido a sua autopropagação elevada e 41 Revista Brasileira de Geografia Física 01 (2011) 033-044 estabelecimento bem sucedido; nenhuma ou predominantes, conforme indicado por Ziller pouca participação em processos ecológicos (2001). No entanto, um estudo prévio deve ser autóctones; e descaracterização da paisagem elaborado com a finalidade de determinar as natural por populações de alta densidade espécies que devem ser utilizadas como (Liesenfels; Pellegrim, 2009). barreira biológica (Zanchetta, 2006). Conforme o IBAMA a contaminação Pelos dados observados neste estudo e por Pinus sp. é advinda da disseminação como explanados no plano de manejo do espontânea, a partir das áreas plantadas, parque, as áreas com Pinus sp., situadas devido à falta de um manejo responsável principalmente ao norte da Unidade de pelas empresas que realizam o plantio. Este Conservação, requerem medidas urgentes de fato atinge também, direta e indiretamente, o recuperação, pois estas espécies, por serem sistema hidrológico da lagoa do Peixe, pois a exóticas e tolerantes às baixas concentrações presença destes contribui para o rebaixamento de nutrientes existentes no solo, estão se do nível do lençol freático. A consequência disseminando rapidamente por todo o Parque, direta para a lagoa do Peixe é o ressecamento comprometendo o equilíbrio das comunidades das áreas úmidas (banhados), atingindo a flora biológicas. e a fauna e o próprio equilíbrio hídrico da Conforme Mack (2000) as invasões lagoa, pois esses banhados funcionam como biótica estão esponjas retendo água para os períodos de naturais seca. precedentes. Se não forem implementadas do alterando as comunidades mundo a uma taxa sem A dispersão das sementes de Pinus sp. é estratégias eficazes para reduzir os impactos feita pelo vento e devido à elevada produção mais prejudiciais dos invasores, corre-se o anual permite uma intensa regeneração risco de empobrecer e homogeneizar os natural ecossistemas da espécie. Esta regeneração indispensáveis da para agricultura, a abundante e de crescimento rápido promove sustentabilidade da um aumento do povoamento natural em quase silvicultura, da pesca e entre outros da região todos os tipos de ambiente, desde os campos de estudo. de dunas até os banhados, prejudicando a vegetação nativa rasteira devido à deposição 4. Conclusões A de acículas. O problema da dispersão das sementes imagens crescente de satélite aos estabelecimento de barreiras de quebra-vento ambientais, assim como o seu monitoramento. ao redor das plantações, ou região definida A expansão da silvicultura na área do da direção dos ventos Portz, L.; Manzolli, R. P.; Saldanha, D. L.; Correa, I. C. S. de tem favorecido função detecção usuários de pelo vento pode ser prevenido com o em a disponibilização mudanças Parque Nacional da Lagoa do Peixe é 42 Revista Brasileira de Geografia Física 01 (2011) 033-044 preocupante, pois, assumiu uma grande Lamprecht, proporção em área, não se encontrando ações trópicos: Ecossistemas florestais e respectivas que espécies arbóreas - possibilidades e métodos indiquem uma desaceleração deste processo. H. (1990). Silvicultura nos de aproveitamento sustentado. Eschborn: Os dados apresentados neste trabalho, principalmente no entorno da lagoa do Peixe e Instituto de Silvicultura da Universidade de Göttingen, GTZ, 343p. da lagoa do Pai João, devem ser considerados como um alerta para a urgente decisão de Liesenfeld, M.V.A.; Pellegrim, L.M. (2004). substituir as culturas do reflorestamento por Risco Ecológico: a invasão por Pinus sp e a vegetação nativa. problemática das espécies alienígenas A utilização de vegetação exótica como vegetais no Parque Estadual de Itapuã – anteparo contra o vento, nos balneários locais, Viamão, RS. InGa – Instituto Gaúcho de também deve ser controlada, principalmente Estudos com relação a esta espécie, pois esta apresenta <www.institutohorus.org.br/download/artigos dispersão espontânea no ambiente podendo /liesenfeld_Pelotas_2004.pdf> Acessado em alterar a configuração ambiental natural em 20 jan 2010. pouco tempo e conflitar com a vegetação rasteira nativa desta região. Por fim, a invasão por Pinus sp. no parque, além de diminuir o valor estético da paisagem natural poderá comprometer o potencial turístico e principalmente de preservação ambiental ao qual o título de Parque Nacional exige. 5. Referências BRASIL. Decreto N.º 2.519, de 16 de Março de 1998. Convenção sobre Diversidade Biológica. Ambientais. Disponível em: Mack, R.N. et. al. (2000). Biotic invasions: causes, epidemiology, global consequences and control. Issues in Ecology, n. 5, p. 20. Moran, C.; Hoffmann, J.H.; Donnely, D.; Van Wilgen, B.W.; Zimmermann, H.G. (2000). Biological Control of Alien, Invasive Pine Trees (Pinus sp species) in South Africa. In: Proceedings of the Internacional Symposium on Biological Control of Weeds, 10, Montana State University, Bozeman, Montana, USA, Neal R. Spencer, pp. 941-953. FNMA-FURG-IBAMA-NEMA-UFPel. Zalba, S.M. (2009). Introdução ás Invasões Disponível em <http://www.ibama.gov.br>. Biológicas, Acessado em: 10 dez 2009. 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