Obesidade, o mal do século também para a oncologia

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1
04/11/14
06:38
www.revistaonco.com.br
novembro/dezembro 2014
Ano 5 • n º 26
Oncologia para todas as especialidades
Entrevista
Especialista em mieloma múltiplo,
Angelo Maiolino defende a busca
por uma solução econômica
que garanta o acesso
a medicamentos de ponta
Políticas Públicas
Entidades ligadas ao câncer
se unem por uma agenda
única para pressionar por mudanças
Cuidados Paliativos
A eficácia das abordagens precoces
Obesidade, o mal do século
também para a oncologia
do bem | campanhas | transplante medula óssea
p03 sumario:Onco& 04/11/14 08:43 Page 3
sumário
entrevista
6
capa
16
Estudos avançam na conexão entre a obesidade e o risco de câncer
transplante
medula óssea
21
A revolução dos procedimentos com doadores 50% compatíveis
Jairo J.N. Sobrinho
cuidados paliativos
28
Abordagens precoces minimizam sofrimento físico e emocional
Sandra Caíres Serrano
políticas públicas
34
Iniciativa inédita no Brasil reúne entidades para montar uma pauta única
de reivindicações ao poder público
do bem
39
Apoio psicológico a paciente com câncer para melhorar a adesão ao tratamento
e ajudar nos mecanismos de enfrentamento da doença
curtas
42
Novidades sobre pesquisas, parcerias e eventos: um giro pelo mundo
da oncologia
curtas esmo
44
Os principais destaques do Congresso da sociedade europeia de oncologia
campanhas
46
Fique por dentro das ações sobre câncer que ganharam destaque na mídia e nas
redes sociais
mundo virtual
48
Aplicativos para tablets e smartphones que ajudam médicos a se manter sempre
atualizados para o diagnóstico e tratamento de seus pacientes
acontece
49
Fique por dentro dos congressos, simpósios, encontros de atualização e outros
tantos eventos da área
calendário
50
Programe-se: eventos e congressos que estão por vir
Angelo Maiolino fala sobre novos fármacos, terapias combinadas e pede mais
transparências na avaliação de novas drogas no Brasil
04-conselho_REV:Onco& 04/11/14 06:41 Page 4
Conselho
editorial
Editor clínico:
Sergio D. Simon
I – Cancerologia clínica
II – Cancerologia cirúrgica
IV – Patologia
Oncologia clínica:
Abdômen:
André Moraes (SP)
Anelise Coutinho (BA)
Artur Katz (SP)
Auro Del Giglio (SP)
Carlos Sampaio (BA)
Clarissa Mathias (BA)
Claudio Petrilli (SP)
Daniel Herchenhorn (RJ)
Fernando Maluf (SP)
Fernando Medina (SP)
Igor Morbeck (DF)
Jacques Tabacof (SP)
João Nunes (SP)
José Bines (RJ)
Karla Emerenciano (RN)
Marcelo Aisen (SP)
Marcelo Collaço Paulo (SC)
Maria de Fátima Dias Gaui (RJ)
Mario Luiz Silva Barbosa (SP)
Nise Yamaguchi (SP)
Oren Smaletz (SP)
Paulo Marcelo Gehm Hoff (SP)
Roberto Gil (RJ)
Sebastião Cabral Filho (MG)
Sérgio Azevedo (RS)
Sergio Lago (RS)
Ademar Lopes (SP)
José Jukemura (SP)
Laercio Gomes Lourenço (SP)
Marcos Moraes (RJ)
Paulo Herman (SP)
Carlos Bacchi (SP)
Felipe Geyer (SP)
Fernando Soares (SP)
Onco-hematologia:
Carlos Chiattone (SP)
Carmino de Souza (SP)
Daniel Tabak (RJ)
Jane Dobbin (RJ)
Nelson Spector (RJ)
Vânia Hungria (SP)
Transplante de medula:
Jairo Sobrinho (SP)
Luis Fernando Bouzas (RJ)
Nelson Hamerschlak (SP)
Yana Novis (SP)
Ginecologia:
Jorge Saad Souen (SP)
Sérgio Mancini Nicolau (SP)
Sophie Derchain (SP)
Mama:
Alfredo Barros (SP)
Antonio Frasson (SP)
Carlos Alberto Ruiz (SP)
Maira Caleffi (RS)
Ruffo de Freitas (GO)
Neurologia:
Manoel Jacobsen Teixeira (SP)
Marcos Stavale (SP)
V – Cuidados paliativos e dor
Ana Claudia Arantes (SP)
Fabíola Minson (SP)
João Marcos Rizzo (RS)
Ricardo Caponero (SP)
VI – Pesquisa
Carlos Barrios (RS)
Conceição Accetturi (SP)
Everardo D. Saad (SP)
Greyce Lousana (SP)
Gustavo Werutzky (RS)
VII – Radiologia e
diagnóstico por imagem
Jairo Wagner (SP)
Cabeça e pescoço:
VIII – Radioterapia
Luis Paulo Kowalski (SP)
Vergilius Araújo (SP)
João Victor Salvajoli (SP)
Ludmila Siqueira (MG)
Paulo Novaes (SP)
Robson Ferrigno (SP)
Rodrigo Hanriot (SP)
Wladimir Nadalin (SP)
Tecido osteoconjuntivo:
Olavo Pires de Camargo (SP)
Reynaldo J. Garcia Filho (SP)
Tórax:
Angelo Fernandez (SP)
Riad Naim Younes (SP)
IX – Especialidades médicas
Urologia:
Cardiologia:
Antônio Carlos L. Pompeu (SP)
Miguel Srougi (SP)
Roberto Kalil Filho (SP)
III – Biologia molecular
Mario Luiz Silva Barbosa (SP)
Ada Alves (RJ)
André Vettore (SP)
Carlos Gil (RJ)
Helenice Gobbi (MG)
José Cláudio Casali (RJ)
Luísa Lina Villa (SP)
Maria Isabel Achatz (SP)
Gastroenterologia:
Clínica médica:
Carlos de Barros Mott (SP)
Geriatria:
Wilson Jacob Filho (SP)
Pneumologia:
Carlos Roberto de Carvalho (SP)
Ano 5 • número 26
novembro/dezembro 2014
Publisher Simone Simon
[email protected]
Editorial Jiane Carvalho
[email protected]
Subeditor Gabriel Ferreira
[email protected]
Direção de arte/Prepress Ione Franco
[email protected]
Consultora médica Cristiane Benvenuto Andrade
Revisão Patrícia Villas Bôas Cueva
4
novembro/dezembro 2014 Onco&
Impressão: Ipsis Gráfica
Tiragem: 10 mil exemplares
ISSN: 2179-0930
Jornalista responsável: Jiane Carvalho
(MTb 23.428/SP)
Colaboraram nesta edição: Angelo Maiolino,
Antonio Carlos Buzaid, Carlos Henrique E. Barrios,
Frederico Perego Costa, Jairo J.N. Sobrinho,
Lourdes Rodrigues, Regiane de Oliveira,
Sandra Caíres Serrano, Viviane Gomes
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A revista Onco& – Oncologia para todas as especialidades,
uma publicação da Iaso Editora, especializada em comunicação médica, traz informações sobre oncologia a
profissionais de todas as especialidades médicas. De circulação bimestral, tem distribuição nacional e gratuita
por todo o território nacional. A reprodução do conteúdo
da revista é permitida desde que citada a fonte. A opinião
dos colaboradores não reflete necessariamente a posição
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(11) 2478-6985 (redação) – (21) 3798-1437 (comercial)
05 editorial:Onco& 04/11/14 06:42 Page 5
Obesidade, preocupação
crescente entre os oncologistas
A
ASSOCIAÇÃO ENTRE OBESIDADE E INCIDÊNCIA DE
ALGUNS TIPOS DE CÂNCER VEM GANHANDO ES-
PAÇO NOS FÓRUNS INTERNACIONAIS DE ONCOLOgia com estudos comprovando o maior risco de
obesos desenvolverem neoplasias. A Onco& dedica
a reportagem de capa desta edição – a última de
2014 – a traçar um panorama geral sobre o tema.
A repórter Lourdes Rodrigues apresenta estudos
internacionais que revelam evidências amplas de
que o excesso de gordura corporal, e o consequente
aumento nos níveis de hormônios circulantes, eleva
o risco de desenvolvimento de cânceres como fígado, vesícula e útero. Um alerta não só para os oncologistas, mas também para os que não atuam na
área, fundamentais na prevenção da obesidade e
responsáveis muitas vezes pelo primeiro diagnóstico da doença.
Também nesta reportagem, Merula Steagall,
presidente da Associação Brasileira de Linfoma e
Leucemia (Abrale), conta sobre a tentativa de unir
entidades diferentes para que debatam e apresentem, de forma conjunta, os pleitos para melhorar
diagnóstico e tratamento do câncer no Brasil. O
evento Todos Juntos Contra o Câncer, em que foram
discutidas propostas amplas o acesso a novas terapias e a utilização de incentivos fiscais na área de
saúde, conseguiu reunir 107 entidades sinalizando
o apoio geral à proposta de união de esforços.
Na entrevista desta edição, o especialista em
mieloma múltiplo Angelo Maiolino, diretor da
Associação Brasileira de Hematologia, Hemoterapia
e Terapia Celular (ABHH), reclama da falta de
transparência nas decisões da Anvisa e propõe a
busca por uma solução alternativa que garanta o
acesso dos brasileiros aos tratamentos de ponta
sem onerar excessivamente o Sistema Único de
Saúde (SUS). Sobre a pesquisa clínica no Brasil,
Maiolino não economiza palavras: “A situação do
Brasil é humilhante”.
Com o tema “Medicina personalizada no tratamento de câncer”, a reunião anual da Sociedade
Europeia de Oncologia Médica (ESMO), realizada
em Madri, foi marcada pela divulgação de uma série
de estudos oncológicos com elevado potencial de
impacto na forma como os pacientes são tratados.
Os pontos mais relevantes de alguns desses
estudos, como o CLEOPATRA, voltado para o câncer de mama, você encontra também nesta edição
da Onco&.
Boa leitura!
Simone Simon
Publisher
Contato: [email protected]
Onco&novembro/dezembro
setembro/outubro 2012
Onco&
2014
55
06, 08,10e11 entrevista MAIOLINO:Onco& 04/11/14 08:47 Page 6
entrevista
Solução para acesso a
remédios de ponta
precisa ser debatida
O onco-hematologista Angelo Maiolino, apontado com uma das
referências em mieloma múltiplo, fala sobre novos fármacos,
terapias combinadas e pede mais transparência na avaliação de
novas drogas no Brasil
Por Jiane Carvalho
A
PONTADO COMO UMA DAS PRINCIPAIS REFERÊNCIAS
Divulgação
EM ONCO-HEMATOLOGIA DO PAÍS, O ESPECIALISTA
Angelo Maiolino
* Professor da Universidade Federal
do Rio de Janeiro (UFRJ) e diretor
da Associação Brasileira de
Hematologia, Hemoterapia e
Terapia Celular (ABHH)
Contato:
[email protected]
6
novembro/dezembro 2014 Onco&
EM MIELOMA MÚLTIPLO ANGELO MAIOLINO PAUTA
seu discurso pela sobriedade. Otimista em relação
aos avanços nas diferentes formas de abordagem da
doença, é crítico em relação às tentativas de melhorar a transparência no relacionamento entre a Anvisa
e a classe médica. Professor da Universidade Federal
do Rio de Janeiro (UFRJ) e diretor da Associação
Brasileira de Hematologia, Hemoterapia e Terapia
Celular (ABHH), Maiolino considera a lentidão da
Anvisa como um entrave aos avanços terapêuticos
no país, mas reconhece que o escopo de atuação do
órgão é excessivamente amplo. “A Anvisa analisa de
remédios para tratamento oncológico a xampu para
cabelo, o que não é razoável.” Maiolino, que também é coordenador do Programa de Transplante de
Medula do Hospital Universitário Clementino Fraga
Filho, da UFRJ, defende a busca por maior transparência na atuação do órgão e por um modelo que
garanta acesso aos novos fármacos, lembrando experiências exitosas no Canadá e na Inglaterra.
Com uma carreira totalmente dedicada à oncohematologia, o professor começou na área enquanto
ainda fazia residência e participou de um programa
voltado para transplante de medula óssea. “Logo me
interessei pelo tema e não parei mais, fiquei um
tempo voltado apenas para transplante, quando ajudei a implantar o programa de transplante no Hospital do Fundão, mas depois voltei o foco para o
mieloma”, lembra o professor Maiolino.
O mieloma múltiplo é um tipo de câncer de
sangue que pode ser assintomático, o que retarda
em muito o diagnóstico, ou sintomático, marcado
por anemia, fraqueza e dor nos ossos. “Temos avançado nesse item, mas ainda considero demorado o
diagnóstico”, comenta o professor, lembrando que
a doença é o segundo tipo de câncer hematológico
mais frequente e acomete cada vez mais pacientes
entre 40 e 50 anos.
Otimista, Maiolino põe em primeiro plano os
avanços terapêuticos para tratamento da doença
que vêm elevando a sobrevida dos pacientes, destacando a associação do bortozomibe – fornecido
pelos planos de saúde, mas com distribuição irregular pelo SUS – com a lenalidomida – um imunomodulador que não provoca efeitos indesejáveis
como neuropatias, ao contrário da talidomida. Disponível em 80 países, a lenalidomida foi reprovada
pela Anvisa, decisão muito criticada pelo médico.
“Não tem nenhum sentido esta decisão, a falta de
transparência é grande nos processos de avaliação”,
06, 08,10e11 entrevista MAIOLINO:Onco& 04/11/14 08:47 Page 8
diz o médico, lembrando que há dezenas de pacientes que já usam a lenalidomida com base em
decisões judiciais.
Nesta entrevista concedida à revista Onco&,
Angelo Maiolino traça um panorama dos avanços
no tratamento do mieloma múltiplo, reclama da
falta de isonomia dentro da própria rede que atende
pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e destaca avanços importantes na farmacologia e no diagnóstico
dos diferentes tipos de câncer do sangue.
Onco& – Como o senhor avalia a situação atual
Para o tratamento
da leucemia linfoide
crônica (LLC) e
do mieloma, 90%
dos medicamentos
citados lá fora como
novas referências,
e já em estágio fase
III de aprovação,
não estão nem
sendo cogitados
ou analisados
aqui no país
das doenças onco-hematológicas no Brasil?
Angelo Maiolino – Na parte de diagnóstico a situação chega a ser satisfatória, não é o ideal, mas
evoluiu muito nos últimos anos. O Brasil tem conseguido acompanhar os programas de diagnóstico,
incluindo os avanços sobre a patologia em termos
moleculares. É inegável que há algum atraso, mas
ele hoje é pequeno.
Onco& – A queixa da classe médica em relação
à lentidão da Anvisa é frequente. Por que isso
ocorre? Qual a causa de tanta burocracia?
Angelo Maiolino – Antes de mais nada, é preciso
reconhecer um fato. O escopo de atuação da Anvisa
é muito amplo, eles analisam de remédios para tratamento oncológico a xampu para cabelo, o que
não é razoável. Recentemente, a Agência Nacional
de Saúde Suplementar (ANS) aprovou o uso de
drogas orais, após muita pressão, o que é um
avanço. E todos sabemos que na avaliação dos
novos fármacos também entra o custo do medicamento, que terá de ser incorporado pelo Sistema
Único de Saúde (SUS). Mas para negar a incorporação de um novo remédio, a Anvisa alega de tudo,
dificulta o processo de todas as formas. Há uma
total ausência de transparência na forma de atuação
da Anvisa, eles nunca dizem claramente o porquê
das decisões.
Onco& – Há espaço para o diálogo entre a classe
Onco& – A informação, pelo que o senhor está
descrevendo, chega até a rede de atendimento
do país, mas e o acesso aos tratamentos?
Angelo Maiolino – O brasileiro portador de alguma neoplasia tem sim acesso às novas terapias
que foram surgindo, mas precisamos frisar que no
país nada é homogêneo. Nos laboratórios privados,
por exemplo, a situação é bem mais avançada. Em
alguns casos, quando não se tem conhecimento técnico aqui, o material é enviado ao exterior para análise. Os procedimentos disponíveis são amplos e
rápidos, mas não estão igualmente distribuídos
pelo país. Se falarmos apenas dos cânceres do sangue, também há acesso aos novos tratamentos, mas
eu diria que a situação é um pouco mais desigual.
médica e a Anvisa e ambiente para mudanças
que atendam melhor às expectativas?
Angelo Maiolino – Eles dizem o tempo todo que
vão rever os processos. Mostram-se interessados em
dialogar com a classe médica, com as entidades,
mas essa disposição não avança, nada acontece na
prática. A última sinalização positiva da Anvisa para
mudar seus procedimentos ficou só no discurso.
Chegaram a dizer que, quando o FDA nos Estados
Unidos aprovasse, o trâmite de um remédio aqui
seria mais rápido, mas ficou só na retórica. Até mudança de bula, uma simples atualização, é lenta. O
laboratório pede a mudança e, enquanto a Anvisa
não autoriza, a bula já fica defasada.
Onco& – Quais as consequências dessa demora
Onco& – No que a situação é mais desigual?
Angelo Maiolino – Por exemplo, na incorporação
de fármacos recém-desenvolvidos, que é muito
lenta. Não temos a velocidade necessária para acompanhar os padrões terapêuticos. A Anvisa é muito
lenta e burocrática, mas o pior de tudo é a falta de
transparência no processo de avaliação e de aprovação dos novos fármacos, o que prejudica muito os
pacientes que necessitam de determinado remédio.
8
novembro/dezembro 2014 Onco&
na incorporação de novos fármacos para o trabalho do oncologista?
Angelo Maiolino – São inúmeras as conseqüências, tanto para os oncologistas, que ficam com
menos possibilidades de abordagem da doença,
quanto para os seus pacientes, que muitas vezes
têm de recorrer à Justiça. Por exemplo, para o tratamento da leucemia linfoide crônica (LLC) e do
mieloma, 90% dos medicamentos citados lá fora
06, 08,10e11 entrevista MAIOLINO:Onco& 04/11/14 08:47 Page 10
como novas referências, e já em estágio fase III de aprovação, não estão
nem sendo cogitados ou analisados aqui no país. De tudo que eu vi
de novo no principal congresso mundial de hematologia, o American
Society of Hematology (ASH), não temos nada disponível aqui ainda.
O efeito disso é a judicialização do tratamento, com inúmeros pacientes tendo de recorrer ao Judiciário para ter acesso às novidades. A discussão sobre o custo dos novos fármacos não é só nossa. Países como
Inglaterra e Canadá acharam uma solução intermediária, que passa
por regras e procedimentos bastante transparentes.
Onco& – Em termos de fármacos, o que temos de novidade para
o tratamento onco-hematológico já disponível no país?
Angelo Maiolino – Acho que o mais importante a citar é um fármaco
para o linfoma Hodgkin, o Brentuximab Vedotin, que foi aprovado recentemente pela Anvisa. Foi a surpresa positiva em meio a muitas reprovações. Foi um caso raro de surpresa. Hoje, temos mais ou menos
20% dos pacientes com a doença Hodgkin que não respondem à quimioterapia. O remédio é indicado especificamente para esses pacientes
que não responderam à quimioterapia.
Onco& – Quais são as doenças onco-hematológicas de maior in-
Onco& – A Anvisa ficou anos analisando a aprovação da lenalidomida e, no final, acabou negando o registro. Como o senhor
avalia essa decisão?
Angelo Maiolino – Este é de fato o caso mais emblemático recente
envolvendo uma negação da Anvisa. Eles consideraram insuficientes
os estudos disponíveis sobre a eficácia da droga. Ela já é aprovada nos
Estados Unidos e na Europa, em mais de 80 países, mas a Anvisa considera mesmo assim que faltam dados. Sempre se pode pedir reavaliação, mas são mais alguns anos esperando uma decisão.
cidência no Brasil?
Angelo Maiolino – Em linhas gerais, é difícil saber qual a de maior
incidência, porque há mais de dez tipos de leucemia, 40 subtipos de
linfoma. E o próprio mieloma múltiplo, que não é tão raro quanto
muitos pensam, não deixa de ser um tipo de linfoma. O mais importante a frisar é que a incidência dos problemas oncológicos, incluindo
os do sangue, está aumentando muito, e vai aumentar mais ainda. Primeiro porque o diagnóstico melhorou e porque o envelhecimento da
população é acelerado. O câncer vai ultrapassar as doenças cardiovasculartes como causa de morte em breve. Além disso, o câncer, devido
aos tratamentos mais eficientes, em muitos casos está se tornando uma
doença crônica. O mieloma, por exemplo, tinha uma sobrevida de três
anos, hoje já chega a sete anos e, em breve, conseguiremos prolongar
a vida do paciente, na média, para até dez anos. Aí será um novo impasse para o financiamento dos tratamentos.
Onco& – Entre as doenças onco-hematológicas, quais apresentaram mais avanços no tratamento?
Angelo Maiolino – Os avanços mais recentes, tanto em diagnóstico
quanto em tratamento, foram registrados na leucemia linfoide crônica
(LLC) e nos mielomas, com o surgimento de cinco ou seis fármacos
que auxiliam no tratamento dos pacientes. Já para a leucemia mieloide aguda (LMA) o tratamento hoje é praticamente o mesmo que
fazíamos há 40 anos.
Onco& – Por que, no caso da LMA, os avanços são tão lentos?
Angelo Maiolino – É uma característica da própria doença, faltam
alvos moleculares específicos para serem estudados e combatidos pelos
remédios. Já a leucemia mieloide crônica (LMC) tem um alvo molecular específico, o que torna muito mais fáceis as pesquisas e o desenvolvimento de drogas terapêuticas. Hoje, a LMC é curável. Quando
não temos um alvo molecular específico, é necessário utilizar terapias
combinadas, normalmente quimioterapia mais transplante autólogo
ou de medula.
10
novembro/dezembro 2014 Onco&
Onco& – E qual a solução para os pacientes que precisam da
lenalidomida?
Angelo Maiolino – A solução é, de novo, via judicial. Temos hoje
200 pacientes com mieloma tratando com lenalidomida por meio de
liminares judiciais. Mas isso não tira o atraso na velocidade com que
os pacientes no Brasil têm acesso aos novos fármacos. Nos EUA, por
exemplo, já existem outros remédios para mieloma, como o pomalidomide. E não há hoje nem chances de o fármaco vir para o Brasil e
ser aprovado.
Onco& – No caso da lenalidomida, quais as vantagens para
o paciente?
Angelo Maiolino – A lenalidomida aumenta em muito a sobrevida
do paciente. Há vários estudos comprovando isso. O mais interessante
é que a solicitação para registro no Brasil nem visava seu uso em primeira linha, para início de tratamento, mas só em segunda linha,
quando já houve a recidiva da doença. E mesmo assim foi negado.
Nós sabemos que o custo do remédio é maior que outras drogas, mas
isso é muito relativo, é uma discussão sem fim.
Onco& – Relativo em que sentido?
Angelo Maiolino – Uns vão dizer que a indústria investe, demora
anos pesquisando e, portanto, não é tão caro. Outros já veem exagero
no valor cobrado pela indústria, mesmo com todo o investimento,
risco e tempo para desenvolver a droga. De fato, os testes incluem vá-
06, 08,10e11 entrevista MAIOLINO:Onco& 04/11/14 08:47 Page 11
rias moléculas e por longos períodos. O que importa para um oncologista e seu paciente é buscar
formas de acesso ao remédio.
Onco& – Que tipo de solução, do ponto de vista
econômico, poderia ser encontrada?
Angelo Maiolino – Solução existe, sim. É preciso
disposição para achar um modelo. Na Inglaterra e
no Canadá há diretrizes voltadas para garantir o
acesso a medicamentos de ponta inclusive no sistema público. Há um modelo de coparticipação em
que o paciente que pode arca com uma parte do
custo. No Brasil, nem dentro do próprio SUS tem
equidade. Uns hospitais têm determinado medicamento, atendendo pelo SUS, e outros na mesma
condição não têm acesso. O nosso hospital (Hospital Universitário Clementino Fraga Filho), como
não tem verba direta do Ministério da Saúde, não
tem alguns remédios que outros oncocentros do
Rio, que dispõem de verbas específicas vindas da
pasta, conseguem comprar. São modelos diferentes
de financiamento, não há equidade.
Onco& – Quais são hoje os índices de incidência
do mieloma por faixa etária? Ainda é uma
doença mais comum nos idosos?
Angelo Maiolino – No mieloma múltiplo a maior
incidência, cerca de 80%, é em pacientes com mais
de 60 anos, mas tem muita gente com a doença na
faixa de 40 a 50 anos. O motivo é que o diagnóstico
está sendo feito mais precocemente. Mas, apesar da
melhora, ainda acho tardio o diagnóstico, tem de
avançar mais. É o segundo tipo de câncer hematológico mais frequente. Muitos pacientes chegam ao
hospital já com a doença avançada. Basicamente
tratamos com medicamentos e transplante autólogo
de medula. Os fármacos mais comuns são talidomida, distribuída pela estrutura pública, e bortezomib, que é um produto mais novo, mas por
enquanto só os convênios fornecem, então não é
acessível a todos. É mais um remédio que aguarda
a inclusão no SUS.
Onco& – No geral, o que temos disponível no
país hoje para tratamento dos pacientes com
mieloma é adequado?
Angelo Maiolino – Os tratamentos de primeira
linha vão bem. Quando a doença volta é que é mais
difícil tratar, e nesses casos eu posso dizer que faltam, sim, opções medicamentosas. Nos tratamentos
de terceira linha a situação é pior ainda. Nós só fazemos transplante autólogo, que ajuda muito no
tratamento, para pacientes em bom estado de saúde
e até 70 anos. A técnica para o transplante não
mudou muito nos últimos anos, mas a melhora nos
resultados se deve ao suporte, que avançou bem,
com antibióticos mais eficazes que ajudam no sucesso do transplante autólogo. Hoje, a taxa de insucesso é baixa, de 1% dos pacientes.
Onco& – Em relação às taxas de sobrevida dos
pacientes, há avanços?
Angelo Maiolino – Não é uma doença simples,
mas temos melhorado, sim. A taxa de sobrevida
está evoluindo bem, saltou de três para sete anos
e pode ir além. Há avanços nos fármacos, no diagnóstico mais precoce, nas terapias combinadas.
Enfim, aos poucos a situação dos pacientes vai
melhorando.
Onco& – Em relação às pesquisas clínicas envolvendo o mieloma múltiplo, como o Brasil se
posiciona?
Angelo Maiolino – Nós recebemos muitos convites para participar, mas o processo de regulação é
longo, a Anvisa é muito morosa e não dá tempo de
incluir nossos pacientes. Perdemos um estudo recente sobre mieloma por falta de tempo hábil. Não
posso citar qual o estudo, mas simplesmente não
conseguimos. É claro que os critérios precisam ser
rigorosos, mas com menos burocracia, porque isso
prejudica a pesquisa no Brasil e muito. Só falando
em mieloma, temos hoje globalmente mais de 300
estudos em andamento. Chego a dizer que essa situação é humilhante para o Brasil.
O câncer, devido aos
tratamentos mais
eficientes, em
muitos casos está
se tornando uma
doença crônica.
O mieloma, por
exemplo, tinha uma
sobrevida de três
anos, hoje já chega
a sete anos e, em
breve, conseguiremos prolongar
a vida do paciente,
na média, para até
dez anos
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?????_ ESPECIAL ROCHE_1CORR:Onco& 05/11/14 12:14 Page 12
apoio Roche
Webmeeting divulga resultados do estudo Cleópatra
Especialistas apresentam novo padrão de tratamento de primeira linha
para câncer de mama HER-2 positivo com sobrevida mediana global de 56 meses
Por Viviane Gomes
N
A NOITE DE TERÇA-FEIRA,
7 DE OUTUBRO, DOIS
CONCEITUADOS ONCOLOGISTAS BRASILEIROS
Divulgação
MEDIARAM A WEBMEETING COM ONCOLOGISTAS
Murilo Constantino/Onco&
Carlos Henrique E. Barrios
Antonio Carlos Buzaid
clínicos do país para discutir os resultados impactantes de sobrevida global final do estudo Cleópatra,
patrocinado pela indústria farmacêutica Roche. Divulgado no final de setembro, no Congresso da Sociedade Europeia de Oncologia Médica, em Madri,
na Espanha, o estudo demonstra expressiva melhora
de sobrevida de pacientes com tumor de mama
HER-2 positivo metastático tratados em primeira
linha com pertuzumabe, trastuzumabe e docetaxel.
Carlos Henrique Escosteguy Barrios, diretor do
Grupo Latino-Americano de Investigação Clínica em
Oncologia (LACOG), abriu a webmeeting destacando as principais conclusões do Cleópatra e seus
benefícios à prática clínica. O estudo envolveu 808
pacientes com tumor de mama HER-2 positivo de
primeira linha com doença metastática, de 25 países
dos cinco continentes.
Elas foram randomizadas em dois grupos: o controle (406 mulheres receberam trastuzumabe, docetaxel e placebo) e o experimental (402 mulheres tratadas com pertuzumabe, trastuzumabe e docetaxel).
Depois da primeira análise de sobrevida global com
benefício significativamente melhor do braço à base
de pertuzumabe, para as pacientes do braço controle
foi oferecido o crossover para o tratamento com pertuzumabe em julho de 2012. Com seguimento mediano de 50 meses, observou-se aumento de 15,7
meses a mais de sobrevida no braço de pertuzumabe
em comparação ao braço controle, o que é uma diferença conservadora, tomando em consideração
que houve pacientes no braço controle que se beneficiaram depois do crossover de pertuzumabe também. O resultado da sobrevida global mediana foi
de 56,5 meses com o regime à base de pertuzumabe
versus 40,8 meses.
Perfil de pacientes
Para participar da pesquisa foram exigiu-se:
12
novembro/dezembro 2014 Onco&
câncer de mama HER-2 positivo centralmente confirmado, metastático, localmente recorrente e irressecável. Terapias prévias contra a doença metástatica
foi um critério de exclusão, com exceção de terapia
hormonal.
As pacientes foram tratadas em primeira linha
para doença metastática ou localmente avançada
irressecável. Terapia hormonal foi permitida para
doença metastática antes da randomização, mas
proibiu-se quimioterapia prévia para doença metastática. Exigiu-se tempo livre de doença de 12 meses
após o tratamento neoadjuvante ou adjuvante e função cardíaca com mais de 50% de fração de ejeção
no momento da randomização.
Metade das participantes tinha receptor hormonal positivo. Cerca de 78% das mulheres apresentou
envolvimento visceral. Do total, cerca de 50% receberam tratamento adjuvante ou neoadjuvante prévio,
mas somente 10% das integrantes receberam trastuzumabe adjuvante.
O estudo pretendeu responder se o tratamento à
base de pertuzumabe e trastuzumabe da via HER-2
era superior ao bloqueio simples (trastuzumabe)
combinado com quimioterapia. “Nós melhoramos em
15,7 meses a sobrevida das pacientes ao acrescentar
o tratamento à base de pertuzumabe e trastuzumabe
em primeira linha de paciente HER-2 positivo com
doença metastática. Esse resultado é extremamente
significativo”, ressalta Barrios, que também é diretor
do Instituto do Câncer do Sistema de Saúde Mãe de
Deus, em Porto Alegre. Ele acrescenta que todos os
subgrupos (variáveis como região de origem, idade,
presença ou ausência de doença visceral e receptores
hormonais positivos e outros fatores) se beneficiaram
com o tratamento à base de pertuzumabe e trastuzumabe comparado ao bloqueio simples.
Eventos adversos
Barrios relembrou análises anteriores do Cleópatra e destacou que os resultados de sobrevida já indicavam vantagens a favor do tratamento à base de
?????_ ESPECIAL ROCHE_1CORR:Onco& 05/11/14 12:14 Page 13
pertuzumabe e trastuzumabe, embora sem a magnitude evidenciada
nesta análise final. “Se observarmos a atualização da sobrevida livre de
progressão (desfecho primário de estudo), vemos que os números se
mantêm com pequenas diferenças em relação à analise que declarou o
estudo como positivo pela primeira vez, há dois anos.” Ele diz que, enquanto o grupo controle apresentou 12 meses de sobrevida livre de progressão, o experimental teve vantagem de mais 6,3 meses, chegando a
quase 19 meses de sobrevida livre de progressão em primeira linha.
O especialista informa que as mulheres no braço experimental apresentaram mais neuropenia febril e diarreia de grau 3, o que foi consistente com os resultados apresentados nas análises anteriores. Não apareceram toxicidades cumulativas e os 6 ciclos de tratamento a mais no
braço de pertuzumabe (17,4 ciclos vs 11,4 ciclos no braço controle) não
impactaram os eventos adversos. “Entretanto, as toxidades foram
facilmente manejadas”, informa Barrios. Não houve diferença nos eventos
cardíacos relacionados à introdução do tratamento à base de pertuzumabe e trastuzumabe com docetaxel.
Pós-progressão
Progressão de doença foi a causa da maioria dos óbitos (49% no
grupo controle e 36% no experimental). Menos de 2% das mulheres (dos
dois grupos) morreram por infecção ou neutropenia febril.
Após os 50 meses de acompanhamento, mais de 70% das pacientes
(ambos os grupos) receberam tratamento pós-progressão. A maioria delas
foi medicada com outras opções de bloqueio de HER2: trastuzumabe
(40%), pertuzumabe (1%), lapatinibe (50%) e T-DM1 (10%). “Neste estudo, o tratamento pós-progressão não teve impacto na sobrevida final e
o grande benefício observado na sobrevida livre de progressão se reflete
na sobrevida global”, ressalta Barrios.
O oncologista concluiu que os 56,5 meses de sobrevida mediana global para o grupo experimental são resultado sem precedente prévio para
pacientes com câncer de mama metastático HER-2 positivo: “Isso confirma que o regime de tratamento à base de pertuzumabe e trastuzumabe
é, na nossa opinião, a terapia de primeira linha, preferencial, a ser administrado sempre que disponível”.
Finalizada a apresentação do Cleópatra, Barrios pergunta ao oncologista clínico Antonio Carlos Buzaid, chefe-geral do Centro de Oncologia Antônio Ermírio de Moraes, do Hospital Beneficência Portuguesa
de São Paulo, sua opinião sobre a tolerabilidade e o número impressionante de quase cinco anos de sobrevida para pacientes com doença
agressiva e metastática.
Avanço no tratamento HER2+ na primeira linha
“Em 1998, o HER-2 positivo era considerado um fator adverso. No
final dos anos 90, a sobrevida mediana global para as pacientes era de
25 meses quando tratadas com trastuzumabe e quimioterapia. Agora,
com o regime à base de pertuzumabe, essas pacientes sobrevivem 56,5
meses, o número mais que dobrou. O impacto de primeira linha com
adição de terapia à base de pertuzumabe e trastuzumabe é sem precedentes e é o novo padrão para tratar pacientes HER-2 positivos na primeira linha”, reforça Buzaid.
Metastáses no sistema nervoso central
Barrios enaltece que, diante da sobrevida maior de pacientes HER-2
positivo, deve-se atentar ao possível aumento de metástase no sistema
nervoso central (SNC) no futuro. “Como você vê essa situação e como
poderemos enfrentá-la?” “De acordo com dados do próprio estudo Cleópatra, quem recebeu pertuzumabe mais trastuzumabe teve menos comprometimento do SNC provavelmente devido ao melhor controle sistêmico”, observa Buzaid. Ele diz que, no seu consultório, os casos de câncer de mama controlados são seguidos com ressonância nuclear
magnética do SNC a cada seis meses para detectar pequenas metástases,
tratá-las precocemente e manter a qualidade de vida das pacientes.
Barrios também reforça a importância de realizar ressonância magnética ou tomografia computadorizada, mesmo em casos assintomáticos:
“Dessa forma, com diagnóstico precoce de metástases no SNC, podemos
indicar tratamento cirúrgico ou radiocirurgia, que podem resultar na
melhor qualidade de vida”.
O último bloco da webmeeting recebeu perguntas de oncologistas
clínicos do Brasil sobre o Cleópatra e a abordagem terapêutica em casos
específicos de pacientes no consultório. Comentário enviado por uma
médica de Minas Gerais, por exemplo, observa que, na maioria dos estudos clínicos randomizados, a sobrevida dos braços controle tem melhorado bastante. Barrios responde que isso ocorre, em parte, porque os
pesquisadores hoje selecionam melhor os pacientes, o que resulta em
melhor resposta ao tratamento e maiores benefícios em comparação a
estudos de dez anos. “Melhoramos os cuidados gerais dessas pacientes,
que definitivamente vivem mais tempo. A melhor seleção das pacientes
é importante na doença metastática e fundamental na doença adjuvante”,
complementa Barrios.
O vídeo de 60 minutos da webconferência estará disponível, até o
final do mês, no site: www.dialogoroche.com.br.
Referências bibliográficas:
Sandra M Swain, Sung-Bae Kim, Javier Cortés, et al. Final overall survival (OS) analysis from the CLEOPATRA study of first-line (1L) pertuzumab (Ptz),
trastuzumab (T), and docetaxel (D) in patients with HER2-positive metastatic breast cancer (MBC). Abstract 350O_PR and presentation, ESMO 2014)
Este material obteve suporte e apoio de Produtos Roche Químicos e Farmacêuticos S.A. – NOV/2014 ONC 01130-2014
Onco& novembro/dezembro 2014
13
16-20-materia de capa:Onco& 04/11/14 07:05 Page 16
capa
Obesidade, o novo tabaco
Gordura corporal em excesso aumenta os níveis circulantes de
diversos hormônios, como insulina, leptina, estrogênio e fatores
de crescimento (IGF-1), criando assim um ambiente favorável
ao surgimento de diversos tipos de neoplasias
Por Lourdes Rodrigues
U
M AMPLO ESTUDO SOBRE A RELAÇÃO ENTRE A
OBESIDADE E A OCORRÊNCIA DE CÂNCER, DI-
LONDON SCHOOL
of Hygiene &Tropical Medicine e pelo Farr Institute
of Health Informatics, chamou atenção para uma
questão que já preocupava os oncologistas. Mostrou
que o excesso de gordura corporal aumenta o risco
de desenvolvimento dos dez tipos de câncer mais
comuns: útero, vesícula, rim, cólon, mama, tireoide,
leucemia, fígado, ovários e mama pós-menopausa.
“Há evidências amplas e convincentes de que o excesso de gordura
corporal aumenta o risco de desenvolvimento do câncer. Isso ocorre
porque a gordura corporal em excesso os níveis circulantes de diversos
hormônios, como insulina, leptina,
estrogênio e fatores de crescimento
(IGF-1), criando assim um ambiente
favorável à proliferação celular e desfavorável à apoptose”, explica Maria
Eduarda Melo, nutricionista da Área de
Alimentação, Nutrição e Câncer do Instituto Nacional de Câncer (Inca).
“As células gordurosas podem ter efeito em outras vias de sinalização que afetam a regulação do
crescimento de neoplasias, como mTOR e AMPK”,
VULGADO EM AGOSTO PELA
16
novembro/dezembro 2014 Onco&
acrescenta Gilberto Lopes, responsável pela área de
oncologia do Hospital do Coração de São Paulo e
membro do Comitê de Assuntos Internacionais da
Sociedade Americana de Oncologia Clínica (ASCO).
O excesso de gordura também leva a uma resposta
inflamatória crônica. Indivíduos obesos apresentam
elevadas concentrações circulantes de citocinas próinflamatórias (fator de necrose tumoral, FNT; interleucina, IL-6) e proteína C reativa. Esse estado
inflamatório crônico, que caracteriza o sobrepeso e
a obesidade, contribui na iniciação e na progressão
de diversos tipos de câncer. “Além disso, a gordura
serve como depósito de hormônios, o que também
favorece o desenvolvimento do câncer de mama e de
próstata”, informa Ricardo Caponero, oncologista da
Clinonco – Clínica de Oncologia Médica e coinvestigador de Pesquisas Clínicas Nacionais e Internacionais Multicêntricas.
Apesar da relação entre obesidade e câncer,
Lopes informa que cada tipo de câncer, incluindo
os mais comuns constatados no estudo inglês, pode
ter outros fatores de risco. “Por exemplo, início precoce da menstruação, idade mais avançada quando
da primeira gravidez e não amamentar aumentam
o risco de câncer de mama; exposição à radiação
aumenta o risco de câncer de tireoide e leucemia.”
Maria Eduarda, nutricionista do Inca, acrescenta que não se pode afirmar que, se o número de
16-20-materia de capa:Onco& 04/11/14 07:05 Page 17
obesos diminuir, o número de novos casos de câncer também cairá, considerando que o câncer é uma
doença multicausal. Mesmo nos tipos de câncer fortemente associados à obesidade, há inúmeros outros
fatores aos quais o indivíduo obeso pode estar exposto, como tabaco, bebida alcoólica, sedentarismo,
o que leva ao desenvolvimento do câncer. “No entanto, podemos estimar qual a fração que podemos
prevenir de câncer no Brasil somente pela gordura
corporal adequada, assumindo a não exposição a
qualquer forma de tabaco (INCA/WCRF, 2009). Em
homens estima-se que, somente pela gordura corporal adequada, cerca de 20%, 25% e 10% dos
casos de câncer de esôfago, pâncreas e rim, respectivamente, possam ser prevenidos. Já em mulheres,
estima-se que aproximadamente 26%, 14% e 29%
dos casos de câncer de esôfago, mama e endométrio
possam ser prevenidos (INCA/WCRF, 2009).”
Pesquisas
As pesquisas têm avançado rapidamente, segundo os relatórios da Agência Internacional de
Pesquisa em Câncer e do World Cancer Research
Fund (WCRF). “Já há evidências convincentes de
que a obesidade é uma das causas dos seguintes
tipos de câncer: carcinoma de endométrio, esôfago,
colón e reto, de mama na pós-menopausa, pâncreas
e rim. Evidências prováveis também foram reportadas para o câncer de vesícula biliar e, mais
recentemente, para o câncer de ovário. Novos mecanismos também têm sido propostos para explicar
a relação entre obesidade e câncer, como a interação
entre as células tumorais e os adipócitos circundantes. Essas interações levam a alterações funcionais
nas células adiposas, que por sua vez dão suporte
ao crescimento do tumor, agressividade e invasão.
Além disso, novas evidências têm reportado que a
obesidade pode também ser um fator prognóstico
em alguns tipos de câncer”, afirma Maria Eduarda.
Os principais avanços nas pesquisas que associam a obesidade ao câncer, segundo Mário Kedih
Carra, presidente da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica (Abeso)
e presidente do departamento de obesidade da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia
(SBEM), “estão relacionados ao crescimento de cer-
tos tipos de câncer como útero, cólon, próstata e
outros em menor escala, que parecem estar relacionados ao aumento de produtos celulares tóxicos, os
chamados produtos finais da glicação celular”.
No Brasil, as pesquisas ainda são muito pobres,
de acordo com Caponero. “Não temos dados precisos sobre o assunto. Há um aumento nas taxas de
obesidade, como há um crescimento na incidência
de câncer e um aumento na expectativa de vida.
Como esses fatores se relacionam é o que a ciência
está tentando explicar.”
Evanius Wiermann, presidente da Sociedade
Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC), diz que
fazer um estudo desses no Brasil é muito demorado
e caro. É preciso um grande número de participantes, que devem ser acompanhados ao longo de vários anos. No exterior, as pesquisas têm patrocínio
de universidades e apoio governamental. Wiermann citou como exemplo um estudo observacional que acompanhou os diferentes hábitos
alimentares de 10 mil homens noruegueses durante
40 anos. “Mesmo sendo realizados lá fora, esses estudos também servem para o Brasil, pela diversidade de pessoas que fazem parte deles.”
Novos casos de câncer relacionados à
obesidade
Segundo dados da Vigilância de Fatores de Risco
e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel) 2013, divulgados pelo Ministério
da Saúde em abril de 2014, 17,5% dos brasileiros
são obesos e 50,8% estão acima do peso ideal. “Isso
corresponde a 10 milhões de pessoas, ou seja, uma
cidade de São Paulo de obesos. Sabemos que a
obesidade está se tornando um problema sério no
Brasil, e isso certamente trará implicações no aumento do número de casos de câncer”, diz Marcelo
Cruz, médico do Centro Oncológico Antônio Ermírio de Moraes, da Beneficência Portuguesa de São
Paulo. Segundo Lopes do HCor, a boa notícia é que
pela primeira vez em oito anos esses números pararam de subir. “Um número pequeno, mas crescente,
de brasileiros – 19,3% dos homens e 27,3% das mulheres – come as cinco porções por dia de frutas e
hortaliças indicadas pela Organização Mundial de
Saúde (OMS). Em relação à frequência de atividade
Em 2007, a
estimativa era de
que 4% dos tipos de
câncer em homens e
7% nas mulheres
fossem causados
pelo excesso de
peso. Com a
descoberta de cada
vez mais tumores
relacionados ao
desequilíbrio energético, associado à
gordura, esse
percentual saltou
para algo entre 15%
e 20% das mortes
secundárias ao
câncer relacionadas
à obesidade
Onco& novembro/dezembro 2014
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16-20-materia de capa:Onco& 04/11/14 07:05 Page 18
De acordo com
dados do Inca 2014,
alguns tipos de
câncer mais
incidentes, como
próstata (22,8%),
cólon e reto (15%)
e esôfago (2,6%)
em homens, e mama
(20,8%), cólon e
reto (6,4%) e
endométrio (2,2%)
em mulheres, estão
relacionados ao
excesso de
gordura corporal
18
física em tempo livre também houve um aumento,
de 30,3% para 33,8%, nos últimos cinco anos.”
A obesidade está sendo chamada de “o novo tabaco”, acrescenta Lopes, porque está relacionada a
uma proporção grande de tipos de câncer e é prevenível. “Em 2007 estimava-se que 4% dos tipos
de câncer em homens e 7% nas mulheres fossem
causados pelo excesso de peso, mas nos últimos
anos descobrimos cada vez mais tumores relacionados ao desequilíbrio energético – quando falamos de obesidade, ela não se relaciona somente
à gordura, mas ao balanço energético. Hoje, estimamos que 15% a 20% das mortes secundárias
ao câncer estão relacionadas à obesidade. Por
exemplo, mulheres depois da menopausa, com sobrepeso, têm um risco duas vezes maior de desenvolver câncer de mama”, diz Lopes. Estudos mais
recentes mostram que a obesidade não somente
pode causar câncer, mas também que pacientes
obesos têm maior mortalidade e menores taxas de
cura do que pacientes com peso normal.
De acordo com as estimativas mundiais do projeto Globocan 2012, da Agência Internacional para
Pesquisa em Câncer (IARC, do inglês International
Agency for Research on Cancer), aproximadamente
14 milhões de novos casos de câncer foram diagnosticados no mundo em 2012. Entre os tipos mais
incidentes destacam-se o de mama (1,7 milhão,
11,9%) e cólon e reto (1,4 milhão, 9,7%), que estão
relacionados à obesidade. “As projeções mundiais
com base nessas estimativas preveem um aumento
substancial para os próximos anos, no qual a carga
global de câncer será de 21,4 milhões de novos
casos em 2030”, informa Maria Eduarda.
Em paralelo, projeções globais reportam aumento da obesidade em vários países, incluindo o
Brasil (OMS, 2006), o que torna o cenário preocupante, mesmo que no país hoje já existam dados
sugerindo freada no aumento de obesos. Cerca de
20% da carga mundial de câncer é atribuída ao sobrepeso e à obesidade. “No Brasil, o panorama atual
não é muito diferente. De acordo com dados do
Inca 2014, alguns tipos de câncer mais incidentes,
como próstata (68,8 mil casos novos; 22,8%),
cólon e reto (15.070 casos novos; 15%) e esôfago
(8.010 casos novos; 2,6%) em homens, e mama
novembro/dezembro 2014 Onco&
(57.120 casos novos, 20,8%), cólon e reto (17.530
casos novos, 6,4%) e endométrio (5,9 mil casos
novos, 2,2%) em mulheres, estão convincentemente relacionados ao excesso de gordura corporal”, informa Maria Eduarda.
Alimentação e o câncer
Sabe-se que os alimentos ultraprocessados, como
refeições prontas, fast food, refrigerantes, sucos industrializados, salgadinhos e biscoitos, são determinantes para o excesso de gordura corporal tanto em
adultos quanto em crianças e são cada vez mais consumidos pela população brasileira. A pesquisa Vigitel
2013 mostrou que aproximadamente 23% da população adulta brasileira consome cinco ou mais vezes
por semana refrigerantes e sucos industrializados.
“Essas bebidas, por conterem uma quantidade excessiva de açúcar, sal e aditivos químicos, possuem
alta densidade energética, e por serem hiperpalatáveis estimulam o consumo excessivo. No entanto, o
que de fato esses produtos contêm não é esclarecido
à população”, diz Maria Eduarda.
Para Cruz, a meta é encontrar o equilíbrio. “De
forma geral, a pessoa obesa faz uma dieta muito rica
em alimentos gordurosos, frituras, carnes processadas, refrigerantes, doces e carboidratos, em detrimento de fibras, saladas, frutas e grãos integrais.
Endocrinologistas e nutricionistas devem fazer
parte da equipe multidisciplinar que lida com pacientes oncológicos e obesos.”
“Os alimentos que parecem favorecer o desenvolvimento de câncer são as gorduras e os alimentos que, durante seu preparo, apresentam uma
superfície como se estivesse queimada, como assados e grelhados com aquela ‘capinha queimada’. O
mais importante é a moderação ao se alimentar e
evitar o aumento de peso”, acrescenta Carra. De
acordo com Caponero, a restrição ao uso de certos
grupos de alimentos é específica para cada diagnóstico e cada situação clínica, devendo ser discutida
individualmente.
A obesidade e o tratamento do câncer
É difícil falar em obesidade sem falar em sedentarismo e hábitos alimentares inadequados, fatores
que influenciam nas diversas etapas do tratamento,
16-20-materia de capa:Onco& 04/11/14 07:05 Page 19
e mesmo desde o diagnóstico. “A realização de exames de imagem como mamografias e ultrassom,
por exemplo, para o diagnóstico de câncer de
mama é dificultada pelo excesso de tecido adiposo
e pode comprometer o diagnóstico correto de um
tumor de mama”, esclarece Marcelo Cruz. Além
disso, no tratamento oncológico, pacientes obesos
apresentam maior risco de complicações pós-operatórias, o que pode gerar atrasos em tratamentos
subsequentes. Em mulheres obesas e com diabetes,
o benefício da quimioterapia para câncer de mama
pode ser menor do que em mulheres com índice
de massa corpórea adequado. “Além disso, mulheres obesas com câncer de mama têm taxa de mortalidade 30% maior que mulheres sem excesso de
peso”, informa Lopes.
“Estudos mostram também que, após o tratamento oncológico, o risco de recorrência do câncer
é maior em pacientes obesos do que em pacientes
com peso dentro dos índices normais”, diz Cruz. O
médico da Beneficência Portuguesa diz que é fundamental que pacientes obesos entendam a importância da perda do peso para o tratamento do
câncer e sejam estimulados a adquirir hábitos alimentares e iniciar programas de atividade física, de
preferência sob supervisão de profissionais de
saúde. “Não se deve esperar o fim do tratamento
para iniciar esse programa. Diversos estudos mostram que atividade física durante o período de tratamento contra o câncer reduz os efeitos colaterais
e melhora a qualidade de vida dos pacientes.”
Segundo a nutricionista do Inca, sabe-se que a
obesidade é um fator de risco para a má cicatrização
de feridas, infecções pós-operatórias e linfedema,
bem como para o desenvolvimento de comorbidades (doenças cardiovasculares, cerebrovasculares,
diabetes), o que pode impactar negativamente na
sobrevida desses pacientes. “Além disso, indivíduos
obesos, em geral, têm uma alimentação habitual
inadequada, com elevado consumo de produtos ultraprocessados, ricos em gorduras não saudáveis,
açúcar, sal, aditivos químicos, pobres em fibras, e,
portanto, esse padrão alimentar pode indiretamente
influenciar a resposta ao tratamento.”
Outro aliado do tratamento do câncer em obesos, em conjunto com a dieta adequada, é a prática
de exercícios físicos. “Uma dieta com mais grãos e
menos gorduras e atividade física pós-diagnóstico
diminuem o risco de recidiva, principalmente na
pré-menopausa”, informa Wiermann, da SBOC.
A nutricionista do Inca acrescenta que, até o
momento, as recomendações para controle do excesso de gordura corporal em pacientes com sobrepeso e obesidade não têm focado especificamente
pacientes oncológicos. No entanto, recentemente a
Sociedade Americana de Oncologia Clínica destacou que, diante das crescentes evidências que sugerem influência da obesidade na resposta ao
tratamento oncológico e na mortalidade por câncer,
há a necessidade de maior atenção ao manejo do
peso corporal de pacientes oncológicos que apresentam obesidade.
Maria Eduarda ressalta que a prescrição dietética para pacientes em tratamento, independentemente de apresentarem ou não excesso de gordura
corporal, deve ser preferencialmente individualizada e levar em consideração diversos fatores, como
o sítio primário do tumor, o estadiamento, o tipo
de tratamento, as possíveis intercorrências durante
o tratamento, os hábitos alimentares e as preferências, entre outros. “Mesmo com as evidências sobre
o impacto da obesidade no tratamento oncológico
e os diferentes fatores que influenciam essa resposta, em linhas gerais, promover uma alimentação
saudável, rica e variada, com a inclusão predominantemente de alimentos frescos de origem vegetal
durante o tratamento, e desestimular o consumo de
alimentos ultraprocessados potencialmente podem
contribuir na resposta do paciente ao tratamento,
ou pelo menos minimizar as possíveis intercorrências decorrentes dele.”
Políticas de controle da obesidade
“A difusão da informação é uma responsabilidade de todos os profissionais que atuam na área”,
afirma Caponero. Segundo ele, alertas sobre o risco
da obesidade, não só para o câncer como também
para as doenças cardiovasculares e metabólicas, têm
se tornado cada vez mais frequentes. “Já existe regulamentação para a redução da quantidade de
açúcar nos refrigerantes, e isso deve se ampliar pela
indústria de produção de alimentos.” Kedih Carra
A prescrição
dietética para
pacientes em
tratamento, independentemente de
apresentarem ou
não excesso de
gordura corporal,
deve ser individualizada e levar em
consideração diversos fatores, como o
sítio primário do
tumor, o estadiamento, o tipo de
tratamento e as
possíveis intercorrências durante
o tratamento
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acrescenta que as associações ligadas ao estudo da
obesidade têm se esforçado na divulgação dos problemas de saúde relativos ao excesso de peso. “A
maior responsabilidade, sem dúvida, é dos órgãos
públicos responsáveis pela saúde, e da imprensa,
desde que falasse e explicasse corretamente que a
obesidade é uma doença crônica e de difícil tratamento. Mas as autoridades sanitárias no Brasil insistem em dificultar ou proibir a comercialização
de medicamentos para o tratamento da obesidade.”
Maria Eduarda, do Inca, por sua vez, diz que as
políticas públicas como o Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas
Não Transmissíveis (DCNT) no Brasil 2011-2022 e
a Política Nacional de Alimentação e Nutrição buscam, entre outros objetivos, enfrentar o sobrepeso
e a obesidade por meio de estratégias articuladas,
considerando as políticas e os programas setoriais
vigentes, mas ainda há um grande gap no reconhecimento social da população a respeito da relação
entre a obesidade e o câncer. “Primeiramente, é importante que a população brasileira reconheça que
o câncer é uma doença crônica prevenível, como
definido na Política Nacional de Prevenção e Controle do Câncer (Portaria n.º 874, de 16 de maio de
2013). Nesse contexto, visando o reconhecimento
social, entre outras atividades, a Unidade Técnica
de Alimentação, Nutrição e Câncer, da Coordenação de Prevenção e Vigilância do Inca, vem realizando em todo o país as Oficinas de Capacitação
de Multiplicadores, para a promoção de práticas
alimentares saudáveis e prevenção do câncer, visando capacitar profissionais de saúde a fim de que
incluam o tema em suas atividades de rotina profissional e desenvolvam ações específicas no âmbito
da atenção básica.”
A nutricionista destaca que devemos considerar
que, mesmo diante do reconhecimento social, o padrão alimentar e a composição corporal do indivíduo não são uma simples questão de escolha
pessoal. “Fatores físico-ambientais, econômicos e
20
novembro/dezembro 2014 Onco&
sociais têm um impacto direto nesses padrões e,
consequentemente, no risco de câncer. Isso significa que não só ações de caráter educativo e informativo (como campanhas veiculadas por meios de
comunicação de massa), como também medidas legislativas (como controle da propaganda de alimentos não saudáveis, especialmente os dirigidos ao
público infantil), tributárias (isentando alimentos
saudáveis e onerando os preços dos não saudáveis),
são necessárias para uma política consistente de
prevenção da obesidade. Para isso, é essencial a
atuação sinérgica de organizações da sociedade
civil, governo, escolas, mídia, entre outros, no planejamento e na execução de políticas, bem como
na disseminação dessas informações.”
Segundo Lopes, apesar do Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas Não Transmissíveis, pouco se tem discutido
sobre a relação entre obesidade e câncer. “Nos Estados Unidos, a Sociedade Americana de Oncologia
Clínica (ASCO), a American Cancer Society e outros grupos começaram campanhas de combate à
obesidade, com o objetivo de mostrar ao público
em geral a relação entre o excesso de peso e o câncer. Esse foi um dos tópicos principais da última
reunião anual da ASCO.”
Educação e prevenção são e sempre serão o
melhor caminho e devem começar na escola. “Em
um país subdesenvolvido como o nosso, onde o
acesso à escolaridade e à informação de qualidade
ainda é escasso e uma parcela importante da população adulta é semianalfabeta e sem níveis educacionais adequados, são as crianças que levarão
para dentro de casa as informações que aprenderem na escola. Por isso, acredito que a escola tem
papel fundamental nisso. Para os adultos que já
enfrentam esse problema, o governo e as sociedades médicas precisam fazer sua parte, disseminando informação e acesso a métodos de prevenção da obesidade e tratamentos adequados”,
finaliza Marcelo Cruz.
21-23-JAIRO - TMO-CYAN:Onco& 04/11/14 07:10 Page 21
transplante medula óssea
A revolução dos procedimentos
com doadores 50% compatíveis
O
TRANSPLANTE ALOGÊNICO DE CÉLULAS-TRONCO
HEMATOPOIÉTICAS É UM DOS PROCEDIMENTOS
Divulgação
MAIS UTILIZADOS NO TRATAMENTO DAS DOENÇAS
Jairo J.N. Sobrinho
*Hematologista do Centro
de Oncologia e Hematologia do
Hospital Israelita Albert Einstein
Contato:
[email protected]
malignas hematológicas e das imunodeficiências e
falência medular. A curabilidade do procedimento
é baseada em dois mecanismos de ação. O primeiro
é o condicionamento mieloablativo ou não mieloablativo que visa induzir citorredução significativa e
permitir a enxertia das células hematopoiéticas. Já
o segundo mecanismo é a indução da destruição da
malignidade pela ação das células efetoras imunológicas, o chamado efeito GVL ou GVT (efeito do
enxerto contra a leucemia ou tumor). Essa estratégia de tratamento está atualmente passando por
mudanças significativas devido aos recentes desenvolvimentos tecnológicos, como: (a) transplante de
células-tronco hematopoiéticas obtidas após a mobilização de fatores de crescimento hematopoiéticos
e o transplante de sangue do cordão umbilical; (b)
desenvolvimento e aperfeiçoamento dos transplantes haploidênticos e de doadores voluntários; (c) infusão de linfócitos do doador para o controle da
doença residual mínima; (d) condicionamento de
toxicidade reduzida que visa diminuir a ocorrência
de efeitos adversos sem redução na dose de quimioterapia necessária e promover efeito antitumoral; e
(e) quimioterapia sequencial seguida pelo transplante alogênico após condicionamento não mieloablativo no caso de doenças hematológicas
refratárias ou de mau prognóstico.
A grande maioria das neoplasias hematológicas
está associada a um prognóstico bastante reservado,
apesar do grande avanço em quimioterapia, imunoterapia e utilização de drogas-alvo. O transplante
de células-tronco hematopoiéticas e o seu vasto potencial de exploração da terapia celular continuam
como uma das melhores opções de tratamento com
intuito curativo dessas doenças.
A ação antineoplásica do transplante alogênico
é geralmente baseada em dois mecanismos de ação:
1 - A combinação de quimioterapia intensiva com
ou sem irradiação corpórea total – essa abordagem
manteve-se por anos como base do tratamento com
transplante. O racional está em provocar a destruição das células malignas pelo incremento da dose
e, consequentemente, do efeito citotóxico da quimioterapia e/ou radiação, até os níveis máximos tolerados pelos órgãos vitais e substituição da medula
óssea com a injeção de células alogênicas.
2 - Ação imunológica antitumoral pelas células efetoras imunes, o chamado efeito enxerto-versusleucemia (GVL). A primeira evidência desse efeito
foi observada indiretamente: o risco de recaída da
leucemia diminui com a existência de sinais de
doença do enxerto contra o hospedeiro (GVHD) e
aumenta com a redução da incidência de GVHD
aguda, enxertos pobres em células T ou transplantes singeneicos. A reinjeção de linfócitos do doador
em pacientes em recaída após alogênico tem demonstrado efeito antileucêmico direto. No entanto,
a ocorrência de efeito GVL nem sempre correlaciona-se com a ocorrência de GVHD.
A disponibilidade de um doador compatível foi
um fator limitante à expansão do tratamento com
transplante. De modo geral, apenas um terço da população possui um doador HLA compatível. Por
outro lado, o aumento no número de doadores voluntários nos bancos de medula óssea possibilitou
um aumento significativo na disponibilidade de
doadores. De fato, em alguns países da Europa, no
Japão e nos Estados Unidos há muito o número de
transplantes realizados com doadores não aparentados supera o daqueles realizados com doador
familiar. O desenvolvimento de bancos de células-
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“O desenvolvimento
de bancos de
células-tronco
hematopoiéticas
provindas do
cordão umbilical
veio a contribuir
em muito com a
possibilidade de encontrar um doador”
22
tronco hematopoiéticas provindas do cordão umbilical veio a contribuir em muito com a possibilidade
de encontrar um doador. Atualmente, a grande inovação no campo tem sido a realização do transplante com doadores familiares com apenas 50% de
compatibilidade, os chamados transplantes haploidênticos. Essa técnica é tão revolucionária que, em
teoria, todos os pacientes que possuem pai, mãe ou
irmãos vivos possuem um potencial doador.
Outra limitação à indicação do transplante alogênico tem sido a grande toxicidade iatrogênica associada ao procedimento, representada tanto pelos
efeitos adversos da quimioterapia em altas doses
quanto pelas complicações decorrentes do GVHD
e das infecções oportunistas que invariavelmente
acompanham a imunossupressão.
Em suma, por causa das dificuldades inerentes
ao procedimento e à sua aplicabilidade, nos cabe o
papel de escolher bem os pacientes que são candidatos no que se refere à toxicidade e à possibilidade
de cura.
Fonte de células
As células-tronco hematopoiéticas de doadores
devem ser idênticas nos loci HLA A, B, C, DRB1et
DQB1. A tipagem de HLA é realizada no paciente e
no doador por sorologia ou biologia molecular para
HLA de classe I (A, B, C) e obrigatoriamente pelo
método molecular para HLA de classe II (DR, DP,
DQ). A primeira escolha é, na maioria, das vezes o
doador HLA familiar idêntico. Na ausência de um
doador familiar, a melhor opção é o doador HLA
idêntico10/10 e, algumas vezes, um doador não
aparentado em 9/10. A probabilidade de identificação de um doador adequado é estimada entre 30%
e 40% (sabendo-se que nem todas as populações
não são uniformemente representadas nos registros). O aumento do número de doadores disponíveis em nível internacional (15 milhões de
doadores) explica o aumento dramático nos transplantes não aparentados nos últimos anos.
As malignidades hematológicas representam
82,2% dos transplantes aparentados e 93% dos
transplantes não aparentados (leucemia mieloide
aguda: 32,9%; leucemia linfoblástica aguda: 16,3%;
mielodisplasias: 7,5%; linfomas malignos: 10,2%;
mieloma: 7,3%; e leucemia mielóide crônica: 2,9%).
A medula óssea do doador é removida por punções na crista ilíaca (sob anestesia) ou por leucaférese após estímulo com fatores de crescimento de
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colônia granulocítica (G-CSF).
Quando nenhum doador HLA 100% compatível é identificado, a escolha pode recair nas células
de cordão umbilical. Nesse contexto, examinam-se
6 loci HLA: A, B e DRB1 e são aceitas disparidades
em até 2 genes, sendo que, quanto maior a compatibilidade, melhor o resultado esperado. Além
disso, foi demonstrada a importância do número
de células nucleadas totais e, mais recentemente, de
células CD34 + no produto. Como a determinação
do número ideal de células a ser utilizado no transplante depende do peso do doador, muitas unidades de células de cordão umbilical são insuficientes
para os pacientes adultos. Nesses casos, podem ser
utilizadas duas unidades diferentes de cordão umbilical para um único paciente.
Uma comparação retrospectiva a partir do registro da EBMT entre os transplantes realizados
com uma ou duas unidades de células de cordão
umbilical mostrou uma tendência a maior ocorrência de GVHD e melhor sobrevida livre de doença
nos transplantes duplos. A escolha de uma ou duas
unidades de cordão umbilical depende essencialmente da quantidade de células (CNT, CD34 +) e,
naturalmente, está diretamente correlacionada com
o peso do recipiente. Por fim, embora vários estudos tenham mostrado resultados semelhantes comparando transplantes utilizando medula óssea de
doadores não aparentados e transplantes de sangue
do cordão umbilical, este último permanece com
uma opção alternativa aos doadores HLA idênticos.
Na ausência de um doador compatível e, principalmente, quando se faz urgente a realização do
transplante, pode-se optar pelo transplante haploidêntico. A utilização de células progenitoras de
doadores com apenas 50% de compatibilidade HLA
passou por uma revolução nos últimos anos. Há
pouco tempo o processo só era viável quando se
utilizava a depleção de células T (por seleção em
coluna – método dispendioso e pouco acessível) associada a combinações de imunossupressores. Os
resultados eram animadores, mas muitos pacientes
padeciam de infecções e rejeição. Ultimamente,
pesquisadores da Universidade Johns Hopkins, em
Baltimore, nos Estados Unidos, desenvolveram uma
técnica extremamente eficaz, de custo baixo e reprodutível para a realização de transplantes haploidênticos: a ciclofosfamida, uma droga antiga e
pouco tóxica para as células progenitoras, foi utilizada no terceiro e quarto dias que se seguem à in-
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fusão com o intuito de destruir os linfócitos T aloreativos presentes no
enxerto. Os resultados foram impressionantes. Os pacientes apresentam sobrevida e incidência de GVHD similares às daqueles transplantados com um doador HLA idêntico e superiores às daqueles
transplantados com células de cordão umbilical.
Atualmente diversos regimes de condicionamento estão disponíveis
e podem ser distinguidos pelo poder mielotóxico e imunomodulador:
Condicionamento mieloablativo – utilização de altas doses de drogas
mielotóxicas com ou sem irradiação corpórea total em doses igualmente altas.
Condicionamento não mieloablativo – utilização de doses relativamente menores de quimioterapia e radioterapia com intensa atividade
imunossupressora para permitir a enxertia das células do doador, porém
em doses não mielotóxicas, o que garante uma toxicidade menor.
Condicionamento mieloablativo de toxicidade reduzida – baseiase na utilização de drogas em doses mielotóxicas que, por sua formulação (ex. trosulfano, bussulfano intravenoso) ou pelo monitoramento
do nível sérico, não estão associadas a efeitos tóxicos significantes.
A escolha do regime de condicionamento é feita com base nas características gerais do paciente, levando-se em consideração a idade, a
pontuação comorbidade. Os pacientes idosos e/ou com fragilidade orgânica são preferencialmente tratados com condicionamentos não mieloablativos, enquanto os pacientes mais jovens são naturalmente
candidatos ao condicionamento mieloablativo. Ultimamente, com a disponibilidade de formulações intravenosas de busulfano e do efetivo monitoramento dos níveis séricos, pacientes com idade superior a 65 podem
ser submetidos a regimes mieloablativos sem que padeçam das complicações comumente causadas pelos regimes mielotóxicos tradicionais.
Existem, é claro, algumas complicações dos transplantes que precisamos levar em consideração. Uma delas é a rejeição do enxerto,
uma ocorrência muito rara e geralmente associada à disparidade HLA,
condicionamentos não mieloablativos, baixo número de células progenitoras no enxerto, exposição a medicamentos mielotóxicos no período da enxertia e a algumas infecções virais intercorrentes.
Outra ocorrência é a doença enxerto-contra-hospedeiro GVHD,
que pode ocorrer em até 70% a 80% dos pacientes. Comumente inicia-se a profilaxia antes da infusão do enxerto e mantém-se por até
180 dias nos pacientes que não desenvolvem GVHD e pelo tempo necessário para o controle da doença naqueles que a desenvolvem. As
drogas utilizadas são os inibidores de calcineurina (ciclosporia e tacrolimus) associados a doses baixas intermitentes de metotrexato ou
mofetil micofenolato. É uma das principais complicações do transplante e uma das mais associadas à mortalidade. Caracteriza-se pelo
surgimento de erupções maculopapulares na pele, principalmente no
rosto, no colo e no tronco, algumas vezes pruriginosas, que diferentemente das reações alérgicas comentem palmas e plantas. Nos casos
mais graves (menos que 4%) cursa com eritrodermia generalizada e
formação de bolhas. No tubo digestivo os sintomas mais comuns são
náuseas e vômitos e diarreia volumosa. Outro órgão potencialmente
envolvido é o fígado, cujo acometimento se traduz pela observação de
icterícia (elevação da bilirrubina direta) pela destruição dos canalículos
biliares.
Alguns fatores estão associados à ocorrência de GVHD. Os mais
importantes são a disparidade HLA, a idade do paciente e do doador
e doadores do sexo feminino. A maioria dos pacientes apresenta formas leves e tratáveis. O tratamento, baseado na adição de corticosteroides em doses relativamente altas ao esquema imunossupressor nas
formas cutâneas, na adição de Psoralen e na radiação ultravioleta, tem
se mostrado muito efetivo. Os poucos pacientes que não respondem
rapidamente são tratados com imunossupressores alternativos, como
etanercept, timoglobulina, infliximabe, fotoférese, anticorpos anti-interleucina-2, entre outros, infelizmente sem os resultados desejáveis.
O excesso de imunossupressão associado à GVHD e seu tratamento
impactam fortemente na mortalidade por causa da elevada incidência
de infecções oportunistas.
Há também a ocorrência da GVHD crônica, que surge tardiamente
após o transplante por mecanismos imunológicos diferentes dos deflagradores da GVHD aguda. Pode apresentar-se de maneira muito variada, desde complicações orais, cutâneas e oculares localizadas até
formas extensas que envolvem pulmões, tecido subcutâneo, fáscias e
articulações. Geralmente é tratada com corticosteroides e imunossupressores por tempo prolongado nas formas mais graves.
Os pacientes também podem ser acometidos por complicações infecciosas por causa da intensa imunossupressão a que são submetidos,
com o surgimento de algumas infecções oportunistas ou não comumente observadas.
No período inicial, durante a neutropenia decorrente da toxicidade
do condicionamento até a enxertia, as infecções mais frequentes são
as da corrente sanguínea originadas da translocação das bactérias
gram-negativas intestinais e das bactérias gram-positivas da boca e
pele. Com a utilização rápida e agressiva de antimicrobianos de amplo
espectro, a mortalidade nesse período é geralmente muito baixa.
No período após a enxertia até cerca de 120 dias, as infecções mais
frequentes são a reativação do citomegalovírus e a infecção por fungos
filamentosos. Alguns pacientes submetidos a condicionamentos mais
imunossupressivos estão sujeitos a infecções por adenovírus, poliomavírus e vírus Epstein-baar. O monitoramento da circulação do citomegalovírus por antigenemia ou PCR quantitativo diminuiu muito
a mortalidade associada por causa da instituição precoce dos medicamentos antivirais.
Em suma, a utilização do transplante de medula como alternativa
terapêutica para as doenças hematológicas de alto risco é de grande
valor no aumento da sobrevida dos pacientes. As novas técnicas de
transplante, como a utilização de doadores haploidênticos, devem expandir em muito o número de pacientes que podem se beneficiar. A
melhora constante na profilaxia e no tratamento das infecções intercorrentes contribuiu para os melhores resultados na atualidade, assim
como a diminuição na toxicidade dos regimes de condicionamento.
Infelizmente a GVHD ainda está associada a uma grande morbimortalidade e o seu tratamento tem evoluído pouco nos últimos anos.
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Características clínicas e diagnósticas do tumor
neuroendócrino (TNE) no Brasil
Por Frederico Perego Costa, médico do Centro de Oncologia do Hospital Sírio-Libanês
A
SSIM COMO EM OUTRAS NEOPLASIAS, A REAL INCIDÊNCIA DOS TUMORES
(TNES) NO BRASIL ESTÁ SUJEITA À SUBNOTIFICAÇÃO. POR SER UMA DOENÇA RARA, OS NÚMEROS DE INCIDÊNCIA MUNdial apontam para 5 casos a cada 100 mil habitantes, e sua real importância na população brasileira é desconhecida. Os TNEs são neoplasias
derivadas de células neuroendócrinas existentes em todo o corpo, que
têm como precursores embrionários as células formadoras do sistema
endócrino e sistema neurológico do corpo.
Os TNEs formam uma grande família de tumores com apresentação bastante heterogênea, cujo espectro engloba desde neoplasias de
crescimento muito lento e baixo potencial de metástases, como os tumores carcinoides, até neoplasias de crescimento muito rápido e alto
potencial metastático (como tumores de pequenas células de pulmão
ou de outros órgãos). Outros membros dessa família têm grau variado
de agressividade e incluem, entre outros, tumores de ilhota pancreática,
carcinomas de Merckel e carcinomas medulares de tireoide.
Um fator semelhante, que define as neoplasias neuroendócrinas, é
que as células constituidoras do TNE têm o potencial de produzir peptídeos, hormônios ou neurotransmissores, fatores causadores das síndromes funcionantes hormonais.
Os TNEs diferem das demais neoplasias, pois apresentam características clínicas diferentes quando produzem quadros funcionantes,
isto é, a doença se caracteriza pelo tipo de hormônio que os tumores
produzem. Praticamente todos os tipos de tumores neuroendócrinos
podem apresentar secreção de polipeptídeos clinicamente ativos. Os
peptídeos não específicos mais comuns são o hormônio antidiurético
e o peptídeo relacionado ao paratormônio, e mais raramente histamina,
serotonina e gastrina. Nos tumores primários do intestino delgado,
cerca de 30% dos pacientes apresentam quadros clínicos funcionais,
principalmente na presença de metastátase para o fígado, denominada
síndrome carcinoide, caracterizada por diarreia, rubor facial (flushing),
taquicardia e broncoespasmo secundário a liberação de serotonina.
Já nos tumores pancreáticos, os tumores funcionantes correspondem a cerca de 10% das neoplasias pancreáticas2,3. Nesses casos, o quadro clínico é tão característico ao hormônio secretado que o TNE passa
a ser designado pelo tipo de síndrome que ele produz, isto é, insulinomas (insulina), glucagonomas (glucagon), vipomas (VIP), gastrinomas (gastrina) etc.
O diagnóstico, no caso dos pacientes com tumores funcionantes, é
feito geralmente com doença localizada ou com pequeno volume de
doença hepática devido à presença de síndrome funcional. Já os pacientes com tumores não funcionantes geralmente são diagnosticados com
doença avançada, já que os sintomas relacionados à doença estão assoNEUROENDÓCRINOS
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ciados ao seu efeito de massa. Por essa razão, a maioria desses pacientes
encontra-se com dor abdominal, perda de peso e anorexia4-6.
Os TNEs também possuem capacidade proliferativa e de metastatizar. Por esse motivo, todos eles são considerados malignos e podem
acarretar sintomas decorrentes de seu efeito de massa causados por
suas metástases.
Os TNEs são classificados, pelo sítio do tumor primário, pela presença ou não de quadro clínico funcionante, pelo grau histológico e
seu índice de proliferação (baixo-1, intermediário-2, ou alto-3). Embora cerca de 20% a 30% dos pacientes diagnosticados com TNE de
grau 1 e 2 apresentem doença disseminada, a maioria dos pacientes
apresenta doença com evolução indolente1. Já os pacientes com TNE
de grau 3 apresentam doença bem agressiva. Evidentemente que o estadiamento do TNE (que se caracteriza pelo envolvimento local, locoregional ou metastático) e o grau histológico do TNE são os dois fatores
prognósticos mais importantes que atualmente constituem a classificação atual para TNE usada pela Organização Mundial da Saúde
(OMS) desde 2010.
Como exemplo de sua relevância prognóstica, nos TNEs pancreáticos cerca de 92% dos pacientes apresentam tumores bem ou moderadamente diferenciados. A sobrevida global em 5 anos está entre 3063% conforme a série reportada e a sobrevida global mediana é de 72
meses, muito superior ao observado nos pacientes com tumores de
alto grau (grau 3)2-6. Apenas 8% dos pacientes apresentavam neoplasias
de alto grau, caracterizados por carcinomas neuroendócrinos pouco
diferenciados de células grandes ou anaplásico3,7. Esses pacientes são
tratados de forma agressiva, como os carcinomas ductais do pâncreas,
e apresentam prognóstico semelhante.
Como em outras neoplasias, pacientes portadores de TNE podem
fazer parte de síndromes genéticas, como a síndrome genética autosômica MEN-1, em que cerca de 30% dos pacientes apresentam tumores
pancreáticos. Os tumores associados à evolução mais favorável tendem
a ser não funcionantes em 55% dos casos, são múltiplos e geralmente
localizados no pâncreas.
Histologicamente, o diagnóstico de TNE é estabelecido de forma
definitiva através do H&E, que demonstra tumores bem ou moderadamente diferenciados, WHO 2010 grau 1 ou 2, com características
neuroendócrinas e imuno-histoquímica positiva para cromogranina A
e sinaptofisina8,9. A determinação de ki67 ou contagem mitótica é fundamental no diagnóstico dos TNEs. Tumores bem diferenciados com
ki67 até 2% (grau 1) apresentam sobrevida livre de progressão significativamente maiores que paciente com ki67 mais elevados10. Entretanto, existe grande discrepância no valor de Ki67 nos pacientes com
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tumores grau 2, seja entre o tumor primário e sítios metastáticos, ou
quanto ao valor preditivo de prognóstico. Neste grupo de pacientes o
ki67 de 5%, parece ser um melhor valor determinante de prognóstico
(até 5% ou > 5% -20%).10 Tumores com Ki67% > 20% são considerados grau 3 e são classificados como tumores de alto grau. Esses pacientes, assim como os pacientes com tumores pouco diferenciados,
possuem prognóstico reservado e, portanto, devem ser tratados diferentemente dos pacientes com tumores de grau 1 ou 2.
O estadiamento clínico dos TNEs envolve estudos de imagem convencional como a TC e a RNM. Esses exames exploram a característica
dos TNEs de ser altamente vascularizados e apresentam, portanto, aumento na intensidade do realce do contraste endovenoso durante a
fase arterial precoce e um washout na fase mais tardia. Por essa característica, os estudos de imagem convencionais podem sofrer muita interferência na sua qualidade, conforme a velocidade para a aquisição
das imagens e o protocolo usado para sua aquisição. Outro fator limitante é o tamanho mínimo das lesões detectáveis (hoje é de > de
5 mm). Clinicamente, essas limitações são relevantes no momento
de localização e identificação de todos os sítios de doença nos pacientes
com TNE grau 1 e 2 com indicação cirúrgica com intenção curativa.
Os TNEs apresentam uma característica comum que é a expressão
de receptores de somatostatina (rSTS) na membrana das células tumorais. O rSTS é um receptor composto por uma proteína G presente na
membrana de células dispostas em diferentes órgãos e tecidos como
pâncreas, trato gastrointestinal, fígado, glândula pituitária e cérebro11.
Os TNEs apresentam uma superexpressão desses receptores, com variações quanto à presença de seus 5 subtipos de receptor existentes12.
Essa característica pode ser então explorada através de métodos funcionais de imagem, como o DWI-MR13,14.
A marcação de uma molécula análoga de somatostatina chamada
octreotide com índio-111 utilizando-se um ligante DTPA é hoje disponível na forma de 111In-DTPA-octreotide (OctreoScan® - Mallinckrodt, Inc.). Esse teste de imagem funcional possibilita a localização de
tumores que expressam rSTS, preferencialmente o subtipo 215,16. Outros ligantes ao octreotide como o 68-Ga-dotatate-octreotide (Galio68-PETCT) já estão disponíveis experimentalmente em nosso meio13,14.
Nos pacientes com TNE de baixo grau (grau 1), a sensibilidade de
detecção do Octreoscan® e o Galio-68-PETCT são sensivelmente melhores no estadiamento. Já nos pacientes com TNE de grau 2 ou 3, observa-se que a sensibilidade de detecção do Octreoscan® e o Galio68-PETCT são inferiores, especialmente quando comparado aos pacientes com TNE de baixo grau. Os pacientes com TNE de grau 2 e 3
apresentam maior captação com o uso de FDG-PETCT, que geralmente
é negativo nos pacientes com TNE de baixo grau (grau 1)14.
Seguramente o FDG-PETCT é o estudo funcional de escolha nos
TNEs de grau 2 e 3. Em pacientes com TNE pancreático, por exemplo,
existe um único estudo disponível avaliando a positividade do FDGPETCT e demonstra que é de apenas 40% nos pacientes com Ki67 inferior a 2%, 70% nos pacientes com Ki67 entre 3 e 15% e 93% nos
pacientes com Ki67 > 15%17.
Outra forma de estadiamento por imagem é o uso de restrição à
difusão de água nos tecidos por RNM. Os TNEs apresentam significante redução na restrição a água quando comparados ao tecido normal. Análise dinâmica de diffusion-weighted image (DWI) tornou-se
recentemente disponível em equipamentos de RNM. Sequências de
DWI podem ser ajustadas para estudar todo o corpo do paciente, sem
a necessidade de injeção de meios contrastados. Nosso grupo está ativamente estudando esse novo recurso de estadiamento em TNE18,19.
Cromogranina A (CgA) é o marcador mais frequentemente usado
no manejo de pacientes com TNE. CgA é uma glicoproteína presente
nos grânulos secretórios das células de TNE e portanto está associada à massa tumoral e atividade secretória do tumor. Em contrapartida, seu uso está associado a várias limitações. Não existe um
padrão internacional para o kit de dosagem e, portanto, os resultados da literatura não podem ser interpretados diretamente para
nossa prática clínica20.
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Subnotificação é empecilho para diagnóstico precoce de TNE
Especialista informa que, em média, metade dos casos é identificada de cinco a oito anos
após o início da doença
Por Viviane Gomes
C
ONFORME SALIENTADO PELO DOUTOR COSTA EM SEU ARTIGO, A FALTA
DE DIAGNÓSTICO REPRESENTA UM EMPECILHO PARA O INÍCIO DO TRA-
TAMENTO DE TNE. DESSA FORMA, AS PRINCIPAIS DIFICULDADES PARA
sua detecção precoce são a lenta progressão do tumor e os sintomas
genéricos.
“É difícil identificá-lo porque o médico não pensa nesse tipo de
câncer na hora do diagnóstico. Em média, metade dos casos é diagnosticada de cinco a oito anos após o início da doença. É ruim porque
o paciente acha que é um problema corriqueiro”, relata o doutor Costa.
Na opinião do doutor Riad Naim Younes, coordenador cirúrgico
do Centro Oncológico do Hospital Beneficência Portuguesa e atual
presidente da Sociedade Latino-Americana de Tumores Neuroendócrinos (LANETS), a doença ainda é pouco explorada pela comunidade médica, apesar de a neoplasia ser mais frequente que outras
mais familiares: “Essa doença é pouco estudada. Infelizmente esse
tipo de câncer ainda é considerado raro entre os médicos, apesar de
ser mais frequente que linfoma, câncer de esôfago, de pâncreas e
outros tumores”1.
Doutor Younes esclarece que o TNE é potencialmente tratável e
curável e possui tratamento terapêutico bastante eficaz. Ele informa
que de 70 a 120 mil pacientes diagnosticados vivem com a doença
controlada1.
Falta conhecimento
A oncologista Anelisa Coutinho, coordenadora do Departamento de
Tumores Gastrointestinais da Clínica de Assistência Multidisciplinar em
Oncologia (AMO), na Bahia, também reforça que a falta de conhecimento sobre a doença é um fator limitante e crucial para o tratamento
precoce: “A recomendação para médicos especialistas e não especialistas
é que se lembrem da existência do TNE diante de alguns sintomas, que
podem ser confundidos com outros problemas de saúde”.
Para a doutora Anelisa, episódios de diarreia crônica sem causa
aparente, acompanhados ou não de vermelhidão na face, por exemplo,
deveriam ser considerados sugestivos de um eventual quadro de TNE.
Ela também aconselha que azia e sintomas gástricos devem ser avaliados com endoscopia digestiva alta.
“São queixas muito frequentes, que podem não ser valorizadas. Ao
se lembrar do TNE, poderá chegar ao diagnóstico e encaminhar o caso
ao oncologista clínico”, ressalta a doutora Anelisa.
26
novembro/dezembro 2014 Onco&
Visando ao melhor cuidado do paciente, o ideal é que o oncologista clínico atue com equipe multidisciplinar: “O olhar dos médicos
especialistas promove múltiplas discussões, o que é muito produtivo,
pois amplia o entendimento e favorece a melhor decisão final”, justifica
a médica.
Outro entrave para o diagnóstico precoce de TNE é a ausência de
métodos de rastreamento efetivos, já que a doença é pouco frequente
e pode se manifestar em diferentes órgãos. Tal situação não é observada
para neoplasias mais clássicas, como próstata e mama, cujos exames
específicos permitem o diagnóstico precoce.
Dia Mundial do Tumor Neuroendócrino
Para alertar a comunidade médica, em 10 de novembro é celebrado
o Dia Mundial do Tumor Neuroendócrino. A base da campanha de
conscientização é ressaltar a importância do diagnóstico precoce, com
o slogan “se não suspeitar, não irá diagnosticar”.
O esclarecimento do tema é uma das missões do Grupo Brasileiro
de Tumores Gastrointestinais (GTG), fundado em 2010. O GTG integra especialistas em tumores gastrointestinais. Possui cerca de 100
associados de diferentes especialidades, como oncologistas, gastroenterologistas, proctologistas e cirurgiões oncológicos. Entre as ações do
grupo, destaque para a realização de conferências pela internet
(webmeetings) e a integração de seus membros em consensos médicos
e treinamentos internacionais. Para 2015, o grupo objetiva iniciar
projetos de pesquisa. Consulte o conteúdo científico do TNE no site
www.gtg.org.br.
Há quase dois anos também foi criada a LANETS, para manter médicos alinhados sobre os protocolos de diagnóstico e prevenção da
doença, assim como sua patogênese. A organização, presidida pelo
doutor Younes, atua em sincronia com a equivalente europeia (ENETS)
e a norte-americana (NANETS). O principal objetivo da LANETS é
desenvolver estudos relacionados à doença e seu tratamento e disseminá-los na América Latina.
“Inauguramos centros de referência em TNE no México, Chile e
38 unidades no Brasil. Em 2015, está previsto o primeiro congresso
de tumor neuroendócrino da América Latina”, antecipa o doutor
Younes. De acordo com as recomendações da LANETS, os centros de
referência brasileiros pretendem desenvolver ações que informem médicos e público leigo sobre os principais aspectos dessa doença.
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cuidados paliativos
Abordagens precoces minimizam
sofrimento físico e emocional
P
OR DEFINIÇÃO, CUIDADOS PALIATIVOS SÃO UMA
ABORDAGEM QUE MELHORA A QUALIDADE DE VIDA
Divulgação
DOS PACIENTES E FAMILIARES QUE ENFRENTAM
Sandra Caíres Serrano
*Pediatra, neuropediatra, clínica
de dor e cuidados paliativos;
médica titular e responsável
pelo Serviço de Cuidados
Paliativos do Departamento de Dor,
Neurocirurgia Funcional e
Cuidados Paliativos do Hospital
A.C. Camargo Cancer Center;
mestre em ciências da saúde, com
área de concentração em oncologia
– Fundação Antônio Prudente
Contato:
[email protected]
28
problemas associados com doenças ameaçadoras da
vida, através da prevenção e alívio do sofrimento
por meio de identificação precoce, avaliação impecável e tratamento da dor e outros problemas físicos, psicossociais e espirituais1. O termo “paliativo”
deriva do latim paliare (atenuar) e faz referência ao
manto de lã usado pelos pastores e peregrinos como
proteção contra as intempéries do ambiente2.
Apesar da clara definição dos cuidados paliativos pela Organização Mundial de Saúde (OMS), sua
importância no cuidado global ao paciente ainda é
subestimada por profissionais de saúde e pelo público em geral. Muitas pessoas ainda relacionam a
filosofia dos cuidados paliativos a cuidados de últimos dias de vida ou como sinônimo de “não fazer
nada”. Ao contrário, os cuidados paliativos são cuidados ativos que devem ser iniciados precocemente,
assim que diagnosticadas doenças ameaçadoras da
vida, como traz sua própria definição.
Os cuidados paliativos de qualidade se baseiam
em quatro pilares: a boa comunicação, o controle
adequado dos sintomas, ações para alívio do sofrimento e apoio à família no processo de morte e
posteriormente durante o luto. Os princípios fundamentais1 dos cuidados paliativos são:
- Promover o alívio da dor e de outros sintomas angustiantes;
- Reafirmar a vida e ver a morte como um processo
natural;
- Não pretender antecipar ou postergar a morte;
- Integrar aspectos psicossociais e espirituais do cuidado;
- Oferecer um sistema de apoio para ajudar os pacientes a viver tão ativamente quanto possível até
a morte;
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- Oferecer um sistema de apoio e abordagem de
equipe para identificar necessidades clínicas e psicossociais da família e do paciente, incluindo suporte ao luto, se indicado;
- Melhorar a qualidade de vida e também influenciar positivamente o curso da doença;
- Ser aplicável no início do curso da doença, em
conjunto com outras terapias que visam prolongar
a vida, como quimioterapia ou radioterapia;
- Incluir as investigações necessárias para melhor
compreender e gerir as complicações clínicas angustiantes.
O paciente deve estabelecer seus objetivos e
prioridades, e exercer sua autonomia de decisão.
Ações efetivas para prevenção do sofrimento, através de medidas preventivas, curativas ou reabilitadoras, incluindo ações intervencionistas (como, por
exemplo, para controle de dor ou de dispneia), são
essenciais. A fase final de vida é um período importante que exige esforços para alívio do sofrimento
físico e psíquico, mas é também um período em
que pacientes e familiares podem necessitar de auxílio para suas questões pessoais e existenciais. É
importante respeitar o limite que a doença impõe
às pessoas. À equipe de saúde cabe uma dupla responsabilidade: zelar pela vida e aliviar o sofrimento,
evitando ao máximo a realização de medidas agressivas que tragam sofrimento desnecessário ao paciente. No Brasil, os pacientes têm garantido seu
direito de inclusive recusar tratamentos médicos3.
Boa comunicação auxilia na eficácia
da abordagem
É importante desenvolver uma boa comunicação que permita conhecer o paciente, identificar
suas preocupações e conversar (caso seja seu desejo) sobre sua doença, formas para controlar seus
sintomas e apoio às necessidades que influenciem
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seu bem-estar. A falta de informação sobre o tratamento e a evolução
da doença geram ansiedade para o paciente e seus familiares e criam
expectativas que frustram todo o processo do cuidado4. Em algum momento, os pacientes com doenças crônicas e progressivas percebem
que têm que aprender a conviver com sua doença e com as limitações
decorrentes dela. Esses pacientes e seus familiares precisam de informações sobre a doença, gravidade, sintomas e possibilidades de controle. Dados sobre prognóstico estimado que permita refletir suas
escolhas e estabelecer um mínimo planejamento sobre suas vidas são
uma necessidade comum que não pode ser negligenciada5. Estudo de
Wong e col6 com 144 pacientes com câncer identificou que suas principais preocupações foram obter informações sobre o controle da dor,
fraqueza, fadiga e em como ter acesso aos cuidados paliativos.
Outro fator relevante é compreender quais são o significado e os
efeitos que a dor e outros sintomas causam, e qual seu impacto sobre o
paciente e sua estrutura familiar. O desconhecimento da causa do sintoma e a crença de que tal sofrimento não possa ser aliviado ou de que
a presença do sintoma é uma ameaça imediata à vida podem aumentar
a intensidade do sintoma e levar o paciente ao desespero. Por outro
lado, uma parte dos pacientes é capaz de minimizar suas queixas e negar
sua dor por medo de que isso possa significar progressão da doença.
A comunicação de más notícias é sempre um desafio dentro do
contexto do cuidar, especialmente em situações em que não existe um
vínculo de confiança construído. Estudos sobre comunicação mostram
que as notícias são mais bem recebidas se apresentadas de forma simples e concisa, e se transmitidas através de contato pessoal que demonstre apoio e cuidado que contraste com a frieza dos fatos.
Profissionais devem desenvolver habilidades específicas
A forma de revelar a verdade é sempre uma questão importante.
De forma geral, prevalece a estratégia da “verdade lenta e suportável”
em se tratando de cuidados paliativos. Revelar a verdade de forma
gradual, respondendo apenas o que o paciente pergunta, contribui
para que se elaborem estratégias de enfrentamento. É importante que
todos os profissionais de saúde envolvidos no cuidado desenvolvam
habilidades da boa comunicação, respeitando o desejo do paciente.
Compreender que pacientes com doença avançada se esforçam por
conservar a esperança diante de uma situação de vida cada vez mais
difícil e que nem todos pensam da mesma forma em relação às informações que desejam receber sobre sua doença, tratamento e prognós-
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“Priorizar o que
é essencial ao
paciente, estabelecer objetivos reais
e enfatizar oportunidades para que
o paciente exerça
sua autonomia de
decisão contribuem
para o alívio do
sofrimento”
30
tico faz parte do cuidado e respeito às pessoas7.
Muitas vezes, os profissionais de saúde temem
falar sobre a morte com seus pacientes, por motivos
que variam entre autoproteção, desconforto em
conversar sobre a morte ou simplesmente medo da
reação do paciente ou de seus familiares8. Estar disponível e preparado para falar sobre a morte é importante em cuidados paliativos, já que muitos
pacientes desejam se preparar para o processo de
morte, o que inclui decisões e escolhas pessoais que
trazem repercussões familiares.
Muitos estudos relacionam o bem-estar espiritual com a saúde física e psicológica, e isso adquire
especial importância na doença crônica. A espiritualidade traz uma importante contribuição a todo
contexto de cuidado e não pode ser negligenciada
pela equipe de saúde9,10,11.
O sofrimento é uma dimensão fundamental da
condição humana e uma presença frequente na
doença e em especial na terminalidade. Diversas
causas estão relacionadas ao sofrimento, entre as
quais destacamos o mau controle de sintomas, situações psicossociais inadequadas (como falta de
intimidade, companhia ou solidão indesejada),
pensamentos negativos ou estado de ânimo deprimido ou angustiado. O alívio do sofrimento é um
imperativo ético, mas não é possível atenuar uma
angústia mental sem o alívio de sintomas físicos. O
paciente tem várias questões pessoais e familiares
para resolver. A doença e o sofrimento passam a
ocupar aspectos centrais de sua vida. O tratamento
da depressão é importante também porque a
doença, ao potencializar a aflição da morte, impede
que os pacientes adotem uma abordagem mais ativa
e satisfatória no processo de enfrentamento da sua
realidade. Priorizar o que é essencial ao paciente,
estabelecer objetivos reais e enfatizar oportunidades
para que o paciente exerça sua autonomia de decisão contribuem para o alívio do sofrimento.
Outro ponto fundamental para a aderência ao
tratamento e o melhor controle dos sintomas é estabelecer uma boa relação com pacientes e familiares. O apoio à família é um tema básico em
cuidados paliativos, já que paciente e família constituem a unidade do tratamento: o que ocorre a um
influencia ambos. O apoio à família inclui que ela
participe dos cuidados ao paciente caso isso seja desejado. A participação nos cuidados do doente permite aos familiares expressar afeto e reduzir
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sentimentos de culpa, o que facilita o processo de
luto12,13,14. Familiares e cuidadores necessitam de
informação de qualidade, apoio psicológico e suporte físico e econômico, motivos pelos quais as figuras do psicólogo e do assistente social assumem
grande importância, contribuindo para a melhora
da qualidade de vida e aumentando significativamente a satisfação das famílias15.
Critérios para definição de
pacientes terminais
A doença terminal pode ser definida como a
doença avançada, progressiva e incurável, sem aparentes e razoáveis possibilidades de resposta ao tratamento específico, com presença de numerosos
problemas ou sintomas intensos, múltiplos, multifatoriais e mutáveis, que traz grande impacto emocional ao paciente, à família e à equipe de cuidado,
muito relacionada com a presença, explícita ou não,
da morte, e com prognóstico de vida inferior a seis
meses. Essas características podem estar presentes
no câncer e também, em maior ou menor intensidade, nas fases finais de insuficiências orgânicas específicas (renal, cardíaca, hepática, pulmonar etc.)
ou na aids. Sem dúvida, o fator prognóstico é o que
gera mais dúvida ao incluir um paciente dentro de
uma situação de terminalidade. Nos pacientes não
oncológicos, a dificuldade em estabelecer o prognóstico é mais difícil, uma vez que exacerbações
clínicas consideradas em princípio situações potencialmente reversíveis ou curáveis nem sempre respondem ao tratamento, podendo levar à morte “não
esperada”. Os cuidados de “últimos dias de vida”
exigem atenção especial à deterioração progressiva
do estado físico e psíquico (fraqueza intensa, diminuição do nível de consciência, presença frequente
de síndrome confusional e dificuldade para ingestão
de alimentos e medicamentos e para comunicação)
e a sintomas físicos, psíquicos, espirituais e emocionais16. Além disso, a necessidade de suporte e
acolhimento às necessidades físicas, emocionais, sociais e espirituais dos familiares e amigos envolvidos
nesse delicado momento do cuidado não pode ser
negligenciada.
Em 2012, a International Association for Hospice and Palliative Care (IAHPC) preparou um resumo das evidências disponíveis para apoiar o
desenvolvimento de uma lista de medicamentos essenciais em cuidados paliativos, com o objetivo de
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garantir o acesso universal a medicamentos adequados para o tratamento farmacológico dos sintomas mais prevalentes e angustiantes em
pacientes adultos com doenças ameaçadoras da vida em todo o
mundo17. O grupo de trabalho da IAHPC utilizou como metodologia
a identificação das causas mais comuns de morte, a identificação dos
sintomas mais comuns e angustiantes em cuidados paliativos e a identificação dos medicamentos recomendados para o controle dos sintomas. Devido à dificuldade na implementação de estudos prospectivos
de alta qualidade em controle de sintomas, utilizando instrumentos
validados em pacientes em cuidados paliativos, poucos estudos foram
identificados com alto nível de qualidade. A maioria das evidências
disponíveis de sintomas prevalentes e angustiantes é composta de revisão de casos retrospectivos, opinião de especialistas e relato de casos.
Após a análise das evidências disponíveis, 11 sintomas foram identificados como prioridade: anorexia, ansiedade, constipação intestinal,
delirium, depressão, diarreia, dispneia, dor, fadiga, náusea e vômitos
e secreções do trato respiratório. Assim, 15 medicamentos foram identificados como essenciais para o tratamento desses sintomas. Essas diretrizes, desenvolvidas pela IAHPC e corroboradas pela Organização
Mundial de Saúde (OMS), encontram-se disponíveis para consulta pública no portal da OMS e devem ser conhecidas por todos os profissionais e gestores que atuam na área de saúde18.
Para reflexão
Os esforços da OMS foram e ainda hoje são cruciais para o desenvolvimento e a disponibilidade dos cuidados paliativos no mundo.
Ter acesso a cuidados paliativos adequados é direito de toda pessoa.
A equipe de saúde que assiste o paciente deve conhecer e respeitar a
Referências bibliográficas:
1. WHO. National cancer control programs, policies and managerial guidelines. 2nd ed.
Geneva: World Health Organization; 2002.
2. Santos FS. Cuidados paliativos: diretrizes, humanização e alívio de sintomas. São Paulo: Atheneu; 2011. O desenvolvimento histórico dos cuidados paliativos e a filosofia hospice; p.4-5.
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Brasília, 13 de outubro de 2009, Seção I, p.173.
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5. Correia FR, De Carlo MMRP. Avaliação de qualidade de vida no contexto dos cuidados
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6. Wong RK, Franssen E, Szumacher E, Connolly R, Evans M, Page B, Chow E, Hayter
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cancer and their care want to know. A needs assessment. Support Care Cancer 2002;
10:408-15.
7. Querido AI, Dixe MA. A Esperança e qualidade de vida dos doentes em cuidados paliativos [periódico on line]. Int J Dev Educational Psychol 2010; 613-22. Disponível em:
<URL: https://iconline.ipleiria.pt/bitstream/10400.8/417/1/A%20esperan%c3%a7a%20
qualidade%20de%20vida%20dos%20doentes%20em%20cuidados%20paliativos.pdf>
[2013 jun 20].
8. Otani H, Morita T, Esaki T, Ariyama H, Tsukasa K, Oshima A, Shiraisi K. Burden on
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at peace?”:one item to probe spiritual concerns at the end of life. Arch Intern Med 2006;
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10. Pessini L. Distanásia: algumas reflexões bioéticas a partir da realidade brasileira.
Bioética 2004a; 12:39-60.
32
novembro/dezembro 2014 Onco&
autonomia de decisão do paciente, além de suas prioridades e desejos
em relação às intervenções terapêuticas presentes e futuras.
Os cuidados paliativos devem ser oferecidos em conjunto com os
cuidados curativos como complemento do tratamento integral à pessoa, agregando qualidade de vida, conforto e segurança ao paciente
e à sua família, e deixar de ser vistos como concorrentes do cuidado:
ou curativo ou paliativo. Essa exclusão não existe nem na definição
dos cuidados paliativos nem em sua abrangência, mas se perpetua
no pensamento [imaginário] de muitas pessoas, leigas ou não, como
fruto do desconhecimento.
Infelizmente, a formação mínima em cuidados paliativos é ainda
uma rara exceção na graduação das áreas de saúde, apesar de representar
a mais remota tradição e filosofia do cuidar. Muitos profissionais de
saúde não são (e não foram) formalmente treinados para lidar com o
manejo de sintomas, incluindo estratégias não farmacológicas, comunicação, tanatologia, luto e bioética, e se sentem perdidos ao se defrontar
com essa realidade.
Uma abordagem global, pensando no paciente como um ser biográfico, complexo em seus desejos e pretensões, no atendimento personalizado para alívio do sofrimento de qualquer natureza e no
acolhimento familiar, garante qualidade de vida e re-significa a vida e
até a morte, assim fazendo valer a filosofia dos cuidados paliativos19,20.
Ao contrário do que muitos pensam, cuidados paliativos não são
sinônimo de cuidados de fim de vida. Os cuidados paliativos devem
ser instituídos o mais precocemente possível, evitando sofrimento desnecessário aos pacientes e familiares. Um exemplo disso é a importância crescente que os cuidados paliativos perinatais vêm assumindo
dentro dos cuidados paliativos pediátricos.
11. Pessini L. A filosofia dos cuidados paliativos: uma resposta diante da obstinação
terapêutica. Mundo Saúde 2004b; 27:15-32.
12. Levin DN, Cleeland CS, Dar R. Public attitudes toward cancer pain. Cancer 1985;
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14. Steinhauser KE, Clipp EC, McNeilly M, Christakis NA, McIntyre LM, Tulsky JA. In
search of a good death: observations of patients, family and providers. Ann Intern Med
2000; 132:825-32.
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16. Astudillo W, Mendinueta C, Orbegozo A. Nuevos criterios para la actuación sanitaria
en la terminalidad. In: Astudillo W, Morales A, Clave E, Cabarcos A, Urdaneta E, editors.
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17. International Association for Hospice and palliative Care. IAHPC List of Essential
Practices in Palliative Care. Houston: IAHPC Press, 2012. Avaliable from: <URL:http://
www.hospicecare.com> [2013 jun 20].
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<URL: http://www.hospicecare.com > [2013 jun 20].
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carcinoma epidermoide de cabeça e pescoço: análise retrospectiva dos potenciais indicadores de cuidados nas últimas quatro semanas de vida de pacientes falecidos em um hospital oncológico terciário. São Paulo, 2012.
20. Lotz JD, Jox RJ, Borasio GD, Führer M. Pediatric advance care planning: a
systematic review. Pediatrics. 2013 Mar;131(3):e873-80. doi: 10.1542/ peds.2012-2394.
Epub 2013 Feb 11.
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políticas públicas
União de esforços
Iniciativa inédita no Brasil reúne entidades para montar
uma pauta única de reivindicações ao poder público
Por Gabriel Ferreira
Q
UEM ESTÁ ACOSTUMADO A LIDAR COM O TRATA-
MENTO DO CÂNCER SABE BEM O TAMANHO DOS
Divulgação
DESAFIOS ENFRENTADOS NO BRASIL. DE UM
lado, o governo, que, preocupado com os custos e
com as dificuldades de gestão inerentes a um país
com dimensões continentais, não consegue dar
conta de necessidades básicas dos pacientes, como
um atendimento mais veloz e infraestrutura para o
tratamento. De outro lado, médicos, pacientes, familiares e todos os demais envolvidos no dia a dia
da doença lutam por melhores condições de combate ao câncer.
Abertura do evento Todos Juntos Contra o Câncer com palestra de Merula Steagal
34
novembro/dezembro 2014 Onco&
Ao longo da história, esse último grupo se organizou em uma série de associações buscando assumir um papel importante no debate das políticas
públicas. Apesar de terem muitos interesses em
comum, as associações e ONGs criadas para defender os interesses dos pacientes de câncer quase
nunca adotaram medidas conjuntas. Na prática,
elas se uniam apenas em algumas batalhas específicas e continuavam levando aos governos de plantão suas demandas de forma separada, difusa, o que
reduzia em muito a eficácia da pressão exercida.
A partir de agora, porém, esse quadro deve começar a mudar. No fim de setembro foi realizado,
em São Paulo, o primeiro congresso do Todos Juntos Contra o Câncer, uma iniciativa que, como o
próprio nome diz, pretende se firmar como um espaço de união entre todos os atores que desempenham algum papel no combate aos mais diversos
tipos de câncer. A expectativa é que, com essa união
de esforços, o assunto entre finalmente para o centro do debate público e passe a receber dos governos a atenção necessária, com a inclusão da
prevenção, do diagnóstico e do tratamento do câncer entre as reais prioridades da saúde pública no
Brasil. “Hoje não temos nenhum sinal claro de que
o paciente com câncer receba a atenção que merece
por parte dos órgãos públicos”, diz Maira Caleffi,
mastologista e presidente da Federação Brasileira
de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da
Mama (Femama), uma das entidades que apoiaram
a realização do evento.
Maira Caleffi
A ideia do Todos Juntos Contra o Câncer surgiu
de conversas que Merula Steagall, presidente da
Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia (Abrale),
teve com alguns representantes da sociedade civil
para entender por que os projetos voltados à educação recebiam muito mais atenção e recursos das
empresas do que aqueles voltados à saúde. “Achei
que era hora de fazermos alguma coisa para colocar
em evidência todas as associações e ONGs que
atuam nessa área”, afirma Merula. O projeto inicial
se restringia à criação de um site que serviria como
uma espécie de vitrine para o trabalho das mais diversas entidades de apoio aos pacientes com câncer.
“Era para ser um ‘cardápio de projetos’, para quem
estivesse interessado em apoiar alguma organização
da área.”
Nas conversas que teve para viabilizar a criação
da página virtual, porém, Merula foi apresentada ao
projeto Todos Pela Educação, uma iniciativa que
reúne associações, educadores e grandes empresários, como Jorge Gerdau, da Gerdau, Luis Norberto
Pascoal, da D Paschoal, e Milú Villela, do Itaú, em
torno do debate pela melhora da qualidade do ensino. Lançado em 2006, o Todos Juntos Pela Educação já conseguiu vitórias importantes para a área,
como a aprovação do Plano Nacional de Educação,
que estabelece um conjunto de 20 metas a serem
cumpridas pelos três níveis do poder público. “Vi
que o modelo desenhado por eles era muito pare-
cido com o que já fazíamos na Abrale, então o que
precisávamos era apenas ampliar”, diz Merula.
A partir dessa ideia, a equipe da Abrale iniciou
um movimento de articulação para reunir o maior
número possível de entidades em torno do projeto
do Todos Juntos Contra o Câncer. “Apresentamos
a ideia de união ao Ministério da Saúde, que achou
muito boa a possibilidade de ter alguém que unificasse a pauta, ao invés de ter que buscar a interlocução com inúmeras entidades”, afirma Merula. O
primeiro resultado dessa união pôde ser visto no
congresso ocorrido em São Paulo. “Por causa da
disponibilidade de espaço, tivemos muito pouco
tempo para organizar tudo, mas mesmo assim excedemos a quantidade de apoio que esperávamos.”
O objetivo inicial era reunir 50 organizações em
torno do evento, fosse se responsabilizando por
algum dos painéis, expondo suas iniciativas em estandes ou dando apoio institucional. Ao final, participaram do congresso 107 entidades, que se
aglutinaram em torno da ideia ao longo dos cinco
meses que se passaram entre a primeira reunião
sobre o projeto e a realização do evento.
Divulgação
Divulgação
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A rede social Amar
a Vida foi criada
para ser uma plataforma de troca de
experiências e
informações entre
médicos, pacientes,
familiares e demais
profissionais de
saúde que atuem na
área de oncologia
Merula Steagall
Tamanha mobilização possibilitou que o primeiro congresso do Todos Juntos Contra o Câncer
Onco& novembro/dezembro 2014
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Próximos passos
A partir das discussões realizadas nas 25 plenárias do congresso, a
organização do Todos Juntos Contra o Câncer irá preparar um documento com uma série de reivindicações e pedidos a serem apresentados ao poder público. “Com esse documento em mãos, teremos que
buscar apoio de parceiros importantes, como parlamentares, o Ministério Público e as Defensorias Públicas, para cobrar a execução dessas
medidas”, diz a doutora Maira Caleffi. “Temos que aproveitar que tivemos uma oportunidade única de ver o assunto por diversos ângulos,
ao conseguir reunir pacientes, médicos, indústria e vários outros atores. Isso resultará em um documento bastante amplo.”
Para Merula, é justamente essa pluralidade que garantirá o sucesso
dos próximos passos do Todos Juntos Contra o Câncer. “As instituições envolvidas têm poucos recursos para entrar nessa luta sozinhas,
então temos que aproveitar o que cada uma delas tem de melhor e
potencializar os resultados.” Assim que ficar pronto, o documento
deve ser levado à próxima reunião do Conselho Nacional de Saúde
com o pedido de que o Ministério da Saúde se posicione sobre as demandas e contribuições resultantes dos debates realizados no congresso. “É muito importante quando instituições descobrem formas
de se posicionar em debates tão importantes como esse”, afirma o
cientista político Leandro Machado, sócio da Cause Agência de Advocacy, consultoria especializada no apoio a organizações que atuam
na defesa de alguma causa.
Uma versão resumida do documento também será disponibilizada
a todos os inscritos no congresso, que contou com a participação de
centenas de pessoas de todas as regiões do Brasil. A continuidade das
discussões iniciadas ao longo do evento também pode ser acompanhada pela rede social Amar a Vida, criada para ser uma plataforma
de troca de experiências e informações entre médicos, pacientes, familiares e demais profissionais de saúde que atuem na área de oncologia. O endereço é www.amaravida.com.br.
O que é advocacy?
Iniciativas como o Todos Juntos Contra o Câncer são conhecidas como ações de advocacy. Mas
o que isso significa na prática? Mais conhecido nos Estados Unidos e em partes da Europa, o advocacy é uma prática política organizada para pressionar o poder público na formulação de políticas
e na divisão de recursos de forma mais adequada aos interesses daquele grupo.
As ações de advocacy normalmente envolvem uma série de ferramentas, que vão desde a abordagem direta de políticos e técnicos do governo até a realização de campanhas públicas e ações na
mídia. “É preciso que essas ações sejam muito bem estruturadas, com metas e objetivos claros, para
que seja seguido o caminho mais eficiente para a obtenção dos resultados desejados”, afirma Leandro
Machado, sócio da Cause Agência de Advocacy.
Apesar de ser um nome ainda pouco difundido no país, a prática do advocacy não é uma novidade no Brasil, principalmente na área de saúde. Entre as conquistas já realizadas por meio desse
tipo de ação estão a Lei dos 60 Dias e a inclusão das quimioterapias orais no rol de medicamentos
da Agência Nacional de Saúde Suplementar.
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novembro/dezembro 2014 Onco&
Foto: Marcos Suguio
trouxesse ao debate uma série de assuntos fundamentais para que o
combate a essa doença, enfim, evolua no Brasil. “Ainda temos muitos
gargalos a enfrentar, desde o diagnóstico até o tratamento”, afirma a
doutora Maira Caleffi, da Femama. Durante o evento, a Femama foi
responsável pela organização de uma mesa sobre o papel das ONGs
no controle social e na qualificação de informações ao Legislativo. O
painel trouxe exemplos de experiências bem-sucedidas de projetos
aprovados a partir de pressões realizadas por entidades da sociedade
civil, como a Lei dos 60 Dias, que garantiu aos pacientes com câncer
o direito de ter seu tratamento iniciado no máximo dois meses após a
realização do diagnóstico. “É fundamental não só a pressão para que
se aprovem essas leis, como a vigilância constante, para garantir que a
legislação seja aplicada de forma correta”, diz Maira, lembrando que a
regulamentação inicial da lei trouxe um retrocesso, ao dizer que o
prazo dos 60 dias só começaria a contar após a inclusão do diagnóstico
no Sistema de Informações do Câncer (Siscan), cuja implementação
ainda enfrenta uma série de dificuldades. “Ficamos atentos e conseguimos reestabelecer o texto original da lei.”
Outras discussões realizadas ao longo dos dois dias de congresso
trouxeram ao centro do debate assuntos como os caminhos para o
acesso a novas terapias, a utilização de incentivos fiscais na área de
saúde, os mitos e verdades relacionados à pesquisa clínica no país e os
desafios gerados pelo grande aumento de demandas judiciais na área
de saúde. Os diversos painéis contaram com a participação de médicos, pacientes, profissionais de saúde de áreas diversas, advogados,
membros do Judiciário e jornalistas, que apresentaram suas visões
sobre os assuntos e os possíveis encaminhamentos para que se avance
na prevenção, diagnóstico e tratamento das neoplasias e das doenças
onco-hematológicas. “Nos preocupamos que todas as salas apresentassem um histórico da situação até o momento atual e depois abrissem
o debate para discutir os caminhos que devem ser tomados a partir de
agora”, afirma Merula Steagall.
Leandro Machado
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do bem
Apoio psicológico como
suporte do tratamento clínico
Atendimento a paciente com câncer nos principais centros de
referência do país busca melhorar a adesão ao tratamento e
ajudar nos mecanismos de enfrentamento da doença
Por Regiane de Oliveira
A
DESCOBERTA DE UM DIAGNÓSTICO DE CÂNCER MUDA COMPLETAMENTE
A ROTINA DE UMA PESSOA. MEDOS, INCERTEZAS QUANTO A PROJETOS
de VIDA, ANGÚSTIAS, TRANSFORMAÇÃO DA IMAGEM QUE SE TEM DE
si mesmo são apenas algumas das reações possíveis. Afinal, assim como
se sabe que não existe um câncer igual a outro, a vivência da doença
é também algo muito singular. E o apoio psicológico se tornou um
grande aliado no tratamento multidisciplinar humanizado para aliviar
o sofrimento de doentes e familiares.
“Nós nos aproximamos do paciente em um momento de muita
vulnerabilidade e trabalhamos em um tempo diferente do tempo do
hospital”, conta Mônica Marchese, psicóloga do Instituto Nacional de
Câncer (Inca), que há 16 anos trabalha com saúde pública. Enquanto
o tratamento do câncer é feito de protocolos, horários regrados, consultas, exames, o atendimento psicológico atua com o tempo do paciente. “É o que chamamos de urgência subjetiva. Temos que estar
disponíveis para escutar e estar presentes diante do sofrimento.”
Unir o tempo do paciente ao do hospital é um desafio tremendo
para as instituições de saúde que atuam no tratamento do câncer. O
Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp) resolveu essa questão de uma forma inovadora, com suporte psicológico 24 horas. “Trabalhamos com um modelo de ligação, com 30 psicólogos de referência
atuando em todas as unidades do hospital – UTI, internação, químio,
rádio, ambulatório, pronto-socorro –, sempre em uma relação estreita
com a equipe multidisciplinar. Sabemos que o paciente tem demanda
24 horas, ele não descompensa só durante o dia”, afirma Lórgio Henrique Diaz Rodriguez, psicólogo do Icesp.
No Inca, cada unidade de atendimento conta com um psicólogo
de referência. O processo de aproximação desses pacientes segue um
padrão já comum aos hospitais públicos e privados. No momento da
internação ou atendimento ambulatorial, o paciente é informado sobre
o atendimento multidisciplinar, que inclui o apoio psicológico. Os próprios pacientes e/ou familiares podem solicitar a visita do psicólogo,
mas geralmente são os médicos que identificam a necessidade e acabam pedindo o apoio de um psicólogo.
Ainda há muitos mitos em relação ao papel desse profissional no
tratamento do câncer. “Muitos acreditam que estamos ali para fazer alguém parar de chorar, por exemplo. Mas não é nossa função tirar a
emoção, deixar alguém feliz em um momento triste. Estamos ali para
ajudar os pacientes a encontrar ferramentas para usar nos momentos
de tristeza, como a fé, por exemplo”, conta Mônica.
Ana Merzel Kernkraut, coordenadora do Serviço de Psicologia do
Hospital Israelita Albert Einstein, afirma que o psicólogo trabalha com
um momento único na vida da pessoa, que é a descoberta de um câncer. “Ainda temos bastante medo, preconceito contra a doença, e saber
que você terá que lidar com um tratamento agressivo, que chega sem
hora e data marcada, exige uma reorganização tanto do ponto de vista
das questões práticas – trabalho, filhos, rotina – quanto das questões
emocionais – como se posicionar diante desse novo mundo, como
lidar com a situação, consigo mesmo, com familiares, amigos. São muitos os questionamentos.”
Elena Lerner, psicanalista da Oncologistas Associados, clínica do
Grupo Oncologia D’Or, concorda. Segundo ela, o trabalho do psicólogo é acolher no momento de fragilidade, e não rotular a tristeza de
depressão. “Ajudamos os pacientes a fazer os lutos necessários pelo
adoecimento e pelas perdas dele advindas. Não raro acompanhamos
importantes ganhos a partir dos balanços de vida que se fazem e do
sentimento de urgência que a ameaça do câncer desperta.”
Há 23 anos atuando na área oncológica, Elena afirma que no começo foi muito duro atuar com pacientes com câncer. “Ficava muito
abalada pela gravidade da doença e pela dramaticidade frequentemente
presente no cotidiano dos atendimentos. Mas o campo de trabalho é
muito rico, diversificado e gratificante”, lembra. Ela ressalta que o psicólogo não recebe os pacientes com um roteiro de perguntas ou com
etapas preestabelecidas a serem cumpridas, mais comuns no atendimento médico. “Oferecemos uma escuta em que privilegiamos a singularidade. Trabalha-se o que provoca sofrimento, o que está sendo
difícil para cada um”, explica.
Elena conta que, inicialmente, é frequente os pacientes falarem do
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Mônica Marchese
Sabemos que falta
recurso. A gente
sempre acha que
está aquém da
demanda, mas hoje
é uma prerrogativa
na saúde pública
ter um atendimento integral e
multidisciplinar.
Estamos sempre
correndo atrás
do prejuízo
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impacto do diagnóstico, do medo dos tratamentos,
de suas ideias e fantasias em relação à origem do
câncer, das incertezas quanto à cura. Também se
questiona o estigma do câncer como doença terminal e se aposta na potência do desejo de viver, estimulando-se a articipação ativa no tratamento.
Na Oncologistas Associados do Grupo D’Or são
oferecidas oito sessões (que em alguns casos se
estendem a 12) para pacientes e/ou familiares. “Já
tivemos grupos semanais, que não vêm sendo oferecidos por falta de demanda”, afirma Elena.
Há também o Conte Conosco, um grupo de compartilhamento de experiências, que tem um
encontro mensal. São oferecidos cerca de 90 atendimentos/mês.
Mas é engano pensar que o atendimento psicológico acaba sendo compulsório. “Não há nenhum
tipo de protocolo do tipo ‘todos os pacientes têm
que passar pela psicóloga’”, afirma Elena. “O profissional de psicologia integra a equipe por acreditarmos que é parte importante do tratamento dar
chance ao paciente de falar. Consideramos este um
recurso poderoso, na contramão das cobranças de
que ‘tem que pensar positivo senão morre’. Mas é
fundamental que seja uma escolha do paciente.”
Christina Haas Tarabay, psicóloga oncologista
do Departamento de Psicologia/Psiquiatria do
A.C.Camargo Cancer Center, lembra, inclusive, que
não são todos os pacientes que precisam de apoio
psicológico, mas o diferencial de quem recebe o suporte é poder entender o significado da doença na
vida dele. “O diagnóstico modifica a vida do paciente, da família, é preciso alguém para conversar,
para ver além dos aspectos físicos e buscar estratégias de enfrentamento para uma cirurgia mutiladora
ou um tratamento de quimioterapia em que sua
imagem é alterada, por exemplo”, afirma.
A resistência ao atendimento psicológico ainda
é uma barreira, mas essa realidade vem mudando,
garante Christina. “No passado, era só falar em
apoio psicológico para ouvir que a pessoa não era
louca. A aceitação hoje é boa. As pessoas se dão
conta de que o câncer pode trazer uma sobrecarga
psíquica importante e que poder dividir e se sentir
mais fortalecido é relevante para o tratamento.”
De acordo com Ana Kernkraut, do Einstein,
quando o apoio psicológico é bem indicado pelos
médicos, familiares ou demais profissionais, a recepção do paciente é muito boa. “Mas mesmo
novembro/dezembro 2014 Onco&
assim, há quem sinta que naquele momento não há
necessidade, e temos que respeitar o limite.” É o paciente que vai escolher se quer falar ou não. Afinal,
como concordam os profissionais da área, o atendimento psicológico não é para 100% dos pacientes, pois não é todo mundo que demanda um
trabalho terapêutico. Mas a demanda maior fez com
que o Einstein reforçasse a equipe nos últimos quatro anos. “Dobramos o número de profissionais.
Hoje somos quatro psicólogos atendendo os pacientes.” No caso de transplantes de medula óssea,
o protocolo de atendimento pede que a avaliação
do paciente seja feita desde o começo. “Temos que
saber quais instrumentos de enfrentamento o paciente tem”, explica Ana.
De acordo com Yana Novis, diretora de Hematologia e Transplante de Medula Óssea do Hospital
Sírio-Libanês, hoje em dia não é possível dissociar
a psicologia do tratamento multidisciplinar. “O
apoio psicológico está bem definido e estruturado
em vários países, especialmente na Europa e nos
Estados Unidos. É praticamente uma rotina. E é
imprescindível tanto para os familiares quanto para
os pacientes, pois estamos falando de um momento
de muito estresse, conflitos, angústias e medos”,
afirma. No Sírio, a primeira avaliação é feita sempre
pelo médico, que pode chamar ou não o psicólogo
para uma visita. “Mas a aceitação depende do paciente”, lembra Yana. Para os casos de transplante
de medula óssea, além do apoio aos pacientes, as
famílias podem contar com uma reunião semanal
com o psicólogo na sala de acompanhantes.
Foco na equipe
No Hospital do Câncer de Barretos (HCB), em
São Paulo, além do apoio psicológico aos pacientes
e familiares, a instituição foca no atendimento aos
colaboradores. “A área de saúde é muito estressante,
por lidar diariamente com a questão da morte. O
que oferecemos aos colaboradores não é psicoterapia, é amparo”, afirma Joel Carlos Morais Junior,
psicólogo no HCB, que há 11 anos atua na área oncológica. Toda sexta-feira, a equipe de psicólogos
atende, por agendamento, os profissionais da instituição. O programa faz sucesso. Segundo Joel, a
agenda está sempre lotada. “A próxima vaga é para
daqui a um mês”, lembra.
O Icesp também contratou um psicanalista que
trabalha só com os colaboradores, em sessões em
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grupo ou individuais. E a equipe de psicólogos está sempre a postos
realizando acolhimento dos colaboradores que ficam fragilizados com
a situação dos pacientes. “Não entramos em problemas pessoais, só
aspectos inerentes ao que acontece no dia a dia do trabalho”, explica
Lórgio Rodriguez, do Icesp.
O HCB conta com 11 profissionais atendendo em suas três unidades.
O encaminhamento para o atendimento psicológico pode ser feito por
qualquer membro da equipe ou mesmo por solicitação do paciente. Joel
Carlos acredita que, além de contribuir para o bem-estar do paciente, a
melhora na adesão do tratamento é grande nos pacientes que contam
com apoio psicológico. “Fazemos também um papel de intermediário,
porque às vezes, na frente do médico, o paciente tem dificuldade em
entender tudo o que está acontecendo e nos traz as dúvidas.”
Infelizmente, Joel Carlos afirma que não é possível atender a todas
as solicitações, pois a demanda é grande e a equipe é reduzida. E essa
realidade é comum em todos os hospitais. No Inca, Monica Marchese
explica que trabalhar com a rede de atenção básica tem sido uma saída
para atender a um maior número de pessoas. “Recebemos pacientes de
várias cidades e locais do país. Muitos moram longe do Inca para poder
comparecer com frequência para o atendimento psicológico.” Os profissionais entram em contato com a rede básica e fazem o agendamento
para o local mais próximo do paciente. Se isso dá certo todas as vezes?
Mônica diz que não é 100% garantido. “Sabemos que falta recurso. A
gente sempre acha que está aquém da demanda, mas hoje é uma prerrogativa na saúde pública ter um atendimento integral e multidisciplinar. Estamos sempre correndo atrás do prejuízo. Mas o que escuto dos
pacientes do Inca é que aqui o atendimento é de Primeiro Mundo.”
Iniciativas
O Icesp tem a estrutura mais semelhante com a que defende Cristina Volker, presidente da Sbrapo. O instituto conta com uma série de
iniciativas para melhor acolher os pacientes. São ações como a do
Grupo Acolhida, que recebe pacientes e acompanhantes antes da primeira consulta médica. Lórgio Rodriguez, psicólogo do Icesp, explica
que o objetivo é minimizar o impacto psicológico da chegada e o início
do tratamento, bem como fornecer orientações sobre os profissionais,
serviços e os tratamentos, esclarecendo possíveis dúvidas, ansiedades,
fantasias e temores diante da situação vivenciada. “Hoje não conseguimos atender todo mundo, afinal são 900 mil pacientes por mês, mas
temos projetos de ampliar o grupo.”
Atualmente, o Icesp conta com 30 profissionais na área de psicologia hospitalar. Até setembro deste ano, a equipe da psicologia atendeu, na internação, 21,3 mil pacientes e 39,7 mil acompanhantes. No
ambulatório, foram 9,7 mil pacientes e 4,4 mil acompanhantes.
A área de psicologia hospitalar do Icesp é responsável por uma
série de programas que visam ajudar a minimizar a dor de pacientes e
acompanhantes, como o Programa Visita Humanizada na UTI, que faz
a preparação psicológica e o acompanhamento dos familiares ao leito
do paciente na UTI, e o Programa Cuidados Especiais ao Óbito, que
tem apoio de toda a equipe multidisciplinar, para oferecer os cuidados
necessários aos pacientes e seus acompanhantes em pré e pós-óbito.
“O foco é oferecer suporte emocional, afetivo e psíquico em situação
de crise/caos com o fechamento do ciclo da doença, momento em que
a família sofre o maior impacto emocional de todo o processo do adoecer do ente querido”, afirma Lórgio.
Os novos caminhos da psico-oncologia
O aumento na incidência do câncer tem feito com que mais estudantes passem a se interessar pela psico-oncologia. Mas os cursos de graduação
precisam se atualizar. Segundo Christina Haas Tarabay, psicóloga oncologista do Departamento de Psicologia/Psiquiatria do A.C.Camargo Cancer
Center, os estudantes chegam com muitas interrogações. “Eles têm uma ideia do que é a psicologia hospitalar, que lida com diversos tipos de
pacientes e patologias, mas não sabem nada sobre psico-oncologia, que lida o tempo todo com câncer.”
Lórgio Henrique Diaz Rodriguez, psicólogo do Icesp, concorda que a experiência do hospital é bastante diferente da prática a que os alunos de
graduação estão acostumados. “A graduação do psicólogo ainda é focada no formato de consultório. Aqui no Icesp, atendemos nos corredores, ao
ar livre, na UTI. A ‘sessão’ pode ser de 5 minutos no ambulatório, como pode ser de 3 horas. O paciente faz o tempo da terapia”, explica.
Christina explica que é importante que os profissionais de psicologia tenham um forte suporte teórico e entendam sobre os diversos tipos de
tumor e tratamento, pois o paciente chega bem informado. O psico-oncologista tem que saber o que uma químio pode causar, por exemplo, para
entender o que paciente está falando, pois é isso que cria uma confiança maior.”
A formação em psico-oncologia foi o tema da IV Jornada Franco-Brasileira de Psicologia Oncológica, que aconteceu em outubro no Rio de
Janeiro, dentro do VII Congresso Franco-Brasileiro de Oncologia. De acordo com Cristina Volker, presidente da Sociedade Brasileira de Psicologia
Oncológica (Sbrapo), há uma preocupação com a qualificação e a deficiência no número de psicólogos dentro de instituições. “Há um reconhecimento
maior do papel do psicólogo na equipe multidisciplinar de atendimento ao paciente com câncer, especialmente porque está se desmistificando a
ideia de câncer como sinônimo de morte. Temos, sim, muita qualidade em nosso atendimento no Brasil, mas infelizmente temos um número insuficiente de profissionais.”
Cristina acredita que o maior gargalo está nas faculdades, uma vez que não existe ainda a disciplina psico-oncologia nos cursos de graduação
de psicologia. O reflexo disso é o número insuficiente de profissionais capacitados. Cristina, que há 31 anos atua na área hospitalar sempre com
doenças crônicas, defende que, em uma estrutura ideal, a visita ao psicólogo deveria ser feita logo após o diagnóstico. “Ao abrir o prontuário, o paciente seria encaminhado a um psicólogo para ver o quanto está entendendo em relação ao que está passando, e quais seus mecanismos de defesa
e enfrentamento, entre outros aspectos.” Essa interconsulta ajudaria o médico a saber o perfil do paciente, o que facilita na comunicação e no atendimento. “Infelizmente, tanto no Sistema Único de Saúde quanto na rede privada não temos esse tipo de serviço.”
Onco& novembro/dezembro 2014
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curtas
Fórum debateu o tema “Advocacy
em Saúde”
Com o objetivo de engajar sociedades médicas, parlamentares e
jornalistas, fomentando a discussão sobre a prática do advocacy, foi
realizado, em setembro, o Fórum Debate sobre Advocacy em Saúde,
na cidade de Gramado (RS). Com uma programação totalmente voltada ao cenário brasileiro das doenças onco-hematológicas, a iniciativa teve como intuito promover a discussão em torno do tema, engajar sociedades médicas, profissionais de saúde, parlamentares e
associações de pacientes na luta pela construção do acesso. O Fórum
aconteceu em meio à 9ª edição do Câncer de Mama Gramado –
2014, um dos eventos mais tradicionais do país a discutir as temáticas relacionadas ao câncer.
Para Carlos Barrios, diretor executivo do Latin American Cooperative Oncology Group (LACOG) e diretor do Instituto de Oncologia Mãe de Deus, de Porto Alegre (RS), o importante é engajar
diferentes públicos na defesa dos direitos dos pacientes onco-hematológicos. “A prática do advocacy visa o bem comum. É imprescindível que todos conheçam seu real objetivo, pois é dessa forma que
a sociedade civil e os portadores de doenças irão se beneficiar de
políticas públicas adequadas e que atendam às necessidades que,
hoje, não são contempladas pelo sistema vigente.”
No Brasil, há dois anos aproximadamente, duas importantes
conquistas nesse quesito foram frutos de estratégia da prática de
advocacy: a aprovação da Lei dos 60 Dias (12.732/12), que dá ao
paciente com câncer o direito de ser tratado em até 60 dias após o
diagnóstico da doença, e a lista dos 37 medicamentos orais de combate ao câncer inseridos no rol da Agência Nacional de Saúde (ANS).
Livro Mamãe Tá Careca
aborda o câncer pelo
universo da criança
O Outubro Rosa, como ficou conhecido o movimento popular que começou nos Estados Unidos, ganha
novos adeptos a cada ano, e tem como objetivo alertar a
população para a realidade atual da doença e a importância do diagnóstico precoce.
O câncer de mama é o que mais acomete mulheres
em todo o mundo. Mas como abordar um assunto tão
delicado com as crianças? O lançamento da Editora FTD
Mamãe Tá Careca, de Juliana Vermelho Martins, pode ser
um bom começo. No livro, que a autora decidiu escrever
depois de ter enfrentado a doença, a jovem mãe Mônica
é diagnosticada com câncer de mama, ainda no início da
manifestação da doença.
Para se proteger do medo da doença e da morte, o
filho Leonardo, de 9 anos, cria um mundo de fantasia
onde seus heróis de brinquedo nem sempre vencem a
luta contra o mal. Após a cirurgia de remoção do nódulo,
Mônica enfrenta a quimioterapia. Cheia de incertezas,
mas mantendo a esperança, encara com coragem esse doloroso momento de sua vida e ainda consegue ajudar os
filhos pequenos a compreender a situação e enfrentar o
medo da morte.
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novembro/dezembro 2014 Onco&
OP2471C-0914
A atuação fisioterapêutica na doença ocorre no pré e pós-cirúrgico, durante o tratamento radioterápico e nas reconstruções mamárias.
A cirurgia da retirada do câncer pode trazer algumas complicações, como dor, limitação de movimento do braço operado, alteração
postural, retração da cicatriz, perda de sensibilidade do lado afetado, rigidez dos vasos linfáticos e linfedema. Segundo Maíra Oshiro,
fisioterapeuta especializada em saúde da mulher do Centro de Qualidade de Vida (CQV), os exercícios com o membro afetado são
muito importantes para restaurar os movimentos do ombro e do cotovelo e prevenir perda de massa muscular. “Os objetivos da fisioterapia no câncer de mama são prevenir aderência cicatricial, que pode limitar a amplitude de movimento do braço, prevenir edema
pós-cirúrgico e proporcionar amplitude de movimento articular do ombro homolateral à cirurgia”, diz. Já no caso de linfedema, o tratamento é feito com o que chamamos de Terapia Física Complexa (TFC), que são exercícios para os braços, drenagem linfática manual
e cuidados com a pele.
O tratamento restaura os movimentos e funções comprometidos, minimiza o quadro de dor e incapacidades para que não ocorram
instalação de deformidades e progressão de sintomas. O objetivo essencial da fisioterapia nas reconstruções mamárias é evitar complicações como aderência da prótese e restabelecer o retorno precoce das atividades da vida diária.
Novembro/2014
Fisioterapia auxilia no pós-operatório no câncer de mama
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País recebe especialistas
internacionais em câncer de mama
O Brasil recebeu, por ocasião do Outubro Rosa, os pesquisadores
do Breast International Group (BIG), um dos principais grupos de pesquisa em câncer de mama do mundo: Fabrice André, professor do Instituto Gustave Roussy, na França, e Martine Piccart-Gebhart, professora
da Université Libre e diretora do departamento de Medicina do Instituto
Jules Bordet, na Bélgica. Os especialistas participaram do lançamento
do relatório BIG Retreat Meeting Latin America, que aborda a situação
da pesquisa clínica na América Latina como forma de evitar a possível
epidemia de câncer na região.
As principais barreiras para o desenvolvimento da pesquisa clínica
na América Latina incluem a falta de estrutura nas organizações nacionais ou regionais dedicadas a pesquisas sobre o câncer, um número limitado de pessoas qualificadas e especializadas, a falta de reconhecimento público da importância da pesquisa clínica, obstáculos legais e
regulatórios em alguns países e, criticamente, a falta de financiamento
para apoiar investigações.
O relatório BIG Retreat Meeting Latin America (www.bigagainstbreastcancer.org) aborda a situação atual da pesquisa clínica em câncer
na América Latina, os esforços em curso para a organização de redes
nacionais e regionais entre agências de pesquisa, as barreiras significativas para o desenvolvimento dos estudos clínicos (como o atraso dos
processos regulatórios no Brasil e a falta de investimentos) e, ainda, propõe sugestões práticas para superar os problemas e fazer progressos
substanciais para o futuro.
O Grupo Acreditar Oncologia
– Unidade Santa Marta
Empresa do Grupo Oncologia D’Or, acaba de se tornar a primeira clínica de oncologia do Brasil a receber
o selo de certificação internacional da JCI - Joint
Commission International de acordo com os padrões no
Manual de Cuidados Ambulatoriais. A JCI é uma
organização não-governamental e o mais respeitado
órgão certificador das organizações de saúde do mundo.
O selo atesta a qualidade e a segurança de todos os processos envolvidos no atendimento ao paciente e qualifica a unidade Santa Marta entre outras instituições de
referência mundial.
Onco& novembro/dezembro 2014
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curtas esmo
Divulgação
ESMO reúne 20 mil médicos para discutir avanços na oncologia
Segundo maior evento da oncologia clínica mundial, a reunião anual da Sociedade Europeia de Oncologia Médica (ESMO) foi realizada entre 26 e 30 de
setembro, em Madri. O tema do encontro deste ano foi “Medicina personalizada
no tratamento de câncer”. Quase 20 mil oncologistas, radiologistas, hematologistas
e demais interessados no tratamento das neoplasias discutiram avanços que devem
ter impacto na prática clínica ao longo dos próximos anos. “Estamos muito felizes
de ver os resultados de estudos
muitos importantes, que vão ter um
impacto direto na forma como os
pacientes serão tratados muito em breve”, afirmou o professor Johann de Bono,
presidente da comissão científica do congresso. “Temos estudos muito promissores
referentes aos mais diversos tipos de câncer, como tumores de pulmão e de mama,
além dos melanomas.”
Nesta página de Onco& você confere alguns dos principais destaques apresentados ao longo da ESMO 2014.
Divulgação
Pesquisa de vacina para câncer de pulmão decepciona
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A possibilidade de desenvolver uma vacina para o combate dos tumores de
pulmão parece ter ficado mais distante após a apresentação dos resultados do
estudo de fase III MAGRIT no ESMO 2014. “Os resultados desse estudo foram
decepcionantes, particularmente no caso de câncer não pequenas células”, afirmou o doutor Martin Reck, oncologista-chefe do Departamento de Oncologia
Torácica do Hospital Grosshansdorf, na Alemanha. A opinião de Reck, porém,
não é unanimidade. O principal autor do estudo, o professor Johan F. Vansteenkiste, acredita que ainda é possível testar outros caminhos. “A vacina usada no
MAGRIT pode trazer benefícios se for combinada com inibidores de checkpoint,
que revertam a habilidade do tumor de paralisar o sistema imune. Novas versões
da vacina também podem funcionar melhor”, disse Vansteenkiste.
As quimioterapias adjuvantes para pacientes operados de câncer de pulmão são hoje consideradas o tratamento padrão, apesar
de as taxas de cura permanecerem relativamente baixas – em torno de 45% – e de o tratamento ser pouco tolerado por pessoas
que passaram por uma cirurgia no pulmão. O estudo MAGRIT surgiu como uma forma de buscar uma alternativa de tratamento
adjuvante para esses casos. Os pesquisadores passaram a investigar a proteína MAGE-A3, presente em um terço dos tumores de
pulmão. Estudos haviam apontado bons resultados no uso dessa proteína no tratamento de melanoma metastático.
Para o estudo MAGRIT, 2.272 pacientes foram randomizados para o recebimento da vacina de MAGE-A3 ou placebo. “Infelizmente o tratamento com MAGE-A3 não trouxe ganhos de sobrevida livre de doença comparado com o placebo”, afirmou o
professor Vansteenkiste. “Agora, nós precisamos voltar ao laboratório para entender melhor os mecanismos de ação.” Segundo
ele, o estudo trouxe boas notícias, como o fato de reforçar a ideia de que as vacinas são muito bem toleradas pelos pacientes, com
efeitos colaterais moderados.
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Divulgação
Resultados do CLEOPATRA apontam para novo padrão
A apresentação dos resultados do estudo CLEOPATRA durante a reunião anual
da ESMO trouxe mudanças significativas para a prática clínica, segundo o doutor
Giuseppe Curigliano, diretor da Divisão de Terapias Experimentais de Milão. “Agora
nós temos um padrão para o cuidado de pacientes com câncer de mama HER-2
positivo metastático”, afirmou o médico italiano, que se referia à combinação de
pertuzumabe e trastuzumabe com quimioterapia.
Segundo ele, um dos dados mais impressionantes da pesquisa foi o de sobrevida
global. O estudo apontou que as pacientes tiveram uma sobrevida média de 56,5
meses. No padrão de tratamento anterior, apenas com trastuzumabe, esse índice
era menor em 15 meses.
Também durante a reunião da ESMO, o estudo NeoSphere mostrou resultados
positivos para essa mesma combinação de drogas no tratamento neoadjuvante de
pacientes com câncer de mama HER-2 positivo. O potencial para o tratamento
adjuvante vem sendo medido pelo estudo APHINITY, ainda em andamento.
Para Curigliano, a abordagem proposta por esses estudos pode mudar os padrões não apenas no tratamento do câncer de mama. “A ideia de utilizar dois anticorpos monoclonais pode ser explorada não
somente nesse tipo de câncer, mas em todos os tipos de tumores sólidos”, afirmou o médico durante a conferência.
Estudo mostra importância do rastreamento para câncer colorretal
A introdução da prática bienal de rastreamento para câncer colorretal na região de Côte-d’Or, na França, aumentou em 89%
a detecção de adenomas com alto risco de se converterem em tumores. Os resultados foram apresentados no Congresso da ESMO,
em Madri. Os pesquisadores, comandados por Vanessa Cottet, do centro de pesquisas francês INSERM Unité 866, compararam
dados do levantamento com informações sobre o diagnóstico de adenomas desde 1976.
O estudo incluiu todos os moradores da região com idade entre 50 e 74 anos que tiveram um primeiro adenoma detectado
entre janeiro de 1997 e dezembro de 2008. Os pesquisadores apontaram que 38,7% dessas pessoas tinham adenomas de alto
risco – com características como tamanho superior a 1 centímetro de diâmetro ou alto grau de displasia.
Para esse grupo, as taxas de diagnóstico eram de 136 a cada 100 mil pessoas antes do programa de rastreamento. Após a experiência, a taxa subiu para 257 a cada 100 mil pessoas. No caso dos pacientes que apresentavam adenomas de menor risco, a
taxa de diagnóstico saltou de 235 para 392 a cada 100 mil pessoas.
Segundo os pesquisadores, os dados mostram a importância da realização do trabalho de rastreamento em massa para diminuir
as taxas de tumores colorretais. “A população deve seguir a recomendação de participar das campanhas de detecção precoce. As
taxas de participação são o maior fator de sucesso nesses programas”, afirma Vanessa Cottet.
Agora, o desafio é determinar qual a melhor forma de rastreamento. “A grande questão é qual método é o mais apropriado
para maximizar a participação nesses programas, mantendo a eficácia e os custos sob controle”, afirmou o professor Hans-Joachim
Schmoll, da Martin Luther University, na Alemanha, que comentou os resultados do estudo.
Outro grupo de pesquisadores franceses, coordenados por Sylvain Manfredi, do CHU Pontchalillou, apontou que, no caso
das pessoas que pertencem aos grupos de maior risco de desenvolver câncer colorretal, o uso de testes de sangue oculto nas fezes
para os programas de rastreamento tende a ser mais eficiente do que a realização de colonoscopias.
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campanhas
Fique por dentro das ações sobre câncer que ganharam destaque na mídia e nas redes sociais
Conscientização sobre a saúde do homem
Fabio Rodrigues Pozzebom / Agência Brasil
A maior campanha do Brasil de conscientização sobre a saúde do homem
acontece ao longo de todo o mês de novembro. É o Novembro Azul, que busca
alertar sobre a importância do diagnóstico precoce do câncer de próstata,
doença que atinge um a cada seis homens. Idealizada pelo Instituto Lado a Lado
pela Vida e pela Sociedade Brasileira de Urologia, o Novembro Azul tem como
principal objetivo vencer o preconceito de muitos homens em realizar os exames
preventivos contra a doença. “Os homens são mais resistentes à ideia de ir regularmente ao médico e, por isso, acabam descobrindo a doença em estágio já avançado”, diz Marlene Oliveira, presidente do Instituto Lado a Lado pela Vida.
Neste ano, a campanha já recebeu o apoio de diversas instituições de peso,
como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e o Serviço Social da Indústria (SESI). Para representar o apoio à
causa, diversos prédios e monumentos vão ser iluminados com a cor azul. Entre
os locais que receberão a iluminação especial estão o Congresso Nacional e as sedes
do Banco do Brasil, em Brasília e em São Paulo, e o Cristo Redentor, no Rio.
Textos e vídeos para conscientizar sobre LLC
A leucemia linfoide crônica (LLC) é o tipo de leucemia mais comum em pessoas
acima de 50 anos. Mas médicos e pacientes enfrentam um grande desafio quanto
ao diagnóstico, já que a doença pode ser assintomática em muitos casos, além de
evoluir lentamente e de dar sinais que podem ser confundidos com outras doenças.
Pensando nas dificuldades relacionadas a essa doença, a Associação Brasileira
de Linfoma e Leucemia (Abrale) e a Associação Brasileira de Hematologia,
Hemoterapia e Terapia Celular (ABHH) resolveram criar uma campanha
para disseminar informações sobre esse tipo de câncer dos glóbulos brancos
e mobilizar a classe médica e os profissionais de saúde para a realização do
diagnóstico e o conhecimento das opções de tratamento, visando oferecer
alternativas mais eficientes aos pacientes.
Batizada de “LLC: Cada vida, uma história – um tipo de leucemia que
merece atenção”, a ação envolve divulgação de informações em redes sociais, vídeos explicativos sobre o funcionamento da doença, além de um
site com informações sobre os principais sintomas e as formas de diagnóstico e tratamento. Na área de depoimentos, pacientes contam como é conviver com a doença durante muitos anos.
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48-mundovirtual:Onco&04/11/1408:04Page48
mundo virtual
Onco& recomenda
Sites e aplicativos sobre oncologia voltados tanto para médicos, com novidades e informações
sobre a área, como para pacientes, com dicas de prevenção e assistência ao doente
Apoio na palma da mão
Aplicativos para tablets e smartphones que ajudam médicos a se manter sempre atualizados e no melhor
caminho para o diagnóstico e tratamento de seus pacientes
Atlas Câncer de Próstata
ICD 10
A farmacêutica Astellas lançou o aplicativo Atlas Câncer de Próstata, voltado para
médicos urologistas e oncologistas acostumados a lidar com esse tipo de tumor em sua
prática clínica. Com um banco de imagens em
alta qualidade, a ideia da aplicação é otimizar
a comunicação entre médico e paciente, além
de facilitar a preparação de apresentações.
Com ela é possível editar imagens e enviar
conteúdos por e-mail. O aplicativo está disponível gratuitamente para equipamentos com sistema iOS. Para
visualizar o conteúdo, porém, é necessário informar os dados de
acesso fornecidos por um representante do laboratório.
Este aplicativo, voltado para médicos de
todas as especialidades, reúne mais de 17,5
mil códigos da Classificação Internacional
de Doenças, o CID-10. Com ele, é possível
acessar o conteúdo mesmo estando desconectado da internet, além de encontrar facilmente as informações buscadas e enviar
por e-mail os artigos mais interessantes ou
importantes. Os desenvolvedores do aplicativo garantem a atualização sempre que qualquer um dos códigos
for modificado. Disponível para tablets e smartphones com sistema
Android, por R$ 2,46, e iOS, por US$ 4,99.
The Merck Manual
Epocrates
Esta é a versão móvel de um dos manuais
de medicina mais utilizados em todo o
mundo. Com a participação de mais de 300
colaboradores com experiência em todos os
campos da medicina, o aplicativo conta com
imagens, estudos de caso, um índice de sintomas que pode auxiliar nos diagnósticos,
além de uma série de ferramentas que facilitam a navegação, como a possibilidade de
salvar os tópicos mais importantes para voltar à leitura mais tarde.
A versão de testes está disponível gratuitamente na AppStore. As
versões completas estão disponíveis em sistema de assinatura com
pagamento de anuidade.
Este aplicativo reúne uma série de informações bastante utilizadas na prática diária
de médicos das mais diversas áreas. São
mais de 85 recursos, como informações de
interações medicamentosas de até 30 medicamentos simultâneos, dezenas de calculadoras médicas e acesso a notícias sobre as
novidades das maiores pesquisas clínicas em
desenvolvimento. A aplicação está disponível para tablets e smartphones que rodam os sistemas operacionais da Apple e do Google. A versão básica é gratuita, porém alguns recursos são liberados apenas mediante o pagamento de uma
taxa anual.
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novembro/dezembro 2014 Onco&
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acontece
Fique por dentro dos congressos, simpósios, encontros de atualização e outros tantos eventos
do mundo da oncologia. Confira aqui os principais eventos dos próximos meses
San Antonio Breast Cancer Symposium
Reunião Anual da ASH
Um dos eventos mais tradicionais sobre câncer de
mama em todo o mundo vai ter sua edição de 2014 realizada entre 9 e 13 de dezembro na cidade de San Antonio,
no estado americano do Texas. Com a expectativa de receber mais de 7,5 mil médicos de mais de 90 países, o
evento é tido como referência na área há quase 40 anos.
A ideia do simpósio é difundir para profissionais de todo
o mundo informações sobre prevenção, diagnóstico e
tratamento das doenças da mama. Outros detalhes podem
ser obtidos na página virtual www.sabcs.org.
Entre os dias 6 e 9 de dezembro será realizada em São
Francisco, na Califórnia, a 56ª Reunião Anual da Sociedade Americana de Hematologia (ASH). Maior congresso da área, o evento contará com a participação de
mais de 20 mil hematologistas, de todas as subespecialidades, e com a apresentação de mais de 3 mil levantamentos científicos, trazendo à comunidade o que há de mais
atual nas pesquisas clínicas relacionadas às doenças do
sangue. O programa científico e as informações sobre
inscrição e hotéis na região podem ser obtidos no site da
ASH (www.hematology.com).
SIM – Simpósio Interinstitucional de Mastologia
XXI Jornada Carioca de Urologia
Organizado pela rede de laboratórios de análises clínicas SalomãoZoppi Diagnósticos, este evento foi dividido
em três linhas de discussão, com debates entre os meses
de setembro e novembro. A última delas, vai acontecer em
20 de novembro, tratará do câncer de mama localmente
avançado. Anteriormente, o laboratório promoveu debates
sobre carcinoma ductal in situ e sobre o câncer de mama
inicial. O simpósio será realizado em São Paulo e conta
com vagas limitadas. Os interessados podem obter mais
informações pelo e-mail [email protected] ou pelo telefone (11) 5904-4541.
Entre 19 e 22 de novembro acontece no Rio de Janeiro
a 21ª edição da Jornada Carioca de Urologia. O evento,
que conta com a participação de importantes nomes nacionais e internacionais, tratará dos mais diversos temas
ligados ao dia a dia dos urologistas. Um dos destaques
será o workshop de uro-oncologia organizado em parceria
com a Universidade de Miami, que trará temas como
tratamento de tumores de bexiga de alto risco e manejo
do câncer de próstata localmente avançado. As informações detalhadas sobre programação e inscrições podem
ser conseguidas no site rvmais.com.br/jornada-carioca.
Onco& novembro/dezembro 2014
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calendário 2014
Evento
Data
Local
Informações
II Bienal Internacional de Oncologia
6 a 8 de novembro
São Paulo, SP
http://www.accamargo.org.br/eventos/
HEMO 2014
6 a 9 de novembro
Florianópolis, SC
www.abhh.org.br
1ª Jornada de Física Médica e do Programa
de Residência em Física Médica do Inca
7 e 8 de novembro
Rio de Janeiro, RJ
http://www.inca.gov.br/ie_eventos/
Meeting with Dana-Farber Experts –
II Congresso Oncologia D´Or
7 e 8 de novembro
Rio de Janeiro, RJ
http://rvmais.com.br/oncologia-dor/
III Simpósio de Oncologia de Precisão –
Foco em Mama
8 de novembro
São Paulo, SP
www.einstein.br/eventos
I Simpósio de Hemoterapia
11 de novembro
Rio de Janeiro, RJ
http://www.hupe.uerj.br/
XXI Jornada Carioca de Urologia
19 e 22 de novembro
Rio de Janeiro, RJ
rvmais.com.br/jornada-carioca
Câncer de mama localmente avançado
20 de novembro
São Paulo, SP
http://web.szd.com.br/site
/Reunioes-Cientificas-Eventos
XIII Semana Brasileira do Aparelho Digestivo
22 a 26 de novembro
Rio de Janeiro, RJ
http://www.sbad.org.br/
I Congresso Norte e Nordeste da Sociedade
Brasileira de Cirurgia Oncológica
28 e 29 de novembro
Fortaleza, CE
http://www.cnne-sbco2014.com.br/
Imersão em Oncologia Brasil-Itália –
Câncer de Cabeça e Pescoço
29 de novembro
São Paulo, SP
http://www.accamargo.org.br/eventos/
World Cancer Congress
3 a 6 de dezembro
Melbourne, Austrália
http://www.worldcancercongress.org/
I Simpósio Internacional de Medicina Integrativa
4 a 6 de dezembro
São Paulo, SP
www.einstein.br/eventos
XII Jornada Regional de Nutrição Oncológica
5 de dezembro
Florianópolis, SC
http://www.iepbp.com.br/
56th ASH Annual Meeting
6 a 9 de dezembro
São Francisco, EUA
www.hematology.org/
37th Annual San Antonio Breast
Cancer Symposium
9 a 13 de dezembro
San Antonio, EUA
www.sabcs.org/
Calendário de eventos de 2014 completo e atualizado:
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