15 Anais Semana de Geografia. Volume 1, Número 1. Ponta Grossa: UEPG, 2014. ISSN 2317-9759 A SUBJETIVIDADE FOTOGRÁFICA: POSSIBILIDADES DE APREENSÃO DA PAISAGEM GEOGRÁFICA CULTURAL BATISTA, Martha Raquel de Souza MONASTIRSKY, Leonel Brizolla Introdução A fotografia surge em meados do século XIX, descoberta simultaneamente por Niépce e Daguerre, mas foi o Daguerreotipo que tornou-se público no ano de 1939. No início, pela dificuldade mecânica de manuseio e alto custo, o acesso restringia-se a seus inventores e entusiastas, na ânsia de descobrir como registrar o mundo e eternizar o tempo numa fração de segundos. Desde então a fotografia fora incorporada cada vez mais ao cotidiano da sociedade e o mundo contemporâneo encontra-se plenamente permeado e representado por imagens, principalmente com o advento da fotografia digital. Desde seu surgimento a fotografia caminha para a construção e difusão do pensamento científico. No início do século XX já ocupava papel de destaque na ciência geográfica, principalmente posterior à proposta de Albrecht Penck de levantamento fotográfico da superfície terrestre, que deu origem à obra "Atlas photographique des Formes du Relief Terrestre". Entretanto, cada vez mais a fotografia se desponta no meio científico por sua dualidade. Ao mesmo tempo em que é a representação de uma paisagem real, que se constrói e é construída pelas dinâmicas espaciais, é quadridimensional por registrar o espaço num determinado tempo. A imagem carrega então o discurso invisível das relações espaciais que se materializam na paisagem geográfica. Neste sentido, busca-se compreender como a fotografia, numa abordagem subjetiva, pode ser utilizada metodologicamente na pesquisa da paisagem geográfica cultural, subsidiando a apreensão das dinâmicas e transições desta ao longo do espaço-tempo através das imagens. Para tanto o recorte espacial de análise refere-se ao Centro Histórico Ferroviário de Ponta Grossa, que destaca-se como lugar de memória (MONASTIRSKY, 2006) e que modificou-se reiteradamente ao longo do tempo, passando por diversas atribuições sociais que podem ser inferidas na fotografia. Objetivos Buscou-se compreender como os elementos extra-quadro, ou seja, aqueles que não estão contidos explicitamente na imagem, podem auxiliar o pesquisador da geografia cultural na compreensão da paisagem materializada - em determinadas temporalidades - na fotografia. Metodologia Foram utilizadas fotografias do Centro Histórico Ferroviário de Ponta Grossa registradas por Batista (2014). A utilização da fotografia neste trabalho fora organizado da seguinte maneira: a comparação) entre fotografias do passado e contemporâneas, que materializam os estágios de ascensão e declínio do modal ferroviário, e a análise de XXI Semana de Geografia, III Semana e Jornada Científica de Geografia do Ensino a Distância da UEPG, XV Jornada Científica da Geografia e VIII Encontro do Saber Escolar e o Conhecimento Geográfico "Os desafios, as novas perspectivas e abordagens da Geografia" 16 Anais Semana de Geografia. Volume 1, Número 1. Ponta Grossa: UEPG, 2014. ISSN 2317-9759 fotografias contemporâneas através da composição) identificando os discursos e elementos implícitos na imagem, a linguagem do fotógrafo e suas possíveis recepções pelos sujeitos. Resultados e Discussões A fotografia coloca-se como importante registro das manifestações culturais que ocorrem no espaço e se refletem na paisagem. A imagem faz-se cada vez mais presente na vida social, “desde as que permeiam o espaço de circulação, em especial o urbano, assim como as que pertencem à documentação pessoal de cada pessoa” (BRANDÃO, 2013, p. 60). A imagem visual é compreendida como discurso, e a fotografia, por meio da imagem, possibilita contar uma história, ou empregar a visão de mundo, ou expressar uma opinião, ou fazer poesia. Nesse aspecto é preciso entender os elementos visuais contidos na imagem, que possibilitam inferir sobre sua substância no extra-quadro a partir dos ícones, índices e símbolos presentes na paisagem e que consequentemente na fotografia desta. O trabalho debruçar-se-á sobre os aspectos abstratos da fotografia, não deixando de lado sua concretude, mas partindo destas para a análise subjetiva. Nesse sentido trabalhar-se-á com alguns o método de composição. A composição permite uma visão mais abrangente da paisagem evidenciada no ato fotográfico, que produz a narrativa atravessada por discursos que se sobrepõem. A compreensão da composição fotográfica não é apenas importante ao Fotógrafo que é "filtro cultural" de que fala Boris Kossoy (2011), mas ao sujeito que consegue identificá-las, tornando a análise da paisagem e do próprio ponto de vista do fotógrafo, potencializando a eficiência da utilização da fotografia. As composições evocam inúmeras técnicas. Neste trabalho descaram-se duas delas: a utilização de fotografias panorâmicas, que permitem olhar a paisagem ampla e simultaneamente, e os cortes da fotografia que aproximam o receptor do fotografo, da imagem, e do elemento representado. A fotografia a seguir apresenta o panorama contemporâneo da paisagem da área central de Ponta Grossa. Evidência a sobreposição de formas de diferentes temporalidades num mesmo espaço. Coexistem, como aponta Milton Santos (2006), de maneira transversal objetos passados e presentes. Aparentemente é mais um dia comum, pela tarde onde as dinâmicas urbanas continuam a ocorrem incessante e simultaneamente. O grande fluxo de carros apresenta o fortalecimento da malha rodoviária que se estabeleceu com o declínio da ferrovia e das políticas desenvolvimentistas de abertura econômica e incentivo à montadoras de automóveis, principalmente a partir dos governos Vargas e Kubitschek. A presença do Terminal Central de Viação Urbana da Viação Campos Gerais (VCG) e alguns ônibus da frota, em contraposição a Estação Ponta Grossa vazia faz alusão à mudança na dinâmica de circulação urbana. A presença da Estação, que outrora era a principal responsável pela intensa circulação de pessoas e cargas, ocupa no centro a condição de lugar de memória, um fragmento do tempo que esta cristalizado na paisagem geográfica e que foi atribuído de diferentes sentidos e valorização ao longo dos anos. A técnica permite a visão da paisagem em 180º, estabelecendo proximidade com o olhar do observador. Fotografia 1 - Panorâmica: Estação Ponta Grossa versus Terminal Central de Viação Urbana Fonte: autora (2014) XXI Semana de Geografia, III Semana e Jornada Científica de Geografia do Ensino a Distância da UEPG, XV Jornada Científica da Geografia e VIII Encontro do Saber Escolar e o Conhecimento Geográfico "Os desafios, as novas perspectivas e abordagens da Geografia" 17 Anais Semana de Geografia. Volume 1, Número 1. Ponta Grossa: UEPG, 2014. ISSN 2317-9759 A fotografia 2 é um corte (ou cut, na linguagem fotográfica) da mesma Estação. O corte permite aproximar o fotógrafo - e o receptor - do objeto fotografado. A relação estabelecida a partir desta proximidade pode gerar identificação, reconhecimento, ou não, e carrega em si uma carga de dramaticidade. A narrativa é composta por discursos ainda mais abstratos. Por exemplo na fotografia a seguir é possível sobrepor os seguintes discursos: a concepção do poder público sobre o patrimônio cultural da cidade, tal qual o entendimento e utilização social do prédio histórico. As pichações, vidros quebrados, substituído algumas vezes por pedaços de madeira, enquanto elementos oferecidos para leitura na imagem enriquecem a análise. Tal qual a opção do fotógrafo por trabalhar com sombras e contrastes, no sentido de atribuir à imagem a dramática mensagem do abandono e descumprimento da legislação de conservação do patrimônio cultural. A fotografia evidencia, neste sentido, o caráter coadjuvante da Estação Ponta Grossa nas dinâmicas da sociedade contemporânea. Fotografia 2 - Portas da Estação Ponta Grossa Fonte: autora (2014). Conclusão O trabalho apresentou importantes potencialidades de estudo da subjetividade da fotografia aliada à apreensão da paisagem geográfica cultural. Apesar da abordagem, reconhece-se a importância de outros métodos a serem trabalhados, como: comparação e sobreposição, nas quais são utilizadas fotografias antigas da mesma área, juntamente a imagens contemporâneas. Além disso também destaca-se a existência de outras técnicas de composição que em conjunto auxiliam na leitura dos elementos visuais, como: Regra dos XXI Semana de Geografia, III Semana e Jornada Científica de Geografia do Ensino a Distância da UEPG, XV Jornada Científica da Geografia e VIII Encontro do Saber Escolar e o Conhecimento Geográfico "Os desafios, as novas perspectivas e abordagens da Geografia" 18 Anais Semana de Geografia. Volume 1, Número 1. Ponta Grossa: UEPG, 2014. ISSN 2317-9759 Terços, Enquadramentos, Reflexos e Planos de Fundo, que busca nas técnicas extrair o máximo que uma paisagem pode oferecer em sua representação para leitura e apreensão. Concluiu-se que a utilização da fotografia como metodologia da pesquisa geográfica estabelece diálogo com outras áreas do conhecimento, como a história e semiótica, o que além de potencializar as análises levam à geografia ao alcance de outras ciências, como por exemplo a arquitetura, ou efetivamente utilizada no planejamento urbano. Além disso, a fotografia constitui-se patrimônio cultural de valor inestimável. Na medida em que é documento, é também o registro inexorável da dissolução do tempo, do que foi e do devir. Referências Bibliográficas KOSSOY, B. Fotografia & História. São Paulo: Ateliê editorial, 2001. MONASTIRSKY, L.B. Ferrovia: patrimônio cultural do Brasil: estudo sobre a ferrovia brasileira a partir da região dos Campos Gerais (PR). Tese de doutorado. Florianópolis: UFSC/CFH/PPGeo, 2006. SANTOS, M. A Natureza do Espaço: Técnica e Tempo, Razão e Emoção / Milton Santos. - 4. ed. 2. reimpr. - São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2006. BRANDÃO, C. M. M. Quando foto-graphias (re) apresentam significações míticas do imaginário. Domínios da Imagem: Londrina, ano VI, n. 12, p. 59 -69, 2013. XXI Semana de Geografia, III Semana e Jornada Científica de Geografia do Ensino a Distância da UEPG, XV Jornada Científica da Geografia e VIII Encontro do Saber Escolar e o Conhecimento Geográfico "Os desafios, as novas perspectivas e abordagens da Geografia"