Identificar e proteger Embora existam informa

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BIOLOGIA MOLECULAR
Identificar e proteger Embora existam informa-
FOTO DE BRUNO DE FRANCO
ções, mesmo imprecisas, quanto ao volume de pesca, dados que identifiquem as espécies capturadas e comercializadas são escassos. Ainda segundo os relatórios de pesca do Ibama, em apenas cerca de 20% do total das capturas de elasmobrânquios no país há alguma menção à
classificação taxonômica e, em geral, os registros usam
com frequência apenas nomes populares. Estes, em diversos casos (cação-viola, tubarão-martelo e outros), são
aplicá­veis a mais de uma espécie. Os outros animais capturados são identificados como tubarões (ou cações) e
raias. Isso torna impossível saber quantos exemplares de
cada es­pé­cie são pescados e avaliar quando uma espécie
atinge seu limite de captura e entra em risco de extinção.
Na contramão dessa tendência à extinção, diversos
grupos de pesquisa, em todo o mundo, têm buscado gerar
informações e desenvolver métodos de controle, proibição
e fiscalização da pesca. Os resultados de tais trabalhos
estão acumulados principalmente em universidades e
institutos de pesquisa e, atualmente, muitas das informações têm sido utilizadas para a formulação de ações
e práticas específicas em defesa desses peixes.
No caso da pesca com a intenção de retirar apenas as
nadadeiras dos peixes, prática deplorável e proibida em
muitos países, inclusive no Brasil, a dificuldade de identificação das espécies é ainda maior, e a fiscalização da
pesca predatória (ou sobrepesca) depende dessa identificação. Uma forma de investigar quais espécies vêm
sendo prejudicadas pelo finning e estimar o número de
animais de cada espécie capturados nessa prática é
identificar os animais por meio de nadadeiras comercializadas ilegalmente e apreendidas por órgãos de
fiscalização. Com esse objetivo, o Ibama colocou à disposição de grupos de pesquisa um lote de cerca de 3,5 toneladas de nadadeiras secas apreendidas. Calcula-se
que cada tonelada de nadadeiras secas corresponde a
cerca de 16 mil animais mortos.
O processo de identificação das amostras já foi iniciado. Com esse objetivo, uma equipe de pesquisadores do
Laboratório de Biologia e Genética de Peixes da Universidade Estadual Paulista (em Botucatu), do Laboratório
de Pesquisa em Elasmobrânquios, também da Unesp
(em São Vicente), do Programa de Pesquisa sobre Tubarões da Universidade da Flórida e do Centro de Ciências
do Mar da Universidade do Algarve (Portugal), vem
utilizando, além de métodos mais tradicionais aplicados à conservação das espécies, técnicas modernas
de biotecnologia, envolvendo genética molecular.
Coordenado por Fausto Foresti, Fernando Mendonça,
Claudio Oliveira, Fabio Porto-Foresti e Otto Gadig, o
grupo da Unesp, que conta com renomados pesquisa­do­
res brasileiros, além de alunos de graduação e pós-graduação, vem utilizando uma metodolo­gia de identifica­ção genética de fácil aplicação e baixo custo para de­
terminar diversas espécies de tubarões e raias pescados
nas costas brasileiras. Sabe-se que as diferenças e simi-
laridades presentes nos seres vivos estão ‘registradas’ em
seu material genético. Assim, foi criado um banco de sequências de DNA de elasmobrânquios que habitam a
costa brasileira. No método empregado, conhecido co­mo PCR-multiplex, utiliza-se como ponto de partida as
características genéticas exclusivas de cada espécie.
Foram desenvolvidos iniciadores (primers) da reação
em cadeia da polimerase (PCR, na sigla em inglês) para
cada espécie – os primers reconhecem as sequências diferentes de cada uma delas. Essas sequências localizam-se em um gene (denominado citocromo oxidase I)
extremamente conservado entre as espécies, o que
permite sua aplicação mesmo em populações com alta
variabilidade genética. Após a PCR é efetuada a eletroforese, técnica na qual os fragmentos do gene se movem, em um gel, sob a aplicação de eletricidade, e a distância que percorrem depende de seu tamanho, o que
permite a comparação com o banco de dados genético e
a identificação simultânea de várias espécies.
Primeiros resultados
No Brasil, o comércio de
nadadeiras de tubarões é regulamentado, sendo o tubarão-azul (Prionace glauca) a espécie mais explorada em
todo o mundo para essa finalidade. Os pescadores devem
cumprir rigorosos protocolos para comercializar nadadeiras, incluindo a declaração de todas as espécies
capturadas. Recentemente, uma inspeção de rotina do
Ibama apreendeu, nas cidades de Belém e Bragança,
no Pará, lotes contendo cerca de 8 toneladas de nadadeiras de tubarão, que seriam comercializados na China.
Para avaliar a precisão das declarações contidas nos
mapas de bordo, amostras de tecido foram enviadas para
o Laboratório de Biologia e Genética de Peixes da Unesp
para identificação das espécies. Embora tenha sido declarado que todas as barbatanas apreendidas eram de
tubarão-azul, apenas 149 das amostras (64%) foram identificadas como pertencentes a essa espécie. Das amostras
restantes, 33 (14%) pertenciam à espécie Alopias super­
ciliosus, 26 (11%) a Isurus oxyhrinchus e 21 (9%) a Sphyr­
na lewini. Outras cinco amostras (2%) não foram iden­
tificadas. Esse trabalho comprovou a fraude praticada por
uma empresa na exportação de barbatanas de tubarão.
A lei exige 100% de precisão para evitar pôr em risco
espécies ameaçadas de extinção, mas, nas análises, 36%
das amostras não corresponderam à espécie declarada,
o que constitui crime ambiental.
Em outra avaliação da pesca de elasmobrânquios entre o Rio Grande do Sul e a Bahia, com amostras recolhidas no comércio e usando a metodologia de PCR-multiplex, revelou que a espécie Rhinobatos horkelli,
conhecida popularmente como cação-viola ou raia-viola,
continua a ser capturada indiscriminadamente em toda
a área de ocorrência, embora sua pesca esteja proibida,
pelo Ibama, por se tratar de uma das espécies de vertebrados mais ameaçadas do Brasil. A captura desse pei-
288 | DEZEMBRO 2011 | CIÊNCIAHOJE | 51
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