03-12 - o odio a si mesmo entre os judeus

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O ÓDIO A SI MESMO ENTRE OS JUDEUS
(1941)
DIFICILMENTE o
não-judeu acreditara nisso, mas os judew
sabem muito bem que o ódio a si mesmo existe entre o judeus. É um fenômeno que tem sido observado desde a ernan
cipação dos judeus. O professor Lessing tratou dêsse tema Alemanha (1930), num livro intitulado Der Jidische
Selbsihaj (“O ódio a si mesmo judeu”). Romances como o de Ludwi Lewisohn, Is/and W’ithin, 1928 (“A Ilha
Interior”), que retrat o judeu de Nova lorque por volta de 1930, e os de Schnitzlei que tratam dos problemas do judeu
austríaco no período à volt de 1900, impressionam pela similaridade dos problemas que mo tram existirem. Nesses
diferentes países, surgem os mesmos cor flitos, e judeus de diversas profissões e camadas sociais põem prova a mesma
variedade de soluções.
O ódio a si mesmo judaico é um fenômeno de grupo, tani quanto individual. Na Europa, exemplos notáveis de sentimen
hostil de um grupo judeu contra outro eram o dos judeus Alemanha ou da Áustria contra os da Europa oriental e, ma
recentemente, a atitude dos judeus franceses para com os jude alemães. Não era raro ouvir-se, de judeus alemães, a
opinião que todos os problemas que os judeus tiveram na Alemanha fora causados pela má conduta do judeu da Europa
Oriental. Nos 1 tados Unidos, o ressentimento do judeu espanhol contra o jud emigrado da Alemanha, e a hostilidade
déste em relação ao jud da Europa Oriental, oferecem uma analogia para a situaç européia.
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Falando em têrmos de indivíduos e não de grupos, o ódio do judeu a si mesmo pode dirigir-se contra os
judeus como um grupo, contra uma fração específica dos judeus, contra sua família ou contra si mesmo. Pode
voltar-se contra instituições judaicas, maneirismos judaicos, a língua judaica ou os ideais judaicos.
Entre os judeus, o ódio a si mesmo pode assumir uma variedade quase infinda de formas. A maior delas, e as
mais perigosas, são uma espécie de ódio a si mesmo indireto e furtivo. Se eu devesse contar os casos em que
encontrei desprêzo aberto e direto entre judeus, só poderia indicar uns poucos. O mais impressionante, para
mim, foi o comportamento de um refugiado judeu da Austria, muito bem educado, por ocasião de encontrar
um casal de outros refugiados judeus. Num tom de ódio violento, explodiu numa defesa de Hitier fundada nas
características indesejáveis do judeu alemão.
Mas incidentes que tais são raros. Na maioria dos casos, é mais sutil a expressão do ódio do judeu contra o companheiro
judeu ou contra si mesmo enquanto judeu. O ódio está tão mesclado com outros motivos que é difícil determinar, num
caso específico qualquer, se existe ou não o ódio a si mesmo. Tome-se o caso do judeu bem educado e ateu que concordou
finalmente em fazer uma palestra na sinagoga. Durante a cerimônia que precedeu sua palestra, êle me falou do desgôsto
que sentia ao ver o talitb (xale de rezar) e como essa aversão fôra cedo nêle implantada pela atitude negativa de seu pai
para com a sinagoga. Trata-se, aqui, de uma forma de sentimento anti-judaico ou apenas da grande aversão do ateu pela
religião? O rico comerciante judeu, que se nega a contribuir com o que quer que seja para as obras judaicas de caridade,
odeia êle seu próprio povo ou é apenas avarento? O chefe judeu de um departamento ou de uma loja parece inclinado a
não empregar judeus; mas talvez o que faz seja, na verdade, o máximo que pode ser feito nas circunstâncias.
Raramente acontece — embora ocorra de vez em quando — que um judeu admita francamente que odeia estar na companhia
de outros judeus. A maioria das pessoas que evitam associações iudaicas têm “boas razões” para isso. Estão tão ocupadas
com associações não-judaicas que “simplesmente não têm tempo”. O rapaz que prefere a “Cultura Ëtica” ou a “Ciência
Cristã” ao
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Judaísmo dirá que não está fugindo das coisas judaicas, mas sendo atraído pelos valôres dos outros grupos.
Naturalmente, em alguns casos, tais “razões” podem ser, de fato, as razões reais. Não obstante, há alguns fatos que
causam estranheza. O cônjuge não-judeu, num casamento misto, será freqüentemente muito mais realista no que respeita à
educação dos filhos. Parece compreender a necessidade de a criança crescer com uma compreensão clara de estar ou
dentro ou fora do grupo judeu. O cônjuge judeu assume amiúde a posição de achar que, nos Estados Unidos, as crianças
podem crescer simplesmente como sêres humanos. Negaria que está sendo guiado pelo mesmo sentimento que levou
muitos judeus ricos da Áustria e da Alemanha a batizar seus filhos e a vinculá-los tanto quanto possível a grupos
tipicamente não-judeus.
Todavia, se a aversão de nosso ateu pelos simbolos da religião judaica era seu único motivo, êle deveria sentir a mesma
aversão pelos simbolos de qualquer religião organizada. O fato de êste não ser o caso evidencia que existe alguma coisa
mais sob o seu comportamento. A criança judia de um lar não-ortodoxo que diz à sua mãe: “Eu gosto de ver o velho judeu
rezando com seu talith; é como se eu própria estivesse rezando”, mostra que a indiferença religiosa não leva
necessàriamente a semelhante aversão. Por que o comerciante que se recusa a contribuir para a causa judaica gasta
copiosamente em tôda atividade não-judaica? Por que acampamentos que só recebem crianças judias contratam
cinicamente monitores não-judeus e têm uma cerimônia dominical cristã, mas não canções judaicas, nem outras atividades
judaicas?
O ÓDIO A SI MESMO COMO UM FENÔMENO SOCIAL
Houve uma tentativa de explicar o ódio a si mesmo judaico como conseqüência de certos instintos humanos profundos.
Esse comportamento parece ser um excelente exemplo do que Freud chama impulso de auto-destruição ou “instinto de
morte”. Contudo, uma explicação que tal tem pouco valor. Por que não têm o inglês a mesma dose de ódio a seus
concidadãos, ou o alemão ao alemão, que tem o judeu ao judeu? Se o ódio a si mesmo fôsse resultado de um instinto
geral, deveríamos esperar que seu grau dependesse tão sàmente da personalidade do indivíduo.
Todavia, a intensidade do ódio do judeu a si mesmo, como indivíduo, depende muito mais de sua atitude para com o
Judaísmo que de sua personalidade.
O ódio a si mesmo judaico é um fenômeno que tem analogias em muitos grupos desprivilegiados. Um dos casos mais
conhecidos e mais extremos de ódio a si mesmo pode ser encon— trado entre negros dos Estados Unidos. Os negros
distinguem quatro ou cinco camadas em seu grupo, segundo a côr da pele
— quanto mais clara a côr, mais alta a camada. Esta discriminação vai tão longe entre êles, que uma môça de pele clara
pode recusar-se a casar com um homem de pele mais escura. Um elemento de ódio a si mesmo não tão forte, mas ainda
n’itidamente discernível, pode também ser encontrado na segunda geração de gregos, italianos, poloneses e outros
imigrantes dos Estados Unidos.
A dinâmica do ódio a si mesmo e sua relação com os fatos sociais tornam-se evidentes a um exame um pouco mais atento.
Uma môça judia, numa universidade grã-fina do Centro-Oeste dos Estados Unidos, revelou confidencialmente que contara
aos amigos que seus pais eram norte-americanos natos, embora, na verdade, seu pai fôsse um imigrante de primeira
geração vindo da Europa oriental e falasse com forte sotaque. Ela está agora com a consciência pesada com relação ao pai,
a quem ama de fato, e pretende deixar a universidade. Por que fêz isto? Porque sentiu que se fôsse conhecida sua
ascendência, ela não seria aceita em certos círculos mais elegantes do ambiente universitário.
É assaz evidente a causa desta ação contra o grupo familial:
o indivíduo tem algumas expectativas e objetivos para o futuro. O pertencer êle ao seu grupo é considerado como um
impedimento para atingir tais objetivos. Isso leva a uma tendência a repelir o grupo. No caso da estudante, resultou num
conflito com o vínculo psicológico da família, conflito que ela foi incapaz de suportar. E fácil ver, entretanto, como
semelhante frustração pode levar a um sentimento de ódio contra o grupo como fonte de frustração.
Uma senhora judia que jantava num restaurante elegante com um amigo não-judeu ficou muito irritada com um casal de
outra mesa, que se comportava ruidosamente e estava evidentemente um pouco embriagado. Por qualquer razão, ela
achava que tais pessoas podiam ser judias. O amigo fêz um comentário
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que indicava claramente não ser o casal judeu. A senhora ficou bastante aliviada, e a partir dêsse momento divertiu-se, em
vez de irritar-se, com a turbulência dêles. Incidentes assim ocorrem diàriamente. O fenômeno notável no caso parece ser a
extrema sensibilidade da mulher judia no tocante ao comportamento de outros judeus, semelhantes à sensibilidade da mãe
em relação ao comportamento dos fil1s, quando em público. Ë comum a êste caso e ao da estudante o sentimento do
indivíduo de ver sua posição ameaçada ou seu futuro pôsto em perigo por êle estar identificado com um determinado
grupo.
A sensibilidade à conduta dos outros membros de um grupo não passa de expressão de um fato fundamental da vida
grupal, a saber, a interdependência de destino. Ë revelador o fato de os judeus que se pretendem livres de laços judaicos
revelarem freqüentemente grande sensibilidade. Isso mostra que, malgrado suas palavras, tais pessoas estão de algum
modo conscientes da realidade social. Na verdade, a vida, a liberdade e a busca da felicidade de tôda comunidade judaica
dos Estados Unidos e de todo judeu individual norte-americano dependem, de maneira específica, do status social que os
judeus, como grupo, têm na comunidade mais geral dos Estados Unidos. Caso Hitler ganhe a guerra, essa
interdependência especial de destinos se tornará o fator determinante de maior importância na vida de cada judeu. Se
Hitler perder, a mesma interdependência será ainda um dos fatôres dominantes na vida de nossos filhos.
AS FÔRÇAS QUE IMPELEM PARA OU AFASTAM O
INDIVÍDUO DA PARTICIPAÇÃO NO GRUPO
Analiticamente, podem.se distinguir dois tipos de fôrças no tocante ao membro de qualquer grupo — um tipo de fôrça o
impele para o grupo e o conserva dentro dêle, o outro tipo o afasta do grupo. Podem ser múltiplas as origens das fôrças
que impelem para o grupo: talvez o indivíduo se sinta atraído por outros membros do grupo, talvez os outros membros o
arrastem, talvez êle esteja interessado no objetivo do grupo ou se sinta de acôrdo com a sua ideologia, ou talvez prefira
êsse grupo a estar só. De maneira análoga, as fôrças que o afastam do grupo podem ser o resultado de qualquer tipo de
traços desagradáveis
do próprio grupo, ou talvez sejam expressão da maior atrativj dade de um grupo exterior.
Se fôr negativo o equilíbrio entre as fôrças que impelem para o grupo e as que afastam dêle, e não houver interferência de
outros fatôres, o indivíduo deixará o grupo. Em condições “de liberdade”, portanto, um grupo conterá únicamente os
membros para quem as fôrças positivas são mais intensas que as negativas. Se um grupo não fôr atraente o bastante para
um número suficiente de indivíduos, êle desaparecerá.
Devemos compreender, no entanto, que as fôrças que impelem para o grupo e as que afastam dêle não são sempre uma
expressão das próprias necessidades da pessoa. Podem ser impostas ao indivíduo por algum poder externo. Em outras
palavras, um indivíduo pode ser obrigado, contra sua vontade, a permanecer dentro de um grupo de que gostaria de sair,
ou pode ser mantido fora de um grupo onde desejaria entrar. Por exemplo, um ditador fecha as fronteiras do país, a fim de
que ninguém possa deixá-lo. Um círculo elegante mantém de fora muitas pessoas que gostariam de estar incluídas néle.
FÔRÇAS DE COESÃO E DE DISPERSÃO NUM
GRUPO DESPRiVILEGIO
Um importante fator no que respeita à intensidade das fôrças que impelem para o grupo ou afastam dêle é a medida em
que a satisfação das necessidades do indivíduo é favorecida ou dificultada por sua participação no grupo. Alguns grupos,
como as associações comerciais ou os sindicatos, existem para o fim explícito de promover os interêsses de seus
membros. De outro lado, a participação em qualquer grupo limita, até certo ponto, a liberdade de ação do membro
individual, O estar casado e ter uma espôsa agradável e eficiente pode auxiliar grandemente o marido no que respeita à
consecução de suas ambições, mas o casamento também pode constituir um grande obstáculo. De modo geral, pode-se
dizer que quanto mais o grupo facilitar ou dificultar ao indivíduo atingir seu objetivo, tanto maior será a probabilidade de
que seja positivo ou negativo o equilíbrio entre as fôrças que iinpelem para o grupo ou que afastam dêle.
Esta análise permite uma afirmação geral acêrca dos membros de grupos socialmente privilegiados ou desprivilegiados.
Em
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nossa sociedade, adquirir status é um dos fatôres importantes no determinar o comportamento do indivíduo, O grupo
privilegiado, outrossim, oferece habitualmente mais a seus membros e os ‘estorva menos que o grupo menos privilegiado.
Por tais razões, os membros da elite de qualquer país têm um forte equilíbrio positivo no sentido de permanecer dentro do
grupo de elite. Além disso, se um indivíduo desejar abandonar essa elite, consegue fazê-lo usualmente sem encontrar
obstáculos (embora existam exceções).
O membro de um grupo desprivilegiado é mais estorvado pelo fato de pertencer ao grupo. Ademais, a tendência de adqui.
rir status significa uma fôrça que o afasta dêsse grupo. Ao mesmo tempo, verificamos que no caso de qualquer grupo
socialmente desprivilegiado, a livre mobilidade através da fronteira é limitada ou inteiramente obstada por falta de
capacidade ou por fôrças externas. A maioria mais privilegiada ou um setor influente dessa maioria proibe a livre
mobilidade. Em todo grupo social- mente desprivilegiado existe, pois um certo número de membros para quem o
equilíbrio das fôrças que impelem para o grupo ou que afastam dêle é tal que êles prefeririam abandoná-lo. São mantidos
dentro do grupo não por suas próprias necessidades, mas por fôrças que lhes são impostas. Isto tem influência de grande
alcance sôbre a atmosfera, a estrutura e a organização de todo grupo desprivilegiado e sôbre a psicologia de seus
membros.
LEALDADE GRUPAL E CFIAUVINISMO NEGATIVO
Em todo grupo, podem-se distinguir camadas culturalmente mais centrais e outras mais periféricas. A camada central
contém as idéias, hábitos, tradições e valôres considerados mais essenciais e representativos para o grupo. Para o músico,
isso significa e músico ideal; para o inglês, o que êle considera fipicamente inglês.
As pessoas leais a um grupo têm tendência a dar mais valor às camadas mais centrais. Em outras palavras, o inglês médio
tem “orgulho” de ser inglês e não gostaria de ser chamado “não muito inglês”. Freqüentemente, há uma tendência de
sobrestimar a camada central. Num caso assim, falamos de “americanismo 100%” ou, de um modo mais geral, de
chauvinismo. Mas, uma avaliação positiva das camadas centrais é um resultado lógico da lealdade ao grupo e um fator
essencial no que toca a conservar
o grupo unido. Sem essa lealdade, grupo algum pode progredir e prosperar.
Os indivíduos que gostariam de abandonar determinado grupo não têm essa lealdade. Num grupo desprivilegiado, muitos
dêsses indivíduos são forçados não obstante a permanecer no grupo. Como resultado, em todo grupo desprivilegiado
encontramos uma série de pessoas que se envergonham de nêle participar. No caso dos judeus, um judeu assim tentará
afastar-se tanto quanto possível das coisas judaicas. Em sua escala de valôres, não colocará muito alto os hábitos,
aparências ou atitudes que considera particularmente judaicas; êle as terá por inferiores. Demonstrará um “chauvinismo
negativo”.
Tal situação é sobremaneira agravada pelo seguinte fato:
uma pessoa para quem seja negativo o equilíbrio se afastará tanto do centro da vida judaica quanto a maioria o permitir. A
pessoa se postará nessa barreira e viverá num estado de constante frustração. Em verdade, sentir-se-á mais frustrada que
aquêles membros da minoria que se mantém psicokgicamente bem dentro do grupo. Sabemos, pela Psicologia
experimental e pela Psicopatologia, que semelhante frustração leva a um estado global de grande tensão, com uma
tendência generalizada para a agressão. Làgicamente, a agressão se deveria voltar contra a maioria, que é o que impede o
membro da minoria de abandonar seu grupo. Todavia, aos olhos dessas pessoas, a maioria tem status mais alto. E além
disso, é poderosa demais para ser atacada. Experimentos mostraram que, em tais condições, a agressão tende a se voltar
contra o próprio grupo da pessoa e contra ela mesma.
O PODER DAS ATITUDES DO GRUPO PRIVILEGIADO
A tendência para a agressão contra o próprio grupo da pessoa, nessas circunstâncias, é fortalecida por um outro fator.
Mark Twain conta a história de um negro criado como uma criança branca. Quando se volta contra a mãe, da maneira
mais perversa e covarde, esta lhe diz, “Isso é o negro que há em você”. Por outras palavras, ela aceitara o veredicto do
homem branco, ao caracterizar alguns dos piores traços como típicos do negro.
Reconhece-se, em Sociologia, que os membros das camadas sociais inferiores tendem a aceitar as modas, valôres e ideais
das
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camadas superiores. No caso do grupo desprivilegiado, isso significa que as opiniões que os membros têm de
si mesmos são grandemente influenciadas pela baixa conta em que o grupo é tido pela maioria. Esta
infiltração de opiniões e valôres do que Maurice Pekarsky chamou de “porteiro”, aumenta necessàriamente,
no judeu com um ‘quilíbrio negativo, a tendência a desprender-se das coisas judaicas. Quanto mais
tipicamente judias forem as pessoas, ou quanto mais tipicamente judeu fôr um símbolo cultural ou um padrão
de comportamento, tanto mais desagradável parecerão a um judeu que tal. Incapaz de se libertar totalmente de
suas ligações judaicas e de seu passado judeu, êle volta o ódio contra si mesmo.
ORGANIZAÇÃO DOS GRUPOS DESPRIVILEGIADOS
Os membros da maioria estão habituados a pensar numa minoria como um grupo homogêneo, que possam
caracterizar por um estereótipo como “o judeu” ou “o negro”. Demonstrou-se que êste estereótipo é criado na
criança em desenvolvimento pela atmosfera social em que cresce e que o grau de preconceito é pràticamente
independente do teor e tipo de experiência real que o indivíduo teve com membros do grupo minoritário.
Na realidade, iodo grupo, inclusive os grupos desprivilegiados ecónômicamente ou de outras formas, contém
um certo mImero d’e camadas sociais. Existe contudo a seguinte diferença entre a estrutura característica de
um grupo privilegiado e a de um grupo desprivilegiado. As fôrças que atuam sôbre um dos membros (m) de
um grupo privilegiado se dirigem para as camadas centrais dêsse grupo. As fôrças que atuam sôbre o membro
de um grupo desprivilegiado se dirigem para fora da área central, para a periferia do grupo e, se possível, para
o status ainda mais alto da maioria. O membro da minoria a abandonaria se a barreira levantada pela maioria
não o impedisse disso. Tal quadro representa a situação psicológica daqueles membros do grupo
desprivilegiado que têm um equilíbrio bàsicamente nega. tivo. É a estrutura de um grupo de pessoas voltadas
fundamentalmente contra si mesmas.
É claro que tanto mais difícil se torna uma organização efetiva de um grupo quanto mais membros contiver
que tenham
equilíbrio negativo e quanto mais forte fôr êste equilíbrio nega. tivo. É um fato consabido que a tarefa de
organizar um grupo desprivilegiado, econômicamente ou de qualquer outra forma, é sèriamente dificultada
por aquêles membros cujo objetivo real seja deixar o grupo, mais que promovê-lo. Esse profundo conflito de
objetivos no interior de um grupo desprivilegiado nem sempre se torna claro para os próprios membros. Mas
constitui uma das razões por que mesmo um grande grupo desprivilegiado, que poderia obter igualdade de
direitos se estivesse unido para ação, pode ser mantido assaz fàcilmente numa posição inferior.
m, membro individual per, camada periférica do grupo cc, camada central do grupo B, barreira que proibe a
passagem
LÍDERES VINDOS DA PERIFERIA
partcularmente danoso à organização e à ação de um grupo minoritário, que certos tipos de líderes surjam
dentro dêle. Em todo grupo, os setores aptos a chegar à liderança são os que geralmente têm mais êxito. Num
grupo minoritário, os membros individuais que conseguem êxito econômico ou que se distinguem em suas
profissões geralmente obtêm maior grau de aceitação por parte do grupo majoritário. Isso os coloca
culturalmente na periferia do grupo desprivilegiado e aumenta sua tendência de se tornarem pessoas
“marginais”. Freqüentemente
FIGURA XXVI
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têm um equilíbrio negativo e se mostram particularmente ansiosos de não prejudicar suas “boas relações” com um contato
muito íntimo com aquêles setores do grupo desprivilegiado que não são aceitáveis para a maioria. Apesar disso, são
amiúde chamados para a liderança pelo grupo desprivilegiado, por causa de seu status e poder. Eles próprios anseiam
geralmente por aceitar o papel de liderança na minoria, em parte como substituto de status na maioria, em parte porque tal
liderança possibilita ter e conservar outros contatos com a maioria.
Em conseqüência disso, encontramos o fenômeno assaz paradoxal do que se poderia chamar de “o líder vindo da
periferia.” Em vez de têrmos um grupo liderado por pessoas que têm orgulho dêle, que desejam nêle permanecer e
promovê-lo, vemos líderes de minorias indiferentes ao grupo, líderes que podem, sob uma tênue capa de lealdade, estar
fundamentalmente ansiosos por abandoná-lo ou que tentam desde logo usar seu poder para atos de chauvinismo negativo.
Tendo alcançado um status relativamente satisfatório entre os não-judeus, êsses indivíduos estão principalmente
interessados em conservar o status quo e, por isso, tentam atenuar tôda ação que possa chamar a atenção do não-judeu. Tais judeus nunca pensariam em acusar Knudsen de “dupla lealdade”, por presidir um comício americanodinamarquês, mas estão tão habituados a ver os acontecimentos judaicos com olhos de anti-semitas, que temem a
acusação de dupla lealdade, no ca•so de qualquer ação judaica declarada. Se existe o “perigo” de um judeu ser designado
para a Suprema Côrte, não hesitarão em alertar o Presidente contra semelhante ato.
Como se afirmou no início, pode ser difícil determinar, num dado caso, onde fica exatamente a fronteira entre o
chauvinismo judaico, a laldade normal e o chauvinismo negativo. Todavia, nossa análise deve deixar claro que uma
política de dissimilação, indigna e insensata (por irrealista) deriva das mesmas fôrças de chauvinismo negativo ou de
mêdo em que se origina o ódio do judeu a si mesmo. Constitui em verdade um dos tipos mais nocivos do ódio a si mesmo
judaico.
Existem indícios de que a porcentagem de tais pessoas entre os membros eminentes da comunidade judaica dos Estados
Unidos aumentou a partir da Primeira Guerra Mundial. Malgrado as desastrosas conseqüências que essa política trouxe
para os judeus
da Alemanha, existem provàvelmente nos Estados Unidos, hoje, mais judeus com equilíbrio negativo do que os havia em
1910.
Por outro lado, o desenvolvimento da Palestina, a história recente dos judeus europeus, e a ameaça do Hitlerismo,
tornaram mais claras estas questões. Uns poucos judeus, tal como o infame Capitão Naumann, da Alemanha, se tornaram
êles próprios fascistas ante a ameaça do Fascismo. Entretanto, muitos judeus que perderam contato com o Judaísmo a êle
voltaram sob a ameaça do Nazismo na Europa. A história das revoluções nos ensina que a liderança mais ativa e eficiente
do grupo desprivilegiado adveio de alguns indivíduos que deixaram os grupos privilegiados e voluntàriamente ligaram seu
destino ao da minoria. Por esta ou aquela razão, tais pessoas devem ter tido um equilíbrio positivo particularmente intenso
de fôrças que levam para o grupo e que afastam dêle. Estaria de acôrdo com a experiência histórica se se encontrassem
líderes eficientes entre aquêles que voltaram às fileiras dos judeus conscientes.
O QUE SE PODE FAZER NO TOCANTE AO ÓDIO
A SI MESMO JUDAICO?
O ódio a si mesmo parece ser um fenômeno psicopatológico, e sua prevenção pode parecer principalmente uma tarefa
para o psiquiatra. Todavia, a Psicologia moderna sabe que muitos fenômenos psicológicos não passam da expressão de
uma situação social em que o indivíduo se encontre. Nuns poucos casos, o ódio judeu a si mesmo pode surgir de uma
personalidade neurótica ou com outra anormalidade, mas, na grande maioria do casos, trata-se de um fenômeno
encontrável em pessoas de saúde mental normal. Por outras palavras, é um fenômeno sócio-psicológico, embora
influencie profundamente, via de regra, a personalidade total. Em verdade, as tendências neuróticas em judeus são amiúde
o resultado de sua falta de ajustamento exatamente a tais problemas de grupo.
O ódio a si mesmo judaico desaparecerá sàmente quando fôr atingida uma efetiva igualdade de status com os não-judeus.
Só então a hostilidade do indivíduo contra o seu grupo baixará a proporções relativamente insignificantes, característica
do grupo majoritário. Uma saudável autocrítica a substituirá. Isto não
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quer dizer que nesse ínterim não haja nada a fazer. Afinal de contas, temos um grande número de judeus que difkilmente
poderiam ser classificados de anti-semitas.
A única forma de evitar o ódio a si mesmo judaico, em suas várias formas, é uma transformação do equilíbrio negativo
entre as fôrças que levam para o grupo e as que afastam dêle, num equilíbrio positivo, a criação da lealdade ao grupo
judaico ao invés de um chauvinismo negativo. Somos hoje incapazes de proteger nossos irmãos judeus ou nussos filhos
contra aquelas desvantagens que são o resultado de êles serem judeus. Podemos no entanto tentar elaborar uma educação
judaica tanto ao nível infantil quanto adulto, para contrabalançar o sentimento de inferioridade e o sentimento de
temor que são as fontes mais importantes do equilíbrio negativo.
O sentimento de inferioridade do judeu é apenas um indício do fato de que êle vê as coisas judaicas com os olhos da
maioria hostil. Lembro-me como, quando adolescente, fiquei profundamente perturbado com a idéia de que fôsse
verdadeira a acusação contra os judeus, de serem incapazes de realizar trabalho construtivo. Sei que muitos adolescentes
judeus, criados numa atmosfera de preconceito, sentem o mesmo. Hoje, um jovem judeu que observou o desenvolvimento
da Palestina está em situação infinitamente melhor. Qualquer que possa ser a opinião da pessoa sôbre o Sionismo como
programa político, ninguém que tenha observado de perto os judeus alemães durante as primeiras semanas fatídicas após a
ascensão de Hitler ao poder, negará que milhares de judeus alemães foram salvos do suicídio tão sômente pelo famoso
artigo do Jüdische Rundschau, (“Panorama Judaico”) com suas manchetes “Jasagem vim Judentum” (Dizer Sim à
Condição de Judeu). As idéias ali expressas constituíram centro de reorganização e fonte de revigoramento tanto para os
sionistas quanto para os não-sionistas.
Para neutralizar o temor e fortalecer o indivíduo para enfrentar o que o futuro lhe prepara, nada é mais importante que
uma participação clara e completa num grupo cujo destino tem uma significação positiva. Uma ampla visão, que inclua o
passado e o futuro da vida judaica e ligue a solução do problema da minoria com o problema do bem-estar de todos os
sêres humanos, é uma dessas possíveis fontes de revigoramento. Um forte
sentimento de ser parte essencial do grupo e de ter uma atitude positiva para com êle é, tanto para as crianças como para
os adultos, condição suficiente para evitar atitudes baseadas no ódio a si mesmo.
Um dos programas mais importantes da educação judaica deve ser o de edificar ésse sentimento de participação no grupo,
baseado numa responsabilidade ativa pelo irmão judeu. Isso não significa que possamos criar em nossos filhos um
sentimento de participação, forçando-os a ir à escola dominical ou Heder. Um procedimento que tal significa o
estabelecimento, na infância, do mesmo padrão de participação grupal obrigatória que é característico da situação
psicológica dos chauvinistas negativos e que criará sem dúvida precisamente tal atitude, ao fim e ao cabo. Um número
demasiado grande de judeus foi afastado do Judaísmo por um excesso de Heder. Nossos filhos devem ser criados em
contato com a vida judaica, de tal maneira que frases como “a pessoa parece judia” ou “age como judeu” assumam um
tom positivo e não negativo. Isso implica que uma escola religiosa judaica deve ser dirigida num nível pelo menos
comparável aos padrões pedagógicos do restante de nossas escolas.
Quanto à organização, o grupo como um todo ficaria provàvelmente muito fortalecido se nos pudéssemos livrar de nossos
chauvinistas negativos. Tal expulsão é impossível. Todavia, poderíamos lograr aproximar-nos mais de um estado de
coisas em que a participação no grupo judaico se baseie — pelo menos no que se refere a nós — na disposição do indivíduo
para aceitar responsabilidade e sacrifício ativos pelo grupo. Em minha opinião, os judeus cometeram um grande êrro ao
supor que, para obter grande participação, deva-se exigir o menos possível do indivíduo, Não se criam grupos fortes dessa
forma, e sim por via da política contrária. Neste particular, teríamos o que aprender com o grupo católico, por exemplo.
Na verdade, exigir do indivíduo um espírito de abnegação pode fazer com que diminua o ódio a si mesmo.
Um último ponto merece ser mencionado. Muitos judeus parecem acreditar que o preconceito contra o judeu
desapareceria se todos os indivíduos se comportassem devidamente — isto apesar de tôdas as indicações de que os dois
fatos têm pouco a ver entre si. Os pais judeus costumam insistir, mais que os outros
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pais, na importância da boa apresentação em público. Tal insistência é uma das origens da hipersensibilidade,
já mencionada, ao comportamento do irmão judeu e uma fonte perene de auto-consciência e tensão. Quanto mais o indivíduo aprenda a ver a questão judaica como um problema social, ao
invés de um problema individual de boa conduta, colocando assim sôbre os ombros uma dupla carga, tanto
mais será capaz de agir normal e livremente. Semelhante normalização do nível de tensão é provàvelmente a
condição mais importante para a eliminação do ódio do judeu a si mesmo.
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