CAROLINE ANDRÉIA GARRIDO MAROLA O TEATRO NA EDUCAÇÃO FORMAL: PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS X TEÓRICOS DO ENSINO DE TEATRO Trabalho de Conclusão de Curso apresentada como exigência para obtenção do Título de Especialista em Educação e Psicopedagogia, ao Programa de Pós-Graduação na Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas, Pontifícia Universidade Católica de Campinas. Orientador: Prof(a). Dr(a). Maria Silvia P. L. da Rocha PUC-CAMPINAS 2007 À Maria do Carmo Corrêa Stein Dias que me ensinou, na prática, o valor do ensino do teatro e “a dor e o prazer” de contribuir para a formação de uma sociedade mais humana. A minha mãe, Geni, exemplo de amor e força. Ao meu pai, Sérgio, exemplo de dedicação e persistência. AGRADECIMENTOS O processo, de pensamento e construção deste trabalho, foi penoso pelo conflito entre o pouco tempo para estudo e aprofundamento e o muito interesse e respeito ao tema escolhido. Por terem compartilhado desse sentimento e da troca de idéias, agradeço a minha turma da Especialização em Educação e Psicopedagogia, em especial à Maria do Carmo J. Lencioni que, muitas vezes, me acalmou com a certeza de que fazia um bom trabalho (mesmo sem tê-lo lido) e a João Batista que, com bom humor, se tornou meu parceiro nas dificuldades com o calendário. A minha família pela ajuda e paciência, pela contribuição na administração do meu tempo e pela preocupação amorosa com minha saúde física e mental – “meus parafusos continuam no lugar”! Ao meu marido Yuri pelos desafios a minha concentração e a minha gramática. Aos meus professores pela sabedoria, experiência, desprendimento e prazer em ensinar, principalmente ao Nino e à Maria Silvia que me instigaram com a abertura de novos horizontes de conhecimento. Agradeço, sobretudo, aqueles profissionais da educação que, mesmo com as dificuldades e estímulos negativos que encontram ao longo da estrada do ensino, continuam trabalhando com responsabilidade, respeito e dignidade. RESUMO Trabalho de Conclusão de Curso de Especialização em Educação e Psicopedagogia, trata-se de pesquisa documental que busca abrir a discussão em torno do ensino do teatro na educação formal da maneira como é proposto pelos Parâmetros Curriculares Nacionais para Ensino Fundamental e para Ensino Médio. As propostas encontradas nesses documentos são debatidas com base em textos fundamentais de grandes teóricos do ensino do teatro. Os temas principais para discussão são: o conteúdo a ser ensinado e de que maneira e com que profundidade fazê-lo, como são tratados os aspectos sócio-culturais e, se há uma visão interdisciplinar no seu ensino. Trazer ao conhecimento do profissional da educação a importância do contato com tais documentos do Ministério da Educação e do desenvolvimento de uma visão crítica e embasada quando da leitura dos mesmos. Aberta a discussão pode-se reavaliar as práticas de ensino nas escolas em torno da disciplina Arte e, principalmente, da revalidação dos trabalhos de teatro – como linguagem de ampla comunicabilidade, rica em especificidades e que faz parte da História e do desenvolvimento humano. Termos de indexação: arte-educação, teatro, Parâmetros Curriculares Nacionais. ABSTRACT Work of Conclusion to the Development Course in Education and Psychopedagogy is about documentary research that it search to open the quarrel around the teach of the theatre in the formal education in the way as it is considered by the National Curricular Parameters for Fundamental Education and High School. The proposals found in these documents are debated on the basis of basic texts of great theoreticians of the education of the theatre. The main subjects for quarrel are: to be taught content and how and with that depth to make it, as is treated the partnercultural aspects and, if has an interdisciplinary vision in its education. To bring to the knowledge of the professional of the education the importance of the contact with such documents of the Ministry of the Education and the development of a critical and based vision when of the reading of the same ones. Opened the quarrel it can be reevaluated the practical ones of education in the schools around disciplines Art and, mainly, of the revalidation of the theatre works – as language of ample communicability, rich in specificities and that it is part of History and the human development. Index terms: art-education, theatre, National Curricular Parameters. SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO 2. BASE TEÓRICA 2.1. Teoria sócio-cultural do desenvolvimento humano 2.2. Os autores 2.3. Histórico do Teatro na escola 2.4. Os conteúdos do ensino de Teatro 2.5. Aspectos sociais e culturais de seu ensino 2.6. A Interdisciplinaridade 2.7. Comentário 3. METODOLOGIA 4. RESULTADOS 4.1. PCNs Arte – Ensino Fundamental 4.2. PCNs Arte – Ensino Médio 4.3. Análise Comparativa dos PCNs 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 7. BIBLIOGRAFIA DE APOIO 1. INTRODUÇÃO Durante minha experiência como professora de Arte da Rede Estadual de Ensino, notei uma grande dificuldade entre os profissionais da educação para definir, orientar e compreender o ensino da disciplina em questão. O teatro faz parte dos conteúdos de Arte e sempre foi tido como atividade de livre criação, instrumento de ilustração de outras disciplinas, ou mesmo parte fundamental das festas de fim de ano. O enfoque dessa pesquisa foi esclarecer, partindo de leitura atenta dos Parâmetros Curriculares Nacionais, o verdadeiro valor atribuído ao ensino do teatro dentro da disciplina Arte e dentro da escola, como se propõe sua relação com as demais disciplinas e a forma e conteúdo a serem trabalhados, segundo propostas do MEC. Partindo da história do ensino da Arte nas escolas brasileiras e através de autores citados nos próprios PCNs, pude verificar os equívocos e avanços das propostas dirigidas aos professores. Por meio dessa discussão, a intenção é a de propiciar informação e instigar o senso crítico dos professores para que esses possam buscar novos parâmetros no processo de ensino-aprendizagem na área. A idéia é levantar um debate em relação às propostas do Governo e às bases do pensamento do teatro na educação. Sanando algumas dúvidas e trazendo novos questionamentos, esperamos contribuir para impulsionar a ação do professor. Os textos tradicionais da teoria do teatro nos propõem uma visão sobre a importância do teatro na educação e na formação do indivíduo ora com base em Piaget, ora com base em Vygotsky. Tomando por base as idéias gerais a teoria sócio-cultural de desenvolvimento humano, pude explorar as principais visões e interpretações de seu ensino. Porém, a grande preocupação aqui foi valorizar a visão dos teóricos e educadores da área do teatro que puderam, em seu trajeto de pesquisa desenvolver um forte laço com a prática, já que essa se torna imprescindível para a compreensão ampla dessa área de conhecimento. Mesmo trabalhando como professora de Arte há cerca de cinco anos, nunca tive oportunidade de discutir com meus colegas de área os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental e para o Ensino Médio - textos base para um adequado planejamento escolar. Essa prática de não discussão de documentos fundamentais na estruturação do sistema de ensino é semelhante em todas as escolas, talvez pelo texto apresentar uma visão distanciada da realidade escolar, talvez pela pouca acessibilidade ao material, talvez por falta de interesse das principais partes envolvidas no bom andamento do ensino – o professor, os gestores (diretores e coordenadores) e o próprio governo. O desafio de trazer à tona um texto praticamente morto fez com que minha pesquisa se voltasse para o público interessado no ensino de Arte, e em especial do teatro. A análise dos PCNs foi feita com base em três critérios fundamentais: • conteúdos a serem trabalhados no ensino de Teatro, destacando a profundidade e a complexidade dos mesmos; • aspectos sociais e culturais vinculados ao seu ensino; • interdisciplinaridade, como e a que disciplinas o teatro pode e/ou deve ser trabalhado. Tais pontos são fundamentais para prática do professor: o que, como e por que trabalhar o teatro dentro da escola são questões a serem refletidas a partir da leitura desse texto. Espero que a discussão chegue às Reuniões Pedagógicas nas unidades de ensino, para que o ensino de teatro possa ter o alcance que ao longo da história da humanidade esta arte mostrou ter. 2. BASE TEÓRICA O trabalho foi embasado nas teorias dos grandes escritores sobre teatro e educação: Viola Spolin, Richard Courtney e Ingrid Koudela. Traçarei de início alguns dados fundamentais da biografia dos autores escolhidos e aí será possível encontrar os motivos que me levaram a escolhê-los. De antemão, é bom que se saiba que estes são autores explorados pelos próprios teóricos da educação no Estado de São Paulo, constando da Bibliografia dos Parâmetros Curriculares Nacionais aqui trabalhados. Para que possamos compreender e discutir as idéias principais desses teóricos é importante que conheçamos um pouco as bases de pensamento sobre o desenvolvimento humano que mais aparecem nesses textos. Para tanto será apresentada, primeiramente, um breve resumo sobre a teoria sócio-cultural do desenvolvimento humano que tem como seu principal teórico Vygotsky. Em cada tópico apresentado serão colocadas as principais idéias desses pensadores. 2.1 Teoria sócio-cultural do desenvolvimento humano Vygotsky teve uma ampla visão da relação entre o homem e a sociedade, partindo da idéia de que as questões sociais são fundamentais na formação intelectual e da personalidade humana. Ao nascer a criança começa a ter indícios de que é o outro que atenderá em suas necessidades básicas. Na observação dos que estão a sua volta capta as primeiras regras da comunicação – existe uma organização: enquanto um fala o outro espera e só após o término da fala do primeiro, o segundo se manifesta. Através de um conjunto de sinais e de esboços de fala, vai percebendo uma coerência entre sinais dados e respostas recebidas. Nesse processo se inicia o desenvolvimento da linguagem e da aquisição da cultura – entende-se por cultura todo o repertório de vivências e atividades específicas de cada comunidade regida por regras implícitas e próprias para o bem social. As pessoas se desenvolvem como participantes das comunidades culturais. Seu desenvolvimento só pode ser compreendido à luz das práticas e das circunstâncias culturais de suas comunidades, as quais também mudam (ROGOFF, 2005, p.15). O desenvolvimento da linguagem é ponto crucial para o desenvolvimento psicológico saudável segundo a teoria histórico-cultural. Luria, outro importante teórico deste pensamento, esclarece em muitos dos seus estudos o valor da palavra no desenvolvimento humano: “a palavra codifica nossas experiências” (LURIA, 1987 apud ROCHA, 2000). A transmissão e o aprofundamento da história social e cultural de um povo e de toda a humanidade só são possíveis através da palavra, sendo ela o grande diferencial entre humanos e outros animais. L.S. Vygotsky ligou a questão do desenvolvimento da palavra com a do desenvolvimento da consciência. Para ele, a palavra constitui-se em um aparelho que reflete o mundo externo em seus enlaces e relações (LURIA, 1987 apud ROCHA, 2000). Acredita-se que a palavra surge, na história da humanidade, vinculada às práticas laborais. Com o intuito de organizar o trabalho e suas etapas dentro de um grupo, o homem foi criando uma linguagem própria, nomeando os objetos e ações envolvidas em cada processo. Durante muitas gerações o caráter simpráxico da palavra era suficiente para o desenvolvimento da comunicação social, até porque os grupos eram extremamente pequenos, fechados e ligados a um tipo específico de atividade prática – todas aquelas envolvidas na sobrevivência. As comunidades foram se ampliando e diversificaram-se as atividades: as atividades e funções se tornaram tanto mais complexas quanto pôde o homem se comunicar e organizar em sociedade. Aí, já era possível encontrar a crença e os rituais que utilizavam da linguagem verbal e não-verbal – danças, gestos, representações – para a comunicação com os “deuses”. Portanto, a importância da palavra está na origem das atividades coletivas e das funções sociais, sem o conhecimento da linguagem e a comunicação entre os pares a organização social e o desenvolvimento da “idéia” não existiriam. O desenvolvimento psicológico do homem se tornou mais complexo à medida que a linguagem passou de um caráter simpráxico para um caráter sinsemântico – aquele no qual a palavra carrega, não apenas a imagem do objeto, mas todo o contexto em que o objeto está inserido dentro de uma multiplicidade de significados e outros contextos. Com a aparição da linguagem como sistema de códigos o homem adquire algo assim como uma nova dimensão da consciência, nele se formam imagens subjetivas do mundo objetivo que são dirigíveis. Isto consiste na principal conquista que o homem obtém com a linguagem (LURIA, 1987 apud ROCHA, 2000). Então, o homem tem na palavra, na linguagem, o carro chefe de seu desenvolvimento. Através da linguagem o aprendizado de novas habilidades se torna possível; a linguagem corporal, que no início do desenvolvimento da criança é fundamental, acompanha o homem em toda sua história pessoal. No princípio o ato de apontar o objeto e pronunciar um som faz com que a criança promova uma ligação direta, ela se apossa do gesto, balbuciando, para se comunicar com o outro, e só após a maturação de seu aparelho vocal é capaz de dominar e utilizar apenas a palavra. Para que o desenvolvimento da criança se concretize é imprescindível a interferência de um parceiro mais experiente. De acordo com a teoria históricocultural o ser humano é um potencial aprendiz e o será ao longo de sua história pessoal podendo ou não desenvolver habilidades e conhecimentos de acordo com seu interesse real e o auxílio de outro que já tenha desenvolvido tal conhecimento. Vygotsky já definia através dessa idéia o papel fundamental do aprendizado, tanto formal como informal, para o desenvolvimento psicológico humano: O aprendizado é mais do que a aquisição de capacidade para pensar; é a aquisição de muitas capacidades especializadas para pensar sobre várias coisas (VYGOTSKY, 1994, p.108). Todavia é no aprendizado formal, ou escolar, que se focaliza a questão, pois se percebe a importância do ser parceiro ao desenvolvimento do sujeito estar consciente de seu papel e estar preparado para refletir, reavaliar e redefinir sua função no processo. O pensamento anterior espelha o que diz Smolka (1989): A atividade mental é assim mediada, e essa mediação impregna cada movimento, cada ato humano, constituindo a dimensão sígnica e significativa da experiência humana (SMOLKA, 1989 apud ROCHA, 2000, p.38). Fica claro que qualquer vivência social pode trazer à criança uma possibilidade de desenvolvimento real à medida que convive com adultos, crianças mais velhas ou mais experientes e estão em constante desafio frente ao mundo de descobertas motoras e intelectuais. Porém, vem se discutir o papel de um mediador especializado: o professor ou educador. Somando à sistematização da mediação do educador está a forma explícita de suas interferências, deixando claro à criança a prontidão e preparo desse mediador. Cito acima o preparo e prontidão pois faz parte indissociável do aprendizado da criança o envolvimento desta com o que é proposto, ou seja, para que a criança de fato aprenda e se desenvolva é necessário que haja um interesse real e esta se envolva com o processo de aprendizagem. Nesse contexto é imprescindível que o educador esteja pronto e preparado para uma suposta investigação da própria criança, ou que pelo seu preparo possa identificar os reais interesses de um determinado grupo de crianças. Na citação a seguir pode-se tomar como exemplo o brinquedo (o brincar) tido como ponto de partida para a análise e esclarecimento da importância do preparo e prontidão do educador: É essencial saber como controlar o brinquedo de uma criança, e, para fazer isto, é necessário saber como submetê-lo às leis de desenvolvimento do próprio brinquedo (LEONTIEV, 1989 apud ROCHA, 2000, p.47). 2.2 Os autores O principal motivo que me fez optar por esses autores citados nos PCNs é a profunda ligação que fazem, durante sua vida e obra, entre teoria e prática. Reconhecidos como importantes teóricos da área contribuíram, em todo o mundo, para uma nova visão do teatro na educação e para o resgate do mesmo como manifestação simbólica complexa, capaz de favorecer o desenvolvimento humano. Viola Spolin (1906-1994) foi uma mulher envolvida de todas as maneiras com o teatro. Professora de Teatro, diretora e atriz reconhecida internacionalmente por seu livro “Jogos Teatrais”, em que propõe um sistema de treinamento para o ator. Seu trabalho inicial se assemelha ao trabalho de assistente social, fazendo parte do grupo de recreação que atendia as famílias migrantes dos Estados Unidos durante o Programa de Desenvolvimento (WPA Project implantado a partir de 1935) com a idéia de promover o bem estar social. A diversidade cultural encontrada fez com que Spolin percebesse a importância de um sistema que ultrapassasse as barreiras étnico-culturais. Começou, então, a desenvolver novos jogos que focassem no indivíduo, criativamente adaptando e destacando o conceito de jogo na capacidade individual de auto-expressão. Em 1975, lançou “Jogos Teatrais” que de maneira simples transmitia complicadas convenções e técnicas teatrais em forma de jogos, passando a ser introduzido nas salas de aula. O conhecimento prévio e a idade se tornaram irrelevantes, pois a atuação (jogar) acontecia naturalmente. Experienciar é penetrar no ambiente, é envolver-se total e organicamente com ele. Isto significa envolvimento em todos os níveis: intelectual, físico e intuitivo. Dos três, o intuitivo, que é o mais vital para a situação de aprendizagem, é negligenciado (SPOLIN, 2003, p. 03). Ingrid Dormien Koudela (1948) é Professora Doutora em Teatro pela/na Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP), coordenadora de um importante grupo de discussão em Teatro-Educação - Grupo de Trabalho em Pedagogia do Teatro e Teatro na Educação da ABRACE (Associação Brasileira de Artes Cênicas). Vem expandindo seu trabalho de ensino e pesquisa na área através de projetos ligados à Secretaria Municipal de Educação de São Paulo contribuindo na formação continuada de professores de Arte. Foi consultora do MEC na elaboração dos PCN - Parâmetros Curricular Nacionais na área de Teatro para o Ensino Fundamental e membro da CEEARTES - Comissão de Especialistas de Arte, órgão do MEC/SESU Secretaria de Ensino Superior, onde coordenou a elaboração do documento Diretrizes Nacionais para o Ensino do Teatro (1996-1997). A imaginação dramática, sendo parte fundamental no processo de desenvolvimento da inteligência, deve ser cultivada por todos os métodos modernos de educação. Embora a imitação e o jogo estejam diretamente relacionados com o processo de pensamento e com o desenvolvimento da cognição, a imaginação dramática é um fator-chave – é ela que interioriza os objetos e lhes confere significado (KOUDELA, 2002, p.28). Richard Courtney (1927) é professor de teatro, acadêmico em teatro e especialista internacional em drama infantil. Lecionou Teatro por muitos anos em escolas da Inglaterra. Como professor universitário trabalhou com Peter McLaren, um dos líderes fundadores da Pedagogia Crítica (braço norte-americano da Pedagogia de Paulo Freire). Sendo um respeitado teórico do Teatro publicou uma centena de artigos, livros e reportagens sobre o tema do teatro na educação, arteeducação e crítica e história do Teatro. Se o jogo dramático é tão importante fator na vida das crianças como concluímos, a Educação Dramática exige que centremos nele o processo educativo. Devemos examinar todo o sistema educacional sob essa luz – os currículos, os programas, os métodos, e a filosofia sobre a qual estão fundamentados. Em todos os casos, devemos começar da atuação: com crianças pequenas, o espontâneo faz-de-conta improvisado e inerente a todas elas; com os mais velhos e adultos, a imaginação que lhes permite pensar dramaticamente – pois tanto o pensamento criativo quanto o aprendizado de memória são baseados na identificação interiorizada (COURTNEY, 2003, p.287). Percebendo a grandeza dos trabalhos já realizados por esses teóricos podemos imaginar o grande desenvolvimento que o ensino de Teatro teve nos últimos 50 anos. Com fim de elucidar tal desenvolvimento trago um breve histórico do ensino de teatro nas escolas públicas brasileiras e como ele aparece atualmente. Perceberemos que o pensamento desses autores se alicerça na prática artística como forma genuína de aprendizado, envolvendo os alunos na busca por conhecimento. A profundidade dessa idéia poderemos acompanhar no desenvolvimento deste capítulo. É importante conhecer as transformações ocorridas na idéia do ensino de Arte e do teatro ao longo da história educacional brasileira a partir do séc. XX. Vygotsky (1896 – 1936) nasceu e viveu na Rússia onde desenvolveu sua teoria de desenvolvimento humano que está profundamente ligada com o desenvolvimento da linguagem e que defende a idéia de que o homem é um ser social. Por sua formação eclética e sua vasta rede de interesses intelectuais podese entender o caminho que o levou ao desenvolvimento dessa teoria: formou-se em literatura e direito na Universidade de Moscou e mais tarde estudou medicina. Em seus estudos associou à psicologia experimental os conhecimentos em neurologia e fisiologia, os primeiros trabalhos tratam da psicologia da arte e nos sugere os mecanismos pelos quais a cultura se torna parte da natureza do homem. Seu principal feito foi o de conseguir explicar a transformação dos processos psicológicos elementares em processos complexos dentro da história. 2.3 Histórico do Teatro na escola O ensino de teatro na escola foi transformado a partir do Movimento Escola Nova que se iniciou em 1920, já que não se têm registro do teatro fazer parte do currículo do ensino formal antes dessa data, e ganhou força em 1932 pela divulgação de seu Manifesto. O grupo defendia a idéia da Educação como bem social e que deveria ser pensada em relação ao seu processo e não apenas aos resultados a serem obtidos. Os conteúdos foram então repensados e atividades físicas, manuais e lúdicas ganharam espaço nos currículos. A idéia do professor como guia e da criança como grande desbravador do próprio conhecimento fizeram das atividades lúdicas e de criação um momento para se libertar a criatividade. Ao incorporar esse conceito do teatro como momento de livre criação, de manifestação espontânea da criança passou-se aos valores e conhecimentos próprios do teatro. Em 1954, Peter Slade publicou o livro “O Jogo Dramático Infantil” que posiciona o teatro na escola como momento de catarse emocional do qual a criança necessita; a partir disso, os valores emocionais do teatro ficam em destaque. No ano de 1961, o ensino das artes foi introduzido oficialmente pela lei 4.024/61 que instituía a disciplina arte dramática que buscava o ensino dos fundamentos básicos do teatro. Porém a partir do Golpe Militar de 1964 o teatro passou a ser visto como algo a ser evitado e as escolas interromperam o seu ensino. Durante esse período a disciplina recebeu o nome de educação artística, devendo conter em seu conteúdo todas as linguagens da arte a serem ensinadas de maneira integrada em apenas duas horas/aula semanais. Em geral, as atividades desenvolvidas nesta disciplina enfatizavam muito mais a aprendizagem de produção de objetos decorativos do que a imaginação e o trabalho com as emoções, possível em práticas teatrais. A lei 5.692/71 publicada em 1971 pegou a todos de surpresa e exigia que um único professor licenciado em educação artística – curso que só passou a existir, em nível superior, três anos depois – ministrasse as aulas. O déficit de professores formados na área fez com que as escolas optassem por adaptar seus currículos oferecendo ora desenho geométrico (conteúdo de matemática), ora aulas com o professor de educação física. Essa prática ainda pode ser observada em muitas escolas brasileiras. Com fim de repensar o espaço e a forma do ensino de arte nas escolas foi fundada em 1980 a Federação de Arte-Educadores do Brasil (Faeb). A Federação reunia pesquisadores em arte e educação, professores das diversas linguagens artísticas e animadores culturais e se tornou importante instrumento de reivindicação da categoria. Tudo levava a crer que em 1988, com a publicação da nova Lei de Diretrizes e Bases (LDB) o ensino de arte voltaria a esclarecer a participação do ensino das diversas linguagens da Arte na escola brasileira. Porém um episódio burocrático pôs praticamente abaixo todas as reivindicações da Faeb: o texto aprovado da Lei nº 9.394/96 (a nova LDB) anula vários artigos do texto original e deixa em seus artigos referentes apenas a palavra arte sem especificar se o ensino é de uma ou mais artes e quais. Esse grande golpe deixou a disciplinas de Arte ainda à mercê de leituras equivocadas e possíveis adaptações na sua prática. Há uma tentativa de reparação que pode ser observada a partir de 1997 quando se publicou os Parâmetros Curriculares Nacionais Arte para Ensino Fundamental e em 2000, os PCNs Arte para o Ensino Médio. Tais publicações são essenciais para se repensar e discutir o ensino de Arte, porém não têm ainda o respeito que a Lei impõe. 2.4 Os conteúdos do ensino de Teatro Os conteúdos de Teatro e a maneira de transmiti-los diferem em certos detalhes de um autor a outro. Porém todos concordam que os elementos básicos do teatro devem ser trabalhados com os alunos desde a idade escolar inicial e que a prática deve ser o principal instrumento para o aprendizado. A autora Viola Spolin enfatiza a complexidade do ensino do teatro dentro da sua prática, como algo que necessita de grande entrega e envolvimento dos participantes da ação. Os elementos da técnica teatral e das convenções que fazem parte desse universo são absorvidos organicamente ao longo do processo do jogo, tornando o aprendizado prazeroso e rico. É através do Jogo Teatral que se aprende. Um elemento essencial aqui é o FOCO que ao invés de estreitar a visão dos participantes liberta-os para criar. FOCO – os exercícios são instrumentos contra a artificialidade; estruturas criadas para despertar a espontaneidade – ou talvez uma estrutura cuidadosamente construída para isolar inferências. Importante no jogo é a bola – o FOCO, um problema técnico, às vezes um duplo problema técnico que mantém a mente (um mecanismo de censura) tão ocupado fazendo com que o gênio (espontaneidade) aconteça sem querer (TUNG, 1965 apud SPOLIN, 2003, p.28). O Jogo Teatral não têm como finalidade a criação dramatúrgica e sim a experimentação de estados corporais e emocionais, de ambientes e espaços diversificados e da relação com o tempo de maneira inusitada. Quando se alcança o envolvimento total é que aparece a criação do que é proposto como foco do jogo. Outro ponto essencial para Viola é a INSTRUÇÃO dada pelo professor durante o jogo; essa deve buscar no aluno uma resposta orgânica sem redirecionar a sua ação somente fazer com que seu FOCO e sua energia se mantenham durante o jogo. Essa função de instruir o jogo, inicialmente trabalhado pelo professor, pode e deve ser repassada aos alunos do grupo, essa atitude provoca interessantes modificações na relação professor-aluno e traz ao aluno uma compreensão diferenciada e aprofundada sobre a atividade. A AVALIAÇÃO também é colocada por Spolin como elemento essencial, na medida em que aprofunda as experiências a partir de questões referentes à permanência e exploração do FOCO estipulado no início do jogo. Aqui são expostas as diferentes visões do jogo, de quem vivenciou e de quem observou, buscando possíveis soluções para as dificuldades encontradas. Professor/instrutor, procure atentar para como ou quando você está desviando as questões de avaliação para respostas com expectativas – seu próprio ponto de vista. A avaliação verdadeira, que está baseada no problema (FOCO) a ser solucionado, elimina críticas e julgamento de valores e dissolve a necessidade de o professor/jogador e/ou jogador/aluno dominar, controlar, fazer preleções e/ou ensinamentos. Esta interação e discussão objetiva entre jogadores e grupos de jogadores desenvolvem confiança mútua. Forma-se um grupo de parceiros e todos estão livres para assumir responsabilidades pela sua parte do todo, jogando (SPOLIN, 2003, P.33). A partir desses elementos essenciais as propostas de jogo vão tornando seu foco mais complexo e transmitindo, através da vivência prática, elementos teóricos e técnicos fundamentais para o conhecimento da área. São assim transmitidos conhecimentos de interpretação, cenografia, sonoplastia, iluminação em todos os seus aspectos formais a partir da prática. No processo de elaboração e construção desses elementos de cena é que se aprende sobre eles. A apreciação estética também é enriquecida através da experiência prática e de posteriores conversas sobre pontos positivos e negativos observados no resultado final. O pensamento de Ingrid Koudela segue a mesma linha de Viola - o ato de experienciar continua sendo fundamental para o aprendizado -, mas o enfoque dado ao ensino da Arte do teatro é na formação do indivíduo. Nos primeiros momentos de seu livro “Jogos Teatrais” cita o autor Peter Slade, também estudioso do teatro na educação: No Drama, isto é, no FAZER e LUTAR, a criança descobre a vida e a si mesma através de tentativas emocionais e físicas e depois através da prática repetitiva que é o jogo dramático. As experiências são pessoais e emocionantes, e podem se desenvolver em direção a experiências de grupo. Mas nem na experiência pessoal nem na experiência de grupo existe qualquer consideração de teatro no sentido adulto, a não ser que nós a imponhamos (SLADE, 1978 apud KOUDELA, 2002, p.21-22). A autora propõe uma reflexão profunda sobre os conteúdos a serem trabalhados na disciplina teatro, detectando dois pensamentos comuns e perigosos a respeito da área: ou o teatro como conteúdo programático que deve trabalhar os textos e técnicas clássicas, ou como livre expressão. Deve-se atentar para a importância de um ensino responsável do teatro que traz em si o peso de ser a mais antiga manifestação simbólica humana. Se considerarmos que o símbolo elaborado pelo indivíduo através da imitação, do jogo, do desenho, da construção com materiais possui significado lógico, sensorial e emocional, podemos concluir que, pelo contrário, a educação artística constitui o próprio cerne do processo educacional. Os instrumentos semióticos podem ser utilizados com objetivos sérios de aprendizagem e propiciar respostas altamente organizadas, que as crianças ainda não são capazes de devolver através do pensamento racional e do discurso (KOUDELA, 2002, p. 29-30). Como vimos, Ingrid Koudela enfatiza a importância na formação do indivíduo que tem a prática artística, Richard Courtney, em seu livro “Jogo, Teatro e Pensamento”, acrescenta aí uma forte rede teórica que procura enlaçar e enriquecer o conhecimento abordado pela área com as demais áreas da linguagem e do pensamento. E também chama nossa atenção para a importância de uma educação do sensível: [...] precisamos proporcionar uma educação que habilite os homens para desenvolverem suas qualidades humanas. É esta a maior necessidade de nosso tempo. A crescente especialização de nossa sociedade científica tende a não se concentrar nas qualidades essencialmente humanas. Tanto em nossa educação quanto em nosso lazer precisamos cultivar o “homem total” e nos concentrarmos nas habilidade criativas do ser humano. A imaginação dramática deve ser ajudada e assistida por todos os métodos modernos de educação (COURTNEY, 2003, p. 04). A partir daí, Courtney traça um histórico da importância e do ensino do teatro, desde a Grécia Antiga, em diversas sociedades comprovando o valor histórico do teatro. Em seguida apresenta diversas teorias do desenvolvimento que dão ao jogo e, consequentemente ao teatro, fundamental importância. Portanto, para todos os autores pesquisados, mesmo tendo vertentes diferentes de pensamento, o jogo teatral é a ferramenta que deve ser usada com o intuito de conseguir o envolvimento necessário dos alunos e fazê-los participar do aprendizado que daí decorre. Encontramos também na teoria sócio cultural do desenvolvimento humano uma importante observação sobre os conteúdos a serem ensinados em teatro: Alguns pedagogos se pronunciam terminantemente contra a arte teatral infantil baseando-se nos perigos referentes ao desenvolvimento prematuro da vaidade, a afetação, etc. E, efetivamente, o teatro das crianças, quando pretende reproduzir diretamente as formas do teatro adulto, constitui uma ocupação pouco recomendada para as crianças. Começar com um texto literário, memorizar palavras estranhas como fazem os atores profissionais, palavras que nem sempre correspondem com a compreensão e os sentimentos das crianças, freiam a criação infantil e transformam as crianças em repetidores de frases alheias obrigadas pelo livreto (VYGOTSKY, 1987, p. 87-88). Vygotsky expõe o erro que muitos educadores, ainda hoje, são levados a cometer: o ensino de teatro como preparo de textos clássicos e/ou adultos para apresentação aberta ao público. O autor enxerga no processo de criação do teatro o potencial para o aprendizado infantil, além de ser o principal expoente para a criatividade da criança em se tratando de uma linguagem que engloba as demais em sua elaboração – para a criação de uma peça teatral temos que criar também, o texto, o cenário, a música, os gestos, etc. E aí, então que reside o aprendizado, tanto no desenvolvimento e aprimoramento dos conhecimentos na área como da criatividade. [...] a criação cênica deve constituir sempre o auge do trabalho realizado em todo o período precedente; todo teatro infantil, ao cumprir este objetivo concreto, não pode renunciar a sua função de educação estética; todo teatro infantil (...) deve conter determinados elementos de criação artística (RIVIOS apud VYGOTSKY, 1987, p. 90). 2.5 Aspectos sociais e culturais de seu ensino De maneira geral os autores concordam que a prática é o melhor meio para se tratar as questões sociais, já no que diz respeito à cultura alguns falam em preservar e buscar as raízes culturais e outros trabalham apenas de forma acultural, desvinculando a atividade teatral de qualquer vínculo específico regional e tratá-la como produto da humanidade. Quando se trata do jogo teatral o enfoque é este, é explorado o brincar como atividade natural do homem. Como as propostas de Viola Spolin estão focadas em atividades corporais diversificadas, trata-se de um objeto “acultural”, que não propõe ou parte de uma cultura pré-determinada e sim, tem a capacidade de se adequar, adaptar a qualquer universo cultural – o jogo, o “brincar” está presente em todas as culturas. É importante esclarecer que Spolin não têm ligações teóricas diretas com Vygotsky. As questões sociais também estão no jogo, pois este subentende a participação de pares criativos e “vibrantes”. Relações entre parceiros de jogo, entre platéia e palco, entre papéis desempenhados em determinadas atividades vão tratar diretamente de relações sociais comuns, corriqueiras, cotidianas que devem ser respeitadas e enriquecidas durante o jogo. Por causa da natureza dos problemas de atuação, é imperativo preparar todo o equipamento sensorial, livrar-se de todos os preconceitos, interpretações e suposições, para que se possa estabelecer um contato puro e direto com o meio criado e com os objetos e pessoas dentro dele. Quando isto é aprendido dentro do mundo do teatro, produz simultaneamente o reconhecimento e contato puro e direto com o mundo exterior. Isto amplia a habilidade do aluno-ator para envolver-se com seu próprio mundo fenomenal e experimentá-lo mais pessoalmente. Assim, a experimentação é a única tarefa de casa e, uma vez começada, como as ondas circulares na água é infinita e penetrante em suas variações (SPOLIN, 2003, p. 13) Durante o jogo, as relações humanas vão sendo trabalhadas de maneira espontânea, a estrutura social é experimentada na prática e ganha novo patamar para reflexão. Mesmo quando o aluno desempenha o papel do instrutor, repensando a questão da autoridade e da responsabilidade, experimenta uma transformação na sua reflexão e ação em relação aos colegas, professores, responsáveis em casa e até mesmo em relação às autoridades políticas. Mesmo o simples fato do trabalho de Viola Spolin partir do jogo já o torna uma “questão social” a ser resolvida, pois são jogos de regras que devem ser defendidas por todos os participantes. Qualquer jogo digno de ser jogado é altamente social e propõe intrinsecamente um problema a ser solucionado – um ponto objetivo com o qual cada indivíduo deve se envolver, seja para atingir o gol ou para acertar uma moeda num copo. Deve haver acordo de grupo sobre as regras do jogo e interação que se dirige em direção ao objetivo para que o jogo possa acontecer (SPOLIN, 2003, p. 05). Koudela procura sempre valorizar a experiência teatral em si; até mesmo quando procura tratar de questões cotidianas, acredita que a criança/adolescente traz elementos do seu cotidiano, mas o transforma no palco ou quando está no jogo: O jogo teatral não é uma extensão da vida corrente. A improvisação de uma situação no palco tem uma organização própria, como no jogo. O menino não estava simplesmente imitando, mas trabalhava com o problema de dar realidade aos objetos. O volante, o rádio, os freios, as marchas não foram explicados verbalmente mas se tornaram concretos através da ação (KOUDELA, 2003, P. 44-45). Através desse pensamento Ingrid nos quer demonstrar que o teatro tem sua significação própria dentro do universo real. As experiências são aproveitadas, mas não com âmbito catártico: a criança simplesmente faz uso de elementos observados na realidade, no seu mundo, para fazer valer a realidade do palco. Para Courtney, não há possibilidade de qualquer manifestação expressiva do homem ser acultural, a questão sócio-cultural é intrínseca a qualquer produção artística. O autor busca na Psicologia, Antropologia e Sociologia justificativas para tal afirmação. Segundo ele a sociedade encontra sua própria expressão no teatro: Sendo uma atividade social, o teatro está intrinsecamente ligado às origens da própria sociedade. Todo o âmbito do jogo dramático (da peça à representação teatral) pode ser observado em cada sociedade civilizada, variando de acordo com o desenvolvimento da civilização. De certa maneira, as origens da sociedade são as origens do teatro porque é pela personificação e identificação que o homem, em toda a história, relacionou-se com os outros (COURTNEY, 2003, p. 135). Como a comunicação é um processo social primário o teatro se torna vital por seu grande potencial comunicativo. Além desse aspecto fundamental existem outros: para todos os teóricos a vivência das situações, comuns à sociedade, no jogo teatral faz parte de um aprendizado social, nesse pode-se discutir e modificar à sua maneira a realidade vivida pelos alunos. Tal experiência pode ter o valor catártico para alguns autores, é o que encontramos naqueles que se baseiam nos princípios de Aristóteles para o qual assistir a uma tragédia e experienciar os sentimentos que essa despertava (medo e piedade) purgam os homens das emoções impuras. Uma tragédia[...] é a imitação de uma ação que é importante, e também, em possuindo magnitude, é completa em si mesma, em linguagem e acessórios agradáveis, cada uma de suas formas empregadas separadamente nas partes da obra, não de forma narrativa mas dramática; com incidentes despertando piedade e medo, recurso para efetuar sua catarse de tais emoções (ARISTÓTELES, 1920 apud COURTNEY, 2003). Porém para os autores que trabalhamos aqui o maior valor é o da possibilidade de reflexão frente à representação de significados sócio-culturais e personificações de perfis psicológicos fundamentais e, aprendizado da técnica, representatividade comunicativa e histórica do teatro. Primordialmente as manifestações teatrais estavam ligadas a rituais e, mesmo modificando o seu foco inicial na crença religiosa, o teatro continua sendo sagrado, na medida em que carrega símbolos e linguagem carregada de significado. Podemos através do teatro, identificar e compreender as bases de uma sociedade – tanto na estrutura do jogo teatral como da criação, encontramos um microcosmo semelhante em suas características hierárquicas, organizacionais e de socialização. Portanto deve-se considerar nas manifestações dos alunos os símbolos – corporais, verbais, visuais - que carrega em decorrência de sua vivência em sociedade. Não há como falar sobre os aspectos sociais e culturais no ensino do teatro sem lembrar de Vygotsky, tanto que antes mesmo de citá-lo encontramos suas idéias. Quando Courtney defende o teatro como fundamental na construção dos princípios do próprio homem e na passagem desses, ou quando nos fala de sua importância na formação da linguagem está embebido nas idéias vygotskianas. Vygotsky se apóia na grandeza da linguagem teatral, que agrega a linguagem falada, corporal, simbólica e estética comunicando ao homem o sentido global - em sua profundidade de significados objetivos e subjetivos - da questão exposta, para justificar a valorização de seu papel na educação. A criança mimetiza as impressões externas que percebe do meio que a rodeia. Com a força de seu instinto e sua imaginação, cria situações e ambientes que proporcionam uma vida para improvisar impulsos emocionais (heroísmo, desenvoltura, abnegação). A fantasia infantil não se detém à atmosfera de sonho, como acontece para os adultos. A criança quer tornar real em ações, em imagens vivas, tudo o que pensam e sentem (PETROVA apud VYGOTSKY, 1987). O universo social que circunda a criança se reflete, toma vida na ação criativa do teatro, essa experiência é riquíssima para que se compreenda e experimente os papéis atribuídos aos adultos, em sociedade. Da mesma maneira são transmitidos e compreendidos fundamentais valores culturais, éticos e morais. Também em Vygotsky encontramos a idéia da catarse vivenciada frente a uma obra de arte, assim como Aristóteles, como elemento importante na educação. A arte é o social em nós, e, se o seu efeito se processa em um indivíduo isolado, isto não significa, de maneira nenhuma, que as suas raízes e essência sejam individuais. [...] O social existe até onde há apenas um homem e as suas emoções pessoais. Por isto, quando a arte realiza a catarse e arrasta para esse fogo purificador as comoções mais íntimas e mais vitalmente importantes de uma alma individual, o seu efeito é um efeito social. [...] A arte introduz cada vez mais a ação da paixão, rompe o equilíbrio interno, modifica a vontade em um sentido novo, formula para a mente e revive para o sentimento aquelas emoções, paixões e vícios que sem ela teriam permanecido em estado indefinido e imóvel (VYGOTSKY, 1999, p. 315-316). 2.6 A interdisciplinaridade Essa é a questão mais polêmica e complicada para se trabalhar dentro das escolas. A visão tradicional do teatro como maneira de diversificar e descontrair o trabalho com determinados conteúdos de diversas disciplinas ainda é a idéia mais difundida do que seria a interdisciplinaridade do teatro no ensino formal. Porém todos os autores trabalhados nessa pesquisa trazem visões interessantes e complementares sobre essa questão. Spolin trata diretamente da interdisciplinaridade do teatro dentro da escola, mas enxerga seus exercícios como facilitadores na construção de um foco propício para a aprendizagem de determinados conteúdos; propõe que o jogo seja usado por todos. Nesse caso, o teatro emprestaria seu conteúdo essencial para o trabalho em outra disciplina. “O conhecimento teria uma exatidão maior se viesse da estimulação do próprio aprendizado.” Courtney divide a mesma opinião quanto à utilização do jogo teatral como método de ensino: A Educação Dramática é não apenas o modo de encarar o processo educacional (uma filosofia), ou o modo de ajudar o desenvolvimento individual (uma psicologia) ou assistir o indivíduo em sua adequação ao meio (uma sociologia); é a maneira fundamental na qual o ser humano aprende – e, assim, é o mais efetivo método para todas as formas de educação (COURTNEY, 2003, p. 278). A autora Ingrid Koudela se preocupa em defender a questão essencialista do ensino da Arte. Pela longa experiência e observação do ensino dessa linguagem no Brasil teme o retorno ao processo de tomar o teatro como simples instrumento pedagógico. Porém, admite que deva haver uma aliança entre as áreas comuns à Linguagem com intuito de enriquecer os conhecimentos em particular e ampliar a compreensão do universo histórico, social e cultural do teatro (da Arte). Richard Courtney faz uso de múltiplos conhecimentos para nos falar sobre a importância do teatro, para ele a linguagem teatral é muito mais do que simplesmente uma técnica de arte a ser apreendida e reproduzida. O teórico acredita estar depositado no teatro toda a significação da humanidade na medida em que é a expressão mais pura. Se o teatro está entrelaçado às crenças fundamentais do homem da maneira como se infere da abordagem sociológica, esse fato terá certamente sua influência sobre todo o conjunto de campos análogos de estudo: como o homem se posicionou com relação ao universo (filosofia e religião); as diferentes interpretações que o homem deu ao mundo a cada período (história) e como isso se relaciona com sua compreensão do teatro e das formas dramáticas (crítica teatral); como o homem observou o funcionamento de seus próprios processos mentais (psicologia) e a relação destes com a criação artística (estética) (COURTNEY, 2003, p. 190). Nesse sentido fica claro que, para Courtney, a interdisciplinaridade é essencial também na escola. Somente trabalhando dessa maneira o aluno pode, por exemplo, entender a linguagem humana como manifestação multidimensional e compreender que os fatos históricos estão retratados e preservados através dessas manifestações. O aluno precisa ter uma visão profunda e ampla, não apenas pontual, para aprender e se tornar um indivíduo consciente. Mais ainda, Courtney acredita que o teatro possa ser um grande elo para todos os conhecimentos humanos, funcionando como método e ferramenta. Tanto no processo de seu ensino, como na construção dos elementos necessários para sua concretização final – o espetáculo teatral. [...] a Educação Dramática é uma disciplina acadêmica abrangente. Utiliza como instrumento todos os ramos do aprendizado que se relacionam com o impulso dramático. Utiliza ecleticamente toda e qualquer disciplina em um corpo unificado de conhecimentos, de maneira a que possa nos ajudar a compreender a natureza da experiência. Reúne muitos aspectos dos estudos até então não relacionados: aspectos da filosofia, pois temos de examinar por que educamos nossas crianças dessa maneira; da psicanálise, para entender os símbolos utilizados pelas crianças e os motivos subliminares no contexto do jogo; da sociologia, pois atuar é uma atividade social que inclui a interação dos indivíduos; da psicologia social, porque imitação, identificação, desempenho de papéis e tudo o mais está diretamente ligado à atuação do homem em seu meio; da cognição e psicolingüística, pois o relacionamento entre a formação do conceito e linguagem influencia diretamente o método dramático de aprendizagem. E, ao aproximar-se do teatro, aspectos de matemática, física, engenharia, estética e outros campos de estudo vêm ampliar o nosso raio de ação (COURTNEY, 2003, p. 58). Na obra de Vygotsky não encontramos uma referência direta sobre a interdisciplinaridade, porém podemos entendê-la em suas entrelinhas. O autor trata da Arte sempre como linguagem e a conecta com as demais linguagens do homem, assim como uma rede indissolúvel de transmissão de significados. Porém, defende a arte como linguagem mais completa e, de fato nela, em especial o teatro, trabalha todo tipo de linguagem: escrito, falada, corporal e sinestésica. Dois quadros idênticos foram apresentados a dois grupos de crianças pré-escolares, de mesma idade e nível de desenvolvimento. A um grupo foi solicitado a dramatização do quadro – o que indicaria seu grau de captação imediata do conteúdo; ao outro grupo foi solicitado descrever o quadro em palavras, uma tarefa que requereria um recurso de compreensão conceitualmente mediada. Descobriu-se que os “atores” reproduziram o sentido da situação da ação representada enquanto que os “narradores” enumeraram objetos isolados (VYGOTSKY, 1962 apud COURTNEY, 2003, p. 277). Da mesma maneira que outros autores, Vygotsky acredita que através do jogo o aprendizado se dá de forma mais efetiva: só se aprende com aquilo que se tem interesse real e com o que se envolve. Portanto, o jogo teatral pode e deve ser usado como ferramenta de ensino de qualquer disciplina escolar. 2.7 Comentários É possível verificar uma forte aliança entre os autores e encontrar muitas idéias complementares nas teorias apresentadas. O mais importante aqui é perceber a defesa do grande potencial educativo existente no teatro, o que bastaria para tê-lo como disciplina obrigatória. Além de possibilitar o aprendizado de outras disciplinas de maneira mais interessante e eficaz. Porém um fator relevante é a questão dos aspectos sociais e culturais que traz alguma divergência entre os teóricos. Mesmo acreditando que o jogo teatral é um importante meio para experienciar os papéis sociais e recriá-los, não indica segundo Spolin que o jogo carregue, em si, características culturais da sociedade na qual a criança está inserida, acreditando ser o jogo um elemento da cultura propriamente infantil – de todas as crianças, independente do país, poder aquisitivo, grau de escolaridade. Já somos capazes de debater essa idéia: mesmo brincando, jogando, de maneiras semelhantes as crianças apresentam traços da sua apreensão do mundo ao redor. Há nos jogos aspectos únicos de significado e interpretação para cada criança, a partir do seu universo de vivências sócio-culturais. Os trabalhos de teatro na escola devem levar em consideração tais peculiaridades e também possibilitar a vivência, em jogo, a partir de novos parâmetros sócio-culturais. Os conteúdos específicos do teatro não devem ser deixados em segundo plano, porém seu aprendizado se dará, de melhor maneira, durante os jogos e criações teatrais. Há concordância em relação ao necessário envolvimento, prazer e relevância do que deve ser ensinado, pois o aprendizado ocorre através daquilo e, cujo conteúdo, possui um significado particular para quem aprende. Os elementos técnicos e as convenções vão sendo expostos ao longo do processo de criação, na medida em que se fizerem necessários. Teremos, na seqüência, novos elementos para debate, já que encontraremos maior contradição em relação às idéias e propostas apresentadas e as teorias que embasam o pensamento do teatro na educação. 3. METODOLOGIA Esta monografia trata-se de uma pesquisa documental que se debruça na leitura dos Parâmetros Curriculares Nacionais para Ensino Fundamental e para Ensino Médio tendo como ponto de discussão a maneira como esses documentos tratam a questão do ensino de teatro dentro da disciplina de Arte. Os aspectos detalhados aqui são: os conteúdos propostos para o ensino de teatro; como integram os aspectos sociais e culturais; e se há e como exploram a interdisciplinaridade. As bases usadas para confrontar as idéias dos PCNs foram textos fundamentais de grande importância no universo teórico do teatro na educação que fazem parte, inclusive, da bibliografia dos próprios documentos analisados. São autores com forte ligação com a prática teatral e larga experiência com o ensino do teatro. Primeiramente foi feita a coleta do material a ser pesquisado: Parâmetros Curriculares Nacionais para Ensino Fundamental e Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (PCNEF e PCNEM) e de materiais ligados a ele como a Lei de Diretrizes e Bases e o PCN+ EM. Após a leitura de todos esses materiais foi levantada uma bibliografia específica da área de teatro a partir de autores citados na elaboração dos documentos lidos. Foram encontrados alguns livros e textos que constam daquela bibliografia e outros dos mesmos autores que permitiram uma maior profundidade na compreensão de seu pensamento. Antes de realizar a análise tive a curiosidade de verificar como era o acesso a esse material – fundamental para discussão e para o planejamento escolar. Verifiquei que as unidades escolares estaduais não têm em seu acervo nenhuma documentação pertinente a isso, não encontrei nem os PCNs, nem a Lei de Diretrizes e Bases. Fui informada que na sede da Diretoria de Ensino os professores podem encontrar tais materiais, mas esse material não deveria estar nas escolas? Achei fundamental que se conhecesse a história da formação e da produção desses autores e, para tanto, pesquisei em livros e sites a biografia dos mesmos. Durante a leitura dos livros e textos foram identificados os pontos fundamentais para se debater as questões propostas. Enquanto me concentrava na busca de informações sobre os temas a serem discutidos foi feito uso de novos materiais bibliográficos. Tais materiais de apoio serviram para esclarecer algumas informações técnicas e terminológicas encontradas nos livros pesquisados. Houve preocupação, durante a elaboração do texto, em manter a estrutura usada na apresentação dos PCNs a mais fiel possível, tendo grande parte dos textos sido reescrita com uma linguagem mais adequada para o entendimento e interpretação dos leitores. Essas alterações de linguagem foram feitas também nos textos e livros para discussão que têm, muitas vezes, uma linguagem técnica e de difícil compreensão. O texto da pesquisa, então, foi escrito com uma linguagem de fácil compreensão para os profissionais da área da educação. Outras informações de fundamental conhecimento forma acrescentadas, como um breve histórico sobre a arte e o teatro na educação. 4. RESULTADOS Será apresentado um quadro detalhado das propostas dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) de Arte, com ênfase em Teatro, para Ensino Fundamental e Ensino Médio. A partir da leitura dos PCNs foi possível traçar uma comparação entre o proposto e o esperado para os diferentes graus de ensino. Foi observado o tratamento que o ensino de Arte - Teatro em relação a: complexidade e profundidade de seus conhecimentos, aspectos sociais e culturais de seu ensino, interdisciplinaridade. A estrutura dos PCNs é a mesma: primeiro se apresenta a idéia geral do ensino de Arte no contexto educacional apresentado. Na seqüência, temos os objetivos gerais e os conteúdos a serem ensinados; os conteúdos são subdivididos, porém gerais para todas as áreas de Arte. Então, ao final, é proposta uma reflexão sobre a avaliação e seu valor no aprendizado da Arte, explicitando os ideais de avaliação. Tive uma preocupação especial em manter a estrutura que o MEC apresenta à leitura dos profissionais da educação. Acredito que a própria apresentação do texto dos PCNs já nos indica uma visão importante por parte de quem elabora as propostas educacionais. Portanto, a repetição e a linguagem pouco aberta à reflexão são apenas reproduzidas aqui neste capitulo, ainda que tenham havido algumas mudanças na linguagem para melhor entendimento dos leitores. 4.1 PCNs Arte – Ensino Fundamental Na apresentação dos objetivos gerais do Ensino de Arte para o Ensino Fundamental a proposta é a de que o aluno deva desenvolver conhecimentos estéticos e artísticos para que possa produzir arte individualmente ou com seus colegas se tornando um cidadão interessado na produção artística de diferentes culturas ao longo da História, sendo crítico e sensível para tais. Para tanto, o professor deve ter a preocupação de que, no curso do Ensino Fundamental, o aluno possa: • experimentar e explorar as possibilidades de cada linguagem artística; • compreender e utilizar a arte como linguagem, mantendo uma atitude de busca pessoal e/ou coletiva, articulando a percepção, a imaginação, a moção, a investigação, a sensibilidade e a reflexão ao realizar e fruir produções artísticas; • experimentar e conhecer materiais, instrumentos e procedimentos artísticos diversos em arte (Artes Visuais, Dança, Música, Teatro), de modo que os utilize nos trabalhos pessoais, identifique-os e interprete-os na apreciação e contextualize-os culturalmente; • construir uma relação de autoconfiança com a produção artística pessoal e conhecimento estético, respeitando a própria produção e a dos colegas, sabendo receber e elaborar críticas; • identificar, relacionar e compreender a arte como fato histórico contextualizado nas diversas culturas, conhecendo, respeitando e podendo observar as produções presentes no entorno, assim como as demais do patrimônio cultural e do universo natural, identificando a existência de diferenças nos padrões artísticos e estéticos de diferentes grupos culturais; • observar as relações entre a arte e a realidade, refletindo, investigando, indagando, com interesse e curiosidade, exercitando a discussão, a sensibilidade, argumentando e apreciando arte de modo sensível; • identificar, relacionar e compreender diferentes funções da arte, do trabalho e da produção dos artistas; • identificar, investigar e organizar informações sobre a arte, reconhecendo e compreendendo a variedade dos produtos artísticos e concepções estéticas presentes na história das diferentes culturas e etnias; • pesquisar e saber organizar informações sobre a arte em contato com artistas, obras de arte, fontes de comunicação e informação (PCN Arte, 1998, p.48). Os conteúdos do PCNs para EF têm o mesmo objetivo da formação de cidadãos que se situem culturalmente. O critério da seleção dos conteúdos está na importância à promoção da formação cultural e à participação em sociedade. Então, as escolhas visam a inserção do aluno na História Cultural da Humanidade, tanto como possível criador, dando-lhe conhecimento e possibilidades de experimentação necessária para tal, quanto como apreciador mostrando-lhe os diferentes elementos estéticos, artísticos e simbólicos presentes nas obras de diferentes civilizações. Os conteúdos são divididos em três eixos do conhecimento: produzir, apreciar e contextualizar. Produzir: possibilitar ao aluno que desenvolva um fazer artístico através de informações e experimentações das linguagens da Arte dadas pelo professor. Apreciar: desenvolvimento de uma percepção crítica das informações estéticas e artísticas fornecidas pelo universo cotidiano comum e pelo universo direcionado para Arte. Compreensão da interpretação e decodificação das diferentes produções artísticas. Contextualizar: localizar a sua produção, dos colegas e da arte dentro de um contexto sócio-histórico. Busca-se, através dessa tríade, a compreensão da Arte como conhecimento amplo que situa-se no campo dos sentidos conectado à percepção, sensação e cognição. Eles poderão perceber, imaginar, recordar, compreender, aprender, fazer conexões e formar idéias, hipóteses ou teorias pessoais sobre seus trabalhos artísticos e de outros, assim como sobre o meio em geral, pois situam a arte nas culturas em diversos tempos da história e situações sociais e sabem perceber, distinguir e argumentar sobre qualidades (PCN Arte, 1998, p. 50). A idéia da contextualização vai além: pretende que o aluno perceba a relevância da interação com o conhecimento e com os colegas para o domínio reflexivo do saber artístico. A escolha dos conteúdos é apontada com ênfase nos objetivos de cada proposta. De maneira geral, os conteúdos dão ênfase à formação do aluno como ser sócio-cultural que compreende a arte de seu tempo e de seu povo, se aventura na produção e apreciação de arte. Mais adiante, os PCNs especificam esses conteúdos dando destaque à importância da informação e instrumentalização dos conhecimentos artísticoculturais. • a arte como expressão e comunicação dos indivíduos; • elementos básicos das linguagens artísticas, modos de articulação formal, técnicas, materiais e procedimentos na criação em arte; • produtores de arte: vidas, épocas e produtos em conexões; • diversidade das formas de arte e concepções estéticas da cultura regional, nacional e internacional: produções e suas histórias; • a arte na sociedade, considerando os artistas, os pensadores da arte, outros profissionais, as produções e suas formas de documentação, preservação e divulgação em diferentes culturas e momentos históricos (PCNs Arte, 1998, p. 52). Além das propostas de conteúdos do conhecimento artístico, os PCNs sugerem alguns conteúdos relativos a atitudes e valores que se justificam como objetivos comportamentais. Atitudes como respeito às produções artísticas, desprendimento na própria criação, incentivo a uma postura autocrítica e autoconfiante nas produções pessoais, posicionamento crítico na apreciação, valorização das diversas manifestações culturais, reconhecer a importância do contato com a Arte, estão listados como tópicos a serem observados e trabalhados pelos professores. Em relação à avaliação, os PCNs traçam maneiras de se realizar um diagnóstico do aprendizado em Arte. A avaliação pode ser realizada no processo de aprendizagem: pode-se verificar os conhecimentos prévios dos alunos e acompanhar a interação e o desenvolvimento do aluno nas propostas oferecidas. No que diz respeito aos conhecimentos específicos da Linguagem Teatral, os PCNs levam em consideração a base teórica dada no início, respeitando os objetivos e conteúdos gerais da disciplina Arte. A apresentação do conteúdo Teatro é iniciada com a idéia de que sua importância, para adultos e adolescentes, está na possibilidade de conhecer e confrontar várias culturas em momentos históricos diferentes por meio de uma produção artística coletiva. A importância do fazer teatral está na busca de alternativas criativas e imaginativas pelos alunos para construção de cenas, com objetivo de refinar a percepção sobre eles mesmos e sobre situações do cotidiano. Os autores dos PCNs entendem que a representação dramática faz parte da natureza humana: “provavelmente diz respeito à necessidade humana de recriar a realidade em que vive e de transcender seus limites” e relaciona esse processo com a imitação, simbolização e jogo na infância. Nesse caso, focaliza-se mais precisamente o “jogo de construção”: O jogo de construção não é uma fase da evolução genética mas sim um instrumento de aprendizagem com o qual a criança opera, promovendo o desenvolvimento da criatividade, em direção à educação estética e praxis artística. O jogo teatral é um jogo de construção em que a consciência do “como se” é gradativamente trabalhada, em direção à articulação de uma linguagem artística — o teatro (PCNs Arte, 1998, p. 88). Através do teatro, o aluno faz novas descobertas de idéias, sentimentos, atitudes, e desenvolve sua capacidade de socialização pelo contato com novos pontos de vista, ampliando sua capacidade de dialogar. Também se explora a relação entre palco e platéia, pois é o trabalho criador tendo que dialogar com as regras do próprio teatro. Segundo os PCNs, o texto inicial do trabalho do ator é “escrito” pela linguagem gestual, e a construção desse texto pelos alunos é um exercício de observação riquíssimo que, aos poucos, compõe o banco de gestos para um ator crítico. O estudo do teatro se amplia ao conhecimento de sua história, da cenografia, dramaturgia, encenação. Os PCNs propõe, a fim de explorar essas temáticas, que se façam pesquisas bibliográficas e de observação. A integração entre apreciação e produção artística deve ser mantida e toda prática de teatro deve ter como base a observação, a pesquisa e o entendimento de que os textos dramáticos, as formas de representação e as formas cênicas têm tradições inseridas em diversas épocas e culturas que podem ser objeto de estudo e transformações no contexto presente do aluno. A cultura do próprio adolescente deve ser considerada, porém há de se propiciar informações que lhe dêem condições de avaliar, opinar e interpretar o que vê e para que interaja em sociedade com maior propriedade. Assegura-se que o jovem se identifica com a narrativa dramática e esse fator facilita sua aproximação com os conteúdos que permitam uma visão crítica, importante numa sociedade de consumo que divulga seus produtos fazendo uso dessa linguagem. O universo da mídia e propaganda é interessante como objeto de pesquisa e permite um rico exercício de observação. Por meio do exercício e da pesquisa chega-se à argumentação crítica, buscando esclarecer os modos de construção e os códigos pelos quais a ficção é veiculada. Ir ao teatro e/ou assistir às programações de ficção, mediada ou não, amplia a criação de um discurso próprio e organizado, passando a ser aprendizado imprescindível, prática deliberada e operante, a que os jovens podem se dedicar (PCNs Arte, 1998, p. 90). Assim é finalizada a introdução ao ensino de teatro e iniciam-se os direcionamentos mais específicos para seu ensino na escola. Dentro dos objetivos, encontramos as diretrizes principais do trabalho do educador em teatro para alunos de 5ª a 8ª séries do Ensino Fundamental. Não é apresentada nenhuma novidade em relação aos pontos levantados até então: o teatro como uma linguagem múltipla com dimensões históricas, artísticas, estéticas, social e antropológica que devem ser compreendidas; compreender as influências - cultura local, costumes e crenças, organização dos papéis sociais - na construção da linguagem teatral; saber improvisar com os elementos dessa linguagem, adaptar às condições materiais da escola e da comunidade as suas produções teatrais; apropriar o vocabulário tanto para a apreciação de trabalhos realizados na escola e fora dela, como na composição dos próprios personagens; reconhecer as características estéticas predominantes dos estilos tradicionais da História do Teatro em diferentes produções contemporâneas; Há, também, destaque de outros objetivos que valorizam a documentação sobre teatro e o conhecimento da mesma, o acompanhamento das produções teatrais, conhecimento das possibilidades profissionais do universo do teatro e o reconhecimento da prática teatral como desenvolvimento da solidariedade social. Em resumo, os conteúdos propõem que se encare o teatro de maneira global: como comunicação e produção coletiva; como apreciação; como produto histórico cultural. As propostas são amplas, porém sempre focando o teatro como linguagem e conteúdo que, em si, bastam. Os principais pontos dos conteúdos a serem explorados buscam que o aluno participe de improvisações, visando à exploração de novos espaços na criação de papéis e de ação dramática; reconheça e saiba utilizar capacidades expressivas e criativas que constroem significado na atividade teatral; identifique e possa aprofundar os elementos fundamentais na construção da cena teatral: “atuantes/papéis, atores/personagens, estruturas dramatúrgicas/peça, roteiro/enredo, cenário/locação”. Além de exercitar a observação e transposição do universo físico e cultural circundante, realizar adaptações de roteiros a partir de outros materiais escritos (notícias, mitos, fatos históricos, narrativas populares de diversas culturas e épocas, contos e história), observar e analisar constantemente as propostas e cenas dos colegas, através de formulação escrita e verbal, compreender o teatro como instrumento “que favorece a identificação com outras realidades socioculturais, interagir e reconhecer a diversidade cultural encontrados na criação teatral de diferentes culturas. Compreender e distinguir as diferentes maneiras de “construção das narrativas e estilos: tragédia, drama, comédia, farsa, melodrama, circo, teatro épico”. Compreender e analisar as formas regionais, nacionais e internacionais de teatro, “esclarecendo suas tradições, características e modos de construção”. Pesquisar e ler textos dramáticos e identificar estruturas, personagens, conflito, estilos e gêneros teatrais. Freqüentar e pesquisar o movimento teatral na comunidade, cidade, estado, país e internacional, “para observar o trabalho de atores, diretores, grupos regionais e a crítica de espetáculos”. Consultar e levantar “em centros de documentação, arquivos multimídias, acervos e em bancos de textos dramáticos sobre o teatro, nacional e sobre a dramaturgia universal”. Critérios de Avaliação Os critérios de avaliação dos alunos na disciplina Arte com ênfase em Teatro deve certificar que o aluno: sabe improvisar e atuar em situações de jogo, utilizando as capacidades corporais e vocais; está “capacitado para criar cenas escritas ou encenadas, reconhecendo e organizando os recursos para a sua estruturação”; está capacitado a opinar com clareza e critérios fundamentados sobre atividade teatral; identifica “momentos importantes na história do teatro, da dramaturgia local, nacional ou internacional, refletindo e relacionando os aspectos estéticos e cênicos”; valoriza “as fontes de documentação, os acervos e os arquivos da produção teatral”. 4.2 PCNs Arte – Ensino Médio Os PCNs para o Ensino Médio vinculam a Arte à Área de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias o que já nos indica uma visão mais integrada, interdisciplinar e contextualizada do ensino da arte. Essa percepção é confirmada ao longo da introdução “O sentido do aprendizado na área” que nos expõe as propostas de modificações em relação à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB, Lei n.º 9.394/96). A indicação para mudanças qualitativas é a de sistematizar um conjunto de “disposições e atitudes” para ampliar a participação do aluno no mundo social. A partir dessa intenção vê-se como necessário um aprofundamento no conceito acerca do conceito da Linguagem, e o PCNs esclarece que esta, por sua natureza, é transdisciplinar sendo objeto de estudo de várias áreas como a Filosofia, Psicologia, Antropologia, Sociologia, Epistemologia, História entre outras. A Linguagem é considerada como capacidade humana de “articular significados coletivos e compartilhá-los, em sistemas arbitrários de representação, que variam de acordo com as necessidades e experiências da vida em sociedade. A principal razão para qualquer ato de linguagem é a produção de sentido”. Sendo uma herança social envolve os indivíduos e regula as estruturas emocionais, perceptivas e mentais pelo seu simbolismo. A linguagem permeia o conhecimento e as formas de conhecer, o pensamento e as formas de pensar, a comunicação e os modos de comunicar, a ação e os modos de agir. Ela é a roda inventada, que movimenta o homem e é movimentada pelo homem. Produto e produção cultural, nascida por forças das práticas sociais, a linguagem é humana e, tal como o homem, destaca-se pelo seu caráter criativo, contraditório, pluridimensional, múltiplo e singular, a um só tempo (PCNEM – Linguagem, Códigos e suas Tecnologias, 2000, p.5). Os sinais e suas possíveis combinações socialmente partilháveis na interação verbal são organizados como dados perceptivos em sistemas simbólicos. O aluno deve conhecer as linguagens humanas, considerando todas as variações – verbal, visual, gestual, áudio-visual entre outras – na estrutura simbólica da comunicação, essas linguagens constitui sistemas arbitrários de sentido e comunicação. Na sociedade as normas das linguagens se auto-estruturam ao serem partilhadas e negociadas. A compreensão da linguagem como um todo permite uma participação ativa e cidadã em sociedade. Com o objetivo de atingir tal participação, são apresentadas as competências a serem trabalhadas dentro da Área, entre elas: “Compreender e usar os sistemas simbólicos das diferentes linguagens como meios de organização cognitiva da realidade pela constituição de significados, expressão, comunicação e informação”: vincular o aluno ao caráter intrasubjetivo, intersubjetivo e social da linguagem ao trabalhá-la não apenas em seus aspectos formais; tomar consciência de seu papel no processo histórico reconhecendo no passado uma herança social, e ser crítico em relação a representatividade e construção das verdades instituídas. O exame do caráter histórico e contextual de determinada manifestação da linguagem pode permitir o entendimento das razões do uso, da valorização, da representatividade, dos interesses sociais colocados em jogo, das escolhas de atribuição de sentidos, ou seja, a consciência do poder constitutivo da linguagem (PCNEM – Linguagem, Códigos e suas Tecnologias, 2000, p. 07). “Analisar, interpretar e aplicar os recursos expressivos das linguagens, relacionando textos com seus contextos, mediante a natureza, função, organização das manifestações, de acordo com as condições de produção e recepção” (pág. 08). Conhecer as diferenças históricas, estilísticas e funcionais da produção de linguagem, comparando os recursos expressivos intrínseco a cada manifestação e as razões das escolhas, isso permite que o aluno possa diferenciálas e interrelacioná-las, percebendo a ampla possibilidade da linguagem. Em uma situação de ensino, a análise da origem de gêneros e tempos, no campo artístico, permite abordar a criação das estéticas que refletem, no texto, o contexto do campo de produção, as escolhas estilísticas, marcadas de acordo com as lutas discursivas em jogo naquela época/local, ou seja, o caráter intertextual e intratextual (PCNEM – Linguagem, Códigos e suas Tecnologias, 2000, p. 08). “Confrontar opiniões e pontos de vistas sobre as diferentes linguagens e suas manifestações específicas.” (pág. 08) Para dar ou não validade a uma teoria sobre a linguagem, é fundamental conhecê-la e dispor-se a analisá-la e compreendê-la, pois toda teoria é embasada ou transgressora em relação ao pensamento da época em que surge. Isso nos leva a refletir sobre o que estará envolvido nas construções lingüísticas atuais; estimular o debate, o diálogo a pesquisa para o encontro dessas respostas auxilia o aluno a construir um ponto de vista articulado com o objeto de estudo. A partir dessa busca e dessa construção de sentido, o aluno toma posse de suas idéias e pode compartilhar com maior fluência e clareza seu ponto de vista. “Respeitar e preservar as diferentes manifestações da linguagem utilizadas por diferentes grupos sociais, em suas esferas de socialização; usufruir do patrimônio nacional e internacional, com suas diferentes visões de mundo; e construir categorias de diferenciação, apreciação e criação.” (pág. 09) É através da linguagem que se constrói uma identidade social, pelas suas características comunicativas, formativas e informativas é instrumento valioso para esses fins. O grande elo entre as vivências dos alunos e as manifestações de outros grupos está compreendido na maneira e nos motivos de transmissão dessas culturas. As linguagens se utilizam de recursos expressivos próprios e expressam, na sua atualização, o universal e o particular. Pertencer a uma comunidade, hoje, é também estar em contato com o mundo todo. As práticas sociais deverão estar cada vez mais próximas da unidade para os fins solidários (PCNEM – Linguagem, Códigos e suas Tecnologias, 2000, p. 09). O aluno compreende a sua e as demais linguagens como legítimas quando percebe que as diferenças estão relacionadas aos interlocutores do processo comunicativo, às escolhas discursivas que realizam e aos recursos expressivos utilizados; tal conhecimento contribui para que o aluno supere a visão preconceituosa. “Utilizar-se das linguagens como meio de expressão, informação e comunicação em situações intersubjetivas, que exijam graus de distanciamento e reflexão sobre os contextos e estatutos de interlocutores; e saber colocar-se como protagonista no processo de produção/recepção.” Ao compreender que o homem se utiliza da linguagem, para fins comunicativos, por meio de manifestações expressivas próprias de seu grupo social, o aluno pode sempre se fazer compreensível através de uma análise reflexiva e elaboração consciente de seu discurso. Mais algumas competências são apresentadas com vistas na compreensão mais formal da utilização da língua materna (Língua Portuguesa), da língua estrangeira e das novas tecnologias. Acredito não ser essencial para este trabalho o aprofundamento nessas questões. Após a apresentação geral dos conhecimentos da Área da Linguagem, Códigos e suas Tecnologias, o PCNs nos apresenta com detalhes um a um. Conhecimentos de Arte A Arte no Ensino Médio deve buscar que os alunos apropriem-se dos saberes culturais e estéticos presentes nas práticas de produção e apreciação artísticas para que tenham uma formação completa como cidadãos. O PCNEM Arte tem como objetivo esclarecer as diretrizes gerais para a promoção do conhecimento da arte aos adolescentes, jovens e adultos que cursam o Ensino Médio. As diretrizes a serem apresentadas buscam “contribuir para o fortalecimento da experiência sensível e inventiva dos estudantes, e para o exercício da cidadania e da ética construtora de identidades artísticas”. Há uma preocupação direta com a compreensão da Arte como conhecimento “humano sensível-cognitivo”, voltado para um fazer e um apreciar reflexivos que levem em consideração a história e o contexto social da produção. Antes de traçar os objetivos gerais, o PCNs faz uma retrospectiva sobre a história do ensino de arte no país. Repassa os episódios iniciais quando o ensino se resumia ao Desenho Geométrico ou Técnico e o Canto Orfeônico e nos leva a pensar nos movimentos iniciais de mudança nos anos 60 e 70. A partir de 1971, segundo a Lei no 5.692, a arte passou a ser considerada como “experiência de sensibilização e como conhecimento genérico” deixando de ser reconhecida como conhecimento humano, histórico e importante para a educação do aluno. Esse quadro permanece pelos anos 80 e 90, período em que as escolas têm variadas atividades de práticas “artísticas” desvinculadas de qualquer preocupação teórica e estética no campo da música, teatro, dança e artes plásticas. Em 1982 foram organizadas as Associações de Arte-Educadores em vários Estados do país que reuniam professores, educadores e artistas preocupados com a situação da Arte nas escolas. Vários Congressos Nacionais e Internacionais sobre Arte e Educação forma realizados e neles aconteciam discussões a respeito dos cursos de Arte; esses grupos lutaram para que a Arte estivesse presente nos currículos da Educação Básica no Brasil e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996, Lei no 9.394. Para a construção desse documento houve estudos, pesquisas, discussões que levassem a propostas que tratassem da Arte em sua complexidade. O próprio fato de fazer parte da Área de Linguagem, Códigos e suas Tecnologias a Arte é vista particularmente pelos seus aspectos estéticos e comunicacionais. Conhecimento humano do âmbito sensível-cognitivo, por meio do qual manifestamos significados, sensibilidades, modos de criação e comunicação sobre a natureza e a cultura. As experiências estéticas de homens e mulheres estendem-se a vários âmbitos de seu existir, de seu saber, de sua identidade, enfim, de seu humanizar-se. Em processos de produzir e apreciar artísticos, em múltiplas linguagens, enraizadas em contextos socioculturais, as pessoas experimentam suas criações e percepções estéticas de maneira mais intensa, diferenciada (PCNEM – Linguagem, Códigos e suas Tecnologias, 2000, p. 48). Apesar de ser um conteúdo que se estrutura para a comunicação, sua particularidade está na construção dessas idéias que são elaboradas de maneira sensível, imaginativa, estética por seus produtores. A maneira de expor esse “conjunto sensorial de idéias” é ponto culminante para que se efetive a comunicação, o conhecimento de como criar esse discurso sensível – através de imagens, gestos, sons – é construído ao longo de vivências interpessoais e intergrupais, dentro da diversidade sócio-cultural prevalecente, ao longo da história. Os alunos podem, na escola, desenvolver saberes que facilitem a compreensão e envolvimento em decisões estéticas, apropriando-se de “saberes culturais e contextualizados referentes ao conhecer e comunicar arte e seus códigos”. Para tanto, os estudantes devem ter melhor conhecimento das “práticas e teorias de produção, apreciação, reflexão das culturas artísticas em suas interconexões e contextualizações socioculturais”. Por isso, a concretização e apreciação de produtos artísticos pelos alunos requer aprender a trabalhar combinações, reelaborações imaginativas – criativas, intuitivas, estéticas – a partir de diversos elementos da experiência sensível da vida cotidiana e dos saberes sobre a natureza, a cultura, a história e seus contextos. É na travessia dessas mútuas e múltiplas influências entre reelaborações imaginativas da arte e experiências com as realidades culturais em que vivem que os adolescentes, jovens e adultos da escola média vão desvelando o sentido cultural da Arte e de seus conhecimentos para suas vidas (PCNEM – Linguagem, Códigos e suas Tecnologias, 2000, p. 49). No Ensino Médio, será interessante para o aluno descobrir que as relações do fazer e apreciar artístico são reconstruídas ao longo da história. E que entre os fatores que influenciam nessas mudanças está a maneira como as pessoas interligam aspectos materiais disponíveis na sociedade, de signos perceptivos e simbólicos relacionados a natureza e a cultura, e “expressões- sínteses de sentimentos, de emoções” vivenciados no mundo sócio-cultural. Os estudantes que freqüentam a escola média, ao desenvolverem fazeres artísticos por meio das linguagens e códigos da música, artes visuais, dança, teatro, artes audiovisuais podem aprender a desvelar uma pluralidade de significados de interferências culturais, econômicas, políticas atuantes nessas manifestações culturais (PCNEM – Linguagem, Códigos e suas Tecnologias, 2000, p. 49-50). Competências e habilidades a serem desenvolvidas em Arte Os traços gerais dados pelo PCNs aqui serão apresentados; porém, ao se tratar das especificidades de cada linguagem artística, verificaremos apenas as propostas para o ensino de teatro. O desenvolvimento das competências em Arte está diretamente ligado à prática dos modos de fazer artístico e das “maneiras de fazer apreciações e fruições em cada linguagem da Arte ou em várias possibilidades de articulação”. Para uma compreensão mais ampla, há necessidade de que essas práticas sejam acompanhadas de pesquisa, reflexão, troca de idéias e contextualização histórica e sócio-cultural. A escolha do que será trabalhado em cada série do Ensino Médio deve ser cuidadosa e procurar conteúdos que envolvam os estudantes e possibilitem um “exercício de colaboração artística e estética com outras pessoas com as quais convivem, com a sua cultura e com o patrimônio artístico da humanidade”. A apresentação dos conteúdos escolhidos deve ser feita de maneira viva e instigante. O intuito do processo de ensino-aprendizagem de Arte é, assim, o de capacitar os estudantes a humanizarem-se melhor como cidadãos inteligentes, sensíveis, estéticos, reflexivos, criativos e responsáveis, no coletivo, por melhores qualidades culturais na vida dos grupos e das cidades, com ética e respeito pela diversidade (PCNEM – Linguagem, Códigos e suas Tecnologias, 2000, p. 50). “Realizar produções artísticas, individuais e/ou coletivas, nas linguagens da arte analisando, refletindo e compreendendo os diferentes processos produtivos, com seus diferentes instrumentos de ordem material e ideal, como manifestações socioculturais e históricas”. Por meio dessa competência espera-se que o aluno possa compreender o fazer artístico em toda a sua complexidade, não só na técnica como no pensamento que envolve todo processo de criação artística. Ao longo do processo de criação, é necessário que se realizem constantes análises, reflexões e, muitas vezes, adaptações do projeto inicial. As mudanças podem ser feitas tanto nas questões materiais – que no caso de uma criação teatral são os gestos, por exemplo - quanto aos elementos mais formais que envolvem as idéias do artista. No caso do ensino de teatro, as competências dos alunos caracterizam-se por saber: criação de possibilidades expressivas com os elementos próprios do teatro – corpo, face, voz, movimento, gesto; improvisar, interpretar e atuar personagens, tipos, coisas, situações; compreender a relação palco/platéia e atuar sob esse acordo; pesquisar, analisar e adaptar textos visando a montagem teatral. “Apreciar produtos de arte, em suas várias linguagens, desenvolvendo tanto a fruição quanto a análise estética, conhecendo, analisando, refletindo e compreendendo critérios culturalmente construídos e embasados em conhecimentos afins, de caráter filosófico, histórico, sociológico, antropológico, psicológico, semiótico, científico e tecnológico, dentre outros” (p. 52). É esperado que, além de criar, os alunos sejam capazes de apreciar, porém devem aprender a realizar uma apreciação crítica e reflexiva. Para que possam ser críticos é preciso que saibam reconhecer os elementos trabalhados e as maneiras exploradas pelo artista. Espera-se que os alunos se tornem competentes para apreciação em teatro: “observar trabalhos teatrais como participantes espectadores e pesquisar em acervos de memória outras experiências significativas de artistas e técnicos de teatro que se relacionem com suas experiências e preocupações” (p. 54). “Analisar, refletir, respeitar e preservar as diversas manifestações da arte – em suas múltiplas linguagens – utilizadas por diferentes grupos sociais e étnicos, interagindo com o patrimônio nacional e internacional, que se deve conhecer e compreender em sua dimensão sócio-histórica” (p. 54). O fundamental dessa competência é que o aluno seja capaz de contextualizar as produções artísticas que realiza e as que aprecia. Percebendo a influência sócio-histórica na construção da cultura, o aluno desenvolve o sentido da construção das identidades e convivência com as diversidades culturais. “Valorizar o trabalho dos profissionais e técnicos das linguagens artísticas, dos profissionais da crítica, da divulgação e circulação dos produtos de arte”. (pág. 54) Além de apreciar e produzir, é importante que o aluno seja capaz de valorizar as manifestações artísticas de grupos sociais diferentes em tempo e espaço diversificados, atentando para as qualidades específicas de cada uma e respeitando a sua manifestação. Com o intuito de valorizar as produções de teatro os alunos devem: aprofundar seus conhecimentos da história e estética do teatro, para distinguir a linguagem e os códigos cênicos; valorizar toda rede de profissionais e técnicos envolvidos na produção teatral e na crítica e divulgação da mesma. Os PCNs salienta a importância de permanente aperfeiçoamento do professor de Arte para que a qualidade do trabalho seja coerente com as propostas. Na finalização do PCNEM – Área de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias há um pequeno capítulo “Rumos e Desafios” que nos traz reflexões interessantes sobre a prática nessa Área do conhecimento. A fala, a escrita, os movimentos corporais, a arte estão intimamente ligados à cognição, à percepção, à ação, sendo expressões da cultura. Todos os sistemas procuram tornar os significados comunicáveis. As linguagens se afastam no plano da expressão, constituindo formas próprias de manifestação, e voltam a se encontrar no plano do conteúdo, pano de fundo da construção humana dos símbolos (PCNEM – Linguagem, Códigos e suas Tecnologias, 2000, p. 64). Para o sucesso na comunicação o aluno deve dominar todo o código, inclusive em suas manifestações mais subjetivas que exijam reflexão e distanciamento da situação. A apreciação e produção artística integram a área na perspectiva de recuperar as “formas instituídas de construção do imaginário coletivo”. Dessa maneira, o contexto sócio-cultural e histórico é compreendido como fundamental para o entendimento da produção de significado. A interação entre as diversas linguagens que compõem a Área é sugerida para que se alcance uma maior inter-relação dos sistemas de linguagem, porém sem deixar as especificidades de cada uma. O professor também deve ter uma postura de interação, abrindo espaço para discussão e crítica das manifestações dos grupos sociais em que os alunos estão inseridos. 4.3 Análise Comparativa dos Parâmetros Curriculares Nacionais Inicialmente gostaria de comentar a maneira que enxergo cada PCN, ponderando as questões teóricas do pensamento geral do MEC para a Educação Básica em relação ao aprendizado em Arte. No Parâmetro Curricular Nacional para o Ensino Fundamental encontramos uma visão mais técnica do ensino de Arte que é tratada como conhecimento vasto a ser explorado em todo o seu conteúdo técnico, histórico, cultural, documental, apreciativo. Não há menção a qualquer relação com outras linguagens ou disciplinas escolares. A estrutura pela qual o PCNEF é apresentada não deixa espaço para reflexão, discussão e possíveis mudanças; tendemos a perceber as propostas como metas a seguir. No PCNs para Ensino Médio, o ensino de Arte passa a ter um caráter de formação de identidade e contextualização sócio-histórica; as questões técnicas da produção e apreciação em arte também são conteúdos exigidos. A preocupação com a esfera cognitiva e com a linguagem vêm em primeiro plano, começando pelo fato de Arte fazer parte da Área de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias dentro do PCNs. A apresentação do PCNEM nos instiga a discussão, favorecendo a reflexão do material proposto. Verifico na leitura de ambos os Parâmetros um indicativo pioneiro, que deve ser valorizado: tratar a Arte como área essencial do conhecimento humano a ser trabalhada na escola, de maneira madura e responsável. Sabendo da trajetória do Ensino da Arte dentro das escolas brasileiras nota-se aí um enorme avanço, em que a Arte não mais é tratada como acessório às demais disciplinas ou como disciplina decorativa. Nesse aspecto, percebo no PCNs do Ensino Médio maior maturidade e equilíbrio, tratando os conteúdos de Arte em seus aspectos e elementos particulares, mas também, relacionando-os com os demais conteúdos da Área na qual está inserida – área de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias. Isso deve permitir aos alunos uma visão mais contextualizada da própria Arte, entendendo-a como produção intrínseca da Humanidade. De maneira geral, identifico na elaboração do texto do PCNEM um maior respeito às propostas e idéias do MEC, porém propiciando um aprofundamento nas questões da prática de ensino na Área. No PCNs para o Ensino Fundamental podemos encontrar um grande aprofundamento nos conteúdos que devem ser trabalhados, porém falta coerência com as próprias propostas. Fala-se tanto em contextualização e essa idéia só é trabalhada nos conteúdos quando se trata de contextualizar uma obra de arte em seus aspectos formais e históricos após sua apreciação, não em relação à história da Humanidade ou à produção de linguagem. Mesmo com o alto grau de detalhes dos conteúdos propostos vejo como grave a falta de uma exploração das questões cognitivas e de contextualização da Arte. Em relação ao ensino específico do Teatro encontramos - nos dois PCNs - a mesma estrutura de trabalho: saber fazer, saber apreciar, saber contextualizar. Para ambas a pesquisa, a vivência e a noção da construção histórico-social da Arte são fundamentais para o aprendizado na área. Podemos identificar nas propostas do PCNEF para Teatro um detalhamento maior sobre o que se deve/pode trabalhar nos conteúdos e o que se deve procurar alcançar nos objetivos; há um investimento em promover um conhecimento aprofundado na Área. No PCNEM a consciência para um trabalho com teatro (arte) de maneira mais natural e prazeroso pode ser percebida na maneira como se colocam as propostas – não exigem um aprofundamento teórico e prático tão intenso como no PCNEF – visando sempre que os conhecimentos específicos sejam contextualizados na construção simbólica dos próprios alunos. Além de reforçar, no final de seu texto, a importância do aprimoramento e valorização do próprio professor de arte. Devemos levar em consideração ainda, o tempo destinado ao trabalho da disciplina Arte e, especificamente do teatro, em cada contexto escolar. Durante o Ensino Fundamental (quatro anos) e o Ensino Médio (três anos) são destinadas duas aulas semanais para Arte e, enquanto as Leis de Diretrizes e Bases da Educação nos cobra o ensino de todas as linguagens da Arte (música, artes visuais, teatro e dança), não encontramos nas unidades de ensino profissionais formados nas diversas linguagens da arte. Após analisar a estrutura e as idéias gerais dos PCNs e aproveitando os comentários já feitos, faremos a análise dos temas propostos como foco da pesquisa. O primeiro item importante é a profundidade e complexidade dos conteúdos a serem ensinados para cada faixa escolar. Pudemos observar no PCN para o Ensino Fundamental a existência de grande profundidade e complexidade técnica e teórica do conteúdo artístico teatral. As propostas envolvem detalhamentos exigidos de profissionais da área e buscam um constante aperfeiçoamento do aluno como fazedor da arte, pesquisador e apreciador – um apreciador com opiniões formadas dentro de profundo estudo dos elementos formais da produção teatral, formação de um crítico de arte. Os aspectos sociais e culturais são trabalhados no PCNEF apenas na associação com a produção ou na pesquisa teatral. O aluno deve, com a orientação do professor, procurar em acervos públicos e bibliotecas, dados que contribuam para o seu conhecimento histórico e para contextualização sóciocultural do espetáculo teatral que assistiu, da peça que leu, deseja montar ou que foi proposta pela professora. Não encontramos no PCNEF qualquer idéia ou proposta de interdisciplinaridade, mesmo que parta do conteúdo estudado pela disciplina Arteteatro. O PCN para o Ensino Médio já nos mostra uma idéia mais próxima da interdisciplinaridade desde o início de sua apresentação, classificando o ensino do teatro (dentro da disciplina Arte) como parte fundamental da Área de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias. Durante a leitura do texto, podemos perceber algumas interferências de outras áreas do conhecimento, deixando a cargo do professor optar ou não por realizar uma ligação direta dentro da escola e com outros professores. Outro fator fundamental nesse PCN é a questão sócio-cultural que aparece como estruturante na redação do documento. É a partir do contexto sóciocultural que o MEC posiciona a Arte na área de linguagem e códigos, como parte integral na construção de significados na sociedade. Portanto, considera que as produções teatrais têm um laço essencial com as circunstâncias históricas e sociais nas quais foram realizadas, incluindo as que são produzidas pelos alunos no contexto escolar. Tais aspectos devem ser trabalhados com os alunos com o intuito de conscientizá-los de seu papel na produção, preservação e transmissão de cultura e como ser social dentro de uma estrutura política da qual é participante e formador. Em relação aos conteúdos propostos pelo PCNEM podemos identificar os mesmos traços encontrados no PCNEF – o ensino de elementos técnicos e teóricos por meio do fazer, pesquisar e apreciar -, porém há preocupação de que sejam conteúdos escolhidos a partir do que conhecimento do grupo social a que estarão sendo propostos. Deve-se considerar o universo sócio-cultural do aluno e envolvê-lo na busca do conhecimento artístico-teatral, esse é adquirido no decorrer do processo de criação e apreciação. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Gostaria de, antes de me posicionar especificamente sobre a discussão proposta, citar um trecho do livro de Ricardo Japiassu, Metodologia do Ensino de Teatro, no qual faz uma referência ao pensamento de Vygotsky. Acredito que seja a idéia primeira desse trabalho na medida em que tenta nos lembrar do importante papel do ensino de Teatro, dentre as Artes, para a formação do indivíduo. As artes, entendida como formas humanas de expressão semiótica, ou seja, como processos de representação simbólica para comunicação do pensamento e dos sentimentos do ser humano, fizeram com que seu valor e importância na formação do educando fossem concebidos em novas bases. Sabe-se, hoje, que a principal característica que distingue o ser humano das outras espécies animais é o uso social de signos para a comunicação, controle, organização e transformação de seu comportamento. Esse uso dos símbolos como instrumentos psicológicos afeta de forma irreversível o funcionamento mental humano, bem como a estrutura das relações entre pessoas intra e intercultural (Vygotsky, 1987 e 1998 apud JAPIASSU, 2003, p.22). Lembrado, então, a fundamental importância da Arte, no nosso caso, especialmente do teatro na formação psico-social do aluno, podemos começar a pontuar algumas questões que vêm sendo expostas neste trabalho, desde o início. Mesmo sem analisar o material já me depararei com um erro crasso no sistema de ensino, que pode ser formulado pela seguinte pergunta: como os Parâmetros Curriculares Nacionais e Leis de Diretrizes e Bases não chegam à escola? Mesmo sendo um material essencial para a construção de uma proposta pedagógica consciente, para discussões em Planejamento Anual e mesmo em reuniões pedagógicas a maioria dos profissionais da área desconhecia o conteúdo dos documentos. Depois de constatar essa falha, pude perceber outro equívoco grave: algumas das propostas dos PCNs eram incompatíveis ou ignoravam as Leis de Diretrizes e Bases e outros pareceres e decretos do Ministério da Educação e da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo. É o que encontrei, por exemplo, nos PCNs EM e EF, nos quais há uma grande barreira na relação de interdisciplinaridade ou de transdisciplinariedade - nem são citadas - , mas que são propostas que fazem parte de diversos pareceres do MEC como: Parecer CNE/CEB no4, de 29 de janeiro de 1998 (que trata das Diretrizes Curriculares para o Ensino Fundamental) e o Parecer CEB no 15, de 1 de junho de 1998 (trata das Diretrizes Curriculares do Ensino Médio). O ideal seria encontrarmos um equilíbrio entre o conteúdo “em simesmado” e o diálogo entre conteúdos de outras disciplinas. Tal preocupação em demasiado aprofundamento teórico e prático na área para as crianças, pré-adolescentes e adolescentes do Ensino Fundamental pode tornar os alunos até mesmo arredios aos conhecimentos em Teatro. É o que nos alerta Richard Courtney: “Educação Dramática, portanto, não implica em treinar as crianças para o palco”, pois há um exagero em algumas novas teorias de resgate do teatro, encontramos isso em certa medida nos PCNEF. Mesmo com algumas especificidades em suas teorias, pudemos concluir, a partir da unanimidade dos autores, que só se aprende com prazer e envolvimento; em outras palavras e mais diretiva na nossa questão central: o teatro só se aprende através do jogo, o jogar é similar ao brincar. Conhecendo ainda as propostas dos PCNEF e as idéias do MEC de que se trabalhe todas as linguagens da Arte durante os nove anos do EF, onde poderemos encontrar um momento para “gostar” de Arte? O contato com a Arte deve se dar de maneira mais prazerosa e natural, trazendo aos poucos elementos que façam os alunos refletir sobre questões condizentes com sua faixa etária e com seu universo cultural. O grande desafio é fazer com que a Arte faça parte da vida desses alunos e que eles possam compreendê-la em sua amplitude teórica, prática, histórico-social e que possam participar da construção de significados artísticos e estéticos. As propostas do PCNEF buscam um aperfeiçoamento técnico e teórico em todas as áreas da Arte - vimos apenas a do teatro e já nos parece um currículo digno de curso universitário – de alunos que iniciaram a sua alfabetização, que acabaram de sair do Jardim, do Pré onde a brincadeira era possível, estimulada. As muitas linguagens artísticas que devem ser trabalhadas agora como “disciplinas” que carregam todo um peso teórico; até momentos atrás, eram tratadas como recreação, parte do cotidiano ou lazer na vida das crianças. Além desses fatos, as condições das escolas para o trabalho com Arte – não há material, espaço ou profissionais, pois eles são formados apenas em uma das linguagem da Arte – ,torna inviável, ou até, impossível o trabalho aprofundado proposto pelos PCNs, tanto em relação aos profissionais quanto ao tempo disponível – como trabalhar todas as linguagens da Arte com todo o aprofundamento desejado em tão pouco tempo? As linhas gerais dos PCNs são respeitadas, porém levadas a interpretações diferentes. Acredito ser valiosa a parceria que o PCN para o Ensino Médio faz com as diferentes Linguagens que foram criadas, elaboradas e lapidadas pelo homem ao longo de sua História. O que mais me instigou no PCNEF foi: há uma desvinculação ou pouco interesse nas questões cognitivas e de linguagem nas quais está mergulhado o universo da arte e da estética. É essencial que a compreensão dessas linguagens seja trabalhada paralelamente na escola, no intuito de enriquecer a construção da própria linguagem dos alunos e da compreensão do universo em que vivem. Encontramos nos PCNEM uma ligação forte entre as linguagens, porém ainda não há sugestão, insinuação ou estímulo à interdisciplinaridade; poderíamos considerar que ambos PCNs falham nesse aspecto. Em relação à distribuição temporal e profundidade de conteúdos em teatro propostos para o Ensino Médio, acredito que haja uma maior coerência e maturidade. Os conteúdos são todos trabalhados a partir do interesse e do universo dos alunos, como meio de identificação sócio-cultural e de envolvimento em prol dos conhecimentos específicos da linguagem teatral. Porém, ainda há a proposta de se trabalhar todas as linguagens artísticas e, são apenas duas aulas semanais, por três anos de ensino. Ainda há o agravante de que algumas escolas optam por substituir as aulas de Arte do último ano por “alguma disciplina mais importante para o vestibular”, como o que ocorre nas escolas particulares e públicas que substituem essa aula por aulas de física, matemática, química ou biologia. Essa relação com o ensino de arte-teatro ainda não foi superada e as aulas ainda são vistas como desperdício de tempo. Na escola onde leciono há turmas do 3o ano do Ensino Médio sem aula de Arte; toda vez que cruzam comigo pelos corredores me questionam o por quê. Também encontramos no PCNEM uma proposta mais elaborada em relação aos aspectos sociais e culturais, tanto das questões da própria disciplina como dos alunos. A área em que se “encaixa” o ensino do teatro é tratada como estrutura fundamental da construção da humanidade como a conhecemos, reforçando a comunicação como elemento diferencial da sociedade humana e diferente nas comunidades nas quais se divide. Essa diversidade deve ser respeitada e trabalhada em sala de aula; as idéias centrais dessas culturas trazidas pelos alunos são transformadas em alicerces para o conhecimento a ser adquirido. Lapida-se, aprofunda-se e valorizase o que é a base para construção de significado. Percebemos que há muitos avanços na concepção de uma idéia de ensino de Arte e, especialmente de teatro ao longo desse último século. Temos inúmeros teóricos trabalhando para criar teorias profundamente enraizadas no pensamento científico de diversos campos do conhecimento, com o intuito de envolver a todos na recuperação do que é, ou pode ser, a melhor estratégia para se ter um aprendizado atraente, envolvente, capaz de ensinar o que é essencial - o conhecimento cognitivo, capacidade de solucionar problemas e a capacidade de criar, sem deixar de lado o respeito e valorização do grupo e o respeito e reconhecimento da própria identidade. 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: BRASIL, Secretaria de Educação Fundamental. 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