EUROPA E ÁSIA CENTRAL A crise económica global deixou a sua marca, conduzindo a mudanças na paisagem política de vários países tais como a Hungria, a Islândia e a Letónia, atingidas severamente pela agitação económica. Muitos outros países têm experimentado economias em regressão, por entre receios de que esta situação possa alimentar a xenofobia e ataques a grupos vulneráveis tais como os migrantes e os Roma (ciganos). Milhares de migrantes têm continuado a colocar as suas vidas em risco em travessias por mar para a Europa, desesperadas e inseguras, para, muitas vezes, verem ser-lhes negada a segurança do acesso procedimentos de asilo. Ameaças à liberdade de expressão – e a defensores dos direitos humanos – permanecem generalizadas. DISCRIMINAÇÃO A etnia Roma tem permanecido largamente excluída da vida pública em todos os países, impossibilitados de gozar de pleno acesso a alojamento, educação, emprego e serviços médicos. A situação económica adversa pareceu proporcionar terreno fértil para a exploração de antigos estereótipos dos Roma por elementos que se opõem a eles. A polícia húngara, por exemplo, está a investigar 18 ataques contra a etnia Roma nos últimos 18 meses, incluindo um decorrido em Fevereiro que resultou na morte de um homem e do seu filho de cinco anos, aparentemente mortos a tiro enquanto tentavam escapar da sua casa em chamas no seguimento do que se suspeita ter sido um ataque de fogo-posto. Têm havido marchas e declarações de alguns grupos de extrema-direita na República Checa, incluindo o incitamento à discriminação, hostilidade ou violência contra a comunidade Roma. Em Março, as autoridades italianas despejaram forçadamente uma comunidade de cerca de 150 Roma que viviam sob uma passagem rodoviária no norte de Milão, sem oferecer acomodação alternativa à grande maioria dos dispersos. Na Sérvia, cerca de 250 pessoas da etnia Roma, incluindo crianças pequenas, idosos e enfermos, foram despejados em Abril de um acampamento temporário em Nova Belgrado. Foi-lhes proporcionada acomodação alternativa, na forma de contentores, noutro bairro de Belgrado mas os residentes locais tentaram atear-lhes fogo numa tentativa de impedir os Roma de se mudarem. Na Eslováquia, em Abril surgiram imagens na internet de polícias a maltratar seis jovens da etnia Roma. O vídeo mostrava os jovens a serem forçados, por agentes policiais, a trocar bofetadas e beijos, e a serem forçados a tirar todas as suas roupas enquanto eram observados por mais agentes policiais, enquanto estes tiravam fotografias. No diálogo perceptível, os jovens foram alvos de gritos e abusos raciais. VOZ A liberdade de expressão e de associação continuam a ser atacadas – tal como foram os próprios defensores dos direitos humanos. Na Rússia, Stanislav Markelov, advogado e defensor dos direitos humanos, foi morto a tiro em Janeiro, juntamente com uma jornalista, Anastasia Baburova, em plena luz do dia, no centro de Moscovo. Entre os casos de alto perfil em que havia trabalhado, Stanislav Markelov era advogado da família da mulher chechena, Kheda Kungaeva, que foi raptada, violada e estrangulada até à morte em Março de 2000. Ele havia recebido inúmeras ameaças de morte relacionadas com o seu trabalho neste caso. O defensor dos direitos humanos, Lev Ponomarev, foi atacado e espancado por atacantes desconhecidos fora da sua casa em Março. Membros do staff da Amnistia Internacional continuaram a enfrentar obstrução ao seu trabalho legítimo na Rússia, incluindo serem colocados numa lista que implicava controlos adicionais à entrada ou saída do país. Surgiram receios de que o Quirguistão se poderia juntar à lista de países que aplica sérias restrições ao espaço para actividades de direitos humanos, após Vitali Ponomarev – sincero defensor dos direitos humanos na Ásia Central - ter visto ser-lhe negado o acesso ao país em Fevereiro, para além ter sido proibido de entrar no país durante cinco anos. No mês anterior havia publicado os resultados de uma pesquisa que levantava suspeitas sobre a versão oficial dos eventos que levaram à acusação de 32 pessoas por alegadamente organizarem protestos na cidade de Nookatin, a sul do Quirguistão. As autoridades da Moldávia continuaram a obstruir e perturbar protestos pacíficos apesar de uma nova lei sobre reunião e falhou em proteger a liberdade de expressão. Em Janeiro, detiveram um homem que protestava contra alegados maus-tratos por agentes da polícia e, no mês seguinte, não foram em socorro de várias pessoas que se manifestavam pela liberdade de expressão e que foram atacadas por indivíduos mascarados. Em Abril, na sequência de manifestações que se tornaram violentas após eleições muito disputadas, centenas de pessoas, a maioria em idade estudantil, foram indiscriminadamente detidas pela polícia por entre relatos generalizados de uso de força excessiva e maus-tratos durante a detenção. Adicionalmente, surgiram receios de que activistas da sociedade civil que haviam organizado protestos pacíficos eram considerados responsáveis pelos motins. Num desenvolvimento preocupante, pelo menos sete organizações não-governamentais, incluindo a Amnistia Internacional, viram ser-lhes exigidas explicações relativamente a medidas para a prevenção da violência, e receberam intimações fora dos procedimentos normais para ceder informação financeira. Representantes da inspecção fiscal local pediram à Amnistia Internacional que cedesse também uma lista de todos os seus membros pagos. Num desenvolvimento bem acolhido em Março, o Ministro dos Assuntos Internos do Azerbaijão desistiu do processo cível iniciado pelo seu ministério contra a activista dos direitos humanos, Leyla Yunus, por alegada difamação. A Amnistia Internacional e outras organizações expressaram receios de que os procedimentos constituíssem um obstáculo inaceitável à liberdade de expressão e, em particular, ao trabalho dos defensores dos direitos humanos. O processo de difamação baseava-se numa entrevista por Leyla Yunus na qual esta expressava preocupação relativamente a alegações de violações dos direitos humanos, incluindo tráfico de seres humanos, cometidos durante um julgamento público que estava a monitorizar. IMPUNIDADE Houve alguns progressos no que concerne o combate à impunidade por violações dos direitos humanos. Em Fevereiro, o Tribunal Internacional para a ex-Jugoslávia condenou cinco homens – altos-funcionários e sérvios étnicos – por responsabilidade em crimes contra a humanidade e crimes de guerra no Kosovo em 1999. Este veredicto trouxe, finalmente, justiça para cinco dos principais arquitectos da guerra no Kosovo, que assistiu a milhares de mortes e mais de um milhão de albaneses forçados a fugir da província. Ao mesmo tempo, o papel da Missão das Nações Unidas no Kosovo na morte de dois jovens durante uma manifestação dois anos antes foi sujeito a investigação, resultado de uma audiência pública em Junho. Na Turquia, teve início em Janeiro o julgamento de 60 funcionários estatais implicados na morte sob custódia de Engin Ceber, que morreu após ter, alegadamente, sido repetidamente pontapeado e agredido com barras de madeira e de metal, ambos os episódios sob custódia policial e na prisão, entre Setembro e Outubro de 2008. As autoridades turcas falharam na sua obrigação de lhe proporcionarem atenção médica imediata após a sua transferência para a prisão, uma falha que pode ter impedido a sua transferência antecipada para uma instituição especializada onde os seus ferimentos poderiam ter sido tratados. Também em Janeiro, foram iniciados procedimentos em Espanha relacionados com relatos de maus-tratos sobre o alegado membro da ETA, Igor Portu, admitido no hospital com ferimentos graves no seguimento da sua detenção. Noutros locais da região, a paisagem tem sido confusa. Na Rússia, em Fevereiro, um júri absolveu três homens acusados por relação com o assassinato da jornalista de direitos humanos, Anna Politkovskaya, morta em Outubro de 2006. A Amnistia Internacional apelou às autoridades para que prosseguissem com a investigação com renovado vigor, de forma a fazer os responsáveis presentes à justiça. Em Abril, as autoridades russas anunciaram o fim da “operação contraterrorismo” na República chechena. Uns dias mais tarde, foi retomada em algumas regiões montanhosas da Chechénia, mas tem sido vista pelas autoridades como um passo com vista à normalização. No entanto, a Amnistia Internacional considera que a normalização na Chechénia não é possível sem a completa responsabilização pelas atrozes violações dos direitos humanos que ocorreram na região, devastada por duas guerras nos últimos 15 anos. A verdadeira marca do regresso à normalidade é dar justiça às pessoas, incluindo fazer presentes à justiça os perpetradores das violações dos direitos humanos. Apenas investigações meticulosas e independentes às violações dos direitos humanos, passadas e contínuas, poderá trazer normalização e segurança na Chechénia. Tais investigações deveriam também ser um elemento dissuasor para futuras violações. MIGRAÇÃO Milhares de migrantes atravessaram o mar em condições inseguras para vários destinos europeus como Itália ou Malta este ano – desconhecendo-se o número de mortos nestas tentativas. Continuam a surgir receios acerca das condições de recepção e detenção dos requerentes de protecção internacional, incluindo o risco de repatriamento – sem acesso a procedimentos justos tais como a contestação da deportação. Em Maio, no que aparentou ser o terceiro incidente do género no espaço de um mês, as vidas e a segurança dos migrantes e requerentes de asilo foram postas em risco – primeiro, por uma disputa entre os governos italiano e maltês sobre quem tinha obrigação de responder aos pedidos de socorro ao abrigo das convenções marítimas aos quais fazem parte, depois pela decisão sem precedentes do governo italiano de transferir os migrantes e requerentes de asilo resgatados no mar para Tripoli, Líbia. Disputas sobre jurisdição ou responsabilidade nunca deveriam impedir ou atrasar o resgate, assistência ou desembarque a indivíduos em perigo no mar. A medida de retornar os resgatados no mar à Líbia sem qualquer exame adequado das suas necessidades de protecção está também contrária às obrigações italianas ai abrigo das leis internacionais de direitos humanos e refugiados. Estabelece um precedente perigoso para os Estados-membros da União Europeia. CONTRA-TERRORISMO A 19 de Fevereiro, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos declarou que o Reino Unido havia violado várias disposições da Convenção Europeia dos Direitos Humanos relativamente à detenção indefinida, sem acusação ou julgamento de 11 estrangeiros suspeitos de envolvimento no terrorismo internacional ao abrigo da Lei de Anti-terrorismo, Crime e Segurança de 2001. O Tribunal Europeu declarou que as autoridades britânicas haviam violado o direito à compensação das vítimas de detenção ou prisão ilegal. O Tribunal Europeu também declarou que a medida derrogatória do governo não havia sido expressamente exigida pelas circunstâncias. A Amnistia Internacional tem estado a fazer campanha no sentido da revogação da legislação. Data de Publicação: 28 de Maio de 2009