- Congresso Brasileiro de Meteorologia

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CLIMATOLOGIA DA PRECIPITAÇÃO NO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO
Juliana Silva de Oliveira1
Claudine Pereira Dereczynski2
Christiane Osório Machado1
RESUMO
Uma climatologia preliminar da precipitação no município do Rio de Janeiro é elaborada utilizando-se
9 anos de dados observados na rede de postos pluviométricos da Fundação Geo-Rio. Os resultados da
distribuição espacial da precipitação mostram que os máximos valores das médias mensal, sazonal e
anual concentram-se junto aos três maciços existentes na cidade: na Serra da Carioca e na Serra do
Mendanha, consistente com trabalhos anteriores, e também na Serra Geral de Guaratiba. Tais
valores reduzem-se em direção às planícies, sendo um mínimo observado na “Zona Norte” da
cidade. A análise do ciclo anual da precipitação indica que os maiores (menores) índices
pluviométricos ocorrem no trimestre novembro-janeiro (junho-agosto). A estação do Sumaré
destaca-se por seus elevados índices pluviométricos, com valores superiores àqueles coletados nas
demais localidades durante praticamente todo o ano. Uma análise dos eventos extremos (totais
pluviométricos diários superiores a 30,0 mm em pelo menos 10 estações) indicou que a maior parte
dos 139 eventos selecionados, como esperado, ocorreu durante a estação chuvosa (de novembro a
março), totalizando 81 casos. Tais eventos de “verão” estiveram associados à entrada de sistemas
frontais (51 casos), atuação da Zona de Convergência do Atlântico Sul - ZCAS (22 casos), sistemas
convectivos de mesoescala (5 casos) e precipitação gerada por efeito de circulação marítima (3
casos). No período seco (junho a agosto) ocorreram apenas sistemas frontais (18 casos). Nota-se
que no verão, apesar do maior número de sistemas frontais em relação aos demais sistemas, os
maiores totais pluviométricos diários estão associados aos eventos de ZCAS.
ABSTRACT
A preliminary precipitation climatology of Rio de Janeiro city is elaborated, by means of a
Geo-Rio rain gauges network, in order to better understand the precipitation distribution at the city.
The results, from a 9-year period, show that the rainfall amount distribution is highly dependent on
the terrain topography. There are three regions of maximum precipitation in the city, coinciding
with the three hills: Carioca’s and Mendanha’s Hills, consistent with earlier observational studies,
and Geral de Guaratiba’s Hill. The precipitation values are reduced toward the plains, with
minimum values at “Zona Norte”. An inspection of the annual cycle of precipitation reveals a
maximum (minimum) at the trimester November-January (June-August). At Sumaré station,
precipitation is greater than all other places during almost all the year. An analysis of the extrems
events (rainfall greater than 30.0 mm) shows that the greater part of the 139 selected events, as
expected, occurred during the rainy season (from November to March), resulting in 82 cases. These
summer events were associated with frontal system (51 cases), South Atlantic Convergence Zone –
SACZ (22 cases), Mesoscale Convective Systems (7 cases) and rainfall caused by seawind
circulation (2 cases). In the dry period (Junho to August) occurred only frontal systems (18 cases).
In the summer, although the greater number of frontal systems in relation to other meteorological
systems, the bigger daily pluviometric data are associated to SACZ events.
Palavras-Chave: climatologia, precipitação, Rio de Janeiro
1
Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca – CEFET/RJ - Avenida Maracanã, 229 –
Maracanã, 20271-110 - Tel: (21) 2569-3022 - ramal 163 e-mails: [email protected] e [email protected]
2
Departamento de Meteorologia – UFRJ - Av. Brigadeiro Trompowsky, s/n, Cidade Universitária - Ilha do Fundão,
Prédio do CCMN-IGEO, 21949-900- Tel: (21) 2598-9471- e-mail: [email protected]
INTRODUÇÃO
A cidade do Rio de Janeiro apresenta uma topografia acidentada e extremamente diversa,
marcada pela formação de maciços, cujas encostas originalmente cobertas por florestas da Mata
Atlântica, apresentam altos graus de declividade. Desta forma, os sistemas meteorológicos que
normalmente atingem a região, tais como os sistemas frontais, os sistemas convectivos de
mesoescala, as linhas de instabilidade e outros (Satyamurty et al, 1998) , provocam precipitação de
intensidade variável, dependendo da localização e da topografia da região.
Trabalhos anteriores, tais como Serra (1970) e Serra e Ratisbonna (1957), apresentam
climatologias da precipitação para o município, utilizando contudo poucas estações meteorológicas
e, além disso irregularmente distribuídas. No primeiro trabalho o autor descreve o comportamento
de diversos elementos meteorológicos, porém sem informação sobre a localização exata e período
analisado em cada uma das 17 estações nas Zonas Norte e Sul da cidade. Sobre a precipitação anual
o autor afirma que ocorre um máximo em torno de 1600 mm localizado em extensa área à
barlavento do maciço da Tijuca, reduzindo-se em direção aos bairros localizados na zona sul da
cidade, chegando a 1200 mm próximo à costa. De acordo com o autor, valores inferiores a 1200
mm são observados nos bairros da Zona Norte.
Em FIDERJ (1978) apresenta-se uma climatologia da precipitação, temperatura e ventos no
Estado do Rio de Janeiro para o período de 1931 a 1975. Os mapas mostram pouca resolução sobre
a cidade, devido ao reduzido número de estações meteorológicas na região, sendo 59 localizadas
sobre o Estado e apenas 7 no município. Com relação à precipitação o campo de totais
pluviométricos anuais mostra um máximo na Zona Sul da cidade (entre 1700 e 1900 mm ao sul da
estação do Jardim Botânico) e outro máximo secundário de 1500 mm ao norte da cidade. Na parte
central predominam valores entre 1300 e 1500 mm.
O objetivo deste trabalho é realizar uma análise climatológica preliminar da precipitação
sobre a cidade do Rio de Janeiro, utilizando a base de dados da Fundação Instituto de Geotécnica do
Município do Rio de Janeiro (Geo-Rio) para o período de janeiro de 1997 a dezembro de 2005.
Nesse sentido, este trabalho contribui para o entendimento da distribuição da precipitação no
município, que ainda não foi contemplado de forma merecida.
DADOS E METODOLOGIA
Os dados de precipitação utilizados referem-se aos observados na rede pluviométrica instalada
pela Geo-Rio no Município do Rio de Janeiro em setembro de 1996. A rede atual é composta de 32
estações automáticas. Neste trabalho foram utilizados os dados de 30 estações, excluindo-se
Laranjeiras e São Cristóvão que começaram a operar em setembro de 2000. O período analisado
estende-se de janeiro de 1997 à dezembro de 2005, obtendo-se 9 anos para análise. Para cada uma
das estações efetuou-se o total de precipitação em 24 horas considerando o acumulado
originalmente a cada 15 minutos, no intervalo entre as observações de 9h e 15min local do dia
anterior e 9h local do referido dia.
A análise preliminar excluiu os totais pluviométricos mensais das estações meteorológicas em
que o número de falhas nas observações foi superior a 120 horas no mês, o que corresponde a 5 dias
de falhas. Os períodos desconsiderados na análise foram: a) Ano de 1997 – Anchieta, Santa Cruz e
Sepetiba em setembro; Sepetiba em outubro e Guaratiba em novembro; b) Ano de 2000 – Itaúna e
Campo Grande em outubro; Campo Grande em novembro; c) Ano de 2001 – todas as estações em
janeiro e d) Ano de 2005 - Grota Funda, Guaratiba e Riocentro em abril e Campo Grande em maio.
A partir daí foram calculados os totais mensais e anuais e as médias sazonais. As médias
sazonais foram obtidas considerando-se para o verão o trimestre dezembro-janeiro-fevereiro e para
o inverno junho-julho-agosto. Os máximos absolutos em 15 e 30 minutos, 1 hora e 1 dia foram
determinados, selecionando-se o maior valor dentre os 9 anos pesquisados para cada posto
pluviométrico. No caso dos máximos de 30 minutos e 1 hora foram calculados os totais móveis.
Para os máximos em 1 dia foram considerados os maiores valores dentre os previamente
acumulados entre 9:15 de um dia até 9:00 do dia seguinte.
Os eventos extremos de precipitação foram considerados como aqueles em que a
precipitação diária é superior a 30,0 mm em pelo menos um terço das estações, ou seja, em 10
localidades. Este valor foi encontrado pois a aplicação da técnica dos percentis a cada uma das
estações revelou que este valor representa um limite inferior para chuvas intensas na cidade.
RESULTADOS
A Figura 1 apresenta a análise do total pluviométrico anual sobre a cidade do Rio de Janeiro.
Nota-se que os máximos de precipitação localizam-se sobre os três maciços existentes na cidade:
Maciço da Tijuca (Serra da Carioca – 2200 mm), Maciço de Gericinó (Serra do Mendanha – 1400
mm) e Maciço da Pedra Branca (Serra Geral de Guaratiba – 1200 mm). Neste último (Maciço da
Pedra Branca) o núcleo de máxima precipitação pode estar localizado a nordeste e mais intenso do
que apresentado na Figura 1. Tal máximo deveria coincidir com a região mais elevada, e não
necessariamente localizar-se sobre a estação da Grota Funda, que é atualmente o único posto
pluviométrico na área. Nas regiões de planície, a precipitação distribui-se de forma homogênea,
com totais anuais em torno de 1000 mm, atingindo valores inferiores a 1000 mm nas estações de
Bangu, Irajá e Penha. Esta variabilidade espacial da precipitação, com máximos (mínimos) à
barlavento (sotavento) das serras, ocorre provavelmente devido ao levantamento do ar úmido
trazido pela brisa marítima ou por sistemas transientes que se deslocam de sul para norte.
Figura 1 – Totais pluviométricos anuais (a cada 200 mm) sobre a cidade do Rio de Janeiro. A
topografia é apresentada em isolinhas a cada 50 m de altitude.
Durante o verão (figura não mostrada), estação chuvosa, o total pluviométrico médio mensal
atinge 200 mm na Serra da Carioca, 180 mm na Serra do Mendanha e 160 mm na Serra Geral de
Guaratiba e na Ilha do Governador. Nas demais áreas da cidade os valores variam entre 130 e 160
mm. Ressalta-se que na Zona Sul (Urca, Copacabana e São Conrado) os índices pluviométricos
(respectivamente 132, 137 e 134 mm) são ligeiramente inferiores aos observados na Zona Norte
(Tanque, Madureira, Piedade, Cachambi e Grajaú, respectivamente 142, 148, 150, 148 e 145 mm),
o que só ocorre nesta estação do ano. Isto pode estar relacionado ao caráter convectivo da
precipitação na Zona Norte durante o verão, que sofre intensificação pelo maior aquecimento local
nesta estação.
No inverno (figura não mostrada), estação seca, ocorre um máximo de 140 mm na Serra da
Carioca, e outros três máximos de 60 mm na Serra do Mendanha, na Serra Geral de Guaratiba e na
estação Riocentro. Valores inferiores a 50 mm são registrados em toda a Zona Norte e parte da
Zona oeste da cidade, destacando-se o total de precipitação de apenas 29 mm na Penha e Irajá.
Para analisar a distribuição da precipitação ao longo do ano (Figura 2), foram selecionadas
cinco estações pluviométricas (Sumaré, Mendanha, Grota Funda, Santa Cruz e Penha)
representativas, respectivamente das regiões localizadas na Serra da Carioca, Serra do Mendanha,
Serra Geral de Guaratiba, “Baixada” e Zona Norte. Os resultados indicam que de forma geral, ao
longo do ano, a precipitação é maior de novembro a janeiro, decaindo de março até junho, quando
verifica-se um mínimo anual. Um aumento gradual da precipitação incia-se em agosto, atingindo
novamente o máximo em janeiro. A estação do Sumaré destaca-se em relação às demais, com
elevados índices pluviométricos durante todo o ano. Seus totais pluviométricos mensais são
inferiores apenas aos do Itanhangá, em janeiro e do Mendanha e da Tijuca (não mostrado), em
fevereiro. Em setembro por exemplo, a precipitação no Sumaré chega a ser 75% maior do que no
Itanhangá (não mostrado), que é o segundo local mais chuvoso naquele mês, e seis vezes maior do
que na Penha (local menos chuvoso em setembro).
300
precipitação (mm)
250
200
150
100
50
0
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
mês
Sumaré
Santa Cruz
Mendanha
Penha
Grota Funda
Figura 2 – Totais pluviométricos médios mensais (mm) nas estações pluviométricas do Sumaré,
Mendanha, Grota Funda, Santa Cruz e Penha.
Os máximos de 15 e 30 minutos, 1 hora e 1 dia foram avaliados para cada estação
pluviométrica (tabela não mostrada). Destacam-se nesta pesquisa os máximos totalizados em: a) 15
minutos: 51,2 mm no Jardim Botânico no dia 24/01/03 e São Conrado no dia 14/11/04; b) 30
minutos: 69,7 mm em Campo Grande no dia 18/03/00; c) 1 hora: 116,2 mm em Campo Grande no
dia 18/03/00, e d) 1 dia: 272,8 mm na Tijuca no dia 09/01/98.
Uma análise dos eventos extremos de totais pluviométricos diários (valores superiores a 30,0
mm em pelo menos 10 localidades) mostrou que a maior parte dos 139 eventos selecionados, como
esperado, ocorreu durante a estação chuvosa, ou seja, de novembro a março, totalizando 81 casos.
Tais eventos de “verão” estiveram associados à entrada de sistemas frontais (51 casos), atuação da
Zona de Convergência do Atlântico Sul - ZCAS (22 casos), sistemas convectivos de mesoescala (5
casos) e precipitação gerada por efeito de circulação marítima (3 casos). No período seco (junho a
agosto) ocorreram apenas sistemas frontais (18 casos). Nota-se que no verão, apesar do maior
número de sistemas frontais em relação aos demais sistemas, os maiores totais pluviométricos
diários estão associados aos eventos de ZCAS.
A análise dos percentis revelou que na Penha 1% dos totais pluviométricos diários (percentil
99) é superior a 34,7 mm, enquanto no Sumaré este valor alcança 92,3 mm.
CONCLUSÕES E CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho apresentou uma climatologia preliminar da precipitação no município do Rio de
Janeiro, a partir do conjunto de 9 anos de dados coletados em 30 estações pluviométricas da GeoRio, homogeneamente distribuídas pela cidade.
As análises indicaram que ao longo de todo o ano os máximos de precipitação localizam-se
sobre os três maciços existentes na cidade: Maciço da Tijuca (a leste), Maciço de Gericinó (ao
norte) e Maciço da Pedra Branca (a oeste). Tais máximos são observados respectivamente, em
ordem decrescente nas estações do Sumaré, do Mendanha e da Grota Funda. Nas áreas de planície,
a precipitação distribui-se de forma homogênea. A estação do Sumaré se destaca, com valores
elevados durante todo o ano. A região com menores índices pluviométricos localiza-se na Zona
Norte da cidade, exceto no verão quando os valores na Zona Norte são ligeiramente superiores aos
da Zona Sul da cidade. A partir do maior detalhamento espacial do campo de precipitação, foi
possível identificar o máximo sobre o maciço da Pedra Branca, que não havia sido citado nos
trabalhos anteriores, e a correta localização e intensidade dos outros dois máximos pluviométricos
sobre a cidade. A análise dos percentis aplicados a cada estação revelou que na região menos
chuvosa (Penha) 1% dos dados é superior a 34,7 mm, enquanto na região mais chuvosa (Sumaré)
este valor atinge 92,3 mm. Os máximos de 15 e 30 minutos também puderam ser determinados
graças a maior freqüência (totais a cada 15 minutos) dos dados da Geo-Rio, com relação às demais
fontes. Da análise dos eventos extremos ocorridos no período (139 casos), notou-se que a maior
parte ocorreu durante a estação chuvosa (81 casos), sendo que destes, 51 foram provocados pela
passagem de sistemas frontais. No inverno os raros eventos (apenas 18) foram provocados por
sistemas frontais. Em que pese o fato de que este estudo analisou um período de tempo
relativamente pequeno de dados (9 anos), portanto, sendo algo limitado em relação às normais
climatológicas (30 anos), de qualquer maneira pode-se afirmar que esta climatologia preliminar da
precipitação na cidade do Rio de Janeiro é extremamente útil.
AGRADECIMENTOS
As autoras agradecem a Fundação Instituto de Geotécnica do Município do Rio de Janeiro
(Geo-Rio) por disponibilizar todo o conjunto de dados de precipitação em seu sítio
(http://www.georio.gov.br), o que tornou possível a realização deste trabalho.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
FIDERJ, 1978: Indicadores Climatológicos do Estado do Rio de Janeiro. Governadoria do Estado
do Rio de Janeiro, Secretaria de Planejamento e Coordenação Geral (SECPLAN), Fundação
Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social do Rio de Janeiro (FIDERJ). Sistemas de
Informação para o Planejamento Estadual (SIPE), 156 p.
SATYAMURTY, P., C. NOBRE E P. L. SILVA DIAS, 1998: South América. Capítulo 3 C,
Meteorological Monographs, vol. 27, No. 49, pp. 119-139.
SERRA, A. B., 1970: Clima da Guanabara. Boletim Geográfico, no. 214, ano 29, jan/fev 1970,
Fundação Instituto Brasileiro de Geografia (IBGE), 135 p.
SERRA, A. B. e L. RATISBONNA, 1970: Clima do Rio de Janeiro. Ministério da Agricultura.
Serviço de meteorologia, 2ª edição. Boletim Geográfico, no. 214, ano 29, jan/fev 1970, Fundação
Instituto Brasileiro de Geografia (IBGE), 135 p.
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