CONTRIBUIÇÕES A COMPARTIMENTAÇÃO DO RELEVO DA ILHA

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A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO
DE 9 A 12 DE OUTUBRO
CONTRIBUIÇÕES A COMPARTIMENTAÇÃO DO RELEVO DA ILHA DO
CARDOSO, COM ÊNFASE EM FATORES MORFODINÂMICOS
Pedro Michelutti Cheliz1
Regina Célia de Oliveira2
Resumo: Realizou-se aplicação do nível de tratamento da Compartimentação de
Relevo de Ab`Saber a Ilha do Cardoso, no litoral sul de São Paulo. Após realização de
trabalhos de campo, criação e sobreposição de mapas altimétricos, clinográficos e geológicos propose dividir e caracterizar a Ilha a partir de dois grandes compartimentos, Planícies Costeiras e
Serranias
Mamemolizadas.
Num
segundo
momento
segmentou-se
as
unidades
em
subcompartimentos, tendo para este fim atenção especial a fatores morfodinâmicos predominantes
nos fluxos de matéria vinculados a Ilha. Espera-se que compartimentação proposta possa servir, por
meio de elaboração de cenários pretéritos de distribuição das subunidades, fornecer subsídios para
discussão das oscilações nas condições morfodinâmicas da Ilha ao longo do tempo.
Palavras-chave: geomorfologia litorânea, Região Lagunar Cananéia-Iguapé,
Compartimentação do Relevo
Abstract: Has made implementation of the first level of treatment of relief propused by Ab`Saber relief
to the Cardoso Island, south of São Paulo. After conducting field work, creation and overlay of
elevation, inclination and geological maps the Island has been characterized by the point of view of
two large compartments, Coastal Plains and Diversificate Saws. Secondly it has segmented into sub
units, and for this purpose special attention to prevailing morphodynamic factors in terms of flows
linked to island. It is expected that subdivision proposal can serve, through elaboration of past tenses
scenarios distribution of the subunits, to provide subsidies for discussion of fluctuations in
morphodynamic conditions of the island over time.
Keywords: coastal geomorphology, Cananeia-Iguape Region, geomorphology
1 – Introdução
Aproximando-se do paralelo 25 do litoral brasileiro, massivas silhuetas
erguem-se defronte a linha de costa a partir das águas circundantes. Inserida na
costa sudeste do Brasil e no litoral sul paulista, a Ilha do Cardoso e seu relevo se
1
Núcleo de Estudos Ambientais e Litorâneos, Departamento de Geografia, Instituto de Geociências
da UNICAMP (IG-UNICAMP)
2
Núcleo de Estudos Ambientais e Litorâneos, Departamento de Geografia, Instituto de Geociências
da UNICAMP (IG-UNICAMP)
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destacam rapidamente mesmo numa análise inicial do chamado Complexo Lagunar
Cananéia-Iguapé (Besnard, 1956). Constituída por pouco mais de uma centena de
quilômetros quadrados de extensões emersas, realça-se em diversas escalas e
pontos de observações possíveis. De estudiosos que analisam o Litoral Sul das mais
elevadas alturas do firmamento por imagens de aeronaves e satélites, à navegantes
que em pequenas embarcações lançam seus olhares ao horizonte. A figura
imponente da Ilha se faz presente já há milhares de metros de distância. Rompe
aparente suavidade do relevo local alçando-se centenas de metros aos céus através
de monumentais escarpas rochosas, em meio às vastas planícies rentes ao oceano e
águas lagunares.
As amplas Serranias recobertas por matas atlânticas e as Planícies
Costeiras arenosas e suas florestas de restinga, manguezais e campos de dunas
consolidam sua posição no contexto regional. Firma-se como massivo anteparo que
resguarda as águas plácidas da Região Lagunar da inclemente ação das forças do
Oceano Atlântico. Movimentado relevo da Ilha constituiu ainda referencial natural
para a navegação no tempo histórico - das frágeis embarcações dos ancestrais
homens de sambaqui as imponentes caravelas coloniais. Dos densos navios de
cabotagem a vapor às criativas e ágeis canoas e barcos caiçaras. Cumpriu
longamente o papel de selar o limite meridional do Litoral Sul, servindo-lhe de marco
terminal natural (Souza, 2011).
Usualmente é tida como resquício de um anteriormente mais vasto
contraforte litorâneo. Violentas tempestades subtropicais, potentes vagas e ressacas
marinhas, intensas correntes de vento, oscilantes regimes fluvio-marinhos, processos
paleoclimáticos
e
mesmo
longínquos
terremotos
derruíram
amplamente
o
embasamento rochoso original da Ilha. Em conjunto ou alternadamente exumaram
profundezas plutônicas sieníticas do edifício ígneo primordial e trouxeram a tona
litologias de distintas fácies metamórficas, cujos reminiscentes formam as escarpas
centrais da Ilha. Contribuíram ainda para criar espaço de acomodação suficiente para
deposição de extensos depósitos sedimentares inconsolidados em planícies e
cordões litorâneos que bordejam as escarpas centrais.
O Dinamismo da geomorfogênese na Ilha se manifesta também no tempo
histórico, particularmente através de ativos e dinâmicos processos de sedimentação
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e erosão marinhas. A intensidade destes processos é tal que foi capaz de promover
no espaço de décadas registro de progradações e retrogradações da linha de costa
que podem atingir dezenas de metros de magnitude em planta (Tesler e Suguio,
1990). Ao longo dos últimos anos vem se registrando novos episódios desta
dinâmica em áreas que permaneceram até então sob agradação, evidenciados entre
outros por ação erosiva agressiva em setores diversos das Planícies Costeiras da
Ilha.
Ao analisar tais processos, Mialy e Agudo (2002) e Ângulo, Sousa e Muller
(2007)
sustentam que envolvem magnitudes sem precedentes dentre o registro
histórico. Defendem ainda que tais processos levarão à mudanças radicais no
traçado dos bordos da Ilha e mesmo a rupturas na continuidade das próprias
Planícies Costeiras. Gouveia (2012) por sua vez defende que os processos atuais
podem ser compreendidos como inseridos dentro da magnitude registradas no tempo
histórico para episódios pretéritos.
Diante deste contexto, o presente trabalho busca realizar estudo
geomórfológico da Ilha do Cardoso a partir da proposta tríade de Ab’SAber (1969),
com
foco
no
nível
de
tratamento
da
compartimentação
do
relevo.
A
Compartimentação da Paisagem visa através de uma sobreposição da análise das
bases geológicas e morfométricas, delimitar unidades geomórficas relativamente
homogêneas. No caso específico do presente trabalho procurou-se, sobretudo para
definição dos sub-compartimentos de relevo, dar um peso especial não somente para
atributos altimétricos, morfométricos e da balização litológica como também
destacar processos morfodinâmicos predominantes. O presente texto apresentará
resultados parciais e discussões vinculadas a compartimentação de relevo da Ilha,
ligado a projeto de mestrado em desenvolvimento no Instituto de Geociências da
UNICAMP.
2 – Desenvolvimento
Com base na sobreposição dos modelos digitais de terreno, mapas
clinográficos, altimétricos, geológicos, vegetacionais e trabalhos de campo
realizados foram delimitados dois grandes compartimentos de relevo, as Planícies
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Costeiras
e
Serranias
Mamemolizadas.
Seus
atributos
sumários,
e
sub-
compartimentos associados, são a seguir apresentados.
Numa análise inicial as Planícies Costeiras da Ilha do Cardoso parecem
não revelar diferenças significativas de outras unidades geomórficas similares que
pautam o litoral do Complexo Lagunar de Cananéia e mesmo do litoral sudeste
brasileiro nos locais onde prevalecem Planícies Costeiras areno-argilosas. As
condições geológicas, topográficas e vegetacionais inicialmente parecem pouco
diferir dos padrões usuais médios para estas áreas. Envolvem extensões de
depósitos sedimentares areno-argilosos e/ou coberturas de alteração deles
derivadas contidos entre 0 e 20 metros acima do mar, gradando da linha de costa
para os sopés das Serranias através de declividades suavizadas e raramente
superiores a cinco graus. De maneira similar a outros segmentos em que
predominam planícies costeiras sedimentares encontram-se marcados pela
alternância de formas de detalhe que incluem praias arenosas, planícies alagáveis,
terraços marinhos, fluviais e flúvio marinhos. Seus conjuntos geomórficos, depósitos
sedimentares e coberturas de alteração encontram-se superimpostos a associações
vegetais também características do litoral sudeste brasileiro,
Das matas das
restingas associadas a seus cordões arenosos aos manguezais ligadas aos
depósitos argilosos periodicamente alagados, das associações diversificadas
instaladas em campos de dunas a vegetação hidrófila instalada em microdepressões permanentemente encharcadas.
Numa abordagem de maior aprofundamento porém realçam-se algumas
peculiaridades significativas das Planícies Costeiras da Ilha do Cardoso em relação
a maioria das unidades geomórficas semelhantes do litoral do Brasil Sudeste. Uma
delas envolve o caráter relativamente delgado dos depósitos sedimentares que
constituem o substrato básico de suas paisagens. Enquanto em áreas como a
Baixada Santista ou mesmo na adjacente Ilha Comprida existem registros de
sondagens de subsuperfície e/ou estudos geofísicos que bancos sedimentares
atingem a magnitude de centenas de metros de espessura antes de encontram o
substrato rochoso, na Ilha do Cardoso dados similares apontam que a espessura
dos estratos areno-argilosos dificilmente atingem vinte metros (Karman et al, 1999).
Registram-se mesmo entre os pescadores da Ilha na desembocadura de muitos dos
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rios que cruzam as Planícies rumo a laguna, dificuldade para deslocamento mesmo
de pequenos barcos ante lâminas rochosas do assoalho que se sobresaem em meio
a cobertura sedimentar. Caráter delgado das planícies possivelmente encontra-se
associado a níveis erosionais esculpidos por condições morfodinâmicas e climáticas
pretérias, enquanto o caráter espesso da maior parte das Planícies do litoral sudeste
encontram-se ligadas ao expressivo rejeito das bacias sedimentares cenozóicas
costeiras.
As Planícies da Ilha também se realçam por estarem simultaneamente em
exposição a fatores morfodinâmicos significativamente diversos. Seus segmentos
nortistas encontram-se resguardado da ação direta das fortes vagas, ventos e
correntes do oceano atlânticos devido estarem a retaguarda do anteparo rochoso
representado pelas Serranias da Ilha. Já seus segmentos a sul encontram-se
expostas diretamente a intensa ação morfodinâmica atlântica, enquanto os canais
de Ararapira a Oeste e a Barra de Cananéia apresentam aspectos particularizados
ao perfarezerem a transição e troca de fluxo e energia entre a região lagunar e o
mar aberto. Tal diferenciação já é significativa para as Serranias e seus conjuntos
rochosos de maior resistência a ação marinha. Para as Planícies, e seus mais
facilmente desagregados e remobilizáveis cordões sedimentares, esta exposição a
diversificados fatores morfodinâmicos adquirem maior centralidade e constituem
fator central ao ser levado em conta na análise de seus atributos geomórficos.
As Planícies Costeiras abrangem predominantemente formas de relevo
semi-aplainadas associadas a depósitos sedimentares arenosos inconsolidados e a
cotas altimétricas entre 0 e 20 metros, perfazendo cerca de 38%. da Ilha do
Cardoso. Distribuem-se ao longo de praticamente todas as bordas da Ilha a partir
dos sopés das Serranias Mamelolizadas em diversificadas extensões. Enquanto em
múltiplos setores ao sul da Ilha elas não cheguem a perfazer um quilômetro em
planta a partir da linha de costa antes de darem lugar as Serranias em múltiplos
segmentos a norte, particularmente no nordeste da Ilha, chegam facilmente a
perfazerem cinco quilômetros de distanciamento entre o Complexo Ígneo-Central e a
Baia Interna.
Uma observação apressada aponta para as Planícies Costeiras uma
aparente homogeneidade morfológica, em oposição aos marcantes contrastes
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paisagísticos das Serras Mamelonizadas.
Analisando-se com maior rigor porém
nota-se uma série de sutis mas importantes quadros de diferenciação internas.
Heterogeneidades pautadas sobretudo por diferentes exposições aos diversificados
mecanismos das dinâmicas fluviais, marinhas e eólicas e distintas legados herdados
da dinâmica paleoambiental quaternária. Nesta linha de raciocínio pode-se
segmentar as Planícies em sete subunidades de relevo, dentro do que Ross (1992)
chama de morfoescultura: Planícies Alagáveis, Praias Atuais, Cordões Litorâneos
Frontais, Morros Residuais, Cordões Litorâneos Intermediários e Cordões Litorâneos
Elevados. As quatro primeiras subunidades encontram-se atualmente sob influência
direta de variações cíclicas das marés enquanto as duas últimas encontram-se
majoritariamente resguardada da ação cíclica das águas salobras oceânicas (Petri,
Suguio, 1971).
As praias atuais constituem de material majoritariamente arenoso, sem
cobertura vegetal e raramente excede a altimétria de 3 metros. Encontram-se
expostas diretamente a ação da maré e, no segmento sul, a ação de arrebatenção
de ondas atlânticas. No segmento norte da Ilha apresentam extensão em planta
média de 30 metros enquanto no segmento sul podem exceder 100 metros em
vários trechos. As Planícies Alagáveis são formadas por predomínio de material
argiloso, altimétria raramente superior a 3 metros e podem ser recobertas por águas
salobras por ocasião das marés mais elevadas, sendo pautadas pela fixação de
ecossistemas de Manguezal. Os Cordões Litorâneos Frontais apresentam cobertura
de material arenoso e presença de neossolos, sustentando ecossistemas de
Restinga Aberto pautado pelo predomínio de gramíneas e vegetação arbustiva com
raridade ou ausência de estratos arbóreos. Altimetria oscila entre 2 e 6 metros acima
do nível marítimo atual. São ocasionalmente cobertos pelas lâminas de água
oceânica pela ocasião da sobreposição de marés mais elevadas e tempestades
marítimas intensas. Morros Residuais são constituídos por reminiscentes isolados do
embasamento ígneo-metamórfico que compõe as Serranias, pautando-se por
altimetrias que podem superar 50 metros, declividades médias de 20 graus e
vertentes mamemolizadas com bases marcadas por solapamento e estreitos
terraços decorretes da ação marinha.
Os Cordões Litorâneos Intermediários por sua vez encontram-se contidos
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majoritariamente entre as cotas de 6 e 10 metros acima do nível marítimo. Pautamse pelo predomínio arenoso e ocorrência de neossolos, sustentando ecossistemas
de maior biomassa que os anteriores englobando a Restinga Baixa, pautada pela
presença mais intensa de estratos arbóreos e predomínio de bromélias. Os Cordões
Litorâneos Elevados encontram-se majoritariamente contido nas cotas entre 10 e 20
metros, também de predomínio arenoso pautado pela presença de espodossolos e
vegetação de Restinga Alta marcada por estratos arbóreos mais elevado e menor
presença das bromélias.
Já Serranias Mamemolizadas trata-se da unidade paisagística de maior
destaque na Ilha, tanto em área total quanto em expressão visual. Suas
monumentais escarpas são visíveis a quilômetros de distância, alçando-se
subitamente centenas de metros rumo aos céus em contraste fragrante com as
Planícies praticamente rentes ao oceano que as bordejam. As Serranias
Mamemolizadas associam-se a conjunto de vertentes de média e alta declividade
bem como a interflúvios e remanescentes residuais dispersos ligados ao complexo
ígneo-metamórfico central da Ilha, abrangendo predominantemente os intervalos de
cotas altimétricas entre 20 e 700 metros e cerca de 62% da extensão total da Ilha.
A ascensão altimétrica das Serranias é tão brusca e o contraste com as
circunvizinhanças tão intenso que compromete a sua própria estabilidade mesmo
na escala temporal humana. A maior parte de sua extensão corresponde a
destroços reliquiares acumulados de um pretérito muito mais expressivo conjunto de
picos e serras. As violentas tempestades torrenciais que abatem-se sobre as
íngremes serranias as fazem com frequência entrarem em colapso, num processo
constante de destruição e remobilização por meio de enérgicos movimentos de
massa. Suas escarpas erguem-se em meio as gigantescas e espessas pilhas de
escombros do edifício rochoso original. Os amplos vales sulcados pelas vertentes
que a dissecam encontram-se escavados em meio a amplos depósitos de blocos
rochosos originados de fluxos gravitacionais
As escarpas da Serra do Mar e mesmo de várias outras Ilhas Continentais
e Oceânicas do litoral brasileiro se apresentam predominantemente na forma de
rebordos de extensos planaltos. Mesmo escarpas de Ilhas expostas a ação de
climas semi-áridos e com grande heterogeneidade litológica como Trindade
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(Almeida, 1964) mostram-se frequentemente como bordos de extensos planaltos
elevados e semi-aplainados. Na Ilha do Cardoso tal organização morfológica ocorre
de maneira distinta. Suas maiores atitudes não encontram-se correlacionadas a
unidades de planaltos mas sim a enxutos alinhamentos descontínuos de enxutos
interflúvios graníticos. Picos estes que por vezes se mostram em formatos
pontiagudos desnudos similares aos designados como “Dedo de Deus” por Ab’Saber
(1954), blocos graniticos maciços despidos de sua cobertura regolítica pretérita em
forma de setas mamelonizadas cortando as nuvens mais rebaixadas vindas do
oceano profundo. Tal alinhamento de altos picos se mostra alinhados em direção
predominante SW-NE, atingindo altimetria de 720 metros no segmento mais a
sudoeste e em intensidade assimétrica decresce em atitude até a extremidade leste,
onde se limita pela cota de 480 metros e apresenta inflexão aproximando-se da
direção W-E.
Nos segmentos proximais ao extremo sudoeste do alinhamento os
interflúvios enxutos se mostram mais contínuos, chegando a apresentarem
distâncias horizontais de vários quilômetros em que a variação de altitude não
excede 40 metros. Já nos segmentos mais próximos a extremidade leste a
continuidade dos alinhamentos é comprometida. Múltiplas das vertentes dos canais
que seccionam seus bordam mostram-se recuadas em relação a seus segmentos a
este, com os vales das cabeceiras da rede de drenagem logrando seccionar o
alinhamento de interflúvios. Em verdade é justamente na extremidade leste que se
se mostra com mais frequência os picos agudos do tipo “Dedo de Deus”,
praticamente ausentes no segmento oeste das Serranias.
A sul e a norte a partir deste alinhamento elevado de picos se mostram os
conjuntos mais prominentes de escarpas. Elas salientam-se a navegantes que
aproximam-se da Ilha vindos de qualquer direção pelo aspecto de muralhas
massivas. Tais conjuntos pautam-se onduladas pelas extensas vertentes que as
cortam, em canais principais de direção predominante próxima do N-S e com
distâncias médias entre os enxutos interflúvios de mais de 2 quilômetros. Os
conjuntos de escarpas encontram-se expostas a intensidades de ação marinha e
superimpostas a ossaturas geológicas bastante distintas. O conjunto de escarpas a
sul dos altos picos mostram-se voltadas para o mar aberto, sendo vários de seus
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trechos bordejados diretamente pelo Oceano Atlântico, sobrepondo-se a um
conjunto diversificado de rochas graníticas. As que desenvolvem-se a norte
encontram-se voltadas predominantemente para as menos agitadas águas
lagunares, e mostram-se num conjunto litológico de maior diversificação. Nas cotas
topográficas mais elevadas também mostram-se sobrepostas a litologias graníticas
mas nas altitudes intermediárias e inferiores estão associadas a heterogêneo
conjunto de rochas metamórficas, desde mica-quartzo xistos rosas que predominam
nas cotas mais rebaixadas até quartzo-mica xistos que mostram-se com mais
frequência nas cotas intermediárias (Karmann, Dias Netos e Weber, 1999).
Encontram-se nas Serranias inúmeros registros de anomalias e
heterogeneidades morfológicas nos segmentos sul e norte. No segmento norte as
declividades médias e o arrasamento dos interflúvios é reduzido quando comparado
ao segmento sul – no segmento sul chegam a se registrar padrões dentífricos de
drenagem enquanto no segmento norte encontra-se unicamente o padrão
retangular. Registra-se também maior presença de interflúvios em cotas topográficas
intermediárias preservados quando comparado ao segmento sul. Registram-se
ainda número significativo de anomalias em vertentes principalmente nas direções
Leste-Oeste e Noroeste-Sudeste, sendo as vertentes voltadas para norte com
inclinações por vezes até 50 graus superiores as voltadas para sul.
Tais heterogeneidades surpreendem numa primeira análise pois diante da
distribuição litológica seria justamente o contrário o esperado. Os sienitos ao sul
apresentam resistência ao intemperismo mecânico e químico muito maior do que o
conjunto de rochas metamórficas ao norte, de forma que favoreceriam um
arrasamento maior dos interflúvios no segmento voltado para a Baia de Paranaguá e
não no direcionado diretamente ao Oceano Atlântico. Aponta-se assim a influência
de outros fatores que estão se sobrepondo a influência litológica, que podem incluir
em intensidades diversificadas deformações rúpteis e/ou dúcteis e a exposição
diferenciada a aumentos da energia erosiva por ocasião das mudanças de base que
acompanharam oscilações marítimas pretéritas.
Interessante também notar que embora existam amplos setores com
declividades médias elevadas estas são amplamente inferiores as dos conjuntos
serranos continentais a pouco mais de uma dezena de quilômetros a norte da Ilha
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como a Serra do Aleixo Enquanto os contornos dos mencionados alinhamentos
serranos são profundamente salientes e dissecados – com predomínio de
inclinações acima de 50 graus em suas vertentes - as escarpas da Ilha apresentamse comparativamente relativamente suavizadas, tendo apenas 10% de suas
extensões com inclinações superiores a 30 graus. Simultaneamente suas cotas
altimétricas mais elevadas são relativamente próximas do registrado nas serranias
continentais – os picos altimétricos da Ilha se aproximam dos 800 metros enquanto
na Serra do Aleixo chegam a pouco mais de 900 e na de Ipitangui próximo dos 700
metros. A despeito de sua ampla diversidade de formas ela pode ser dividida em 3
compartimentos de relevo: Altos Interflúvios e Vertentes, Média Vertentes e Baixas
Vertentes.
Os Altos Interflúvios e Vertentes perfazem as cotas altimétricas mais
elevadas da Ilha, estando contidos majoritariamente entre 400 e 720 metros.
Pautam-se também por elevadas inclinações médias, que superam 40 graus.
Registra-se o predomínio de processos erosivos - notadamente o fornecimento de
detritos para movimentos de massas em episódios de intensa pluviosidade - estando
praticamente ausentes a presença de blocos de rochas. Há que exclusivamente
afloramentos de rocha expostas. As Médias Vertentes majoritariamente encontramse contidas nas altimetrias entre 200 e 400 metros, pautando-se por inclinações
médias que superam os 30 graus em geral tanto mais intensas quanto maior a
altimetria. Caracterizam-se pela atuação tanto de processos erosivos de movimento
de massa quanto pela sedimentação decorrente dos mesmos processos, com
granulometria média dos blocos de rocha que recobrem os canais e encostas
oscilando entre 40 centimétricos e 5 metros sendo elevação dos valores médios
controlados também pelo crescimento da altimetria. As Baixas Vertentes encontramse inseridas primordialmente entre as cotas de 20 e 200 metros, dominando
inclinações que oscilam entre 10 e 30 graus. Prevalecem nelas os processos de
sedimentação associada aos movimentos de massa com granulometria média entre
10 e 30 centímetros dos blocos rochosos que recobrem os canais fluviais.
Ao se delimitar as unidades na compartimentação da paisagem procurouse realizar especial ênfase na identificação dos processos morfodinâmicos
dominantes em cada uma delas. Tal intuito se fez dentre outros motivos devido a
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intensa variação espacial que se registra ao longo do tempo das formas de relevo,
sobretudo as ligadas a Planícies Costeiras. Pretende-se em etapas posteriores da
pesquisa aprofundar a caracterização das unidades de relevo delimitadas através de
procedimentos como a análise laboratorial petrográfica, química e granulométrica de
amostras de sedimentos, solos e rochas recolhidas. Busca-se também em momento
posterior identificar, fotografias aéreas e imagens de satélite, padrões texturais e
assinaturas espectrais das unidades de relevo identificadas e caracterizadas,. Tal
procedimento tem o fim de permitir por meio de imagens aéreas identificação do
padrão de distribuição de unidades de relevo em diferentes períodos. Tal prática é
buscada sobretudo por cada unidade de relevo identificada encontra-se relacionada
a determinados processos morfodinâmicos predominantes. Espera-se ao fim do
processo poder analisar assim não somente a mudança temporal na distribuição das
formas de relevo mas também do predomínio dos processos responsáveis pela
geração das unidades geomórficas.
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