aprendizagem: muito para além da compreensão do cérebro

Propaganda
��������
Event Report
����������
��������
�
�����
��������
�
APRENDIZAGEM:
MUITO PARA ALÉM
DA COMPREENSÃO
DO CÉREBRO
O VII Seminário da Sociedade de Pediatria do
Neurodesenvolvimento, decorrido em finais de
Janeiro, no Porto, acolheu uma sessão sobre
«Desenvolvimento e aprendizagem: investigação
neurofuncional». Dois palestrantes discutiram
aspectos como a linguagem e a memória na
aprendizagem, assim como a atenção/percepção
visual e a motivação. Estes são, de resto,
conceitos que ajudam a compreender melhor as
perturbações do Neurodesenvolvimento.
4
Enunciar um verbo, proferir uma palavra ou até
visualizá-la são procedimentos simples, que activam áreas específicas do cérebro – e que têm
sido estudadas, de forma exaustiva, com recurso
às técnicas de imagiologia. No entanto, há ainda muito por descobrir. Na sua conferência, o
Prof. Doutor Alexandre Castro-Caldas, docente
da Universidade Católica Portuguesa (UCP), explicou que «o cérebro é um órgão que se adapta
��������
����������
��������
Event Report
�
�����
��������
às solicitações, dentro dos
limites das suas com�
petências, tendo influências do contexto, dos aspectos biológicos e do comportamento. Trata-se
de uma complexidade de fenómenos em que a
variação não genética, por exemplo, está longe
de ser compreendida».
são essenciais, na medida em que permitem a
aprendizagem da linguagem. Nas crianças com
autismo, por exemplo, não há neurónios em espelho. Esta é uma das explicações para que as
crianças afectadas não desenvolvam algumas das
competências necessárias».
Nas crianças, à medida que a idade vai avançando, «a memória episódica é a que aparece mais
tardiamente. A criança tende a reter mais facilmente as palavras finais, assim como as rimas.
Em todo o caso, todos estes processos – desde
a memória sensorial até à memória episódica
– ocorrem de forma natural, variando de criança
para criança», frisou o especialista.
Percepção visual
e motivação
O orador relembrou também que «a assimetria
hemisférica é algo que se desenvolve com a
idade. Recorrendo às técnicas de imagiologia, e
sobrepondo o hemisfério direito ao hemisfério
esquerdo, pode-se constatar que essa assimetria
tende a transformar-se ao longo das várias etapas
da vida. Não se sabe, porém, quais as influências
da assimetria hemisférica».
«Os neurónios em
espelho permitem
a aprendizagem
da linguagem. Nas
crianças com autismo,
não há neurónios em
espelho. Daí que não
desenvolvam algumas
das competências
necessárias.»
Coube ao Prof. Doutor Miguel Castelo-Branco,
investigador do Instituto Biomédico de Investigação da Luz e Imagem (IBILI), da Universidade
de Coimbra, tecer algumas considerações sobre a
atenção/percepção visual e motivação na aprendizagem.
O orador começou por explicar que «a motivação
e as emoções andam de mãos dadas. São elas que
nos dirigem para as acções. Não podemos ignorar que a motivação depende de causas primárias
(elementares para a sobrevivência) e secundárias
(das quais fazem parte conceitos e factores culturais como a liberdade, amizade, honra, riqueza…). A emoção resulta, assim, da integração
destes componentes fisiológicos, comportamentais e cognitivos» – originando, consequentemente, o comportamento motivado.
que a aprendizagem está ligada ao desenvolvimento. Na Pediatria do Neurodesenvolvimento,
importa saber os timings e a intensidade adequados à aprendizagem. A investigação clínica
aplicada pode encontrar respostas que ajudem
a definir melhor como e quando actuar, perante
determinadas perturbações», sublinhou o especialista.
«a motivação e as
emoções andam de mãos
dadas. São elas que nos
dirigem para as acções.
Não podemos ignorar
que a motivação depende
de causas primárias
(elementares para
a sobrevivência) e
secundárias (das quais
fazem parte conceitos e
factores culturais como
a liberdade, amizade,
honra, riqueza…).»
A aprendizagem implica a atenção focada e a
percepção periférica. «Temos também de pensar
Alguns linguistas chegaram a considerar que
poderia existir um órgão exclusivo da linguagem. Contudo, actualmente, sabe-se que o que
existe é «uma matriz de sucessão, envolvendo
áreas associativas mais complexas. Além disso, aspectos tão variados como a visão, a audição e a motilidade exercem uma forte influência sobre a linguagem», explicou o docente da
UCP.
Na sua palestra, Alexandre Castro-Caldas acrescentou ainda que «a imitação é um processo fundamental. Os designados neurónios em espelho
5
��������
����������
��������
Event Report
«Terão de se unir
sinergias entre a ciência
básica e a prática
clínica. Só juntando
médicos, técnicos da área
do Neurodesenvolvimento
e investigadores será
possível alcançar
resultados.»
�
Nesta palestra, ficou assente que «vemos muito menos do que aquilo que verdadeiramente
pensamos que vemos. O mundo visual parece
íntegro e uno, mas isso é uma ilusão». E mesmo os comportamentos mais simples envolvem
mecanismos bastante complexos. Um exemplo:
«se rodarmos uma máscara de uma face colocada fora de contexto, diante dos nossos olhos, o
cérebro não aceitará ver o rosto de forma côncava, pois na natureza só existem faces convexas»,
elucidou Miguel Castelo-Branco.
Para o investigador, o futuro não passa tanto
pelo estudo e compreensão da localização das
áreas cerebrais, mas antes pela forma como elas
se conectam (conceito de conectividade funcional). «Será que conseguiremos fazer com que as
pessoas aumentem o seu desempenho cognitivo?
É possível manipular a actividade de determinadas áreas cerebrais? Como é que a imaginação,
�����
��������
por si só, pode intervir a nível de gerar sinais de
�
feedback fisiológico? Através da conectividade
funcional será possível responder a estas e outras
questões», concluiu o palestrante.
«vemos muito menos
do que aquilo que
verdadeiramente
pensamos que vemos.
O mundo visual parece
íntegro e uno, mas isso
é uma ilusão.»
Ciência básica e prática clínica:
uma ligação útil e desejada
Prof.ª Doutora Guiomar Oliveira
Presidente da SPND
Com a realização do VII Seminário
da Sociedade de Pediatria do
Neurodesenvolvimento (SPND),
pretendeu--se aliar a ciência básica
(i.e., a investigação funcional das
neurociências para perceber a
ocorrência de determinados défices)
à prática clínica.
As intenções deste encontro
6
passaram, por isso, pela actualização
de conhecimentos, colocando
os participantes a par do que de
melhor se faz não só em termos de
investigação científica, mas também
assistenciais. Daí que este Seminário
se tenha centrado em questões
fulcrais como «Desenvolvimento
e Aprendizagem: investigação
neurofuncional» e «Investigação
neugenética»; e «Compreender para
intervir».
Hoje, já se conhecem alterações
genéticas que estão na base
de determinadas síndromes.
A Neuroimagem funcional e a vertente
neurofisiológica desempenham
igualmente um papel fundamental em
prol da compreensão das perturbações
do Neurodesenvolvimento, ajudando a
identificar, com maior precisão, as vias
cerebrais lesadas. A pouco e pouco,
os neurocientistas têm desbravado
novos caminhos, rumo à invenção de
testes inovadores e de metodologias
da reabilitação específicas. Ainda não
estamos lá, é certo, mas nunca como
agora estivemos tão perto de atingir
esses objectivos.
Para se alcançarem verdadeiramente
estas metas, terão de se unir
sinergias entre a ciência básica e
a prática clínica. Só juntando os
médicos, os outros técnicos da
área do Neurodesenvolvimento e
os investigadores será possível
ultrapassar barreiras e alcançar
resultados. Os vários painéis que
integraram o VII Seminário da SPND
demonstraram, aliás, que os hospitais
e os centros clínicos devem estar,
cada vez mais, ligados às instituições
científicas.
Défice cognitivo, autismo e défice de
atenção e hiperactividade são áreas
em que já há resultados palpáveis
– e que ilustram bem os benefícios
de juntarmos as ciências básicas à
prática clínica. A causa genética e os
mecanismos destas perturbações
são conhecidos. A intervenção mais
adequada será o caminho a seguir.
Download