LU Q < tr LL ¦LU cn o o 1 A Mãe: ontem e hoje Teatro HELENA SIMÕES /l A /% ¦ J .JL JL Mãe, peça didáctica de Bertoltßrecht (1898-1956), estreou em 1932 em Berlim, numa primeira versão cé- nica, a partir do romance homónimo de Máximo Gorki (1868-1936). A peça narra o percurso épico da transformação de Pelagea Vlassova, de viúva pobre, analfabeta e apolítica, numa militante bolchevique, alfabetizada, comprometida com o movimento revolucionário na Rússia czarista no início do século vinte. A mudança ideológica que acompanha o crescimento do movimento operário até à Revolução de 1917 tem a sua contrapartida social e política individual na consciencialização dos camponeses e operários. A peça, que estreou ainda durante a República de Weimar, tendo nela também participado operários, conheceu durante a vida de Brecht outras produções, a última na República Democrática Alemã já depois da segunda guerra mundial, em 1951. Como é usual em Brecht, a peça foi sendo reavaliada e adaptada às difee por esse rentes condições sócio-históricas, facto, acumulou várias versões, mas manteve, da preceptiva teórica da peça didáctica, o carácter pedagógico de aprendizagem através da realiza- ção das acções em palco. A mudança operava-se tanto no intérprete, que era o sujeito activo na concretização do novo método (dialéctico) de representação, como no espectador que, através da nova forma teatral (nomeadamente pela destruição da convenção de divisão palco/plateia), participava, por processo de análise crítica, nos pressupostos cénicos. Estes visavam a emancipaos dados ção dos espectadores fornecendo-lhes e os métodos para interferirem na resolução das questões colocadas. Em Portugal, A Mãe estreou no Teatro da Trindade em 1976, com encenação de Carlos Wallenstein e Arma Paula na protagonista. Em 1977, João Mota apresentou-a na Comuna com Manuela de Freitas no papel titular. Agora, a Companhia de Teatro de Almada traz ao grande palco do seu Teatro Municipal esta alegoria pela mão do seu director, o encenador Joaquim Benite, numa excelente tradução de Yvette K. Centeno e Teresa Balté. Com dezoito actores, conta ainda com um terceto musical (acordeão, trompete e percussão) que assegura a boa execução da difícil e belíssima partitura original de Hanns Eisler, bem dirigida por Fernando Fontes. Este é um dos elementos mais importantes do espectáculo, a assegurar a organização fragmentária da peça em catorze cenas; sintetiza de forma lúdica e rigorosa os conhecimentos adquiridos a cada passo, contribui indelevelmente para a vertente lírica da estética do teatro político, demonstra definitivamente o fundamental efeito V (de distanciação, ou estranhamento) como pilar da estrutura do teatro brechtiano. Benite deu aos actores também a função de cantores, integrando cena de forma orgânica e natural. os coros na Actores que, de forma geral, reagiram bem ao canto, com (Luís Madureira) individual e em grupo. Teresa Gafeira é, naturalmente, a Mãe, que por amor e sentido de protecção, inicia uma viagem que a levará a constituir-se como a Mãe da Revolução. O seu desempenho a um boa elocução tempo comprometido e crítico com a emoção ajuda a compreensão da obra. De realçar as boas contribuições de Marques d'Arede, numa delicada composição do discreto professor e intelectual céptico e de André Albuquerque, o filho que dialecticamente faz nascer a mãe: os vértices aprendizado. do triângulo desta parábola de Há, contudo, nesta produção, questões estilísticas de base, nomeadamente o cenário e os figurinos de época a gerirem as condições de exercício da fala e do canto, que afectam toda a organização estrutural do espectáculo e colidem com a essência não-naturalista ou antiilusionista do teatro brechtiano. Trazer para a cena a figuração de operários e camponeses do início do século vinte na Rússia de Nicolau 11, ou o retrato do czar, compromete o carácter abstracizante e os preceitos teóricos do teatro épico, a sugerirem a opção historicizante. Assim, chegamos à questão principal: qual a proposta de hoje para uma peça didáctica em 2010? Qual seria a ética (estética e poética) de representação que permitisse investigar (eventualmente solucionar) as novas questões? Ou apenas, como reconstruir nesta época de posmodernidade o materialismo brechtiano? A MAEde Bertolt Brecht, música Hanns Eisler, tra- • dução Yvette K. Centeno e Teresa Balté, encenação musical Fernando Fontes, Joaquim Benite, direcção cenário Jean-Guy Lecat, figurinos Sônia Benite e Ana Rita Fernandes, voz e elocução Luís Madureira, penteados Sanno de Perpessac, desenho de luz José Carlos Nascimento, com Teresa Gafeira, Alberto Carlos Gonçalves, Quaresma, André Albuquerque, Carlos Santos, Celestino Barbeiro, Trindade, Guerreiro, Silva, Daniel Fialho, Lauta Luzia Paramés, Manuel Mendonça, Mano Marques d'Arede, Miguel Martins, Paulo Paulo Matos, Pedro Walter, Sofia Correia, Teresa Mónica, e João Frade (acordeão), Cláudio Silva {trompete), Rudolfo Freitas (percussão). Teatro Municipal de Almada, de quarta a sábado às 21h30, domingo às lóhOO. Até 31 de Janeiro.