plano de tese - DEHA/UFC - Universidade Federal do Ceará

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O CRISTALINO COMO MEIO AQUÍFERO NO ESTADO DO
CEARÁ
Ticiana Marinho de Carvalho Studart
Esnesto da Silva Pitombeira
Horst Frischkorn
Professores do Depto. de Enga Hidráulica e Ambiental
Universidade Federal do Ceará - Campus do Pici - Bloco 713
Caixa Postal 6018 - CEP: 60451-970 - Fortaleza-Ceará
INTRODUÇÃO
Apenas nas últimas duas décadas se começou a estudar uma outra
propriedade das rochas, além da estabilidade - sua capacidade de
armazenar e transmitir água (Pitombeira, 1994).
Tanto as rochas duras como os depósitos sedimentares não
consolidados podem conter água subterrânea. Na realidade, qualquer tipo
de rocha, seja ela sedimentar, ígnea ou metamórfica, desde que seja
suficientemente porosa e permeável, pode se constituir um aquífero.
Os depósitos sedimentares se originam a partir do intemperismo
ou meteorização que decompõe e desintegra rochas pré-existentes. Um
exemplo de rocha sedimentar é aquela que se origina a partir de
sedimentos arenosos ou argilosos, transportados e depositados em ambientes sub-aquáticos. Quando os depósitos de areia e argila são suficientemente espessos, a pressão exercida pelas camadas superiores sobre as
sotopostas tende a compactar a areia e a argila, reduzindo o seu volume.
A infiltração nos poros e aberturas entre os grãos de areia produz a
cimentação dos mesmos, tanto durante como após a compactação
(CETESB,1978). Deste modo, a areia é transformada em arenito e as
argilas em folhelhos argilosos.
As rochas ígneas são aquelas que se originam do resfriamento de
uma mistura de silicatos em fusão (magma), oriunda de profundidades
variáveis da crosta terrestre. O magma quando extravasa na superfície é
designado "lava" que, em virtude do resfriamento rápido, apresenta as-
pecto vítreo. As atividades vulcânicas produzem as rochas designadas
extrusivas ou vulcânicas. O basalto é um importante exemplo de rocha
extrusiva vulcânica, que, frequentemente, constitui-se em um bom
aquífero, devido a quantidade de fraturas e fendas que apresenta, além de
apresentar grande porcentagem de poros ou aberturas de tamanho
considerável, pelo escapamento dos gases (CETESB,1978).
Entretanto, quando o magma solidifica em profundidades
consideráveis, as rochas resultantes apresentam os minerais bem
desenvolvidos, em consequência do resfriamento lento. Essas rochas são
denominadas plutônicas ou intrusivas. Normalmente não são porosas, ou
apresentam um percentual muito pequeno de poros; o granito é um
exemplo.
As rochas metamórficas compreendem rochas ígneas e
sedimentares, bem com as próprias metamórficas alteradas em grandes
profundidades da crosta terrestre em virtude das enormes pressões e
altíssimas temperaturas, além da ação de fluidos quimicamente ativos
(CETESB,1978). Nessa condições, o arenito se transforma em quartzito;
os folhelhos argilosos dão lugar aos filitos e a micaxistos; o granito se
transforma em gnaisse ou migmatito
O cristalino, formado pelas rochas ígneas e metamórficas,
ocupa cerca de 95% do volume da crosta terrestre, entretanto, comporta
apenas 5% do total de água subterrânea do planeta (CETESB,1978),
devido à sua baixísima porosidade intergranular, da ordem de 3%, e
muito comumente, de 1% (Davis e DeWiest, 1966). Os poucos poros
existentes são muito pequenos e geralmente não interligados, resultando
em permeabilidades tão diminutas, que podem ser consideradas nulas em
muitos casos. Entretanto, a porosidade e a permeabilidade podem ser
sensivelmente incrementadas pelo intemperismo e fraturamento destas
rochas. Dentre os distúrbios superficiais mais importantes, estão os
desmoronamentos de rochas e o alívio de pressão devido a processos
erosivos de camada inferiores, que produzem depósitos locais de
fragmentos rochosos que podem se tornar importantes zonas de recargas
(Davis e DeWiest, 1966).
A porosidade média das rochas ígneas e metamórficas decrescem
rapidamente com a profundidade (Davis e DeWiest, 1966). Este
decréscimo está relacionado ao peso das camadas sobrejascentes e à
tendência destes distúrbios superficiais só serem sentidos a uma certa
profundidade do maciço rochoso. Juntas, falhas e outros fraturamentos
tendem a se fechar e a se distanciar com a profundidade, chegando a
inexistirem por completo após algumas centenas de metros (Davis e
DeWiest, 1966).
A ÁGUA SUBTERRÂNEA E O CRISTALINO CEARENSE
Inserido totalmente no “Polígono das Secas”, território oficial da
incidência de secas no Nordeste, no qual a aridez do solo, em maior ou
menor grau, é uma constante, o Estado do Ceará ocupa área de 148.016
2
km , cerca de 9,5% da área total do Nordeste, onde vivem cerca de 6,3
milhões de pessoas (Gondim Fo,1994). Segundo o Censo de 1991,
98,69% de sua população rural vive na área semi-árida do Estado
(Gondim Fo, 1994). A população urbana, pelo mesmo estudo,
corresponde a 65% da população total do Estado, tendendo a crescer para
82%, no ano 2.020, segundo projeções do Grupo de Recursos Humanos
do Projeto Áridas (1992).
A geologia do Estado, com rochas cristalinas aflorando em
aproximadamente 75% de sua área (Ceará, 1992.a) , torna seu potencial
de águas subterrâneas bastante baixo; vez que as rochas cristalinas têm
sua capacidade de acumulação restrita ao manto de intemperismo, aos
aluviões e às zonas fraturadas (fendas e falhas).
Em geral, o rendimento hídrico de poços em rochas ígneas e
metamórficas é baixo, da ordem de 2 a 6 m3 /h (Davis e DeWiest, 1966.);
no Ceará, essas vazões se situam entre 1 e 3 m3 /h (Ceará, 1992.a)
(Tabela 2). As variações existentes poço a poço refletem mais as
diferenças nos graus de fraturamento e intemperismo que na mineralogia
das rochas (Tabela 1).
A alimentação destes terrenos é de ordem pluvial, com infiltração
direta ou por intermédio dos rios. No Ceará, a primeira constitui-se na
principal contribuição, limitada pelo curto período da estação chuvosa e
pela pouca capacidade de retenção de água pelo solo, excetuando-se as
zonas fraturados ou intensamente intemperizadas.
O
regime
torrencial e intermitente de seus rios influencia na pouca alimentação dos
‘
aquíferos. Os cursos d água permanecem secos a maior parte do ano; as
precicipitações escoam, provocando inundações temporárias ou são
consumidas pela evapotranspiração.
Tabela 1 - Vazão Média de Poços em Rochas Ígneas e Metamórficas
(m3/h)
LITOLOGIA
Granito
Gabbro
Gnaisse
Xisto
Dolomita
Quartzito
2,00
-
-
5,00
-
-
-
-
-
-
-
3,00
1,20
-
6,80
-
Oeste de Rajasthan, Índ
1,20
-
-
-
-
1,60
-
-
Suécia
1,80
-
2,00
-
-
-
-
2,00
Estados Unidos:
-
-
-
-
-
-
-
-
Connecticut
2,60
-
2,40
2,80
-
-
-
-
Maryland
-
2,20
2,40
4,80
1,60
-
-
-
Virginia
2,40
-
3,40
2,40
-
-
-
-
North Carolina
3,40
6,00
4,60
4,40
-
-
-
-
Maine
5,00
-
-
4,00
-
3,00
-
-
Sul de New England
7,60
-
1,80
2,00
-
-
-
-
Pretória, Africa do Sul
Nordeste da Rodésia
Filito Ardósia
Fonte: Davis e DeWiest, 1966.
Tabela 2 - Média e Limite dos Parâmetros Hidrogeológicos das Rochas
Cristalinas no Estado do Ceará
Ígneas
Metamórficas
Profund.
X
60,30
58,10
90%
81,00
76,00
N.E.
X
7,80
9,20
90%
14,00
17,00
N.D.
X
38,10
35,90
90%
60,00
56,00
Q
X
2,50
2,87
90%
5,80
6,70
Q/sw
X
0,21
0,27
90%
0,55
0,75
X = Valor médio obtido pela distribuição de frequência
90% = Limite abaixo do qual estão contidos 90% dos valores observados
para o parâmetro considerado. Fonte : Ceará, 1992.a
A avaliação das reservas, disponibilidades e potencialidades das
águas subterrâneas no Estado é ainda muito imprecisa. Os estudos
regionais foram feitos nas décadas de 60 e 70 e desde então não foi
efetuado um estudo detalhado para quantificação desses valores,
existindo, inclusive dados controversos sobre as reais potencialidades
hídricas subterrâneas (Costa, 1995). Calcula-se, entretanto, que existam
no Estado, até a profundidade de mil metros, aproximadamente 510
bilhões de metros cúbicos de águas subterrâneas, valor correspondente à
apenas 4% das reservas nordestinas (ABAS, 1995)
A região sedimentar do Estado se localiza basicamente ao longo
do litoral, sendo formado pela província Costeira, que abrange os
aquíferos Dunas e Barreiras. Na área coberta pelo cristalino, entretanto,
são encontradas algumas “manchas sedimentares”, conhecidas como
“bacias sedimentares interiores”, por se encontrarem no interior do
continente. São elas a Bacia de Iguatú-Icó, a Bacia de Várzea Alegre Lavras da Mangabeira e, finalmente, a mais importante de todas, a Bacia
do Araripe, que ocupa uma área de 11.500 km2. Excetuando-se a Bacia
do Araripe, as demais bacias não desempenham papel importante nas
potencialidades hídricas subterrâneas do Estado.
Abrangendo praticamente todo o Estado, a sub-província Escudo
Oriental Nordeste é caracterizada por aquíferos fissurais livres,
constituídos por rochas metamórficas ou ígneas.
A circulação de água subterrânea tem íntima relação com a
geometria e interligação da rede de juntas, fraturas ou falhas das rochas
do substrato. Essa disposição é muitas vezes refletida em superfície pela
rede de drenagem, que facilita a alimentação. A medida que se
aprofundam, o sistema de interligação fica mais rarefeito, diminuindo a
capacidade de circulação (SUDENE,1971). As fraturas que não estão
associadas a falhas apenas produzem um pequeno aumento na porosidade
total. As fissuras são praticamente fechadas, com aberturas inferiores a
2mm em rochas sãs (Davis e DeWiest, 1966).
A determinação das características geométricas de todas as
fraturas do local de estudo é praticamente impossível. Deste modo, é
indispensável a abordagem probabilística destas características, no
sentido de determinar quais distribuições de probabilidade melhor
descrevem o comportamento das variáveis aleatórias abertura das
fraturas, densidade de fratura, comprimento das fraturas e orientação
das fraturas (Pitombeira, 1994).
Para uma rocha de dada permeabilidade, a porosidade da zona
fraturada é mais fortemente dependente do espaçamento entre as fraturas
abertas e de suas aberturas médias do que da variação das aberturas e da
orientação das fraturas (Snow,1968).
Baecher et al (1977) concluiu, após vários estudos, que o
comprimento das fraturas segue uma distribuição Lognormal e que o
espaçamento entre os planos de fraturas segue uma distribuição
exponencial.
Segundo Snow (1968) a frequência de fraturas interceptadas por
furos de sondagem de comprimentos iguais diferem de um lugar para
outro, porém, obedecem uma distribuição de Poisson.
Snow (1968) concluiu ainda que a abertura das fraturas elevada
ao cubo segue uma distribuição Lognormal.
A orientação das fraturas segue uma distribuição de Fisher
(Pitombeira, 1994), a qual foi originalmente desenvolvida para o estudo
de medidas de posições na superfície de uma esfera.
Conclusão
A teoria até hoje desenvolvida no campo da hidrologia de águas
subterrâneas faz com que seja possível a determinação das características
hidráulicas de um aquífero confinado. Esta análise é usualmente baseada
na teoria de Theiss, que assume como verdadeiras as hipóteses de que o
aquífero é isotrópico, homogêneo e de área infinita. Infelizmente, essa
metodologia vem sendo aplicada também em aquíferos que não
satisfazem essas condições ( Gringarten e Withespoon, 1972).
Isto pode ser complicado quando se trata de aquíferos fraturados.
Estudos de campo mostram que o comportamento do fluxo subterrâneo
nestes aquíferos é significativamente distinto daquele realizado em
sistemas homogêneos ( Lewis e Burgy, 1964).
A hidráulica de rochas fraturadas é bastante complexa e pouco
conhecida. A circulação das águas se dá exclusivamente através das
fraturas e, desta forma, somente em áreas de intenso fraturamento e,
desde que as fraturas sejam abertas, interconectadas e estejam ligadas a
uma zona de recarga, é que se pode esperar vazões razoáveis (Ceará,
1992.a).
É, portanto, de fundamental importância aprimorar os
conhecimentos sobre este assunto assim como sobre as reservas e
recursos exploráveis da sub-província Escudo Oriental Nordeste, tendo
em vista a determinação de suas reais potencialidades, para que se possa
desenvolver regras de exploração de poços de reduzida vazão, no sentido
de assegurar retiradas compatíveis com a recarga do aquífero cristalino,
se houver.
Não basta apenas que sejam implantados pontos de abastecimento
de água no semi-árido. E preciso conhecer, com o necessário detalhe, o
substrato cristalino do Ceará, para que se possa avaliar suas
potencialidades e limites em termos de exploração, a fim de garantir,
’
antes de tudo, que estes pontos d água atendam a população durante
períodos críticos de seca, que invariavelmente acontecem.
BIBLIOGRAFIA
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Lewis, D.C. e Burgy, R.H. - 1964 - Hydraulics Characteristics of
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Rebouças, A. de C. - 1978 - Recursos Hídricos: As Águas Subterrâneas
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Snow, D.T. - 1968 - Rock Fracture Spacings, Opennings, and Porosities.
Journal of Soil Mechanics and Foundations Division , ASCE , v.94, no.
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SUDENE - 1971 - Inventário Hidrogeológico Básico do Nordeste Folha 05: Fortaleza - SO, Recife.
SUDENE - 1980 - Plano de Aproveitamento Integrado dos Recursos
Hídricos do Nordeste do Brasil , Fase I. Recursos Hídricos I - Águas
Subterrâneas - Vol VII, Recife.
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