O Islã, uma religião que desperta interesse e acelera a

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“O Islã, uma religião que desperta interesse e acelera a conquista de fiéis no Brasil”
Dilaci S. Faria*
[email protected]
A presença do Islã é cada vez mais marcante em todo o mundo. Conforme noticiou o jornal
Reuters (1) “O Islã ultrapassou o catolicismo romano como a maior religião do mundo”, informação
veiculada no anuário estatístico de 2008 do Vaticano, que registrou o percentual 19,2 de
muçulmanos na população mundial, e de 17,4 a de católicos. No Brasil, aguarda-se o resultado do
censo IBGE 2010 para ser retratado o Islã neste país.
Por qual motivo o Islã, uma religião com características tão peculiaridades, tão diferentes
daquelas a que estão acostumados os brasileiros, nascidos num país abrigado pelo manto do
catolicismo, tem crescido e despertado tanto interesse em estudiosos das mais diversas áreas de
conhecimento? Certamente, a imprensa internacional - ao noticiar fatos ocorridos em países
muçulmanos- estimula a curiosidade sobre seus habitantes, suas crenças e práticas religiosas. Mas,
afinal, o que é o Islã? A que se propõe? Religiosos, sociólogos, antropólogos e historiadores
brasileiros e latino-americanos buscam se aprofundar no entendimento do Alcorão, livro sagrado do
Islã, ao mesmo tempo em que procuram
conhecer em detalhes a vida do Profeta
Muhammad(Maomé), tanto quanto as práticas religiosas e o modo de vida dos muçulmanos. No
Brasil, as comunidades islâmicas mais expressivas se encontram em São Paulo, Paraná, Santa
Catarina e Rio de Janeiro. A proposta desta comunicação é avançar no conhecimento da realidade
do Islã no Brasil e contribuir para uma melhor compreensão de seu crescimento.
Palavras-chave: Islã, muçulmano, catolicismo.
1
* Mestranda em Ciência da Religião. Programa de Pós Graduação-PPCIR-Universidade Federal de
Juiz de Fora. MG. Brasil
“O Islã, uma religião que desperta interesse e acelera a conquista de fiéis no
Brasil”
Introdução.
O islã é uma religião revelada por Deus ao profeta Muhammad(Maomé), no século
VII, na região onde se localiza hoje a Arábia Saudita. As revelações divinas foram
memorizadas e registradas após a morte do profeta constituindo-se em um livro sagrado:o
Alcorão.(JOMIER:1992) Essa religião expandiu-se por quase todas as partes da Terra. E, no
início do século XV, com a descoberta do Brasil o islã chegou a este a país pelas mãos dos
portugueses, onde, até os dias atuais apresenta crescente aceitação.
Em razão da progressiva presença do islã no Brasil esta abordagem elegeu, como
forma ilustrativa, duas comunidades muçulmanas: a Associação Beneficiente Islâmica de
São Paulo e a do Rio de Janeiro, marco inaugural e significativo do islamismo
contemporâneo brasileiro que essas Associações representam.
1.As primeiras influências do islã no Brasil
A colonização do Brasil por seus descobridores portugueses trouxe, na sua bagagem
para este país, língua, linguagem, expressões idiomáticas,diversos modelos culturais
marcados pela força do idioma e cultura árabe.Isso porque os mouros, assim conhecidos os
árabes muçulmanos, conquistaram a Península Ibérica a partir do século VII.A ocupação
muçulmana desse local durou cerca de 700 anos, quando o general bérbere, Táric ibnZiyad,invadiu a Espanha em 711, e terminou no século XV, com a rendição do emir Boabdil
de Granada, em 1472.2 Nas suas conquistas territorias os árabes estenderam seus domínios
do norte da Africa até Ibéria, e para leste atingiram a Ásia central e India.
A língua árabe,que é de origem semítica,possui caracteres específicos e profundas
diferenças das linguas neolatinas influiu de maneira significativa no idioma português.São
mais de 1.000 palavras com características árabes, sendo que cerca de 200 delas ainda são
muito usadas.Para Carolina Michaëlis de Vasconcelos:
“os elementos árabes, não só numericamente, mas também
quanto à sua importância, são os mais notáveis entre os não latinos
da língua portuguesa. Esses factos-continua a filóloga lusitanacompreende-se bem. Foram séculos de convivência forçada,muito
embora e em regra bélica, com homens sagazes, de civilização
superior brilhantíssima, e que exerceram nos domínios conquistados
2
FRANCA, Rubem. Arabismo, uma mini-enciclopédia do mundo árabe.Pernanbuco: Editora
Universitária-UFPE. 1994. p.21
uma actividade fecunda, tanto agrária como
científica”(Lições de Filologia Portuguesa, p.299)3
artística
e
Na África, conforme já mencionado,desde o século VII, o Islã era praticado e os
portugueses, tão logo lá chegaram, receberam influência muçulmana.E,quando esse povo
de Portugal, séculos depois, descobriu, conquistou e colonizou o Brasil transmitiu seus
hábitos culturais e religiosos, marcadamente influenciados pela língua e costume
islâmicos.Todos esses fatos históricos mostram o tecido cultural português que os
descobridores e os colonizadores usavam quando aqui aportaram, se estabelecendo a partir
de 1500.
Algarismo,álgebra,algorítmo,zero
são
dentre
outras,
palavras
árabes.
Alfaiate,tarrafa,zênite são arabismos, como também almaço, casmurro,garrido,os verbos
afagar,alvoroçar,arrematar,mourejar e as interjeições alvíssaras!, oxalá!, arre!.
Algumas expressões usadas na língua portuguesa são comuns no diálogo dos
muçulmanos, como por exemplo, “ Insh Allah” cuja tradução é “se for da vontade de
Allah”, ou seja “se Deus quiser”, que se refere a uma situação futura só conhecida por
Allah que determina para o crente do Islã o que vai lhe acontecer.Outra expressão que
também se encontra no diálogo cotidiano muçulmano é “Al Hamdulilah”, frase para
manifestar a gratidão ao Criador,que significa“graças a Deus”, e é muito usada pelos
brasileiros. Os termos islã, islamismo e islâmico provêm da palavra árabe islan que
significa resignação, rendição,submissão a algo ou alguém.4 No caso da religião do islã o
fiel se submete à vontade e determinação de Allah pois os muçulmanos entendem que um
crente em Allah vive, incondicionalmente, nessa submissão.
Um fato de suma relevância para a entrada do islã no Brasil foi a chegada da mão
de obra escrava negra, no século XVIII. Alguns grupos de negros que vieram para o Brasil,
como escravos, eram conhecidos como MALÊS, nome de significado controverso (REIS,
2003). A mais apropriada definição é que a palavra Malês surgiu a partir de Mali, com o
objetivo de identificar os pertencentes ao Império Mali, reino muçulmano no vale do Rio
Niger, na África (BASTIDE, 1971).Os escravos muçulmanos que vieram dessa região foram
levados para a Bahia e posteriormente “male” passou a ser o nome atribuído ao negro
muçulmano.A comunidade africana “malês” procurou manter no Brasil sua identidade
étnica, cultural e religiosa: memorizavam o Alcorão e os mais instruídos procuravam
3FRANCA, Rubem. “Arabismo, uma mini-enciclopédia do mundo árabe”.Pernambuco: Editora
Universitária-UFPE. 1994. p.21
BINGEMER,MariaClara
Lucchetti.Org.
“Violência
e
islamismo,judaismo.Três religiões em confronto e diálogo”.p 176.
4
Religião-
cristianismo,
alfabetizar crianças e adultos. No entanto, não foi possível evitar uma gradual crioulização
do Islã no Brasil (DEMANI, 2008).
Esses escravos organizaram movimentos de libertação na Bahia, no século XIX, e
uma das maiores revoltas ocorridas (1814), ficou conhecida como “A revolta dos Malês”.O
grupo foi dissolvido, condenado, alguns mortos e outros deportados para a África.O
pequeno
número
que
restou
viveu
na
clandestinidade
e
atualmente,
um
islã
especificamente negro ou com ideologia de negritude parece não mais existir no Brasil.
(DEMANI, 2008)
2. As imigrações árabes após a visita de D. Pedro II ao Oriente Médio.
A história do Brasil narra que foi por meio do Imperador D. Pedro II que vieram as
primeiras levas de imigrantes árabes para a terra brasileira, pois, ao realizar duas viagens
diplomáticas ao Oriente Médio em 18715,visitou o Egito; em 1876, o Líbano,a Palestina e a
Síria.D. Pedro II mostrou-se fascinado pela cultura desenvolvida ali e pela amabilidade do
povo árabe.6 O povo da Síria e do Líbano, que vivia sob dominação do Império TurcoOtomano, encontrou na emigração uma maneira de sair fora da dominação turca. Os
árabes que professavam a religião cristã eram perseguidos pelos turcos de fé islâmica, fato
que muito influenciou na decisão de, no fim do século XIX,saírem de seus países e
procurarem outros lugares do mundo para se instalarem: América do Norte, América do
Sul, e, o Brasil. Recentemente,no mês de março de 2010 o então presidente do Brasil, Luís
Inácio Lula da Silva, esteve em viagem pelo Oriente Médio.Esses foram os únicoa estadistas
brasileiros que,até hoje, visitaram essa região.
O Brasil era um país pouco conhecido do mundo árabe, e muitos imigrantes
pensaram que estavam se dirigindo para América, a do Norte, para os Estados Unidos,
quando deixaram suas pátrias.Ao aportarem em terras brasileiras ficaram surpresos de
estarem de fato, na América do Sul e no Brasil.7 Os registros oficiais apontam a chegada
significativa desses imigrantes aos portos de Montevidéo, Buenos Aires, Rio de Janeiro e
Santos. Nas décadas de 1870, 1880 e 1890 essa movimentação iria se acentuar, sendo que
muitos desses imigrantes acabaram fixando residência na faixa de fronteira gaúcha, em
5Fonte:
www.libanbylody.com.br/dpedroliban.html- Acessado em 20-08-2011
6
Cabe lembrar que o orientalismo, a partir do século XVIII,tornou-se um campo intelectual de
estudos na Europa, quando se pensava que os muçulmanos eram uma unidade cultural homogênea
com uma forma de vida e organização social baseada precipuamente nos ensinamentos do Alcorão.(
Said,2010.p.99)
7
Fonte:http://icarabe.org/- Acessado em 20-08-2011
especial nas cidades de Santana do Livramento e Rivera, Barra do Quaraí, Bagé, Quaraí,
Artigas e Chuí.8
Por volta de 1900 calcula-se que havia chegado ao Brasil cerca de 5.400 árabes. Nos
anos vinte o movimento foi revitalizado com um contingente por volta de cinco mil
entradas anuais. A partir de então, a depressão e o sistema de quotas adotado pelo
governo brasileiro colocaram o movimento imigratório em níveis baixos.
Até 1908, os imigrantes sírios e libaneses não eram discriminados pelos registros
imigratórios, mas apenas englobados na categoria "outras nacionalidades". Em termos
relativos, as estatísticas disponíveis para o estado de São Paulo apenas permitem focalizar
períodos compreendidos após esta data.9 E no início do século XX, devido aos problemas
sócio-econômicos agravados no Oriente Médio a emigração aumentou e em 1920 viviam no
Brasil cerca de 50.00 árabes.
Os árabes eram imigrantes em busca de melhores condições de vida.De maneira
diferente do que aconteceu com as outras emigrações, os sírios e libaneses não vieram
para atuar na agricultura. Iniciaram a vida no Brasil como mascates e com o passar do
tempo tornaram-se comerciantes, grandes varejistas e industriais. Os libaneses formam
atualmente a maior colônia de origem árabe, com cerca de 6 milhões de pessoas, somando
imigrantes e descendentes. Ao lado deles, a comunidade árabe-brasileira é reforçada por
sírios, palestinos e, em menor número, egípcios, marroquinos, jordanianos, iraquianos e
outros grupos. A população árabe ou de origem árabe no Brasil é hoje de quase 10 milhões,
e de árabes-muçulmanos, aproximadamente 1 milhão.10
Apesar de estarem em vários estados brasileiros,os árabes concentraram-se
inicialmente no sul e sudeste
brasileiro, e hoje desempenham papel relevante no
desenvolvimento da economia do País distribuídos em todo território nacional. Além dos
primeiros imigrantes cristãos, vieram também, para o solo brasileiro os muçulmanos, tanto
adeptos da tradição sunita como a xiita, havendo um grupo minoritário que se dedicava ao
sufismo.
Como ocorreu em toda a latino América, esses árabes muçulmanos não mantiveram
sólidas comunidades. A tradição do Brasil de tolerância comunitária e de mestiçagem
custou aos imigrantes assimilação de tipo de vida local.De forma diversa da xenofobia que
prejudicou a posição do Islã na Europa e nos EUA, no Brasil a sobrevivência de uma cultura
8
Fonte:http://icarabe.org/- Acessado em 20-08-2011
9
www.imigrantesbrasil.com/2008/05/imigrao-rabe-no-brasil.html-Acessado em 23-08-2011
10
Fonte:http://icarabe.org/ acessado em 20-08-2011
islâmica específica tem que conviver com uma cultura geral “receptiva demais”, sendo
tida por alguns como “leviana” em relação aos padrões rígidos do puritanismo do islã.
(DEMANI, 2008).
Posterirmente,por causa da guerra civil no Líbano, outros imigrantes vieram e se
concentram em Foz do Iguaçu e em razão dos atentados da al Qaeda, alguns imigrantes
desses grupos receberam acusação de serem atuantes de atividades terroristas
fundamentalista. (DEMANI, 2008).
Com respeito a fé e religião brasileira, percebe-se que há uma mistura de crenças que
não possibilitam visualisar-se de modo claro os segmentos religiosos professados por muitos
brasileiros.Muitos se dizem católicos, não praticantes,outros frequentam a igreja católica e
também centros espíritas. Muitos deixam sua religião e convertem-se a outras, como os
convertidos ao islã.Em razão dessa mobilidade de fé religiosa pode-se dizer que o campo
religioso brasileiro esta em constante mudança,quase sempre ligada às relações de
poder.(BORDIEU,2007).
O sincretismo religioso brasileiro percebe-se pela grande alternância de crenças
professadas, pela assunção de outros credos semelhantes ou diferentes dos conhecidos pelos
brasileiros. O sincretismo não é considerado maléfico para Pierre Sanchis que o considera
como uma maneira de universalizar um processo de construção coletiva de relações
similares entre um universo particular e “próprio” em contato com o universo do “outro.”
(SANCHIS.1994) Isso porque não existe no Brasil uma identidade religiosa firme e forte que
congregue a maioria da
população. (SANCHIS.2001).O que acontece nesse país é uma
constante de redefinição social e religiosa. Em razão desses fatos, a busca por uma religião
que parece mais adequada ao pensar e sentir do fiel o leva a procurar acolhida naquele
credo que lhe oferece resposta ao seu desejo.
3. O surgimento dos polos religiosos muçulmanos.
O marco inicial do processo imigratório de muçulmanos para o Estado brasileiro
ocorreu na região Sudeste do Brasil, precisamente, em São Paulo.Foi na maior cidade de
concentração de populacional brasileira, São Paulo, que surgiu a primeira “Sociedade
Beneficente Palestina, para depois ser nomeada “Sociedade Beneficiente Muçulmana”,
fundada em 1929
11
de onde nasceu a primeira
mesquita,que recebeu o nome de
“Mesquita Brasil.” Essa mesquita começou a ser edificada em 1929,ampliada, reformada e
reinaugurada em 1956.
Sua parte externa é pintada de cor branca e internamente as
paredes são decoradas com pinturas em arabescos no estilo egípcio, lembrando motivos
11
PINTO –Revista USP.SãoPaulo.Nº67, p.237.setembro/novembro 2005.
religiosos do Oriente Médio contemporâneo, remetendo dessa maneira, à lembrança do
observador12 uma “época de ouro” da arte islâmica. Um alto minarete aponta para o céu
de Allah e também dos paulistanos.Situa-se na rua do Estado e destaca-se de outras
instituições islâmicas, como o Centro de Divulgação do Islã para a América Latina 13, que se
encontra estabelecido nessa grande metrópole. O espaço religioso da mesquita, além de
ser usado para as práticas devocionais, é um local onde também são ministrados cursos da
lingua árabe e da doutrina e onde acontecem celebrações de festas sociais como
formaturas e outras similares, além de ser o espaço onde os convertidos aprendem a ler o
Nobre Alcorão. Essa mesquita recebe frequentadores de outras comunidades muçulmanas,
principalmente nas orações de sexta-feira.
As aulas procuram ensinar aos recém convertidos, mas são abertas
aos não-
muçulmanos que desejam conhecer e entender o Islã, o que acaba propiciando novas
conversões. Os trabalhos educativos e religiosos são realizados pelos shaykhs, líderes
religiosos, especializados em cada uma das atividades religiosas que compõem a liderança
da comunidade (liderança das orações, ensino, sermão, consultas morais, etc). Os shaykhs
dessa mesquita são todos oriundos da Universidade Al-Azhar, a instituição de estudos
religiosos mais prestigiosa do mundo sunita, seja da sua sede no Cairo ou de sua filial em
Beirute, ou da Universidade Islâmica de Medina, na Arábia Saudita.
14
A outra mesquita existente em São Paulo que é mais conhecida como Mesquita do
Brás, é a “Mesquita Muhamad Raçulullah” (expressão transliterada e aportuguesada de
Muhammad Rasul Allah – Maomé, o Profeta de Deus).Ela é o centro de referência da ala
xiita muçulmana paulistana, com aproximadamente 20.000 membros, apesar de ser bem
menor o número de seus afiliados que a frequentam assiduamente.
Outro local da região Sudeste do Brasil muito conhecido e pesquisado pelos
estudantes de antropologia, história e religião é a Mesquita do Rio de Janeiro que se
encontra ainda em fase de construção.Situada na rua Gonzaga Bastos,no bairro Tijuca
funciona também como centro religioso de oração e escola.Ela é mantida pela Sociedade
Brasileira Rio de Janeiro, criada em 1950 por um grupo de imigrantes muçulmanos,
comerciantes sírios e libaneses.Gradativamente os adeptos aumentaram e no ano 2.000,
como ensina Montenegro (2.000.p 30 ) havia cerca de 5.000 muçulmanos envolvidos nas
12
PINTO –Revista USP.SãoPaulo.Nº67, p.239.setembro/novembro 2005.
13
Idem.p.239.
14
Ibidem.
práticas da Mesquita. O interessante de se observar nessa comunidade é que ela é formada
por um “conjunto multicultural e multiétnico de árabes e seus descendentes, africanos (
muitos são estudantes no Brasil, além de imigrantes) e brasileiros convertidos de outras
tradições religiosas”15
De modo geral as comunidades muçulmanas no Brasil são formadas por imigrantes
árabes,sua descendência,brasileiros convertidos16 e visitantes muçulmanos, muito deles
africanos, que cumprem a missão de divulgar o Islã. Frequentemente as Associações
recebem visitas de shaykhs de outros países (MONTENEGRO. p. 19)
como parte de um
relacionamento entre comunidades muçulmanas internacionais, as “ummas”
“Umma” é um modelo de irmandade não congregacional de muçulmanos que se
propõe a praticar atos de fraternidade, de solidariedade entre seus pares muçulmanos.A
gênese da
“umma” é a mesma do islã.Surgiu com a saida dos muçulmanos de Meca,a
hégira,e a fixação desse grupo em Medina.Essa primeira comunidade formada no novo local
recebeu o nome de “umma”. A palavra “umma’ originou-se a partir do termo “umm”, que
significa,mãe, ou origem comum.(Dictionnaire d´Íslam, Religion et Civilization. 1997, p
204).Pode ser também inferida da palavra Iman, lider religioso, chefe. (HASSAM, 2002).Os
seguidores do Profeta Muhhammad passaram a constituir uma “umma.”
As Associações procuram seguir o exemplo das primeiras comunidades islâmicas
“ummas”e os fiéis empenham-se em divulgar os ensinamentos do Profeta, atividade
considerada de máxima importância para os muçulmanos.As palavras reveladas por Allah e
transpostas para o Livro Sagrado, junto com os ensinamentos do Profeta, as sunnas,são
memorizadas e os muçulmanos empenham-se em levá-los para sua família, seus colegas de
trabalho e escola.
O Brasil, país de tradição colonial católica, pois os portugueses colonizadores
praticavam em sua maior parte essa ala devocional cristã, convive harmoniosamente com
outras crenças religiosas,o que faz com que a prática do islã não seja submetida a situações
constrangedoras de confronto e rejeição popular aos seus devotos.Muitos dos imigrantes
árabes que praticavam o islamismo em sua terra natal, ao encontrarem um país com
população, na sua maioria católica, acabaram assimilando essa religião.Atualmente, os
brasileiros, sem ascendência muçulmana,procuram o islã como opção religiosa e se
convertem a ela, sem se sentirem menosprezados.No entanto esses
brasileiros, em sua
maioria, não dominam o idioma árabe o que dificulta o aprendizado do Sagrado Alcorão. As
15
PINTO –Revista USP.São Paulo.Nº67, p.231.setembro/novembro 2005.
aulas de árabe ministradas nas mesquitas exigem do aluno grande dedicação e significativa
participação, que nem sempre ele pode dispor.
Algumas mussalas(salas de oração) e mesquitas facilitam no sentido de realizar a
leitura e o sermão de sexta-feira nas duas línguas, árabe e português,mas não há
obrigatoriedade na tradução do árabe para o português. Traduzir o sermão fica a critério de
cada Imann ou Sheikh responsável pela palestra.Os brasileiros que não entendem a língua
árabe, quando o sermão é feito só nesse idioma, ficam sem compreender o significado do
sermão.De modo geral um membro da comunidade faz um breve resumo do conteúdo do
sermão. Por isso muitas comunidades adotam a opção de que a leitura e o sermão sejam
traduzidos. Algumas delas mais arabistas, como as da Foz do Iguaçu, só fazem o sermão em
árabe. Isso parece ser o dilema do islã ocidental em geral: encontrar o equilíbrio entre a
identidade étnica tradicional, de grupos específicos com vocação árabe particular,com a
alteridade de uma outra realidade comunitária que não é de língua árabe e nem cultural e
religiosamente praticante do islamismo o que dificulta o islã a assumir uma posição
universalista,sua vocação inicial.
Uma das práticas devocionais diárias dos muçulmanos, que os convertidos não
possuiam, pois trata-se de ritual peculiar do islã, é a forma de serem rezadas as cinco
orações obrigatórias do dia.Essas orações exigem uma performance única que os brasileiros
ao assumirem o islã praticam criteriosamente como fiéis de Allah.A Salá, a oração, é um
dos atos mais importantes que o muçulmano precisa realizar. Essa prática sistemática e
disciplinada tem contribuído para manter a força do islã. Para orar, o muçulmano se põe
sobre um solo puro, descalço ou usando calçados puros. Para isso é utilizado um tapete
especial, a fim de evitar o contato com o solo impuro. O fiel posiciona-se em direção a
Meca ou para Caaba se estiver em Meca e faz suas preces. A oração é retirada de versículos
do Alcorão que são recitados num ciclo de posições: em pé, em curva, de joelhos e em
prostração. Todas as orações são proferidas em árabe, em qualquer lugar do mundo.
Qual é basicamente essa oração?
“Senhor! A Ti o louvor ” Rabbanâ Iaka I-hamd.
(JOMIER 99). Essa assertiva é sempre repetida em cada oração com pequenas variações:
1. Antes do nascer do sol, de madrugada: oração da aurora (al fajr), após o fim da
noite escura (repetida duas vezes).
2. Imediatamente após o sol ter atingido o ponto mais alto do céu, meio-dia (al
zuhud), oração do meio dia(repetida quatro vezes).
3. Após a metade da tarde (al’açr), oração pós- meridiana (repetida quatro vezes)
4. Imediatamente depois do pôr do sol (maghreb), repetida três vezes).
5.
Após escurecer: oração da noite escura (al-asha), mais ou menos uma hora
depois do por do sol(repetida quatro vezes)
A menção ao sol não significa que o Islamismo seja um culto solar e sim que este
astro serve de referência para a hora da prece. Jomier ensina que de forma geral, é a
partir da puberdade que o homem e a mulher muçulmana ficam obrigados a realizar
individualmente as cinco orações. Além das orações diárias, os homens, às sextas-feiras no
meio do dia, têm que fazer a prece em comum na mesquita, além de ouvir um sermão.
Fora isso, há orações especiais para as grandes festas do ano, para funerais e para
comemorações públicas.
Os muçulmanos não têm que orar em comum na mesquita. Podem rezar
individualmente em qualquer lugar. O que é necessário é buscar o estado de pureza
espiritual e de fato, este último obtido com a prática de abluções, atos de higiene pessoais
necessárias de serem realizados antes de rezar. Lava - se as mãos, o rosto e os pés de
modo determinado pelo ritual.
4.Os muçulmanos no Brasil
Na realidade quantos são os muçulmanos no Brasil? Uma estatística católica mundial
informa que em março de 2008 o número de muçulmanos ultrapassara o número de
católicos. Estimou-se em 1,3 bilhões de professantes do islamismo, número esse que
significa ser o islã o maior religião do planeta Terra. Dessa maneira “o Islã ultrapassou o
catolicismo romano como a maior religião do mundo”, informação veiculada no anuário
estatístico de 2008 do Vaticano, que registrou o percentual 19,2 de muçulmanos na
população mundial, e de 17,4 a de católicos.( PINTO. 2010.p.21)
O Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística,IBGE, é o órgão federal que
coleta,mensura e qualifica as informações relativas às geociências, estatísticas sociais e
econômicas, o que lhe autoriza a realizar censos, analisá-los,organizar as informações
coletas nesses censos para prover os órgãos das três esferas governamentais da
organização política do Brasil,federal, estadual e municipal, além de outras entidades não
governamentais e o público em geral.
No censo demográfico de 2000, num total de 169 872 856 de homens e mulheres
recenseados 124 980 132 indicaram a igreja católica apostólica romana como sua profissão
de fé.Apesar da predominância do catolicismo no Brasil, a proporção de pessoas que se
declararam católicas caiu de 83,8%, em 1991, para 73,8%, em 2000. Em contrapartida, os
evangélicos, que correspondem ao segundo maior percentual, representavam, em 1991, 9 %,
e em 2000 chegaram a 15,4%. Os católicos, evangélicos e sem religião representavam, em
2000, 96,5% da população brasileira. O censo de 2 000 afirma existirem 27.239 muçulmanos
no Brasil, enquanto as instituições islâmicas falam de 1 a 3 milhões de adeptos do islã no
país.17 O Censo IBGE em 2010, nos primeiros resultados definitivos, divulgados em novembro
passado, apontaram uma população brasileira formada por 190.732.694 pessoas.
A informação de religião captada pelo Censo 2010 foi da mesma forma que em 2000,
ou seja, uma pergunta aberta. Dessa forma, não há e nem haverá nenhuma análise da
parte
do
IBGE
sobre
religiões
islâmicas,
especificamente.
Como essa informação só foi coletada no questionário da amostra, elas só estarão
disponíveis a partir de 25 de novembro (expectativa de divulgação dos resultados
preliminares da amostra), porém, os microdados, que permitirão que as análises sejam
feitas pelos interessados, somente no início de 2012.18
[...] os dados estatísticos sobre a presença atual do Islã são
matéria de controvérsia. De um lado, as instituições islâmicas, tais
como o Centro de Divulgação do Islã para a América Latina (CDIAL),
na cidade de São Paulo e a maior parte das Sociedades Beneficentes
Muçulmanas no Brasil se reportam ao número de 1.000.000 de
muçulmanos na soma total e em todo o Brasil.
Ao mesmo tempo, publicações de instituições muçulmanas
internacionais asseveram outras cifras, como por exemplo, afirma Ali
Kettani, do Instituto para Minorias Muçulmanas, que no Brasil os
muçulmanos somam 380.000. Já o Guia Mundial de Grupos
Muçulmanos registra que no início da década de 1980, os
muçulmanos no Brasil já alcançavam à cifra de 500.000, como foi
publicado por MONTENEGRO, S.M. em Dilemas Identitários do Islã no
Brasil e a Comunidade Sunita.
A aproximação mencionada data de 1980.Trinta anos transcorreram após a pesquisa
mencionada pelo Guia Mundial de Grupos Muçulmanos que apontou o número de 500.000
muçulmanos no Brasil.Apesar de não haver dados oficiais sobre essa prática religiosa em
terras brasileiras,nos últimos anos assiste-se a um movimento de “despertar” do Islã no
Brasil, com correspondente ampliação das congregações em razão do apoio logístico e
financeiro que a Arábia Saudita dá a este projeto.Os brasileiros convertidos são estimados
em 10.000, vindos de diversas religiões. A maior dificuldade para esses fiéis é, como já
referido, entender o sermão da sexta –feira, dia sagrado para os muçulmanos, e a oração de
pós o meio dia, que é a mais importante para a congregação realizar em conjunto. Isso
17
PINTO.PauloGabrielHiludaRocha.Islã:ReligiãoeCivilização,umaabordagem Antropológica.p25
18
Informações colhidas no Escritório Administrativo do IBGE, em Juiz de Fora, MG, Brasil.Setembro de 2011.
porque caso haja um único muçulmano que fale a língua árabe essas práticas serão
realizadas no idioma árabe.
A religião islâmica, que inicialmente se restringia a um grupo étnico determinado,
tem assumido nas últimas décadas, paulatinamente, o caráter de uma religião
universalista.Apesar de ser vista ainda como uma religião de outra cultura, a comunidade
brasileira é receptiva e convive com os muçulmanos, sejam eles de berço ou convertidos. A
maioria dos imigrantes que pisou no solo brasileiro tinha intenção de retornar ao seu país.
No entanto,por diversas razões,essas pessoas nem sempre voltaram.Assim, a convivência dos
professantes do islã com os brasileiros fez com que o povo do Brasil conhecesse e se
interessasse pelo islã.No entanto, para Silvia Montenegro, “o islamismo é pouco visível no
Brasil, porque o interesse acadêmico tem se concentrado em certas tradições religiosas
numericamente destacadas,...deixando de lado o islamismo e o judaismo”( MONTENEGRO.
2002).
A partir de 11 de setembro de 2001 a midia, radiofônica,impressa, televisionada,
eletrônica do Brasil e internacional tem destacado quase que diariamente fatos relativos ao
islã. As recentes notícias de conflitos internos que se propagam nos países do Oriente Médio
ocasionam interesse e formam opinião de brasileiros sobre as questões políticas e religiosas
sobre os muçulmanos.Um consenso sobre esses fatos parece não existir no Brasil.
A crescente ampliação das vias eletrônicas de comunicação, ou seja a internet, no
Brasil e no mundo,tornou-se um forte veículo de expansão da divulgação do islã. Numerosos
sítios de informação foram criados para expor sobre o islamismo,a importância do livro
sagrado Alcorão, do estudo da crença e também do cotidiano da vida dos muçulmanos, além
de dados sobre a cultura árabe.Paralelamente a criação de lojas virtuais internacionais e
brasileiras comercializam para os fiéis e para os interessados diferentes produtos:
livros,vestimentas( para as mulheres e homens), adereços.
Junte-se a essas mídias,o fomento de entidades sem fins lucrativos instituidas
especificamente para fazer a divulgação islâmica,participando de feiras de livros,palestras e
informação presencial em munícipios brasileiros e via internet de maneira a possibilitar
distribuição gratuita de livros,desde o Alcorão até simples folhetos explicativos sobre a
religião. Desta maneira o islã torna-se dia-a-dia mais conhecido internacionalmente e
também pelos brasileiros de todas as idades.
Considerações finais.
O contínuo e constante desenvolvimento do islã no Brasil é fato notório.Além dos
cursos realizados nas mesquitas sobre a prática, crença islâmica e língua árabe,
ensinamentos a distância, via internet, tornam-se cada dia mais frequentes.Dessa maneira a
distância física, dificuldades de locomoção para pessoas se disponibilizarem a irem às
mesquitas para conhecer o islã parece não existir mais. Assim,em síntese,é cabível anuir ao
pensamento de PACE sobre a trajetória e organização do islã desde seu início, com o profeta
Muhammad, até os dias de hoje :
“Pode-se dizer, .....que a religião de Mohammad conhece
outro tipo de pluralismo: a diferenciação da mensagem
religiosa, consoante as diversas realidades sócio culturais que
o Islã vai conquistando no seu percurso expansivo desde a
península Arábica a várias amplas áreas do planeta”.19
19 PACE, Enzo. Sociologia
Vozes.2005 p 280
do Islã. Fenômenos religiosos e lógicas sociais.Petropólis.
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Vozes,2005.
do Islã. Fenômenos religiosos e lógicas sociais”.Petropólis.
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MONTENEGRO,Silvia Maria. “Identidades muçulmanas no Brasil: entre o arabismo e a
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SOARES DE AZEVEDO, Mateus – “Iniciação ao Islã e Sufismo”. Rio de Janeiro: Record, 2001
Sites consultados:
www.imigrantesbrasil.com/2008/05/imigrao-rabe-no-brasil.html
http://icarabe.org/
www.libanbylody.com.br/dpedroliban.html
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