Rosélia Maria Silva Vilarins

Propaganda
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
FACULDADE INTEGRADA AVM
A IMPORTÂNCIA DO PROCESSO VISUAL NO DESENVOLVIMENTO
COGNITIVO DO SER HUMANO
Por: Rosélia Maria Silva Vilarins
Orientador
Prof.ª Dra Marta Relvas
Rio de Janeiro 2011
2
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSO”
FACULDADE INTEGRADA AVM
IMPORTÂNCIA DO PROCESSO VISUAL NO DESENVOLVIMENTO
COGNITIVO DO SER HUMANO
Apresentação de monografia à Universidade Cândido
Mendes como requisito parcial para a obtenção do grau
de Especialista em Neurociências Pedagógicas.
Por Rosélia Maria Silva Vilarins.
3
AGRADECIMENTOS
A Deus, que me permitiu realizar mais um
sonho;
A minha orientadora Dra. Marta Relvas, pelo
apoio efetivo e carinhoso durante o curso e a
realização deste trabalho;
Ao optometrista Dr.Ricardo Bretas, que, ao me
falar de Optometria Comportamental, mostroume o caminho das Neurociências;
À Dra. Andrea Rocha Ferreira e à Prof.ª
Sandra Pelegrini, que com paciência e carinho
elucidaram tantas dúvidas;
À Dra. Renata Fully, por me incentivar a iniciar
esta caminhada.
4
DEDICATÓRIA
A meu pai Deusdedit Vilarins e a minha
irmã Rose May Vilarins, que partiram
durante a realização deste curso, com
muito amor e saudade;
A meu grupo familiar unido e querido: mãe,
irmãs e sobrinhos, pelo apoio em todos os
meus projetos;
A Jorge, companheiro de vida e de ideais;
5
RESUMO
Este trabalho tem a finalidade de estabelecer a importância do pleno
funcionamento
do
sentido
da
visão
no
processo
de
aprendizagem
e
desenvolvimento pessoal do ser humano. Para que a visão atinja sua plenitude é
necessário que, desde o nascimento, o olho receba o estímulo da luz e que na
retina haja a formação de uma imagem bem focalizada. Também é certo que cerca
de 50% do córtex cerebral de primatas e seres humanos está envolvido com o
mecanismo visual. Tal preponderância atesta a importância da visão para o pleno
desenvolvimento dos seres.
No momento do nascimento, o globo ocular está com suas estruturas
quase aptas a um perfeito funcionamento. Para a maturação, é fundamental o
estímulo luminoso, que fará com que o desenvolvimento se complete. A retina
precisa receber imagens perfeitas e transmiti-las pelas vias ópticas ao córtex visual.
Imagens perfeitas só são obtidas com a correção de alguma ametropia existente.
Os globos oculares devem estar bem alinhados. Olhos desviados por estrabismo
não propiciarão uma imagem retiniana correta, e olhos com ametropias vão gerar
imagens borradas. Pais, parentes, cuidadores e, mais tarde, professores devem
estar atentos a sinais e sintomas que possam evidenciar a existência de problemas
oculares o mais precocemente possível, já que, até os sete anos de idade, é
possível,
por
meio
de
exercícios
e
estimulação
específica,
reverter
satisfatoriamente alguns quadros de baixa acuidade visual. Embora neurocientistas
já estejam desenvolvendo pesquisas para melhora visual em adultos amblíopes,
esses procedimentos ainda estão na fase de experiências laboratoriais. É
importante que muita atenção seja dispensada para a triagem das condições
visuais desde os primeiros anos de vida e não apenas quando a criança ingressa
na escola, perto dos sete anos de idade, o que impede a possibilidade de
intervenção em uma fase de plasticidade neuronal mais propícia.
No primeiro capítulo, será estudado o globo ocular, com ênfase nas
estruturas responsáveis pelo processo visual. O globo ocular tem o formato esférico
6
e é formado por três túnicas concêntricas. A mais interna, a retina, é uma parte do
cérebro e contém células foto sensíveis, os cones e bastonetes, além de uma rede
intrincada de neurônios que fazem sinapse entre si e iniciam o processamento das
imagens visuais captadas. O nervo óptico, o trato óptico e as radiações ópticas
compõem as vias ópticas e levam ao córtex visual primário os impulsos visuais.
No segundo capítulo, será apresentada a formação do sistema nervoso
central em suas etapas desde o momento da concepção e a origem do globo
ocular. Serão apresentadas pesquisas que mostram a prevalência de deficiências
visuais em crianças. Essas deficiências causam impacto no processo cognitivo e na
escolaridade formal.
A conclusão é que é fundamental que as crianças sejam examinadas
antes mesmo de seu ingresso na escola. Os que convivem com elas devem
conhecer os sinais de dificuldades visuais. Isso vai garantir uma melhor visão,
elemento de grande importância para o desenvolvimento e a educação.
Dificuldades visuais em idades precoces alteram o desenvolvimento da
motricidade,
cognição
e
linguagem
durante
os
períodos
sensíveis
do
desenvolvimento infantil. A baixa acuidade visual está associada ao baixo
rendimento escolar.
As pesquisas sobre prevalência de deficiências visuais deveriam ser
repassadas para as escolas e os dados confrontados com o desempenho escolar.
Assim, teríamos um entrelaçamento de informações que permitiria o planejamento
de ações efetivas em benefício das crianças de nosso país.
Estamos tão familiarizados com o ato de enxergar, que é
preciso um salto de imaginação para nos darmos conta de que há
problemas a serem resolvidos. Mas imagine. Recebemos imagens
invertidas diminutas e distorcidas, e vemos objetos sólidos,
separados no espaço que nos rodeia. Pelos padrões de
estimulação da retina nós percebemos o mundo de objetos e isso é
nada menos que um milagre. (Richard l. Gregory. Eye and
Brain.1966.)
7
METODOLOGIA
Esta pesquisa é uma revisão bibliográfica sobre o problema da
necessidade de prevenção e intervenção precoce, visando evitar a perpetuação de
problemas visuais que ocasionem baixa visão e suas consequências na vida das
pessoas atingidas. A pesquisa foi feita com a leitura de livros e artigos
especializados em algumas áreas como Anatomia e Fisiologia ocular e
Neurociências. Foram consultados sobretudo os clássicos, em busca de opiniões
abalizadas. Também foram utilizados artigos de revistas especializadas com
informações de pesquisas mais recentes sobre o processo do desenvolvimento
infantil e o papel da visão nessa etapa crucial do ser humano.
Nos tratados de Oftalmologia, foram pesquisadas as estruturas oculares
e, nas revistas especializadas, resultados de avaliações visuais em crianças de
vários grupos, buscando as ametropias e as patologias oculares mais encontradas
na infância. Na área da Educação, foram encontradas informações sobre como
acontece a aprendizagem formal e as condições que podem facilitar ou prejudicar o
seu desenvolvimento. Foram consultados, ainda, sites específicos sobre o
desenvolvimento infantil e a importância dos primeiros anos de vida no desabrochar
pleno do ser humano. Após o levantamento bibliográfico, foram realizadas leituras
críticas.
Neste trabalho, foram utilizados também os registros de atendimentos no
consultório de Óptica e Contatologia da autora.
8
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
09
CAPÍTULO I - O GLOBO OCULAR E SUAS ESTRUTURAS
11
1.1: A RETINA
14
1.2: CÓRTEX VISUAL
23
CAPÍTULO II - DESENVOLVIMENTO CEREBRAL
27
2.1: O MECANISMO VISUAL
34
2.2: O DESENVOLVIMENTO DA VISÃO
38
2.3: DIFICULDADES VISUAIS NA INFÂNCIA
42
CONCLUSÃO
46
ANEXO
48
BIBLIOGRAFIA
54
ÍNDICE
57
9
INTRODUÇÃO
A visão é um dos principais sentidos do ser humano. As informações
captadas pelos olhos são a maneira da criança aprender, por imitação, a se
comportar, a se inserir no mundo que a rodeia. Pela visão, ela reconhece formas e
letras na educação formal. Com o auxílio da visão, o processo de letramento vai se
realizar com mais facilidade.
As deficiências visuais constituem uma barreira a ser vencida e
superada. Dependendo de sua gravidade, pode ser necessário o uso de recursos
especiais para que a aprendizagem formal aconteça e mesmo para os atos
corriqueiros da vida diária.
Crianças com baixa visual grave demonstram essa deficiência. Crianças
com deficiências visuais moderadas não fornecem pistas de sua necessidade.
Dessa forma, ficam isoladas nas brincadeiras coletivas, tornam-se tímidas e
ensimesmadas sem que as causas desse comportamento sejam identificadas.
Como não enxergam nitidamente o quadro, não copiam corretamente os deveres
ou o fazem lentamente. Pais ou professores, ignorando a deficiência, cobram um
desempenho que a criança não consegue alcançar. Daí surge o desânimo, o
desinteresse com os estudos, o mau desempenho escolar.
Infelizmente, nem todos os municípios brasileiros exigem exames
básicos como o teste do reflexo vermelho em recém-nascidos ou exames de
acuidade visual em escolares. Esses procedimentos alertariam para problemas
visuais, e as crianças se beneficiariam bastante, pois algumas deficiências são
passíveis de correção.
A literatura nos brinda com muitos resultados de pesquisas, resultados
de triagens visuais. Na quase totalidade, as triagens são realizadas em escolares,
ou seja, crianças já com sete anos de idade ou mais. As intervenções em
problemas visuais são mais efetivas quanto mais precocemente sejam realizadas.
Examinar crianças antes dos sete anos de idade seria o ideal. Esses exames
10
deveriam ser repetidos rotineiramente, e não serem realizados em caráter
excepcional, como ocorre agora.
As pesquisas de acuidade são geralmente feitas por profissionais da
área da saúde. Infelizmente, os achados não são repassados para as equipes de
Educação nem confrontados com o desempenho escolar. Essa providência
permitiria a elaboração de gráficos que quantificassem a relação e o impacto da
baixa visão no fracasso escolar.
Para compreender a importância do processo visual é fundamental
conhecer o próprio mecanismo visual, suas estruturas e as conexões cerebrais das
quais participa. Entendendo a visão como um todo, pode-se avaliar sua importância
no processo cognitivo do ser humano.
11
CAPÍTULO I
O GLOBO OCULAR E SUAS ESTRUTURAS
A visão é um dos sentidos especiais do ser humano e traz muitas das
informações que podem ser obtidas sobre o mundo que nos rodeia e no qual
estamos inseridos. Ela é de grande importância para se obter detalhes sobre
objetos distantes que não podem ser discriminados por tato, olfato ou audição. Do
ponto de vista evolutivo, suas utilidades principais são: observação de objetos
móveis ou imóveis como alimentos em potencial, a manutenção da postura
adequada e a percepção de nossa própria posição no espaço. Essas funções são
assemelhadas às do sistema vestibular, já que existe uma relação fisiológica entre
esses dois sistemas sensoriais. Fox, 1999.
O sistema visual inclui os globos oculares, as estruturas neurais das vias
visuais e o córtex visual (córtex estriado). Inicialmente, serão descritas as
estruturas oculares, as estruturas neurais das vias visuais, o córtex estriado e as
áreas visuais primárias e secundárias. Compreendendo como o sistema deve
funcionar, serão abordados a seguir as diversas anomalias visuais que decorrem
de falhas estruturais desse sistema e sua consequência para a aprendizagem
formal.
O globo ocular (G.O.) fica alojado na órbita. A órbita é uma cavidade
óssea formada por sete ossos: maxilar, frontal, zigomático, etmoide, lacrimal,
palatino e esfenoide. Sua função é proteger e alojar uma estrutura importante e
frágil, o olho. A órbita contém o globo ocular, gordura orbitária que serve de
proteção, fáscia (bainha de tecido conjuntivo), músculo elevador da pálpebra
superior, glândula lacrimal, os seis músculos extraoculares, além de nervos e vasos
sanguíneos que irrigam o conteúdo orbitário e algumas estruturas da face. A órbita
possui oito aberturas (forames) que permitem a entrada e saída de veias, artérias e
nervos relacionados ao G.O. (figura 01)
12
O olho é um órgão excepcionalmente complexo, envolvendo elementos
sensoriais e estruturas acessórias elaboradas que processam as informações tanto
antes como após a sua detecção pelas células fotossensíveis. Meiss, 2008. Tem a
forma aproximada de uma esfera e é composto de três túnicas concêntricas. A
camada mais externa é a esclera, uma camada rija e opaca de tecido conectivo. A
parte anterior da esclera é a córnea, onde há uma organização mais regular das
fibrilas, tornando-a transparente e permitindo a passagem dos raios luminosos para
o interior do olho. A córnea é avascular e sua curvatura é mais acentuada que a da
esclera. Ela contribui com aproximadamente 42.00 dioptrias para o processo de
refração. Esse poder de refração é suficiente para focalizar os raios luminosos a
aproximadamente 2,4 cm atrás, na distância que a separa da retina. Dioptria é a
unidade de medida que indica o poder de vergência de um sistema óptico. A
distância da superfície refratora até o ponto em que os raios de luz paralelos
convergem chama-se distância focal.
A córnea é inervada pelos ramos sensoriais do nervo trigêmeo (V par),
que são responsáveis pelas sensações de dor, temperatura e tato. Fox, 1999.
A segunda túnica que compõe o globo ocular é a coroide, uma camada
vascular que possui uma ampla rede de vasos sanguíneos que abastecem a parte
externa da retina e as camadas internas da esclera. Na sua face anterior, está
localizada a íris, que dá a coloração ao olho. A íris é um diafragma circular
pigmentado que fica em frente ao cristalino. Sua borda periférica está ligada ao
corpo ciliar enquanto a borda central é livre, formando uma abertura controlada
neuralmente, a pupila. A íris divide o espaço interno do olho em câmara anterior,
espaço limitado pela face posterior da córnea e a face anterior da íris, e câmara
posterior, pequeno espaço entre a face posterior da íris e o cristalino.
O tamanho da pupila é condicionado pelo equilíbrio das ações dos
músculos intrínsecos do olho, os músculos esfíncter e o músculo dilatador, que
integram a anatomia da íris. Yamane, 2003. O músculo esfíncter da pupila é
controlado por fibras autônomas parassimpáticas que percorrem a divisão inferior
do N.C. III, formam sinapse no gânglio ciliar e se projetam para o esfíncter da pupila
como nervos ciliares curtos. O músculo dilatador é controlado por fibras autônomas
simpáticas que acompanham a divisão nasociliar do ramo oftálmico do N.C. V, que
se divide no interior da órbita em dois nervos ciliares longos. Fox, 1999. Quando a
luz incide sobre a pupila, provoca a miose, a contração pupilar do olho que está
13
sendo iluminado (reflexo pupilar direto) e do olho contralateral (reflexo consensual).
Esse reflexo pupilar à luz direta envolve conexões entre a retina e os neurônios do
tronco encefálico que controlam os músculos que contraem a pupila. Portanto,
alterações dos reflexos pupilares ou da reação à luz são indícios clínicos
importantes de distúrbios do sistema nervoso autônomo. O conjunto de coroide,
corpo ciliar e íris recebe o nome de úvea, por sua cor arroxeada.
O diafragma da íris tem três funções importantes: regula a quantidade de
luz que penetra no olho; aumenta a profundidade de foco do olho pela diminuição
do orifício pupilar e reduz as aberrações cromática e esférica, especialmente sob
luz intensa, quando a pupila está pequena. Davson, apud Dantas, 1995.
Exatamente atrás da íris está o cristalino, a lente natural do olho. O
cristalino é totalmente transparente e está preso ao corpo ciliar por fibras
organizadas radialmente, as fibras zonulares. Essas fibras têm certa elasticidade, o
que permite a alteração da forma do cristalino quando focalizamos para longe ou
para perto. Ao olhar para longe, para o infinito (convencionado como 6 m), o
cristalino está relaxado. O ponto mais distante que pode ser visto sem esforço pelo
olho normal ou olho Emétrope, “que mantém a medida”, está situado no infinito. Ao
olharmos para perto, ocorre a acomodação, na qual o cristalino altera sua face
anterior, aumentando o seu poder dióptrico. O ponto mais próximo em que
podemos ver em foco é chamado ponto próximo. No adulto jovem, o ponto próximo
está a cerca de 10 cm. Com o passar da idade, o cristalino vai perdendo sua
elasticidade e o ponto próximo se afasta, na condição chamada presbiopia. Aos 60
anos, o ponto próximo está a aproximadamente 80 cm. O cristalino contribui com
cerca de 16 a 26 dioptrias para o processo de refração. Rhoades, 2008.
À frente do cristalino, entre sua face anterior e a face posterior da
córnea, há um espaço, a câmara anterior, cheia permanentemente de um líquido
incolor, o humor aquoso, que é secretado pelos vasos sanguíneos do corpo ciliar e
drenado pelas veias da esclera. O humor aquoso dá suporte metabólico ao
cristalino e à parte posterior da córnea e é responsável pela pressão intraocular.
Fox, 1999. Ele está sempre sendo formado e drenado para fora do olho pelas veias
da esclera. Distúrbios nesse mecanismo resultarão em aumento da pressão
intraocular, uma patologia chamada glaucoma, que, se não tratada corretamente,
acarreta perda de fibras do nervo óptico, aumento da escavação fisiológica e
alteração no campo visual, com prejuízo significativo da visão.
14
1.1 - A Retina
Toda essa superestrutura intrincada existe no interesse da
retina, ela mesma uma estrutura fantástica. A retina transforma luz
em sinais nervosos, nos permitindo ver em condições que vão
da luz das estrelas à intensidade do sol, discriminando
comprimentos de onda de modo que possamos ver cores e dando
precisão suficiente para podermos detectar um fio de cabelo ou uma
mancha de poeira alguns metros além. (David Hubel).
A camada mais interna a compor o globo ocular é a retina.
Diferentemente de outras estruturas sensoriais como a cóclea ou os receptores
somáticos da pele, a retina não é um órgão periférico, mas parte do sistema
nervoso central. Durante o desenvolvimento, ela forma uma extensão do
diencéfalo, denominada vesícula óptica, que sofre invaginação para formar o cálice
óptico. A parede interna do cálice óptico produz a retina enquanto a parede externa
dá origem ao epitélio pigmentar. Purves, 2005. A organização sináptica da retina é
similar a de outras estruturas neurais centrais e é relativamente simples, se
comparada a outras regiões cerebrais. A retina contém apenas cinco classes
principais de neurônios conectados em um padrão de conexões intrincadas, mas
com uma organização anatômica de camadas bem ordenada. Essa combinação de
diversidade fisiológica e organização estrutural relativamente simples faz a retina
muito útil para a compreensão de como as informações são processadas pelos
complexos circuitos neurais. Kandel, 2000. Na retina, pela proximidade entre seus
neurônios, a maior parte das comunicações celulares envolve dispersão
eletrotônica (as células simplesmente hiperpolarizam ou despolarizam) e não
propagação de potenciais de ação. Meiss, 2008. A importância da condução
eletrotônica é que ela permite uma condução gradual ou proporcional à força do
sinal. Assim, para os cones e bastonetes, o sinal hiperpolarizante de saída está
diretamente relacionado à intensidade da iluminação. O sinal não é “tudo ou nada”,
como seria no caso de condução por potencial de ação. Guyton, 2009. (figura 02)
O processamento visual se inicia na própria retina, após a luz atingir as
células fotorreceptoras, cones e bastonetes, onde tem início uma série de eventos
mediados pelas células bipolares, horizontais, amácrinas e ganglionares. As
informações processadas serão projetadas para quatro núcleos: o corpo geniculado
lateral, para a percepção de objetos; o colículo superior, para o controle dos
movimentos oculares; o pré-tecto, para o controle pupilar e o núcleo
15
supraquiasmático, para o controle dos ritmos diurnos e alterações hormonais. Daw,
2006.
As células fotorreceptoras da retina são os cones e os bastonetes. A
parte sensível à luz dos fotorreceptores é a sua parte externa, adjacente ao epitélio
pigmentar. Assim, a luz que penetra no olho deve atravessar praticamente toda a
retina antes de sensibilizar estas terminações. Por esta razão, alguns autores falam
em “retina invertida”, condição presente em todos os vertebrados. Como a retina é
transparente, suas camadas não significam uma barreira para os raios luminosos.
Kiernan, 2003.
A retina é constituída de dez camadas. Oito constituem a retina neural e
duas a retina não neural. A camada mais externa, próxima à coroide, é o epitélio
pigmentar da retina (EPR) e faz parte da retina não neural. Portanto, a primeira
camada e a décima, que será citada mais à frente, são camadas não neurais. As
células do EPR contêm melanina, material opaco que também está presente entre
os cones e bastonetes, impedindo a dispersão luminosa e reflexão intraocular. O
EPR participa da fisiologia da retina fornecendo vitamina A e nutrientes aos
fotorreceptores e removendo resíduos metabólicos de suas terminações.
A retina neural se inicia na segunda camada, a camada de células
fotorreceptoras. Nela, estão as células fotossensíveis do olho humano, os cones e
bastonetes. Eles são o primeiro neurônio da via visual. A disposição de cones e
bastonetes é caprichosa. Os cones ocupam o centro da retina e estão agrupados
principalmente na região conhecida como mácula lútea, que mede um cm de
diâmetro. No centro da mácula há uma área côncava chamada fóvea, medindo
cerca de 1,5 mm. Ela abriga uma região ainda menor, a fovéola, onde só há cones.
Os cones do centro da retina são pequenos e estão densamente agrupados. A
mácula, por isso, responde pela discriminação fina e alta acuidade visual dos seres
humanos. À medida que se afastam da fóvea, os cones ficam mais longos e o
espaçamento entre eles é maior. A densidade das células receptoras diminui em
direção à periferia da retina e cessa totalmente na região conhecida como ora
serrata. Também não há fotorreceptores na papila ou emergência do nervo óptico,
o local por onde o nervo óptico sai do olho, que por esta razão recebe o nome de
ponto cego.
Cada olho contém cerca de 110 a 125 milhões de bastonetes e 6,3 a 6,8
milhões de cones. Os cones estão agrupados no centro e bastonetes estão
16
localizados na periferia da retina. Os cones são responsáveis pela visão fotótica (na
presença de luz) e os bastonetes respondem pela visão escotópica (na sombra).
Os detalhes estruturais dos cones e bastonetes são muito semelhantes, mas os
bastonetes têm sido mais estudados. Os cones possuem um segmento externo de
forma cônica e o pigmento iodopsina. Há três fotopigmentos associados aos cones,
e eles reagem à luz de comprimentos de onda diferentes. O pico de sensibilidade
espectral para o pigmento sensível ao vermelho é 560 nm, para o verde é em torno
de 530 nm e para o azul, 420 nm. Os fotorreceptores correspondentes são
chamados cones vermelho, verde e azul, respectivamente. Dantas, 1995. A falta de
um dos sistemas de cores produz uma visão dicromática. A falta de dois, uma visão
monocromática. Se os três forem inexistentes, haverá apenas visão com os
bastonetes.
Os bastonetes têm a forma de bastão e o seu segmento externo tem um
pigmento fotossensível chamado rodopsina ou púrpura
visual. Eles são
extremamente sensíveis à luz e reagem mesmo com baixa luminosidade. Os
bastonetes não detectam cores.
Os elementos visuais dos fotorreceptores são responsáveis pela
fototransdução, que é a transformação da energia luminosa em sinais elétricos
biologicamente reconhecíveis, e é processada no segmento externo dos cones e
bastonetes.
A terceira camada da retina é a membrana limitante externa. Na
verdade, ela não é uma membrana, mas sim um ponto no qual os fotorreceptores
são agrupados em um tipo de junção celular chamado zônula adherens. A seguir,
vem a quarta camada, a membrana nuclear externa, que contém os corpos
celulares dos fotorreceptores. Eles desempenham as funções específicas de
suporte metabólico e transmitem as respostas elétricas iniciadas nos segmentos
externos das células fotorreceptoras. Fox, 1990.
A quinta camada é a plexiforme externa, e nela ocorrem as primeiras
sinapses da via visual. O termo “plexiforme” indica camadas sem corpos celulares,
mas com sítios sinápticos. Nessa camada, as extremidades dos fotorreceptores
fazem sinapse com os dendritos das células bipolares (que são o segundo neurônio
da via visual) e das células horizontais. A terminação sináptica dos cones é
achatada e tem o nome de pedículo. Já os bastonetes têm extremidades
17
arredondadas, as esférulas. As células bipolares transmitem os sinais visuais em
direção ao córtex em uma transmissão vertical de informações. Fox, 1990.
Algumas células bipolares retransmitem informações de um único cone
foveal e, dessa forma, cada célula representa um só ponto no espaço. Como a
concentração de cones na fóvea é alta, esta transmissão direta de informações é
responsável pela alta resolução espacial e melhor acuidade visual da fóvea. Outras
células bipolares recebem e integram informações provenientes de vários cones e
bastonetes periféricos. O mapeamento inicial de informações de muitos para um
(vários receptores fazendo conexão com uma única célula bipolar) representa um
início de processamento de informações no sistema visual. A integração diminui a
especificidade espacial de cada fotorreceptor, resultando em uma resolução baixa,
mas, por outro lado, assegura uma integração espacial alta na retina periférica.
Essa organização aumenta a sensibilidade para a detecção de luz.
A camada plexiforme externa também contém células horizontais que
conectam lateralmente os corpos sinápticos de cones e bastonetes, bem como se
conectam com dendritos de células bipolares. As saídas das células horizontais são
sempre inibitórias. Essa ação assegura a transmissão de padrões visuais com o
contraste correto já que evita que os padrões excitatórios se espalhem na retina.
Células bipolares e células horizontais têm ações específicas. As células
bipolares estabelecem uma via direta desde os fotorreceptores até as células
ganglionares. Já as células horizontais fornecem informação lateralmente para a
camada plexiforme externa, influenciando a atividade tanto de células bipolares
vizinhas como de fotorreceptores. Bear et al , 2007.
A sexta camada é a nuclear interna, que contém os núcleos das células
bipolares, cujos prolongamentos centrais formam o segundo neurônio da via visual.
Nela estão contidas também células horizontais, células amácrinas e células de
Muller. As células de Muller são gliócitos retinianos e foram descritas pela primeira
vez por Muller em 1851 e depois estudadas por Cajal em 1892. Dantas, 1995.
Como células gliais, as células de Muller dão apoio nutricional e mecânico aos
neurônios da retina. Elas estão dispersas pelas camadas internas até a camada
nuclear externa, ou seja, da camada 5 à camada 9. A camada 9 é a camada mais
externa suprida pela circulação retiniana e não mais pela circulação da coroide.
As células amácrinas não possuem axônio e por isso conduzem os
impulsos bidirecionalmente. Elas integram informações das células ganglionares,
18
melhorando a detecção de limites e podem estar também envolvidas no
processamento temporal de informações como o movimento da imagem visual
através da retina.
A sétima camada é a camada plexiforme interna. Nela há sinapses
formadas por projeções das células amácrinas e axônios das células bipolares com
dendritos das células ganglionares.
A oitava camada é a camada das células ganglionares. As células
ganglionares são os primeiros neurônios da via visual a demonstrar os verdadeiros
potenciais de ação observados no SNC. Fox, 1999. A maioria das células
ganglionares tem os campos receptivos com organização concêntrica, podendo ser
células ganglionares com centro On ou com centro OFF. Stephen Kuffler, em 1950,
foi o primeiro a gravar as respostas das células ganglionares a focos de luz. Seu
estudo foi feito na retina de gatos. Kufler usou um estimulador óptico desenhado
por Samuel Talbot e pode identificar a característica de células que reagem quando
iluminadas no centro ou quando a luz incide em sua periferia.
As células ganglionares recebem aferência de tipos específicos de
células bipolares e podem ser células ganglionares do tipo M, magno, que são
células grandes ou células ganglionares do tipo P, parvo, que são células
pequenas. As células P constituem 90% das células ganglionares. As do tipo M
representam 5%. Os demais 5% são constituídos de um tipo celular chamado
células ganglionares não M e não P. Há ainda outra característica importante, pois
algumas células do tipo P e células do tipo não M e não P são sensíveis a
diferenças no comprimento de onda da luz. Esses neurônios sensíveis à cor são
chamados de células de oposição de cores, pois a resposta a um comprimento de
onda no centro do campo receptivo pode ser cancelada por outro comprimento de
onda, incidindo na periferia do campo receptivo. Há oposição vermelho versus
verde e azul versus amarelo. Bear et al, 2007.
Os axônios das células ganglionares formam o nervo óptico, II nervo
craniano, que transmite as informações visuais do olho. Esses axônios percorrem o
interior da retina, formando a nona camada, a camada de fibras nervosas. A última
e décima camada é a membrana limitante interna, composta de fibras colagenosas
que conectam as células de Müller. Ela separa a camada de células ganglionares
do humor vítreo, a substância gelatinosa que preenche o fundo do olho.
19
O sinal neural gerado na retina é transmitido ao córtex visual pelas vias
visuais. Elas são constituídas de partes diversificadas, responsáveis por áreas
específicas dos campos visuais. Dessa forma, através das alterações (defeitos) nos
campos visuais, é possível a localização topográfica das patologias existentes. As
vias visuais ou vias ópticas são constituídas pelo nervo óptico, II par craniano,
quiasma óptico, tratos ópticos, corpos geniculados laterais e radiações ópticas
(trato genículo - calcarino). Bicas, 1997. (figura 03)
O nervo óptico tem um comprimento aproximado de 35 mm do globo
ocular ao quiasma óptico. Ele pode ser dividido em quatro partes: porção
interocular, com comprimento de 1 mm do disco óptico à lâmina crivosa, parte
perfurada da esclera por onde ele sai do globo ocular; porção intra-orbitária, com
comprimento de cerca de 25 mm, do globo óptico ao forame óptico, uma abertura
em formato de “S” na parede da órbita. Do polo posterior do olho ao forame, seu
comprimento é 18 mm, com 7 mm de comprimento extra para que ele possa
realizar as rotações oculares; porção intracanalicular, com cerca de 7 mm de
comprimento ao atravessar o forame junto com a artéria oftálmica. A última parte é
uma porção intracraniana, com aproximadamente 10 a 12 mm de comprimento, que
vai do forame ao quiasma óptico. Rhein, 2010. Cada nervo óptico contém cerca de
um milhão de fibras.
Após passar pelo forame na parte posterior da órbita, o N.O. segue pela
parte inferior do cérebro até o quiasma óptico (do grego Khiasma, encruzilhada),
onde ocorre um cruzamento parcial das fibras provenientes de cada olho. As fibras
oriundas das retinas temporais seguem sua direção ipsilateralmente enquanto as
fibras provenientes das retinas nasais cruzam contralateralmente. Meiss, 2008.
Nos mamíferos, as relações anatômicas de projeção do campo visual
para a retina e, posteriormente, para o córtex visual são muito bem elaboradas. Em
invertebrados inferiores como o sapo, o cruzamento de fibras provenientes dos
olhos ocorre integralmente, ou seja, as fibras provenientes de O.D. passam para o
lado esquerdo, e as provenientes de O.E. passam integralmente para o lado direito.
Por esta condição, o animal não tem visão binocular. Em mamíferos inferiores
como o rato ou coelho, ocorre uma sobreposição parcial dos campos visuais dos
dois olhos, havendo um cruzamento incompleto. Deste modo, apenas cerca de
30% da área visual do córtex cerebral recebe informação dos dois olhos e pode
mediar a visão binocular. Em cães e gatos ocorre cerca de 80% de sobreposição, o
20
que confere uma visão binocular bem satisfatória. Primatas e seres humanos
possuem uma visão binocular total, pois a parte nasal de cada retina se projeta
para o lado contralateral.
A visão binocular assegura a estereopsia, que é a noção de distância e
profundidade. Thompson, 2005. Após o cruzamento no quiasma, as fibras formam
os tratos ópticos, que seguem em direção ao corpo geniculado lateral, o núcleo
retransmissor do tálamo. Partindo do trato óptico, alguns axônios ganglionares, em
vez de seguirem para o geniculado corpo lateral (C.G.L.), seguem para alvos não
talâmicos e vão inervar outras estruturas. Assim, um pequeno número de axônios
se desprende e vai estabelecer conexões sinápticas com células do hipotálamo
(núcleo supraquiasmático do hipotálamo), formando a via retino-hipotalâmica, via
responsável por informações de claro/escuro para os ritmos circadianos. Cerca de
10% das fibras atravessa o tálamo e se dirige para o mesencéfalo e núcleo prétectal, formando a via retino pré-tectal. Essas fibras estão relacionadas com o
reflexo fotomotor consensual e fotomotor direto e movimentos oculares reflexos
para focalização. Há ainda axônios que formam o feixe retino tectal, com fibras que
se dirigem para o colículo superior, relacionado com o controle dos movimentos
oculares direcionais rápidos conjugados. A maior parte das fibras, porém, segue
para o C.G.L., conduzindo as informações visuais na chamada via retino
geniculado. Guyton, 2009.
Os corpos geniculados laterais são os maiores e provavelmente os mais
importantes núcleos visuais primários em humanos. Nele, as fibras retinofugais
cruzadas ou não cruzadas são organizadas em pares homônimos. Os C.G.L. fazem
parte do tálamo e estão inseridos profundamente no recesso lateral da fissura
coroidal. A visualização direta é obstruída pelo giro do hipocampo, no lobo
temporal. O C.G.L. apresenta seis camadas neuronais distintas e constitui o quarto
neurônio das vias visuais. Ele recebe os axônios dos tratos ópticos. Os axônios
cruzados do olho contralateral terminam nas camadas 1,4 e 6. Os nãos cruzados,
provenientes do olho ipsilateral, terminam nas camadas 2,3 e 5. Cada camada
recebe impulsos de apenas um olho. Os neurônios das quatro camadas superiores
são pequenos ou parvocelulares e recebem projeções das células ganglionares
reticulares. Os neurônios das duas camadas inferiores são grandes ou
magnocelulares e recebem projeções das células ganglionares M da retina. A maior
parte das células P é sensível à cor, e as células M não, mas as células M são
21
muito mais sensíveis a estímulos em branco e preto de baixo contraste, ou seja, a
formas. Estes dois tipos de células ganglionares retinianas são a origem de duas
correntes distintas no cérebro do primata e do ser humano. Thompson, 2005. Os
neurônios do C.G.L. projetam-se para o córtex visual primário, a área 17 de
Brodman.
Os C.G.L. são mais que um simples centro de retransmissão de sinais e
atuam no processamento das informações. Eles recebem impulsos de centros
corticais e subcorticais, incluindo formação reticular pontina, pulvinar do tálamo e
córtex visual. 80% dos axônios que chegam a cada NGL vêm do córtex visual
primário, embora não exista uma explicação funcional para estas conexões de
retroalimentação. O processamento dos sinais visuais ocorre por meio de uma
organização sináptica altamente complexa de células de retransmissão dentro do
C.G.L.
Quando os axônios do trato óptico alcançam o N.G.L. terminam em um
mapa ordenado do hemicampo contralateral, embora em camadas separadas. Os
neurônios do C.G.L. mantêm esta ordem topográfica em sua projeção para o córtex
estriado. As regiões mais periféricas da retina são representadas em regiões mais
anteriores do córtex visual enquanto a fóvea é representada na parte posterior. A
área cortical correspondente a cada unidade de superfície sensorial reflete a
densidade de receptores que suprem a região e, assim, a representação da mácula
é desproporcionalmente grande, ocupando a maior parte do polo caudal do lobo
occipital. Purves, 2005.
As seis camadas do C.G.L. esquerdo projetam impulsos para a IV
camada do córtex visual esquerdo, e as seis camadas do C.G.L. direito projetam
para a IV camada do córtex visual direito. As entradas das diferentes camadas do
C.G.L. para o córtex visual são segregadas, e assim uma determinada célula na IV
camada do córtex visual recebe impulso de um ou de outro olho, não de ambos.
Thompson, 2005.
Os axônios do C.G.L. formam as radiações ópticas ou radiações ópticas
de Gratiolet. Os axônios deixam o CGL formando um feixe compacto, o pedúnculo
óptico, no lobo temporal, e passam lateralmente pelo corno inferior do ventrículo
lateral. A partir daí seguem em feixes ordenados relativamente ao campo visual
representado. Esses feixes ocupam uma área ampla, sendo, por essa razão,
22
sujeitos a traumatismos dos lobos occipital, parietal e temporal. As lesões dessas
vias suprageniculares ocasionam defeitos de campo visual característicos.
Deficiências grandes dos campos visuais são chamadas de anopsias.
Deficiências pequenas são escotomas. O primeiro termo é considerado com vários
prefixos para indicar a região específica do campo visual a que se refere. (Figura
04)
As lesões no N.O. situadas antes do quiasma óptico geram perda visual
limitada a um olho. As lesões no quiasma óptico resultam em deficiências que
abrangem os campos visuais de ambos os olhos, podendo afetar as fibras das
retinas nasais que aí se cruzam, deixando intactas as fibras das retinas temporais
que não fazem cruzamento. Lesões em estruturas mais centrais em relação ao
quiasma óptico, incluindo o trato óptico, N.G.L., radiações ópticas e córtex visual
resultam em deficiências limitadas ao hemicampo contralateral. As lesões em
estruturas visuais centrais podem levar ao fenômeno denominado preservação de
mácula, onde há perda visual de grandes áreas do campo visual com exceção da
visão da fóvea. Embora a preservação da mácula esteja mais associada à lesão do
córtex, pode ser um aspecto característico de qualquer lesão ao longo da via visual.
As bases para esta preservação ainda não são conhecidas. Purves, 2005. As
radiações ópticas terminam na área estriada (área 17 de Brodman) ou paraestriada
(Área 18) no córtex occipital.
O córtex visual ocupa o lobo visual, sendo definido anatomicamente
como as áreas 17,18 e 19 de Brodman. Seus limites anatômicos são de difícil
definição, sendo demarcados geralmente por uma linha teórica da fissura parietooccipital até a incisura têmporo-occipital. A área 17 é chamada de córtex estriado
porque tem a aparência macroscopicamente estriada, contendo faixas ou linhas
brancas e cinza, chamadas Estrias de Gennari. Essas estrias são fibras das
radiações ópticas misturadas com fibras intracorticais que conectam o córtex
estriado com outras áreas do córtex cerebral. Tais projeções neuronais
mielinizadas vistas através dos neurônios locais mais escuros produzem o aspecto
estriado. Fox, 1999. Elas são visualizadas mesmo a olho nu e têm esse nome
porque foram descritas pela primeira vez em 1782, pelo estudante de medicina
Franscesco Gennari, da Universidade de Parma. (Figura 05).
23
Conclusão: A saída do olho, após duas ou três sinapses,
contém informações bem mais sofisticadas que a representação
pontual do mundo codificada nos cones e bastonetes. O que foi
especialmente interessante para mim foram os resultados
inesperados refletidos no fracasso de que ninguém antes de Kuffer
tivesse sequer imaginado que pudesse existir alguma coisa como
células com campo centro-periferia ou que o nervo óptico iria
virtualmente ignorar alguma coisa tão tediosa como níveis difusos
de luz. Pela mesma reflexão, ninguém fazia uma ideia mesmo
aproximada do que estava para aparecer nos níveis seguintes da
via – no cérebro. É essa falta de previsibilidade que torna o cérebro
fascinante – e torna ainda mais engenhosos seus trabalhos depois
que nós os descobrimos. (David Hubel).
1.2 - Córtex visual
O córtex visual tem sido sistematicamente pesquisado, e, por esta razão,
sua estrutura é mais bem compreendida que a de outras regiões do córtex cerebral.
A maioria das regiões do córtex possui seis camadas, mas o córtex visual
apresenta oito camadas. Fox, 1999. Para manter a organização de Brodman de
seis camadas para o neocórtex, a camada IV foi subdividida.
O córtex é dividido em cinco áreas. A principal é a área V1, que recebe
os sinais do tálamo. Ela é chamada de córtex visual primário ou córtex estriado e
tem seis camadas, sendo que a quarta camada é dividida em quatro partes: IVA,
IVB, IVCα e IVCβ. A principal função do córtex visual primário é a de decompor a
imagem que chega à retina, obtendo características estruturais das informações
visuais levando em conta forma, movimento e cor. O processo de interpretação dos
sinais visuais é distribuído, sendo processado em vários estágios. Os sinais
percebidos são mais específicos à medida que se avança.
Os neurônios do córtex visual podem ser piramidais ou estrelados
espinhosos. Os neurônios piramidais têm axônios que saem da área V1. Os
neurônios estrelados têm apenas conexões locais. A camada 1 é formada por
axônios e dendritos de neurônios de outras camadas.
As radiações ópticas se projetam para as células granulosas da camada
IV. As células granulosas, por sua vez, projetam-se para outros neurônios do córtex
estriado. Elas também se projetam para neurônios oculomotores do tronco cerebral,
ao longo do trato cortico-mesencefálico. O trato mesencefálico está envolvido na
24
geração de movimentos oculares rápidos em direção a objetos localizados dentro
do campo visual. Fox, 1999.
O córtex visual primário, ou área 17 de Brodman, contém um mapa
topográfico da retina. A área V1 responde ao movimento, à cor, à posição do
campo visual. Ela recebe projeções topograficamente organizadas do N.G.L. e, por
sua vez, se projeta topográfica e/ou funcionalmente a todas as outras áreas visuais.
Fox, 1999.
A área 18 ou V2 circunda a área V1. Ela responde a informações sobre
direção e cor, pois seus neurônios são orientados em relação às faixas do espectro
e seletivos à cor e à disparidade. Pontos retinianos adjacentes da área V1
conectam-se a pontos adjacentes da área V2 e por esta razão a área V2 possui um
segundo mapa topográfico da retina. Essa área projeta informações sobre a retina
periférica para a área V4.
A área V3 está situada na área 18 e segue próxima à V2. V3 recebe
projeções diretas de V1, criando um espelho de V2. V3 responde a informações de
orientação, mas não a informações para cores.
A área V4 está lateral à V3 e recebe estímulos da área V2, com um
menor estímulo da área V1. V4 responde aos campos grandes e à cor. Ela
apresenta alguma resposta específica à orientação.
A área V5 está localizada anteriormente à V4, ao longo do lobo temporal
póstero-lateral e recebe projeções de V1. V5 responde sobretudo ao movimento
unidirecional e não responde à cor.
A área V6 foi descrita em macacos e certamente é o equivalente à área
temporal súpero-medial TSM em humanos. Esta área TSM está situada
anteriormente à V3 e recebe projeções complexas da área V2. Ela responde ao
movimento unidirecional complexo. Todas as áreas visuais apresentam respostas
corticais múltiplas e estão estreitamente interconectadas, projetando-se para pelo
menos duas outras áreas corticais e para estruturas subcorticais. Fox, 1999.
Do córtex visual primário, a informação visual é disseminada em mais de
30 áreas corticais diferentes para funções visuais superiores específicas, fluindo em
duas direções principais: para o lobo parietal, através da via dorsal, e para o lobo
temporal inferior, através da via ventral. Na via ventral (via “What”, ou “o que”)
ocorrem funções de reconhecimento, percepção de cores e discriminação de figurafundo. Na via dorsal (via “Where” ou “Onde”), estão funções como a coordenação
25
olho-mão e a orientação espacial. Na Via ventral pode ser destacada a área IT
(temporal inferior), que está relacionada à percepção e à memória visual. Parte
desta área seria responsável pelo reconhecimento de faces (Bar et al., 2002). Na
Via dorsal se localiza a área MST, que detecta movimentos lineares além de
movimentos radiais que vão em direção a um determinado centro, bem como
movimentos circulares. (Figura 06).
Embora a visão se forme nas áreas estriadas e paraestriadas, esta é
ainda um nível intermediário, e o processo de compreensão de imagens, resgate de
memórias para as devidas identificações e entendimento do que se vê só vai
ocorrer nas áreas de associação. Há indícios de associação nas áreas 17 e 18,
porém, também participam do processo as áreas periestriadas 19, a área 39 do giro
angular, as áreas supramarginais 40, no lobo parietal. Algumas áreas do lobo
temporal e algumas conexões entre os hemisférios cerebrais por meio do corpo
caloso também estão envolvidas com as funções de reconhecimento visual.
Pelo exposto até aqui, cabe uma pergunta: o que significa “ver”? Na
retina há um primeiro contacto com a imagem, a recepção e um início de
processamento. Depois os sinais seguem pelos vários caminhos – inicialmente a
rede altamente complexa das células retinianas e depois nervo óptico, quiasma
óptico, onde há um cruzamento parcial. Isso nos confere a visão binocular, ou seja,
a junção da visão fornecida por um olho, com detalhes específicos, à visão
fornecida pelo olho contralateral, também com suas especificidades. Mais além, as
fibras retinofugais atingem várias regiões cerebrais, e é aí que vai ocorrer
realmente a “visão”, a compreensão do que está sendo captado com os olhos. A
interpretação visual ocupa muitas áreas cerebrais, muito mais que áreas
específicas para outros sentidos. Neste processamento visual ocorre o resgate de
memórias, a lembrança do que já conhecemos, e é esse conjunto de
conhecimentos que traz a compreensão do objeto visualizado.
Algumas vezes, são feitas comparações entre o olho humano e uma
câmera fotográfica. Na verdade, o olho é muito mais do que uma câmera, ele é um
computador dos mais sofisticados já que não só capta, mas também processa e
decodifica a imagem obtida. Hubel e Wiesel afirmaram que temos que entender a
visão em termos de uma hierarquia anatômica e funcional, na qual células simples
alimentam
células
complexas,
células
complexas
alimentam
células
hipercomplexas, e assim os sinais vão seguindo até chegarem ao córtex estriado.
26
À medida que técnicas de exame mais sofisticadas permitem um maior
conhecimento das estruturas envolvidas no processo visual, mais é percebida a
amplitude desse sistema no cérebro humano. Com as pesquisas de David Hubel e
Torsten Wiesel, que receberam o Prêmio Nobel de Medicina em 1981, foi
desvendado muito sobre a estrutura do corpo geniculado e do córtex cerebral. Em
seu trabalho, eles fizeram a implantação de eletrodos no córtex visual de gatos e
depois no de macacos. Os resultados evidenciaram a formação colunar do córtex
com colunas específicas de dominância ocular para cada um dos olhos se
sucedendo em áreas denominadas listras e espaços intermediários com bolhas.
Em pesquisas complementares, já foram identificadas mais de 25 áreas
visuais além das áreas V1 a V5. Algumas dessas áreas foram comprovadas em
primatas, mas há indícios de que estejam presentes também em seres humanos.
Portanto, já é conhecido que mais da metade do neocortex de primatas não
humanos está envolvida no processamento de informações visuais. Fox, 1999.
Quais as contribuições desses conhecimentos para a Educação? Não há
dúvidas de que seja possível estimular uma criança nascida cega para despertar
suas outras potencialidades, até porque exames de imagem mostram outras áreas
cerebrais sendo ativadas durante atividades específicas quando não há visão.
Porém, a tarefa de ensinar será mais difícil e envolverá estratégias específicas, que
não são dominadas pela maioria dos professores dos primeiros anos. A
preocupação com o ensino de crianças cegas não será objeto deste trabalho, mas
é importante comentar que Vigotski já se preocupava com essa particularidade do
processo
ensino-aprendizagem
para
alunos
sobretudo com a criança cega. Vigotski, sem data.
com
necessidades
especiais,
27
CAPÍTULO II
DESENVOLVIMENTO CEREBRAL
Os educadores sempre se interessaram pelas complexidades do
processo ensino - aprendizagem, e mais especificamente, porque um aluno
aprende e outros não, embora sejam despendidos esforços e utilizadas estratégias
variadas. No mundo atual, onde uma pluralidade de mídias e aportes de novas
tecnologias atrai ou dispersa o aluno, a atividade do magistério tornou-se mais
árdua. Os novos conhecimentos das Neurociências mostraram a complexidade do
ser humano, mais que tudo a do ser aprendente, trazendo um novo desafio: não
bastam os conhecimentos específicos de uma disciplina ou o saber como transmitir
esses ensinamentos. Há que saber também como se aprende, como acontece a
mágica da transmissão / fixação de conhecimentos, o que se passa no cérebro do
aluno, pois, como já dizia o mestre Paulo Freire, para ensinar é preciso saber como
se aprende.
Contando com pesquisas e novos conhecimentos sobre as atividades
cerebrais, as dificuldades de aprendizagem cada vez mais são um desafio e não
uma barreira. Relvas corrobora:
Diante disso é fato que diversas dificuldades de aprendizagens
poderão ser resolvidas ou ao menos amenizadas, caso os
educadores tenham seu olhar focalizado também em sua sala de
aula como neuroanatomistas, ou seja, mantendo a ação de
promover o desenvolvimento das diversas inteligências a que se
expõe de forma que se compreendam os processos e os princípios
das estruturas do cérebro, conhecendo e identificando cada área
funcional, visando estabelecer rotas alternativas para aquisição da
aprendizagem. Relvas, 2009.
Dessa maneira, o estudo das Neurociências e o conhecimento que as
novas pesquisas trouxeram sobre o cérebro em funcionamento, e não mais apenas
do cérebro pós-morte, tem contribuído de forma significativa com o trabalho dos
educadores. Enquanto Broca só pode se certificar da área cerebral que causava o
28
problema de seu famoso paciente Tan após realizar sua autópsia, hoje, os exames
de imagem nos permitem estudar o cérebro em atividade, identificando o aporte
sanguíneo para as áreas que estão desempenhando ou planejando uma tarefa.
Sabe-se mais, também, sobre a importância de uma estimulação precoce, e já está
comprovado que, nos primeiros anos de vida, a criança está mais apta a adquirir
conhecimentos, e que é através dessa aquisição que são estimuladas as
formações e preservadas as sinapses, arcabouço indispensável a um bom
desenvolvimento cerebral.
Segundo Herschkowitz, o crescimento cerebral é determinado pela
interação de genes, expressão de genes e estímulos ambientais. Ele vai além,
afirmando que um cérebro privado de estímulos terá uma estrutura comprometida
e, assim, uma criança isolada de experiências sociais apresentará um crescimento
cerebral anômalo, bem como atraso no comportamento, emoções e habilidades
cognitivas. Conclui que é importante conhecer como ocorrem as etapas do
desenvolvimento para tentar evitar alterações anormais enquanto isso ainda é
evitável. Herschkowitz, 1988.
Há muito as dificuldades de aprendizagem são estudadas. Numa revisão
histórica, os primeiros especialistas que as pesquisaram foram os médicos. O final
do século XVIII e o início do século XX foram marcados por um grande
desenvolvimento das ciências e da psiquiatria e, a partir daí, surgiram rígidas
classificações de “anormais” para pessoas não integradas em um comportamento
pré-determinado. Os estudos de neurologia, neurofisiologia e neuropsiquiatria eram
realizados em laboratórios anexos a hospícios. Não foi, portanto, estranho que os
fracassos escolares fossem atribuídos a alunos “duros de cabeça” ou “idiotas”,
categoria que era anteriormente confundida com a de loucos, e que fosse mesmo
sugerida a criação de pavilhões especiais para abrigar essas crianças. Patto, 1990.
Porém, apesar dos aportes das Neurociências cognitivas, com estudos
sobre o desenvolvimento cerebral e a constatação da importância da estimulação
ao desenvolvimento da criança desde as mais tenras idades, para alguns, ainda era
e é mais fácil atribuir o fracasso escolar a transtornos ou mesmo a heranças
genéticas, num processo chamado por Patto de “medicalização do fracasso
escolar”.
29
Para compreender como acontece a mágica da aprendizagem, é
fundamental entender o cérebro humano desde o momento de sua formação.
Segundo Herschkowitz N., 1988:
No desenvolvimento estrutural do cérebro oito eventos interrelacionados, mas distinguíveis podem ser reconhecidos: 1. Indução
neural, 2. Proliferação de neuroblastos, 3. Migração neuronal, 4.
Agregação neuronal seletiva, 5. Diferenciação neuronal e formação
de padrões específicos de conexão, 6. Morte neuronal, 7.
Eliminação seletiva de sinapse e 8. Mielinização. Os mecanismos
que regulam o desenvolvimento desses eventos são determinados
geneticamente, mas em algum estágio do desenvolvimento fatores
epigenéticos e ambientais modulam a regulação genética.
Uma tabela de N.Herschkowitz, do artigo Brain development in the Fetus, Neonate
and Infant, de 1988, situa essas etapas.
DESENVOLVIMENTO ESTRUTURAL DO CÉREBRO HUMANO
1. Indução neural
2. Proliferação de neuroblastos
3. Migração neuronal
4. Agregação neuronal seletiva
5. Diferenciação neuronal, formação de padrões
específicos de conexão
6. Morte neuronal (córtex)
7. Eliminação seletiva de sinapses (córtex)
8. Mielinização
3 a 4 semanas de gestação (S.G)
8 a 25 S.G.
8 a 34 S.G.
8 a 34 S.G.
5 S.G. – 4 anos
2 a 16 anos
2 - 16 anos
25 S.G. - 20 anos
O desenvolvimento cerebral é, pois, um processo prolongado, que se
inicia cerca de duas a três semanas após a fecundação e prossegue até perto dos
20 anos, já na vida adulta. O desenvolvimento que ocorre durante os meses prénatais está, principalmente, sob controle genético. O meio ambiente pode também
interferir de modo significativo, pois a falta de nutrição adequada, principalmente a
de ácido fólico ou a presença de toxinas como o álcool podem prejudicar
enormemente esse processo. Já no período pós-natal, o desenvolvimento cerebral
depende muito dos estímulos e é definido pelas interações gen - meio ambiente.
Duas semanas após a fecundação, o embrião é uma estrutura esférica
de três camadas. Em uma parte desta esfera as células se espessam para formar a
placa neural. Na sequência, a placa se invagina e se transforma em goteira ou
30
sulco neural. Essa estrutura gradualmente se fecha, formando o tubo neural. São
as células internas deste tubo que darão origem ao Sistema Nervoso Central
(encéfalo e medula espinal). As células externas darão origem ao Sistema Nervoso
Autônomo. Fatores teratogênicos nesta fase terão efeitos devastadores, podendo
levar a más formações ou morte do feto. Hershckowitz, 1988.
Após o fechamento, o tubo neural se transforma em uma estrutura com
três vesículas e, sequencialmente, em uma estrutura com cinco vesículas. A parte
anterior do tubo dará origem ao prosencéfalo ou encéfalo anterior composto de
hemisférios cerebrais, diencéfalo (tálamo e hipotálamo) e gânglios basais. As
células em torno da vesícula medial formarão o mesencéfalo ou encéfalo médio. A
parte inferior do tubo dará origem ao rombencéfalo ou encéfalo posterior (ponte,
bulbo e cerebelo). As células remanescentes formarão a medula espinal. Nelson III
& Tierney, 2009.
A proliferação celular se inicia com o revestimento do neuroepitélio do
sistema ventricular no interior do tubo. Nessa fase, as células proliferam em razão
logarítmica. Áreas proliferativas secundárias são encontradas no giro dentado e na
camada granular externa do cerebelo. À medida que se multiplicam, as células
formam uma segunda zona, a zona marginal, que vai conter axônios e dendritos.
Como a fase de proliferação continua, o cérebro do recém-nascido tem mais
neurônios que o do adulto. O pico de produção nesta etapa pode chegar a 250.000
neurônios por minuto. Cowan, 1979, apud Oliva & Reis, 2008. Após seu
nascimento, as células nervosas seguem para sua destinação final, para compor o
córtex cerebral, em um processo de migração radial seguida por 70 a 80% dos
neurônios. Esse movimento obedece a uma organização de dentro para fora, e as
células partem da zona ventricular e migram pela zona intermediária. As primeiras
células a migrar ocupam as camadas corticais mais profundas, e as subsequentes
vão formando as camadas mais externas. Na 25ª semana após a fecundação, as
seis camadas que compõe o córtex cerebral estão formadas. Essas células são
principalmente neurônios do tipo piramidal e células da glia. As células piramidais
são os maiores neurônios do córtex cerebral. Esses neurônios são responsáveis
pelo envio de sinais para diferentes camadas do córtex e para outras partes do
cérebro. As células gliais são células cerebrais não neuronais e estão envolvidas no
apoio aos neurônios, produzindo a bainha de mielina, removendo debris e células
cerebrais mortas.
31
As demais células seguem um processo de migração organizado em
direção tangencial. Essas células são basicamente interneurônios, neurônios
relativamente menores que participam das comunicações entre as células
piramidais com camadas específicas do córtex. No estriado e giro dentado, os
neurônios são gerados in loco e não migram. Os sinais e sistemas guias que
orientam a migração de neurônios para sua destinação topográfica final não estão
ainda bem esclarecidos. Alguns tipos de neurônios mostram uma estreita
associação aos processos gliais radiais formados inicialmente, o que pode conduzilos a seu destino final.
Após atingir seu objetivo, as células têm duas possibilidades: podem se
diferenciar, tornando-se um neurônio completo, com axônio e dendritos ou ser
eliminadas pela morte programada de células ou apoptose que reduz o excesso de
células nervosas ao nível das de um adulto. Esse processo ocorre inteiramente sob
controle genético. Esse será o destino de 40% a 60% das células. Oppenhein &
Johnson, 2003 apud Nelson III & Tierney. 2009.
O desenvolvimento dos axônios é facilitado pelos cones de crescimento,
pequenas estruturas que se formam na superfície do axônio. Seu crescimento em
direções determinadas é mediado por processos celulares que acontecem nestes
cones de crescimento, fornecendo “pistas” moleculares de orientação de direção.
A formação dos dendritos ocorre por um processo sutilmente diferente,
que parece ser controlado por genes que regulam a síntese dos fatores de
transcrição regulados por cálcio. Aizawa e outros 2004. Apud Nelson III & Tierney,
2009. Eles surgem inicialmente como fios grossos, com pequenas protuberâncias,
os espinhos, que se iniciam a partir de seu corpo celular. A maturação dos
dendritos faz com que o número e a densidade dos espinhos aumente, o que
aumenta também a chance dos dendritos de estabelecerem contato com axônios
próximos. A base da conexão sináptica entre neurônios é exatamente a ligação
entre dendritos e axônios, em um processo essencial para as funções cerebrais.
Segundo Molliver, Kostovic & Van der Loos, 1973 apud Nelson III &
Tierney, 2009, as primeiras sinapses surgem na 23ª semana de gestação, porém, o
pico ocorre somente em algum momento, no primeiro ano de vida. Tal como
sucede com os neurônios, há uma intensa formação de sinapses e depois um
movimento de redução ou pruning. Essa redução é altamente dependente da
experiência e serve como base do tanto de aprendizagem que ocorra durante os
32
primeiros anos de vida. São eliminados os excessos de sinapses e as sinapses não
utilizadas. Até o momento da sinaptogênese, os estágios de desenvolvimento
cerebral são inteiramente guiados pelo gen. No momento da eliminação das
sinapses, a experiência tem papel relevante.
O pico da formação de sinapses não é um processo coletivo, ocorre em
momentos diversos nas várias estruturas cerebrais. No córtex visual, ele acontece
entre o 4º e o 8º mês após o nascimento, porém, as áreas do córtex pré-frontal só
vão atingi-lo por volta do 15º mês pós-natal. O momento de formação mais intensa
de sinapses determina o momento da plasticidade, pois quanto mais tarde o pico
ocorrer, por mais tempo a região manterá a plasticidade. Huttenlocher & Dabholkar,
1977 apud Tierney &Nelson III.
A redução de sinapses é fundamental para a flexibilidade necessária à
capacidade de adaptação do cérebro em formação. As ligações ativadas pelo meio
ambiente serão mantidas, em detrimento das que não estão sendo estimuladas.
“Desta forma, as redes de neurônios envolvidas no desenvolvimento de
comportamento são afinadas e modificadas conforme a necessidade.” (Nelson III
&Tierney, 2009). A redução do excesso de sinapses ou pruning também ocorre em
momentos diversos nas várias estruturas cerebrais. Nas áreas corticais envolvidas
no processo visual e no processo auditivo, o podamento estará completo entre o 4º
e o 6° ano de vida. Já nas áreas cerebrais envolvidas com as altas funções
cognitivas como controle inibitório e regulação das emoções, ele continua até a
adolescência. Hutterlocher & Dabholkar, 1977, apud Tierney & Nelson III.
A etapa que se segue é a da mielinização dos axônios. A bainha de
mielina serve para aumentar a velocidade na transmissão de sinais. Esse processo
também ocorre seletivamente. As áreas cerebrais sensoriais e motoras recebem as
bainhas primeiro, com o témino do processo próximo à epoca da pré-escola. Já nas
áreas que envolvem habilidades cognitivas superiores como o córtex pré-frontal, o
processo só estará completo na adolescência ou no início da vida adulta, conforme
estudos de Nelson, de Haan &Thomas, 2006 e Nelson & Jeste, 2008, apud Nelson
III & Tierney. Para Hasegawa M, Houdou S., Mito T. et al, citados por Valente,
2010, a mielinização segue uma sequência ordenada com expressão entre o 2º
semestre de vida pré-natal e o 2º ano de vida, prosseguindo em algumas áreas até
a 3ª ou 4ª décadas da vida.
33
A mielinização, portanto, obedece a uma sequência ordenada do
desenvolvimento onto e filogenético. Os sistemas arcaicos mielinizam-se primeiro.
O desenvolvimento é ascendente, em sentido caudo-rostral, centrífuga e posteroanteriormente. Os tratos do SN vão se mielinizando à medida que se tornam
funcionais, sendo primeiro os do SNP, depois a medula espinal e só então os das
áreas encefálicas. Weidenheim KM, Kress Y., Epshteyn I. et al., citados por
Valente, 2010.
A tabela de White T. e C.A. Nelson, 2004, resume as etapas do
desenvolvimento cerebral.
EVENTOS NO DESENVOLVIMENTO DO CÉREBRO HUMANO (White T. e C. A. Nelson,
2004)
EVENTO DE
DESENVOLVIMENTO
NEURULAÇÃO
MIGRAÇÃO NEURONAL
SINAPTOGÊNESE
LINHA DO TEMPO
PANORAMA DO EVENTO
18 – 24 dias pré- As células se diferenciam em uma de
natais
três
camadas
–
endoderme,
mesoderme e ectoderme – que
formam então os vários órgãos do
corpo.
O tubo neural (do qual o SNC deriva)
se desenvolve a partir das células do
ectoderme; a crista neural (da qual o
Sistema
Nervoso
Autônomo
é
derivado) fica entre a parede
ectodermal e o tubo neural.
6 – 24 semanas Os neurônios migram para a zona
pré-natais
ventricular ao longo das células gliais
para o córtex cerebral.
Os neurônios migram em uma direção
de dentro para fora, com as últimas
gerações de células migrando através
de
células
desenvolvidas
previamente.
O córtex se desenvolve em seis
camadas.
3º
trimestre
– Neurônios migram para a placa
adolescência
cortical e estendem dendritos apicais
e basilares.
Sinais químicos guiam os dendritos
em desenvolvimento em direção à
sua localização final, onde as
sinapses
são
formadas
com
projeções das estruturas subcorticais.
Estas conexões são fortalecidas por
atividade neuronal, e conexões com
muito pouca atividade são podadas.
34
NEUROGÊNESE PÓSNATAL
Nascimento – vida Novas células se desenvolvem em
adulta
várias regiões cerebrais, incluindo:
- giro dentado do hipocampo;
- bulbo olfatório;
- possivelmente giro cingulado;
- regiões do córtex parietal.
MIELINIZAÇÃO
3º trimestre – meia Os neurônios são envolvidos em uma
idade
bainha de mielina, resultando em um
aumento de velocidade dos potenciais
de ação.
GIRIFICAÇÃO
3º trimestre – idade O tecido liso do cérebro se dobra para
adulta
formar giros e sulcos.
DESENVOLVIMENTO
Nascimento –
O córtex pré-frontal é a última
ESTRUTURAL DO
avança pela idade
estrutura a sofrer girificação durante a
CÓRTEX PRÉ-FRONTAL adulta
vida uterina.
A densidade sináptica alcança seu
pico aos 12 meses: entretanto a
mielinização desta estrutura continua
durante a vida adulta.
DESENVOLVIMENTO
Vida
uterina
– Todos os maiores sistemas de
NEUROQUÍMICO
DO adolescência
neurotransmissores passam por um
CÓRTEX PRÉ-FRONTAL
desenvolvimento inicial durante a vida
uterina e estão presentes no
nascimento.
Embora ainda não estando bem
estudado em humanos, a maioria dos
sistemas de neurotransmissores não
alcança maturidade total até a vida
adulta.
2.1 - O mecanismo visual
O principal objetivo da Oftalmologia é tradicionalmente descrito como “a
prevenção da cegueira”, mas o caráter restritivo desse termo tem sido colocado em
questão e muitas instituições vêm substituindo essa denominação por “Organização
para a Prevenção da Deficiência Visual” Kara-Junior, 2009.
Ações para combater a cegueira evitável – a baixa visual decorrente de
fatores que possam prejudicar definitivamente o desempenho visual de um
indivíduo ou interferir negativamente em sua vida devem ser estimuladas e
difundidas.
Por um lado, temos as baixas visuais definitivas em crianças que, dentro
do período crítico, o período de melhor platicidade neuronal para o sistema visual,
não receberam o estimúlo luminoso, seja pela presença de uma catarata não
operada, seja por estrabismo ou ametropias não corrigidas. Na criança, as
35
consequências são dramáticas, pois, uma vez instalada a baixa visual ou ambliopia,
dificilmente é revertida, a não ser que as providências sejam tomadas seja pela
extração da catarata ou correção cirúrgica ou óptica da visão, aliadas a um
programa de exercícios específicos, geralmente incluindo a oclusão parcial do
melhor olho.
Uma pessoa não precisa ser totalmente privada de visão para ser
considerada “Legalmente cega”. A Organização Mundial da Saúde utiliza valores
quantitativos de acuidade visual ou do campo visual para definir a cegueira e a
baixa visão, baseando-se na Classificação Estatística Internacional de Doenças e
problemas relacionados à saúde (CID). Nakanami, 2009.
Segundo essa determinação, define-se “Baixa visão” ou “Visão
subnormal” (atualmente prefere-se a primeira denominação) quando o indivíduo
apresenta acuidade visual corrigida no melhor olho menor que 0,3 ou maior ou igual
a 0,05 ou campo visual menor que 20° no melhor olho, com a melhor correção
óptica. A cegueira é estabelecida na CID quando a acuidade visual corrigida no
melhor olho for menor que 0,05 ou o indivíduo apresentar campo visual menor que
10° no melhor olho, com a melhor correção óptica. Nakanami, 2009. O campo
visual normal é 150° no meridiano horizontal e 60° no meridiano vertical.
O problema em uma sala de aula pode não chegar a ser o aluno que se
encaixe na categoria de Baixa Visão ou de Cegueira legal. Esses, se já foram
incluidos nestas categorias, já passaram por avaliações e exames que deram esses
diagnósticos. O problema principal é o aluno lento, que não consegue copiar do
quadro, que encosta o rosto no caderno ou no livro para poder visualisar as letras,
que pula linhas na leitura, que só consegue ler corretamente com o auxílio do dedo
ou de uma régua, ou que simplesmente não consegue avançar no letramento não
dando conta das tarefas que são propostas. Esse seguramente tem um deficit
visual ainda não diagnosticado e, portanto, ainda sem possibilidade de tratamento.
Há pais e até mesmo professores que tentam “corrigir” posturas e
atitudes como ver televisão muito de perto, inclinar a cabeça lateralmente, chegar o
rosto próximo ao caderno, sem saber que a criança não assume essas posições
por teimosia ou insubordinação, mas as assume tentando enchergar alguma coisa,
já que nas distâncias convencionais não logra fazê-lo. É bom lembrar também que
a criança com dificuldades visuais não tem parâmetros para avaliar que não
36
consegue ver. Ela nunca viveu a experiência de enxergar plenamente e, assim, o
mundo que conhece é este: embaçado, desfocado, confuso.
A revista Educação dedicou o número 73 (ano 07, edição de maio de
2003) às deficiências visuais. Entre os muitos exemplos de crianças que
descortinaram um novo mundo após ganharem um simples par de óculos, a
jornalista Carolina Cassiano cita Guimarães Rosa:
Depois de perguntar ao menino por que ele apertava tanto os olhos,
o doutor José Lourenço tirou os óculos e os dependurou no nariz
de Miguilim. O morador do Mutum não podia acreditar. Tudo era
uma claridade, tudo novo e lindo e diferente, as coisas, as árvores,
as caras das pessoas. Via os grãozinhos de areia, a pele da terra,
as pedrinhas menores, as formiguinhas passeando no chão de uma
distância. E tonteava. Aqui, ali, meu Deus, tanta coisa, tudo...
Coração de Miguilim batia descompasso.
O médico simplesmente intuíra que o menino que “apertava os olhos”
era míope, como ele mesmo o era. E bastou o empréstimo improvisado dos óculos
para fazer o sertão se mostrar aos olhos da criança, deslumbrada com tantos
detalhes que sua visão agora alcançava. No dia a dia de um educador há muitas
crianças de “vista curta”, que sofrem até terem seu verdadeiro problema
identificado e poderem também viver o seu momento de deslumbramento.
A capacidade visual de um indivíduo é a Acuidade Visual. Acuidade
visual é definida como a habilidade do sistema visual em distinguir detalhes finos de
objetos apresentados no espaço. Costa e Höfling-Lima, 2009. Ela pode ser aferida
para fins de documentação de diversas formas, sendo a mais utilizada a Tabela de
Snellen, criada em 1862 pelo médico holandês Herman Snellen. Esta tabela
consiste em letras e números enfileirados, em tamanhos decrescentes. Deve ser
lida a aproximadamente 6 metros ou 20 pés para evitar a acomodação visual – o
processo no qual o cristalino se altera por um reflexo neural e aumenta o seu poder
de refração. As letras são padronizadas, de modo a que os resultados sejam
estandartizados. Algumas tabelas usam a letra “E” em várias posições e pode ser
usada em testes em crianças ainda não alfabetizadas ou em adultos não letrados.
Para crianças se usa ainda os Otoptipos de Lea, específicos para faixas etárias
mais baixas. (figura 07).
37
O resultado da leitura da Tabela de Snellen é expresso em uma fração
na qual o numerador indica a distância em pés e o denominador indica a distância
na qual uma pessoa sem problemas visuais leria esta mesma linha. A melhor visão
é 20/20 (ou 6/6 em paises europeus que utilizam a medição em metros) e a menor
20/200. Caso o examinado não alcance nem essa marcação, o examinador se
aproxima um metro e exibe dedos. Caso o examinado os identifique corretamente,
a leitura será identificada como: Conta dedos a 5m ou a 4m, como for. Se não
houver visão dos dedos, o examinador acena a mão para ver se há percepção de
movimento. Pode-se testar também se há percepção luminosa. O examinador
acena uma lanterna para ver se o examinado percebe o movimento e presença da
luz. Evidentemente, pessoas que só contam dedos ou percebem a luz são pessoas
com baixíssima acuidade visual.
A avaliação do campo visual é feita pelo exame específico de campo
visual, uma maneira de aferir se há baixa no campo, o que ocorre em determinadas
patologias. O campo visual é medido em graus e se avalia se há redução do campo
ou se existem “pontos cegos”, chamados escotomas (scotos, do grego sombra).
A boa acuidade visual é de grande importância para facilitar o processo
cognitivo do ser humano. Pelos olhos, a criança identifica o rosto materno e,
gradativamente, os rostos das pessoas com as quais convive. Também pela visão
ela percebe a diferença entre os objetos, avalia a distância para alcançá-los,
orienta-se ao engatinhar e dar os primeiros passos, recebe estímulos variados que
serão integrados aos auferidos pelos outros sentidos. No momento da
escolarização, a visão é um elemento facilitador para o conhecimento de letras e
algarismos.
A acuidade visual também é utilizada como detalhe exclusivo para o
acesso a tarefas como direção de veículos, por exemplo. O DETRAN exige visão
mínima de 20/30 no melhor olho para motoristas amadores e 20/20 para motoristas
profissionais. O ingresso às academias das Forças armadas é vedado a candidatos
sem visão perfeita. A Aeronáutica exige 20/20 dos candidadtos a piloto.
Modernamente, os testes de função visual e os exames de neuroimagem
permitem uma melhor compreensão da capacidade visual e da correlação do
processo visual com as diferentes áreas cerebrais, bem como da determinação das
épocas de maturação do sistema visual em crianças normais e nas que apresentam
lesões neonatais. Costa e Höfling-Lima, 2009.
38
2.2 - O desenvolvimento da visão
O desenvolvimento pré-natal pode ser dividido em três fases marcadas
pelas
ocorrências
da
embriogênese,
organogênese
e
diferenciação.
A
embriogênese acontece entre a 1ª e a 3ª semana após a fecundação. É
caracterizada pela individualização dos folhetos embrionários (ecto, meso e
endoderma) até o aparecimento do olho primitivo. Nesta fase, ocorre também a
migração das células da crista neural e a formação do tubo neural. Na
organogênese, que ocorre entre a 4ª e a 8ª semana, as camadas se organizam em
padrões específicos, formando órgãos. Na fase da diferenciação, acontece a
elaboração das estruturas características de cada órgão. Esta fase é mais tardia e
se prolonga, indo até depois do nascimento. Na retina, ela acontece entre o 3º e o
9° mês, na mácula no 16° mês e na fovéola no 45° mês. Costa e Höfling-Lima,
2009.
O início da maturação visual ocorre na 30ª semana gestacional, quando
o feto manifesta reflexo pupilar e palpebral à luz e apresenta sistema vestibular
bem desenvolvido. Com 37 semanas de idade gestacional, o feto já pode fixar
objetos grandes por meio de estímulos provenientes de estruturas subcorticais.
Costa e Höfling-Lima, 2009.
No momento do nascimento, o globo ocular tem uma dimensão de 75%
a 80% do olho adulto. Seu aspecto é quase normal, mas sua maturação ainda não
está completa. O volume vai mudar durante a evolução. O comprimento axial do
olho do recém-nascido é em média 16 mm, o do adulto é 23 mm. O crescimento,
porém, ocorre rapidamente. Aos 18 meses, o comprimento axial costuma estar em
torno de 20,3 mm. Na fase infantil, dos dois aos cinco anos de idade, o olho cresce
mais 1,1mm, chegando a 90% do olho adulto. Entre os 5 e os 13 anos o olho
aumenta mais 1,3mm, atingindo a média do olho adulto. No sexo masculino o olho
costuma ser 0,3mm maior do que no sexo feminino, em todas as etapas do
desenvolvimento. De-Maria-Moreira, Amorim, De-Maria-Moreira e Curi, 2008. Como
o eixo antero-posterior do olho é curto, as crianças costumam nascer com uma leve
hipermetropia, que aumenta até os sete anos de idade. Em prematuros, costuma
acontecer miopia pelo desenvolvimento mais lento do segmento anterior.
Embora o olho não seja tão pequeno no nascimento, o desenvolvimento
da função visual vai depender da maturação de estruturas oculares, sobretudo da
39
parte posterior do olho, onde se situa a retina, e de estruturas do próprio sistema
nervoso central. Existe uma grande variação no comportamento visual infantil em
decorrência desse desenvolvimento.
Inicialmente, a densidade de cones é muito baixa, sendo às vezes a
metade da do adulto. A mácula ainda está mal desenvolvida no nascimento, e o
aprofundamento da fovéola só acontece entre os seis e os oito meses de idade, o
que limita a acuidade visual da criança. A mielinização do nervo óptico acontece
entre os sete meses e os dois anos de vida.
Segundo Daw, 2006, embora não apresentando ainda uma boa acuidade
visual, as crianças podem ver ao nascer. Elas podem imitar a abertura da boca em
oposição à protrusão da língua poucas horas após o nascimento. Salapatek &
Cohen, citados por Daw, 2006. O rosto materno só pode ser discriminado do rosto
de um estranho com o auxílio da voz, porém, o bebê olha para sua mãe por mais
tempo do que olha para um estranho.
Até os dois meses, o bebê não é capaz de olhar diretamente nos olhos
de sua mãe porque sua maneira de olhar é inspecionar os traços externos da face,
como o queixo e a linha dos cabelos, em vez de dirigir o olhar para a parte interna
da face, onde estão os olhos. Essas ações evidenciam, portanto, alguma
percepção visual e algum controle dos movimentos oculares. O que acontece após
o nascimento é um refinamento dessas habilidades natas. Daw, 2006.
A estereopsia ou visão binocular começa a se desenvolver em torno dos
quatro a cinco meses de idade, quando acontece a maturação foveal. As
habilidades vão se estabelecendo e aos 12 meses a criança já apresenta
coordenação motora, atenção visual, discriminação de formas e objetos e a sinergia
acomodação-convergência. Entre os três e quatro anos, acontece a maturação do
sistema visual. Costa e Höfling-Lima, 2009. O quadro abaixo detalha esses
eventos.
MATURAÇÃO DA VISÃO
MANIFESTAÇÃO
Reação pupilar à luz presente
IDADE
30 semanas de gestação
Reação pupilar à luz plena
1 mês
Fechamento palpebral à luz intensa
30 semanas de gestação
Pestanejar à ameaça visual
5 meses
40
Fixação visual presente
Nascimento
Fixação visual bem desenvolvida
2 meses
Olhar horizontal conjugado bem desenvolvido
Nascimento
Olhar vertical conjugado bem desenvolvido
2 meses
Nistagmo optocinético desenvolvido
Nascimento
Acompanhamento visual desenvolvido
3 meses
Acomodação desenvolvida
4 meses
Alinhamento ocular estável
1 mês
Convergência fusional bem desenvolvida
6 meses
Estereopsia desenvolvida
6 meses
Estereopsia igual à do adulto
7 anos
Acuidade visual pelo potencial evocado (PEV) igual à do 6 a 12 meses
adulto
AV pelo olhar preferencial (PL) igual à do adulto
18 a 24 meses
AV pelo nistagmo optocinético (NOC)
20 a 30 meses
AV Snellen igual à do adulto
7 anos
Fim do período crítico
10 anos
De-Maria-Moreira; Amorim; De-Maria-Moreira; Curi. 2008
A saúde visual de uma criança deve ser motivo de total atenção. Há um
exame que deve ser feito logo após o nascimento, ainda na maternidade, o Teste
do Reflexo Vermelho conhecido como Teste do Olhinho. Esse teste faz parte da
rotina obrigatória do exame do recém-nascido nos estados de São Paulo e Paraná,
e nas cidades do Rio de Janeiro e Porto Alegre (Projeto de Lei nº 559, de 2007).
Por esse exame é possível verificar se as estruturas transparentes do globo ocular
(córnea, cristalino) estão realmente transparentes ou se há alguma opacidade
impedindo a luz de atingir a retina. O exame é importante na detecção precoce de
patologias oculares como catarata congênita, glaucoma congênito, infecções
intraoculares, malformações, tumores. Costa e Höfling-Lima, 2009.
Segundo dados de 2009 apresentados no XXXV Congresso Brasileiro de
Oftalmologia, que teve como tema oficial Saúde Ocular e Prevenção da Cegueira,
60% das causas de cegueira e comprometimento visual grave infantil são
previsíveis ou tratáveis. Ainda segundo a mesma fonte (Conselho Brasileiro de
Oftalmologia), 20 a 25% das crianças pré-escolares e escolares abaixo de 15 anos
41
de idade apresentam algum tipo de deficiência visual. 5% a 8% possuem alguma
ametropia. Costa e Höfling-Lima, 2009. Em se tratando de visão infantil, quanto
mais precocemente um problema for detectado, maiores serão as chances de uma
boa recuperação visual.
A visão do bebê e de crianças não verbais pode ser detectada por
técnicas diferentes das empregadas para a aferição visual de um adulto. Em
primeiro lugar, bebês não podem falar. Além disso, sua atenção não fica presa a
um ponto por muito tempo. Dessa forma são empregados exames como respostas
eletrofisiológicas
básicas,
pelo
Potencial
Visual
Evocado,
ou
pelo
Eletroretinograma. Há também exames específicos nos quais se observa a
resposta dos movimentos oculares ou a fixação de um objeto de interesse. A
verificação é feita pela medida das respostas perceptuais e sensoriais. Gorman,
Cogan, & Gellis, 1957 citados por Salomão, 2007.
Nos anos 70, foram introduzidas duas técnicas para definir o
desenvolvimento de crianças de faixas etárias mais baixas, o método do Olhar
Preferencial (OP ou OP de Escolha forçada) e Potenciais Visuais Evocados (PVE).
No teste de PVE, um ou ambos os olhos são estimulados. Enquanto isso, a
atividade elétrica é recebida e gravada por eletrodos. Os eletrodos são afixados na
parte occipital da criança. Podem ser utilizados dois tipos de estímulos: flashes de
luz ou o padrão reverso, constituído de uma tela de televisão com padrão xadrez.
Nessa tela, os quadrados brancos ficam pretos e os pretos ficam brancos. Numa
criança com comportamento visual pobre, mas exame oftalmológico normal,
incluindo reflexos pupilares com reações normais, a ausência de resposta ao PVE
pode significar cegueira cortical.
Tanto o Método Comportamental (OP) como o Método Eletrofisiológico
(PVE) de Medida da Acuidade Visual se baseiam na capacidade da criança em
resolver padrões listrados ou em formato de tabuleiro de xadrez. Essa habilidade
visual é chamada de Acuidade de Resolução de Grades. As grades usadas como
estímulos de acuidade podem ser listras pretas e brancas com bordas marcadas
(grades de onda quadrada) ou grades senoidais, que tem perfil de luminância de
onda senóide, e parecem listras com bordas borradas ou graduadas. As barras
escuras e as claras têm a mesma largura.
O Olhar Preferencial de Escolha Forçada (OPEF) foi desenvolvido por
Teller. Como esse teste tinha um protocolo estatístico rigoroso para determinar o
42
limiar de acuidade visual, foi criado outro exame, o teste dos Cartões de Acuidade
de Teller, que recebeu esse nome em homenagem à pesquisadora americana
Davida Teller, em reconhecimento a sua dedicação a estudos do desenvolvimento
da acuidade visual em bebês com a utilização do padrão do olhar preferencial e
também pelo fato de o teste dos cartões de acuidade ter sido desenvolvido em seu
laboratório. Esse teste pode ser empregado desde os primeiros dias de vida até a
idade verbal. Salomão, 2007.
O tambor optocinético é usado para o Teste do Nistagmo Optocinético. O
nistagmo optocinético (NOC) é um movimento repetitivo desencadeado por uma
estimulação visual. É composto de dois tipos de movimentos oculares: um
movimento lento de seguimento e um movimento rápido de fixação, o movimento
sacádico. Atribui-se a criação deste teste a Helmholtz, que descobriu pela primeira
vez este tipo de nistagmo, ao observar os olhos de passageiros que olhavam
através das janelas dos trens em movimento. O Nistagmo Optocinético é útil para
determinar a maturação visual em crianças, e está presente, em um grau variado,
nos recém-nascidos. Mier, 2010.
Em crianças com maior nível de compreensão, a acuidade visual pode
ser testada com a tabela E de Snellen. A criança é orientada a indicar para que
lado estão as pontas do “E”. Para facilitar, a criança pode receber uma letra E de
plástico ou papel cartão para compreender melhor o que está sendo solicitado. Há
também optotipos específicos com imagens com motivos infantis. De qualquer
forma, ao examinar crianças em testes em que haja uma colaboração mais efetiva,
o examinador deve estar seguro de que a criança esteja compreendendo as
ordens, para que o resultado do exame possa ser fidedigno.
2.3: Dificuldades visuais na infância
Cerca de 20% das crianças em idade escolar apresentam alguma
deficiência visual. Perto de 500.000 crianças ficam cegas anualmente no mundo.
Déficits visuais têm uma ocorrência cinco a sete vezes maior em países pobres do
que em países ricos. Mais de 90% de casos de cegueira em menores de 16 anos
de idade ocorrem nos países pobres. Albuquerque e Alves, 2001.
43
Infelizmente, mais da metade dos problemas que causam baixas visuais
poderiam ser detectados e, com a correta interferência, não deixar sequelas se
fossem identificados enquanto a criança está na faixa etária adequada. Antes dos
sete anos de idade, a resposta a intervenções é excelente. Após essa idade, ainda
é correto fazer tentativa. Atualmente, com novas técnicas de estimulação, são
obtidos resultados em crianças com até o dobro desta idade. Esses tratamentos, no
entanto, são mais complexos que os que podem ser aplicados em crianças
menores.
Uma das dificuldades para identificar problemas visuais decorre da
incapacidade da criança de acusar deficiências. Outra, do despreparo ou
negligência dos responsáveis. Serão apresentados a seguir resultados de várias
triagens de acuidade visual em crianças, realizadas em diversas cidades
brasileiras. Em todos os estudos que serão mostrados, a conduta foi semelhante.
Escolares de diferentes faixas etárias passaram por uma triagem inicial onde foi
apresentada a Tabela de Snellen. As crianças que apresentassem acuidade visual
inferior a 0,7 foram encaminhadas para exames oftalmológicos. A triagem inicial foi
feita por um agente treinado. Esse profissional não tinha que ser da área da saúde
visual. Algumas escolas utilizaram as próprias professoras ou outros profissionais
habilitados a lidar com as crianças. Em alguns estudos, houve a participação de
acadêmicos de medicina e, em outros, de estudantes de cursos de Saúde Pública.
Albuquerque e Moreira realizaram uma triagem no Serviço de Oftalmologia do
Hospital Geral de Pediatria do Instituto Materno-Infantil de Pernambuco no período
de fevereiro a outubro de 2001, com crianças de 0 a 15 anos, sendo a idade média
3,5 anos. Foram examinadas 388 crianças. Do total atendido, 13,4% apresentaram
exame visual normal. 63,9% apresentaram problemas visuais como transtorno dos
músculos oculares, do movimento binocular, da acomodação e de refração. Dentre
estas crianças, 34,9% tinham estrabismo. O estrabismo não corrigido pode levar à
supressão e à consequente ambliopia. A ambliopia pode ser revertida se houver
intervenção antes dos sete anos de idade. Depois disso os resultados não são tão
promissores. Este estudo atendeu predominantemente crianças em uma faixa
etária ainda passível de recuperação. (figura 08).
Jeveaux, Portes, Couto Júnior e Shinzato realizaram um estudo com
crianças de 3 a 6 anos do Morro do Alemão, R.J., entre janeiro de 2005 e julho de
2006. De 559 crianças convocadas para a triagem, só 265 compareceram,
44
evidenciando a queixa da maioria dos pesquisadores de outros estudos, que é o
descaso ou desinteresse dos responsáveis. Das crianças examinadas, 52% tinham
exame visual normal. 127 crianças tinham deficiências visuais, sendo que 44,4%
precisaram de lentes corretoras. 5 das crianças examinadas neste estudo já
tinham ambliopia. Neste estudo em particular o absenteísmo foi alto.
Na cidade de Araçatuba, SP, foi realizada uma pesquisa com 1.345
crianças de 0 a 15 anos de idade matriculadas na rede pública de ensino. Das
crianças examinadas, 637 ou 47,36% tinham problemas visuais. Dessas, 539
receberam óculos.
Todos os pesquisadores citados, diante dos resultados encontrados,
enfatizam a importância dessas triagens como prevenção de casos de cegueira
evitável. Castilho lembra que o bom desenvolvimento neurológico, a boa audição e
a visão perfeita são pré-requisitos importantes para o desenvolvimento das
capacidades de uma criança e que a presença de erros de refração, sobretudo em
alunos da primeira série do ensino fundamental, pode levar a problemas de
desenvolvimento da personalidade da criança. Desde a década de 70 a
Organização Mundial da Saúde (OMS) indica ações promocionais e preventivas em
saúde ocular com o intuito de reduzir o índice mundial de “cegueira evitável” e
“baixa visão”. Albuquerque e Alves, 2003. Seguindo essa diretriz, o Conselho
Brasileiro de Óptica e Optometria tem se empenhado na realização de mutirões de
atendimento sistemáticos. O Conselho Brasileiro de oftalmologia faz o mesmo. A
meta da OMS é que, até o ano 2020, possam ser eliminadas as causas de cegueira
evitável. Estas campanhas deveriam ser permanentes e atingir todos os municípios
brasileiros. Infelizmente isso não acontece.
A triagem de escolares é importante. Com o ingresso na escola, a
criança passa a desenvolver mais intensamente as atividades intelectuais e sociais,
que estão associadas diretamente às capacidades psicomotoras e visuais. Esta
maior demanda de esforço visual provoca a manifestação de problemas já
existentes que vão redundar em deficiências no desempenho escolar e mesmo em
distúrbios emocionais e psicológicos, dificuldades de socialização e prejuízos no
desenvolvimento da personalidade. Sena Neves et al, 2011.
Os levantamentos de acuidade visual em estudantes são feitos sempre
por profissionais da área da saúde. Embora se valendo da concentração das
crianças nas escolas e usando professores treinados para um levantamento inicial,
45
os resultados não são comparados com o rendimento escolar, e fica difícil associar
fracassos no desempenho escolar com baixa visual. Das pesquisas encontradas
que incluíram levantamentos em municípios variados como alguns do Rio Grande
do Sul, do interior do Ceará, de uma escola no semiárido da Bahia e, embora os
pesquisadores falem da importância da boa visão para a aprendizagem, somente
um estudo fez a confrontação entre visão e desempenho escolar. Trata-se de
Detecção precoce de deficiência visual e sua relação com o rendimento escolar,
realizado no município de Juiz de Fora. Neste estudo, a triagem inicial avaliou 222
dos quais 161 foram submetidos a estudos mais detalhados. As crianças eram da
terceira série, com idades entre 8 e 10 anos. A incidência de deficiência visual foi
de 34,5%. Das crianças avaliadas e declaradas com visão normal, 89,5% tinha
rendimento escolar considerado satisfatório. Entre as crianças com baixa acuidade
visual, 75% tinha rendimento escolar satisfatório. Os autores citam também que
dois terços das crianças examinadas nunca haviam passado por um exame ocular
antes, o que reforça a importância dessas triagens. E a conclusão é que a saúde
ocular das crianças deve ser sempre avaliada independente da faixa etária e da
presença de sintomas. Identificar precocemente deficiências visuais e assegurar
atendimento, evitando dificuldades de aprendizagem pode contribuir positivamente
para diminuir índices de repetência que culminam com a evasão escolar. Toledo,
Carolina et al, 2010.
Um
estudo
realizado
com pré-escolares
por pesquisadores
da
Universidade da Califórnia associa erros refrativos ao potencial de aprendizagem.
Os pesquisadores usaram a Wechsler Preschool and Primary Scale of Intelligencerevised, que avalia o desempenho em reconhecimento de formas, análise espacial,
integração viso-motora e desempenho verbal. A conclusão aponta para um
desempenho mais baixo de crianças com deficiências visuais quando comparadas
a um grupo de controle com boa acuidade visual. Roch-Levecq, sem data. Portanto,
seria importante que dados de avaliação de acuidade visual fossem sempre
comparados ao desenvolvimento efetivo da criança, para que esse cotejamento
induzisse reflexões e apontasse caminhos.
46
CONCLUSÃO
A visão é o sentido responsável pela aquisição de 80% do conhecimento
humano. Deficiências visuais prejudicam o desenvolvimento das aptidões
intelectuais e psicomotoras, interferindo na vida escolar e profissional do indivíduo.
Lopes et al, 2002. Infelizmente, a deficiência visual geralmente é ignorada quando
se procuram as causas para o mau desempenho escolar de uma criança. É
importante frisar que a criança não se dá conta de sua deficiência e acaba sendo
chamada de lenta, desinteressada ou pouco inteligente.
Uma criança pode perder suas oportunidades na escola por um fator
cruel: o descaso de profissionais que, embora pagos para realizar um atendimento
médico, são omissos ao exercer suas tarefas. G.B.S. nascido em 3/07/88 usava
óculos desde os 9 anos de idade. A mãe, cuidadosa, anualmente levava o menino
ao posto do INSS para um exame oftalmológico. Ao trazer o filho tinha as
prescrições de todos esses anos, desde os primeiros óculos de G.B.S.
A mãe contou sua história. O médico diagnosticou uma baixa visual sem
determinar o problema que a causara. No olho direito, o menino tinha 20/50 (0,4 de
visão) e no olho esquerdo, 20/70 (0,28 de visão). Anualmente, a mesma prescrição
era repetida. Mãe e filho se conformaram. G.B.S. estava atrasado na escola, por
esta razão sua turma era de crianças bem mais novas. Ele era alto e se destacava
entre crianças de menor estatura. Em decorrência do problema visual, não
conseguia copiar as tarefas do quadro negro. Não podia sentar nas primeiras
carteiras porque, por ser alto, impedia a visão das outras crianças. Mesmo que o
fizesse, sua visão não permitia que lesse o que estava escrito no quadro. Contava
com a boa vontade da professora para escrever as lições em seu caderno. Muitas
vezes atarefada com as demais crianças, ela não tinha tempo para copiar os
exercícios, e o menino ficava para trás. As demais crianças o chamavam de burro e
ele não queria mais frequentar a escola.
Com a persistência materna, G.B.S. foi encaminhado a outro
oftalmologista. A surpresa veio com a conclusão: o menino tinha uma visão perfeita,
apenas estava usando óculos com a prescrição bem inferior a que necessitava.
47
Novos óculos, e G.B.S., como o Miguelim de Graciliano Ramos, passou a enxergar
um novo mundo. Veio agradecer, e, num abraço, disse a frase emblemática: Tia, eu
não sou burro, eu só não enxergava. G.B.S. escapou de uma baixa visual definitiva
porque sua deficiência era a miopia, que surgiu aos 9 anos, período em que a visão
já se consolidou.
A Organização Mundial da Saúde tem o projeto 20/20. Ele planeja que
no ano de 2020 não haja mais no mundo baixas visuais por deficiências evitáveis. A
marcação 20/20 indica a visão 1, ou acuidade perfeita. Esse projeto deve contar
com o esforço dos profissionais que trabalham com crianças, em todos os setores,
o da saúde e o da educação.
Precisamos nos unir e trabalhar com afinco para que, um dia, no Brasil,
não haja mais nenhuma criança prejudicada na vida e nos estudos, não por ser
burro, só por não ser capaz de enxergar corretamente.
48
ANEXO
- Figura 01: “Globo ocular, destacando a Retina”.
- Figura 02: “Cones e Bastonetes”.
- Figura 03: “Vias Ópticas, Nervos Ópticos, Quiasma Óptico, Trato Óptico,
Radiações ópticas”.
- Figura 04: “Alterações no campo visual decorrentes de lesões nas diferentes
partes do trajeto das vias ópticas”.
- Figura 05: “córtex visual primário”.
- Figura 06: “Córtex Visual e as vias What em vermelho e Where em negro”.
- Figura 07: “Tabelas para aferição da acuidade visual de crianças não
alfabetizadas”
- Figura 08: “Teste do olhar preferencial”
49
Figura 01
E. Globo ocular, destacando a Retina. D. Retina e os Fotorreceptores, Mácula e Fóvea. De:
Principles of neural science. Eric Kandel.
Figura 02
Cones e Bastonetes. De: Principles of neural science. Eric Kandel.
50
Figura 03
Vias Ópticas, Nervos Ópticos, Quiasma Óptico, Trato Óptico, Radiações ópticas.
Figura 04
Alterações no campo visual decorrentes de lesões nas diferentes partes do trajeto das vias
ópticas.
51
Figura 05
Delimitação do Lobo Occip
Occipital na face lateral do hemisfério cerebral.
bral. Uma linha imaginária
(linha Parieto-Temporal,, em
e pinos vermelhos) conectando a projeç
projeção da extremidade
superior do Sulco Parieto
rieto-Occipital (SPO) à Incisura Pré-Occipital (IPO)
(IP
separa os lobos
parietal e temporal do lobo occipital. De: Cássio Vinícius dos Reis – Tese
Tes de doutorado.
E Córtex visual primário.
52
Figura 06
Córtex Visual e as viass Wha
What em vermelho e Where em negro.
De: Principles of neural
al scie
science. Erik kandel.
Figura 07
Tabelas para aferição da ac
acuidade visual de crianças não alfabetizadas
zadas. Duas tabelas
exibem imagens e a terceir
erceira tabela é o e de Snellen.
53
E Cartões De Teller
Figura 08
Teste do olhar preferencial
54
BIBLIOGRAFIA
ALBUQUERQUE, Raquel Costa; ALVES, João Guilherme Bezerra. Afecções
oculares prevalentes em crianças de baixa renda em serviço oftalmológico na
cidade de Recife, PE, Brasil. Arquivos Brasileiros de Oftalmologia vol.66 n.6. São
Paulo. Nov/dez 2003.
BEAR, Mark; CONNORS, Barry; PARADISO, Michael.
Desvendando o sistema nervoso. Porto Alegre: Artmed, 2008.
Neurociências.
COSTA, Elaine de Paula; HOFLING-LIMA, Ana Luísa. Desenvolvimento da Visão in
Saude Ocular e Prevenção da Cegueira. KARA-JOSÉ, NEWTON; RODRIGUES,
Maria de Lourdes Veronese. Rio de Janeiro: Cultura Médica, 2009.
DANTAS, Adalmir Morterá. Neurofisiologia Ocular. Rio de Janeiro: Colina/Revinter,
1995.
DAW, Nigel. Visual development. New York: Ed.Springer, 1995.
DE-MARIA-MOREIRA, Nelson Luis; AMORIM, Daniela Silva de; DE-MARIAMOREIRA, Daniella; CURI, Renato Luiz. Desenvolvimento Ocular. Revista Pediatria
Moderna maio/junho 2008 V.44 N.3 pag. 95 a 99.
FOX, Charles. The visual system in Neuroscience for rehabilitation. COHEN, Helen.
Philadelphia: Lippincott Williams, 1999.
GUYTON, Arthur; HALL, John. Tratado de Fisiologia Médica. Rio de Janeiro:
Elsevier, 2006.
HASEGAWA, M; HOUDOU, S; MITO, T. et al. Development of myelination in the
human fetal and infant myelin basic protein immunohistochemical study. Brain Dev
1992; 14:1-6.
HERSCHKOWITZ, N. Brain development in fetus, neonate and infant. Biology of the
Neonate. Vol. 54, nº 1. 1988.
55
HERSCHKOWITZ, Norbert. Neurological bases of behavioral development in
infancy. Brain & Development 22 (2000) 411 a 416.
HUBEL, David Hunter. Eye, Brain and Vision. Scientific American Library. 1988.
Baixado da Internet.
KANDE, l Eric R.; SCHWARTZ, James H.; JESSELL, Thomas M. Principles of
Neural Science 4th Edition: New York: McGraw-Hill, 2000.
KIERNAN, John. Neuroanatomia humana de Barr. São Paulo: Manole, 2003.
LENT, Roberto. Neurociência da mente e do comportamento. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2008.
MEISS, Richard A. Sensory Physiology in Medical Physiology. Rhoades, A.
Rodney. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins, 2008.
MOURA-RIBEIRO, Maria Valeriana; GONÇALVES, Vanda Maria. Neurologia do
desenvolvimento da criança. Rio de Janeiro: Revinter, 2010.
MUSTARD, James Fraser. Investindo no desenvolvimento infantil. Preenchendo a
lacuna entre o que sabemos e o que fazemos. Do site Fundação Maria Cecília
Souto Vidigal. Disponível em: www.fmcsv.org.br. Acesso em 7/09/11.
NELSON, Charles A. Brain development during puberty and adolescence.
Comments on Part II. Ann. N. Y. Acad. Sci.1021:105 - 109.2004. Disponível em:
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed 1375444. Acesso em dezembro 2011.
OLIVA, Ângela Donato; DIAS, Gisele P. & REIS, Ricardo A. M. Plasticidade
sináptica: Natureza e cultura moldando o Self. Disponível em: www.scielo.br/prc.
Acesso em 8 de set. de 2011.
PURVES, Dale et al. Neurociências. São Paulo: Artmed, 2005.
REIS, Cassius Vinicius Corrêa dos. O limite anterolateral do lobo occipital: estudo
anatômico e em neuroimagem. Belo Horizonte, 2007. 122f. Tese de Mestrado –
UFMG.
56
RELVAS, Marta Pires. Fundamentos Biológicos da Educação. Rio de Janeiro: Wak
Ed., 2009.
RELVAS, Marta Pires. Neurociência e Educação. Rio de janeiro: Wak Ed., 2009.
RHEIN, Leandro; PAESLEME, Eduardo Fratari. Fundamentos de Neurologia da
Visão. São Paulo: Ed. Santos, 2010.
RHOADES, A. Rodney; BELL, David. Medical Physiology. Philadelphia: Lippincott
Williams & Wilkins, 2008.
ROCH-LEVECQ, A. C. Impact of refractive errors on learning potential of lowincome preschoolers: Pilot study results. Disponível em: http://www.iovs.org Acesso
em dezembro de 2011.
SADUN, Alfredo; GLASER, Joel S. & BOSE, Swaraj. Anatomy of the visual sensory
system. Vol.2, Chapter 4. Duane’s Foundations of Clinical Ophthalmology. 2006.
SALOMÃO, Solange Rios. Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP.
Psicologia USP, 2007, 18(2), 63-81.
PATTO, Maria Helena Souza. A produção do fracasso escolar. Histórias de
submissão e rebeldia. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2000.
TIERNEY, Adrienne; NELSON III, Charles A. Brain Development and the Role of
Experience in the Early Years. Zero to three, 2009. Disponível em:
www.zerotothree.org/reprints. Acesso em maio de 2011.
THOMPSON, Richard F. O cérebro. Uma introdução à Neurociência. São Paulo:
Santos, 2005.
TOLEDO, Carolina Cumani et al. Detecção precoce de deficiências visuais e sua
relação com o rendimento escolar. Revista da Associação Médica Brasileira. SP.
AMB. V.56 n.4.p.415-419, jul/agosto 2010.
WEIDENHEIM, K. M.; KRESS, Y; Epshteyn, I et al. Early myelination in the human
fetal lumbosacral spinal cord: characterization by light and electron microscopy.
J.Neuropathol. Exp Neurol 1992; 51:142-149.
YAMANE, Riuitiro. Semiologia ocular. Rio de Janeiro: Cultura Médica, 2003.
57
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO
02
AGRADECIMENTOS
03
DEDICATÓRIA
04
RESUMO
05
METODOLOGIA
07
SUMÁRIO
08
INTRODUÇÃO
09
CAPÍTULO I
O GLOBO OCULAR E SUAS ESTRUTURAS
11
1.1: A RETINA
14
1.2: CÓRTEX VISUAL
23
CAPÍTULO II
DESENVOLVIMENTO CEREBRAL
27
2.1: O MECANISMO VISUAL
34
2.2: O DESENVOLVIMENTO DA VISÃO
38
2.3: DIFICULDADES VISUAIS NA INFÂNCIA
42
CONCLUSÃO
46
ANEXO
48
BIBLIOGRAFIA
54
ÍNDICE
57
Download