CORREIO BRAZILIENSE Caderno Cidade – 26/abril/2009 HABITAÇÃO Bairro de 800 hectares Veto a emenda do Pdot permitirá a ocupação de área nas proximidades de Sobradinho com prédios comerciais e residenciais Helena Mader e Raphael Veleda A sanção do Plano Diretor de Ordenamento Territorial e os 56 Carlos Vieira/CB/D.A Press vetos do governador José Roberto Arruda ao projeto vão abrir 11/11/08 caminho para a criação de um novo bairro próximo a Sobradinho, perto do Grande Colorado. A área de 800 hectares às margens da DF-425 está no centro de uma polêmica que envolve moradores da região, parlamentares e representantes do governo. O Pdot previa originalmente transformar a região rural em uma zona urbana. Mas uma emenda apresentada pelo deputado distrital Raad Massouh determinou que o espaço continuasse vazio, como uma área rural. Agora, o governador vetou a emenda, o que O terreno onde o novo bairro autoriza a ocupação do imóvel com prédios comerciais e deve ser instalado fica nas residenciais, escolas e equipamentos públicos. proximidades do Grande Colorado O terreno vago faz parte da antiga fazenda Paranoazinho. Grande parte da propriedade rural foi parcelada irregularmente ao longo das últimas décadas. Hoje, são 56 condomínios de baixa, média e alta renda, onde vivem 38 mil pessoas. Mas uma área equivalente a 800 campos de futebol permaneceu intacta, mesmo com a onda de invasões e especulação imobiliária. Os herdeiros da fazenda se uniram a um grupo empresarial — a construtora paulista Birmann — e criaram a Urbanizadora Paranoazinho S.A. O objetivo era regularizar os parcelamentos ocupados irregularmente e fazer projetos imobiliários para a área vazia. Mas o grupo foi surpreendido pela aprovação da emenda na Câmara Legislativa. Na época, o distrital argumentou que o adensamento urbano da região traria impactos ambientais e transtornos para a comunidade. O governo decidiu vetar o artigo que mantinha a região como rural por critérios técnicos, de acordo com o diretor técnico da Companhia Imobiliária de Brasília (Terracap), Luís Antônio Reis. Ele explica que a área vazia faz parte de um enorme aglomerado urbano consolidado e não há possibilidade de manter a classificação do espaço como rural. “Na região, há condomínios de várias faixas de renda e essas pessoas precisam de parques, comércio e escolas. A área vazia precisa se integrar ao sistema urbano já existente”, justifica Luís Antônio. “Além disso, a implantação de um produto imobiliário diferenciado vai valorizar a região inteira”, acrescenta Reis. O projeto elaborado pela Urbanizadora Paranoazinho S.A. e já apresentado ao governo prevê a construção de prédios, parques e ciclovias. Os edifícios residenciais devem ter entre seis e sete pavimentos. A grande preocupação dos moradores da região com relação ao novo empreendimento é o impacto do adensamento populacional. 1 CORREIO BRAZILIENSE Caderno Cidade – 26/abril/2009 Preocupação A transformação da área vazia em aglomerado urbano é vista com desconfiança pela população que já vive na região. Eles sabem que, saindo do papel, o projeto trará muitos empregos e progresso para a região, que ficaria valorizada. Isso, entretanto, é visto como um problema em potencial porque a regularização incluirá o pagamento dos terrenos para os herdeiros da fazenda Paranoazinho. O valor dos lotes é um temor para moradores como o autônomo Vitor Luiz Dossa Rigoni, 47, que se mudou com a família para o Residencial Morada em 1993. “Paguei pelo meu lote na época e acho injusto ter que pagar de novo, sobretudo se for um preço abusivo. Acho que temos que pagar uma indenização aos herdeiros, mas um valor que não tenha a especulação como norte”, avalia ele. “Acho que vai ser bom para a região a ocupação daquele local, mas o ideal é que isso seja feito independente do processo de regularização”, completou. O trânsito é outra questão que preocupa a comunidade. A DF-150, que corta a região, já sofre muita pressão, assim como a BR-020, que liga Planaltina e Sobradinho ao Plano Piloto. “Se mais 80 mil pessoas forem morar na região com a malha viária atual será o caos”, prevê a presidente da União dos Condomínios Horizontais do DF (Unica), Junia Bittencourt. “Mas o projeto desse empreendimento leva em consideração a construção de uma nova via, que seria opção para a BR-020. Ela sairia ali dos condomínios da região, passaria atrás do condomínio RK e desembocaria no Lago Norte. Seria algo muito bom e o governo já me disse que pretende construí-la”, conclui a líder comunitária. A sanção do Plano Diretor de Ordenamento Territorial vai permitir a criação de 29 novas áreas para habitação no Distrito Federal. Haverá moradia para todas as faixas de renda. O Setor Crixá, em São Sebastião, por exemplo, terá um perfil voltado para a classe média baixa. Já o Setor Noroeste, cujas primeiras projeções já foram lançadas este semestre, é destinado a classe média alta. Os 56 vetos do governador Arruda — incluindo aquele relacionado à área da Paranoazinho — ainda devem passar pela Câmara Legislativa. Os parlamentares podem derrubar vetos do GDF, mas a tendência é que o texto sancionado no último sábado seja mantido. Mutirão para construir casas em Brazlândia F. Gualberto/GDF Moradores de Brazlândia que perderam suas casas em um incêndio no último domingo ganharam um novo lugar para viver. As 423 famílias moravam em uma invasão na quadra 55 da Vila São José e estão sendo assentadas em outros lotes no mesmo local. Ontem o governo organizou um mutirão para construir casas de dois cômodos, banheiro e muro, prontas para serem ampliadas. O governador José Roberto Arruda esteve no local e cobrou pressa na operação. Arruda acompanhou o trabalho de órgãos do GDF e cobrou pressa Segundo ele, a participação de todos os órgãos do GDF é importante para ajudar essas pessoas na busca pelo sonho da casa própria. “São famílias de baixa renda que precisam da 2 CORREIO BRAZILIENSE Caderno Cidade – 26/abril/2009 ajuda do governo e esse sistema de mutirão é o ideal para garantir a construção rápida. Espero que tudo esteja pronto até o fim da semana”, disse ele. O mutirão foi formado por 800 servidores de administrações regionais e órgãos como Terracap, Novacap, CEB, Caesb, Sedest e Codhab que trocaram a folga de domingo pelo trabalho voluntário. Moradores da cidade também ajudaram na construção das casas. A região onde estão sendo construídas as moradias já tem as instalações de águas pluviais, esgoto e iluminação pública. Arruda prometeu asfalto para breve. Agora, as famílias que viviam em uma Área de Proteção Permanente podem desfrutar de uma casa própria. A remoção dessas pessoas estava prevista desde 2007 e ainda não havia sido feita. O incêndio acabou acelerando o processo. Segundo moradores, o fogo que se alastrou rápido pelas casas de madeira e papelão (mas não fez vítimas) foi causado por um curto-circuito em uma das centenas de gambiarras elétricas que existiam no local. (RV) URBANISMO 3 CORREIO BRAZILIENSE Caderno Cidade – 26/abril/2009 Novo visual no Plano Prédios das superquadras estão cada vez mais diferentes da época em que foram construídos: fachadas ganharam cores mais vibrantes e uma nova textura. Tombamento da cidade permite as mudanças Elisa Tecles A menos de um ano do cinquentário, Brasília combina Fotos: Gustavo Moreno/CB/D.A construções originais deixadas pelos candangos com novidades Press propostas pelos atuais habitantes. Prédios do Plano Piloto construídos nas décadas de 1960 e 1970 conservam a estrutura, mas aos poucos ganham cores e formas novas na fachada e no pilotis. O tombamento da capital dá liberdade aos moradores das asas Sul e Norte para modificarem o espaço onde vivem. Com as mudanças nas cores, texturas e materiais dos prédios, o visual original de alguns deles ficou na memória e começaram a aparecer inovações nos blocos. Azul, vermelho e amarelo: o bloco F da 214 Sul chama a O tombamento de Brasília não impede mudanças na fachada ou atenção pela combinação pouco no pilotis, desde que elas não interfiram na volumetria do prédio. comum de cores nas quadras do Plano Piloto. O prédio era Ou seja, não é permitido mexer nas proporções do bloco com o revestido de cinza na década de acréscimo de andares ou varandas não previstos no projeto. O 1960 tombamento da capital federal não é como o de Ouro Preto (MG), ou de algumas áreas de Recife (PE), por exemplo, onde nada pode ser alterado. “Brasília é uma cidade moderna, Lucio Costa sempre foi claro a respeito disso. Ele não queria que mudassem as proporções e a área verde tem que permanecer exatamente com o tamanho que tem. Fora isso, ele não quis engessar ninguém”, explicou o superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Alfredo Gastal. O consenso pela reforma do Bloco F da 216 Sul veio com a queda 216 Sul: moradores trocaram de pedaços dos tijolos aparentes que revestiam a fachada do piso, guarita e toda a fachada do bloco F edifício. Concluído em 1977, o prédio começava a dar problema para os moradores. Depois de reuniões, os condôminos decidiram Jose Varella/CB/D.A Press trocar o piso, as portarias, guarita e toda a fachada do bloco. Eles entraram em acordo pela predominância dos tons de verde no revestimento. Apenas as pilastras de mármore branco foram mantidas, mas ganharam placas de granito preto. “Fizemos o desenho para dar uma identidade. O resto é tudo novo: rampas, corrimão, elevadores”, detalhou o síndico, Dionísio Neto, 60 anos. Wagner, síndico do Bloco C da 210 Sul: características mantidas Varandas Pisos, pilares e fachadas podem ser alterados sem comprometer o prédio, na avaliação da arquiteta Sandra Ribeiro. “O que fere o tombamento é colocar cerca, não preservar o pilotis 4 CORREIO BRAZILIENSE Caderno Cidade – 26/abril/2009 livre para acesso. Ele não impede que você tenha uma boa reforma, modernize o edifício, sem descaracterizá-lo”, opinou. Segundo ela, manter a porcentagem de espaço vazio no pilotis e impedir acréscimos na volumetria, como instalação de varandas, são cuidados necessários para a reforma. A frente do Bloco F da 214 Sul chama a atenção pela combinação de cores pouco comum nas quadras brasilienses: azul, vermelho e amarelo. O edifício foi revestido de cinza na década de 1960, época da construção, e depois disso passou por duas reformas que lhe deram novas cores. Problemas de infiltração e envelhecimento das esquadrias levaram os moradores do prédio a optar pela reforma completa da fachada. As janelas de ferro faziam muito barulho e a água da chuva começava a entrar nos apartamentos. “Para manter um padrão, preferimos trocar tudo junto. Dá trabalho, mas no final todos iam ficar satisfeitos”, explicou o síndico, Reinaldo dos Santos Mello, 55 anos. Com a troca das esquadrias, o fundo do prédio recebeu cerâmica em amarelo claro. Na frente do edifício, as pastilhas cinzas foram trocadas por cerâmica em azul, vermelho e amarelo, ostentando um colorido que destaca a fachada entre todas as outras da quadra. O Bloco K da 311 Sul está na fase final da reforma do pilotis. O tradicional piso preto, que há pouco tempo ainda podia ser visto em vários edifícios da cidade, ganhou cores claras. O condomínio trocou a fachada em vermelho e concreto por pastilhas azuis e beges. O prédio tem mais de 30 anos e sofria com infiltrações e queda de partes do revestimento da fachada. As obras nos edifícios devem ser acompanhadas por um arquiteto ou um engenheiro e registradas no Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do DF (Crea-DF) (veja quadro). “Com esse registro, o profissional é tecnicamente responsável por problemas que venham a surgir com o serviço e as questões podem ser discutidas”, explicou o arquiteto e conselheiro do Crea-DF Osvaldo Pontalti. Preservado Mudar a cara do prédio não está nos planos dos moradores do Bloco C da 210 Sul. O edifício chama a atenção pelos azulejos em azul e branco nas portarias e os arcos de mármore claro que formam jardineiras no pilotis. A construção do prédio foi concluída em 1978, mas a manutenção constante não permite que a fachada aparente a idade que tem. “As pessoas compram apartamentos aqui porque gostaram do que viram. Não pensamos em mudar as características originais”, afirmou o síndico, Wagner Luis Pinto, 63 anos. O ideal de preservação é sustentado pelo estatuto do condomínio, que exige unanimidade em votações relacionadas a mudanças na estrutura do edifício. Manter o visual do prédio exige pintura esporádica das lajotas em relevo, que escurecem com o tempo, além da limpeza dos azulejos. Se alguma peça do revestimento quebra, o condomínio encomenda uma réplica para substituí-la. “Sem manutenção, o prédio perde as características. Isso tem que ser feito, Brasília precisa manter sua memória”, defendeu Wagner. O economiário Márcio Vantil, 55 anos, vive no Bloco C desde 1984 e não pretende se mudar. “Sempre gostei do prédio pela preservação que a gente busca. A estrutura dele tem características modernas, como o concreto, que é bem característico de Brasília”, comentou. 5 CORREIO BRAZILIENSE Caderno Cidade – 26/abril/2009 Segundo ele, esse cuidado se reflete também na valorização dos imóveis do bloco. A preservação do revestimento do prédio pode exigir limpeza, impermeabilização e cuidados com o rejunte, explica a arquiteta Gislaine Garonce. Se ainda assim a opção for pela reforma, é possível manter alguns elementos originais do prédio. “As pastilhas usadas nos prédios são de porcelana, muito resistentes. É só uma questão de lavar, passar um produto. Você pode mandar polir o mármore, fazer a nova paginação aproveitando ele”, disse. O tombamento específico de prédios residenciais do Plano Piloto, que restringiria reformas na parte externa, pode estar a caminho. O Iphan pretende preservar a unidade vizinhança da 308 Sul, que também compreende as quadras 108, 107 e 307 Sul. Dessa forma, os blocos teriam que manter a formatação original. “Estamos tentando fazer o tombamento para que fique uma área protegida. Seria a primeira área”, adiantou o superintendente do Iphan. DÚVIDAS Condomínios que se preparam para uma reforma podem consultar o Crea pelo e-mail [email protected]. O que diz a lei A Lei 6.496, de 1977, criou a Anotação de Responsabilidade Técnica, ou ART, na prestação de serviços de engenharia, arquitetura ou agronomia. Ela é obrigatória inclusive nas reformas de prédios supervisionadas por profissionais da área. A ART contém os dados do contrato firmado entre o profissional e o cliente. Com o registro da obra, os condôminos têm mais segurança para cobrar do responsável caso haja algum problema. 6