Via Láctea Paulo Roberto – www.laboratoriodopaulo.blogspot.com Uma galáxia é um grande sistema, gravitacionalmente ligado, que consiste de estrelas, remanescentes de estrelas (objetos compactos), um meio interestelar de gás e poeira e um importante componente apelidado de matéria escura. Arp 274 é um conjunto de três galáxias. Na imagem parece que elas vão se chocar, mas elas estão separadas por distâncias gigantescas. [Hubble, NASA] A palavra “galáxia” deriva do grego ‘’galaxias’’ (γαλαξίας), literalmente "leitoso", numa referência à nossa galáxia, a Via Láctea. Exemplos de galáxias variam desde as anãs, com até 10 milhões (107) de estrelas, até gigantes com 100 trilhões (1014) de estrelas, todas orbitando o centro de massa da galáxia. A galáxia da Via Láctea (Milky way) possui uma massa de 10^12 massas solares e um diâmetro da ordem de 100 mil anos-luz e estima-se que possua mais de 400 bilhões de estrelas. Alguns números apontam para 200 bilhões. A parte mais brilhante da Galáxia fica na direção da constelação de Sagitário, sendo melhor observável no Hemisfério Sul durante as noites de inverno, pois é nesse momento que se pode contemplar a porção central da galáxia. História do descobrimento da Via Láctea Os gregos cunharam o termo "galaxies kuklos", ou "círculo leitoso", como forma de descrever a Via Láctea. Ela era uma tênue faixa de luz, mas não se fazia ideia do que ela era composta. Quando Galileu estudou a Via Láctea com o primeiro telescópio, determinou que ela era composta de numerosas estrelas. [ in “O Mensageiro das Estrelas”, 1610]. No final do século XVIII, o astrônomo alemão William Herschel (1738-1822), que já era famoso por ter descoberto o planeta Urano, mapeou a Via Láctea e descobriu tratar-se de um sistema achatado. Segundo seu modelo, o Sol ocupava uma posição central na galáxia, mas hoje sabemos que essa conclusão estava errada. Mapa da Via Láctea de William Herschel História do descobrimento da Via Láctea Em 1755, o filósofo prussiano Immanuel Kant já tinha previsto a natureza da Via Láctea e a existência de outras galáxias: Ele deduziu corretamente que a Via Láctea é um grande disco de estrelas, que ele teorizou ter se formado de uma (muito maior) nuvem de gás girando. Ele também sugeriu a possibilidade que outras nebulosas também sejam discos de estrelas de tamanho similar. A primeira estimativa do tamanho da Via Láctea foi feita no início do século XX, pelo astrônomo holandês Jacobus Kapteyn (1851-1922). Em 1922, ele fez suposições mais realistas quanto às magnitudes absolutas e chegou num modelo da Via Láctea similar ao de Herschel, um esferóide achatado com densidade de estrelas diminuindo de acordo com a distância ao centro. O Universo de Kapteyn, as elipses são “superfícies de densidade estelar constante”. História do descobrimento da Via Láctea Harlow Shapley (1885-1972), estudando a distribuição de sistemas esféricos de estrelas chamados aglomerados globulares, determinou o verdadeiro tamanho da Via Láctea e a posição periférica do Sol nela. Shapley descobriu que os cúmulos globulares (150 deles), que formam um halo em volta na nossa galáxia, estavam concentrados em uma direção; nenhum deles era visto na direção oposta. História do descobrimento da Via Láctea Ele concluiu que o Sol não está no centro de nossa galáxia. Assumindo que o centro do halo formado pelos cúmulos globulares coincide com o centro de nossa galáxia, ele deduziu que estamos a 30 mil anos-luz do centro da Via Láctea, que está na direção da constelação do Sagitário. Este valor está superestimado, pois estamos a cerca de 23 000 anos-luz. Em 1924, Edwin Hubble usou um grande telescópio (com diâmetro de 100 polegadas) instalado em Mount Wilson, na Califórnia, e descobriu que as nebulosas em espiral tinham estruturas e estrelas, conhecidas como variáveis Cefeidas, semelhantes às da Via Láctea (essas estrelas mudam de brilho regularmente). Hubble usou as curvas de luz das variáveis Cefeidas para medir a distância entre elas e a Terra, e constatou que estavam muito mais longe que os limites conhecidos da Via Láctea. Portanto, essas nebulosas espirais eram de fato outras galáxias localizadas fora da nossa. Galáxias espirais As galáxias espirais são brilhantes e têm um pronunciado formato de disco, com gases quentes, poeira e estrelas brilhantes exibidos em seus braços espirais. Como as galáxias espirais são brilhantes, respondem pela maioria das galáxias visíveis, mas acredita-se que representem apenas 20% do total de galáxias do universo. A Via Láctea é uma galáxia espiral de grande porte. Messier 81. As galáxias espirais são subdivididas em algumas categorias. Espiral normal: forma de disco evidente, com centros brilhantes e braços espirais bem definidos. As galáxias Sa têm grandes bojos nucleares e braços espirais bem curvados; e as Sc têm pequenos bojos e braços espirais curvados apenas ligeiramente. Espiral barrada: um formato de disco evidente, com centro brilhante e alongado e braços espirais bem definidos. As galáxias SBa têm grandes bojos nucleares e braços de espiral bem curvados; e as SBc têm pequenos aglomerados bojos e braços ligeiramente curvados Via Láctea. Indícios obtidos recentemente apontam que a Via Láctea seja uma galáxia “SBc”. A olho nu, conseguimos observar três galáxias (vizinhas da Via Láctea): Andrômeda (M31), Grande Nuvem de Magalhães e Pequena Nuvem de Magalhães. M31 – Galáxia de Andrômeda. A galáxia mais próxima da Via Láctea é essa galáxia espiral. Estimativas apontam que nela existam mais de 1 trilhão de estrelas. Morfologia da Via Láctea Disco Galáctico: a maioria das 200 bilhões de estrelas da Via Láctea se localiza nele. O disco se divide nas seguintes partes: Núcleo: o centro do disco. Bojo: a área em torno do núcleo, incluindo as regiões imediatamente acima e abaixo do plano do disco. Braços espirais: estendem-se do centro para fora. Nosso sistema solar fica localizado em um dos braços de espiral da Via Láctea. Halo: uma região vasta e pouco iluminada que cerca toda a galáxia. Ela é composta de gases quentes e possivelmente de matéria escura. Todos esses componentes orbitam em torno do núcleo e a gravidade os mantêm unidos. Como a gravidade depende de massa, seria possível pensar que a maior parte da massa de uma galáxia fica no disco galáctico ou perto de sua porção central. No entanto, depois de estudar as curvas de rotação da Via Láctea e de outras galáxias, os astrônomos concluíram que a maior parte da massa fica nas porções exteriores da galáxia, como no halo, onde existe pouca luz das estrelas ou pouca luz refletida pelos gases. Estimativas: o massa do disco: 2 a 13% o massa do bojo: 1 a 6% o massa do halo: 81 a 97% Populações estelares Quais tipos de estrelas existem em cada parte da Via Láctea? Walter Baade (1893-1960), contemporâneo de Edwin Hubble no observatório de Mount Wilson, estudando a galáxia Andrômeda, notou que podia distinguir claramente as estrelas azuis nos braços espirais da galáxia, e propôs o termo População I para estas estrelas dos braços, e População II para as estrelas vermelhas visíveis no núcleo da galáxia. Atualmente, utilizamos essa nomenclatura mesmo para estrelas da nossa Galáxia e sabemos que as estrelas de População I são estrelas jovens, como o Sol, com menos de 7 bilhões de anos, ricas em metais, isto é, com conteúdo metálico (qualquer elemento acima do He) de cerca de 2%, enquanto que a População II corresponde a estrelas velhas, com cerca de 10 bilhões de anos, e pobres em metais, isto é, com menos de 1% em metais. Relação idade-metalicidade o Com o tempo, o meio interestelar é enriquecido de elementos pesados por estrelas que “morreram” (nebulosas planetárias, supernovas). o Deste meio enriquecido as novas estrelas se formam. o Novas gerações de estrelas são mais ricas em “metais“ que as anteriores. Aglomerados abertos Aglomerados globulares Aglomerados abertos (~2000) na maioria no disco Aglomerados globulares (~160) na maioria no halo O Disco Galáctico O disco é a parte mais visível da galáxia, e é nesta estrutura sobre a qual repousam os braços da Via Láctea; sua espessura equivale a 1/5 de seu diâmetro. Constituído pela população mais jovem de estrelas (chamada de população 1) de cor azulada, por nuvens de poeira, gás e por aglomerados estelares. As estrelas do disco, têm um movimento de translação em volta do núcleo. Todas as estrelas que observamos no céu noturno, estão localizadas no disco galáctico. ~7 kpc Bojo O bojo tem sua forma é esférica e é constituído principalmente por estrelas do tipo população 2 (estrelas velhas). Esta região da galáxia é rica em elementos pesados pesados. Também estão presentes aglomerados globulares. O bojo visto no infravermelho pelo COBE Núcleo (ou Centro) Galáctico o A parte mais difícil de observar da Via Láctea é o Centro, escondendo-se atrás de poeira valendo ~30 magnitudes de extinção no ótico, na constelação de Sagitário. o Melhor observável em comprimentos de ondas mais longas, λ > 1 μm o Observando na banda K, λ ~ 2.2 μm, dá pra ver um aglomerado denso de estrelas velhas. Núcleo (ou Centro) Galáctico • Nesta região, as estrelas orbitam algum centro de massa (chamado Sagitário A* (Sgr A*)) tão rapidamente que dá pra observar o movimento. • A estrela mais próxima do Centro Galáctico, S2, orbita Sgr A* em apenas 15.2 anos, chegando a 120 UA do Centro. Em comparação , plutão tem um afélio de 49 UA. • A única explicação que conhecemos para um objeto tão denso e escuro é um Buraco Negro Supermaciço, em contraste aos Buracos Negros Estelares formados na morte de uma estrela, de massas bem menores. • http://www.youtube.com/watch?v=opUkRkexw10 Braços Espirais Até 1953 não se conhecia a existência de braços espirais na Via Láctea, pois a visualização da das espirais era ocultada pela poeira interestelar e dificultada por ser feita do interior da própria galáxia. Até 2008 acreditava-se que possuía 4 braços, mas imagens reveladas pelo telescópio Spitzer revelaram que ela pode não ser exatamente assim. Braço de Perseu Braço de Norma Braço de Centauro (Cruz-Scutum) Carina-Sagittarius Braço de Órion Braços Espirais Robert Benjamin da Universidade de Wisconsin-Whitewater sugeriu que a Via Láctea possui apenas dois braços estelares principais: o braço Perseu e o braço Scutum-Centaurus. Os demais braços foram reclassificados como braços menores ou ramificações Halo O halo tem uma forma esférica e é constituída por partículas ultraexcitadas a alta temperatura, anãs vermelhas, anãs brancas e por aglomerados globulares, que estão em órbita em torno do centro de massa galáctica. O halo não é observável opticamente. As estrelas que formam os aglomerados globulares (de forma esférica) são as mais antigas da galáxia. Supõe-se que sua estrutura seja gigantesca. A sua massa gira entre 5 ou 10 maior do que a massa restante da galáxia. Sua forma, seus componentes e seus limites no espaço intergaláctico são desconhecidos até o início do século XXI, e muitas das afirmações acerca do halo são especulações científicas. Evolução das galáxias – Via Láctea As galáxias não agem sozinhas. A distância que as separa parece imensa, mas os diâmetros das galáxias são igualmente grandes. Comparadas às estrelas, as galáxias ficam relativamente perto uma das outras. Podem interagir e, o mais importante, colidir. Evolução das galáxias – Via Láctea Quando as galáxias colidem, elas na verdade se atravessam mutuamente - as estrelas que elas contêm não se chocam, devido às imensas distâncias interestelares. Mas as colisões tendem a distorcer a forma de uma galáxia. Colisão entre a NGC 4038 e a NGC 4039. Distribuição das galáxias próximas à Via Láctea As galáxias não se distribuem aleatoriamente pelo universo - tendem a existir em aglomerados galácticos. As galáxias nesses aglomerados se mantêm unidas pela gravitação e influenciam umas às outras. Aglomerados pobres - contêm menos de mil galáxias. A Via Láctea e a galáxia de Andrômeda (M31) são parte do Grupo Local, que contém algo entre 35 e 50 galáxias. Distribuição das galáxias próximas à Via Láctea O Grupo Local é o grupo de galáxias que inclui nossa Galáxia, a Via Láctea. O grupo tem o centro gravitacional localizado entre a Via Láctea e a galáxia de Andrômeda. As galáxias do Grupo Local cobrem uns 10 milhões de anos-luz de diâmetro e tem uma aparência binária. A massa total do grupo é estimado em 1,29 × 1012 massas solares. O próprio grupo é um dos muitos em todo o Superaglomerado de Virgem. Distribuição das galáxias próximas à Via Láctea Aglomerados ricos - contêm mil ou mais galáxias. O superaglomerado de Virgem, por exemplo, inclui mais de 2,5 mil galáxias e se localiza a cerca de 55 milhões de anos-luz da Terra. “Nossa galáxia, a Via Láctea, é apenas uma dentre bilhões de outras, sendo sua posição perfeitamente irrelevante. Nosso planeta não ocupa uma posição especial no sistema solar, nosso Sol não ocupa uma posição especial em nossa galáxia, e nossa galáxia não ocupa uma posição especial no Universo. O que temos de especial é a habilidade de nos maravilharmos com a beleza do cosmo.” [Marcelo Gleiser] Referências o Kepler de Souza Oliveira e Maria de Fátima, Astronomia e Astrofísica, in http://astro.if.ufrgs.br/index.htm o Pieter Westera, Noções de Astronomia e Cosmologia, in http://professor.ufabc.edu.br/~pieter.westera/Astro.html o José Roberto Costa, Astronomia no Zênite, Via Láctea, in http://www.zenite.nu/