a reinserção global da economia do irã após o acordo

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A REINSERÇÃO GLOBAL DA ECONOMIA DO IRÃ APÓS O ACORDO
NUCLEAR
João Paulo Alves10
Marina Felisberti11

O Acordo de Lausane de 2015 suspendeu grande parte das sações
internacionais impostas à economia do Irã decorrentes de seu programa
nuclear

As negociações que levaram ao acordo são resultados de uma
conjuntura de dificuldades socioeconômicas no Irã somadas ao
desengajamento dos Estados Unidos do Oriente Médio

As relações internacionais do Irã são condicionadas pela estrutura do
sistema internacional, no qual insere-se como um Estado anti-imperialista e
pró-revolucionário.
Apresentação
Em 14 de Julho de 2015, após
uma série de negociações em Lausanne,
na Suíça, foi acordado o chamado Plano
de Ação Compreensivo Conjunto (Joint
Comprehensive Plan of Action) referente
ao programa nuclear iraniano. Assinado
entre os P5+1 (Estados Unidos, Rússia,
China, Inglaterra, França e Alemanha) e o
Irã, o acordo prevê o levantamento das
sanções uni e multilaterais estabelecidas
sobre a economia iraniana ao longo dos
anos 2000, como retaliação por seu
projeto nuclear. O fim desse bloqueio
abre espaço para a reinserção global da
economia do país, permitindo a sua volta
ao mercado de petróleo, o recebimento
de capitais estrangeiros e a participação
no mercado financeiro internacional.
10
Graduando do 5º semestre de Relações Internacionais na Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Contato: [email protected]
Graduanda do 7º semestre de Relações Internacionais na Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Contato: [email protected]
11
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Geopolítica e História do Irã
Essa força geopolítica e esse
potencial
energético
e
consequentemente econômico - são, no
entanto, constrangidos pela sua imagem
histórica, primeiro enquanto exemplo de
Estado Islâmico revolucionário e,
posteriormente,
enquanto
Estado
buscando tecnologias nucleares. Nesse
sentido, a Revolução de 1979 foi a
responsável pela derrubada do regime do
Xá Reza Pahlevi, tradicional aliado do
Ocidente, mas que era incapaz de
administrar a economia do país, a qual
gradualmente
se
deteriorava
e
aprofundava desigualdades sociais. Em
seu lugar, ascendeu o clérigo xiita
Ruhollah Khomeini à posição de Aiatolá e
líder supremo, sob a promessa de
reformar a economia e de retomar os
valores
tradicionais
da
religião
muçulmana (Lampreia 2014).
Na busca pelo entendimento da
atual conjuntura política e econômica da
República Islâmica do Irã, é necessário
que se faça uma breve apresentação dos
aspectos fundamentais que garantem a
esse Estado a sua estatura nas relações
internacionais: os seus atributos naturais
e geopolíticos e a sua história de luta
contra a submissão à política externa dos
Estados Unidos. Com quase 80 milhões
de habitantes, o Irã está localizado no
coração do Oriente Médio, com acesso ao
Mar Cáspio, ao Norte, e com uma
margem no Golfo Pérsico, ao Sul, sendo
um
gigante
em
uma
posição
extremamente estratégica para o
continente Eurasiano.
Para além de seus atributos
demográficos e geográficos, no entanto,
o Irã tem como maior arma geopolítica o
seu potencial energético, traduzido por
suas imensas reservas de petróleo e gás.
Segundo Lampreia (2014), o Irã possui a
4ª maior reserva provada de petróleo do
mundo - aproximadamente 154 bilhões
de barris, equivalendo a quase 10% do
total mundial. Essas reservas dividem-se
em campos onshore, muito explorados
atualmente, e offshore no Mar Cáspio,
onde 100 milhões de barris tem
exploração prevista para o médio e longo
prazo (Lampreia 2014). Ademais, o Irã
tem a 2ª maior reserva e a 3ª maior
produção de gás natural do planeta, com
uma média de 170 milhões de m³
extraídos anualmente, atrás apenas dos
Estados Unidos e da Federação Russa
(CIA 2016).
A Revolução Iraniana trouxe, em
suma, duas novas diretrizes para as
relações exteriores do país, a) uma
orientação
anti-imperialista,
caracterizada
principalmente
pelo
rompimento das relações com os
Estados Unidos, e b) uma postura prórevolucionária,
com
implicações
significativas sobre o equilíbrio de poder
regional. Com relação aos Estados
Unidos, destaca-se a revogação de
acordos feitos antes de 1979, cessando
o apoio iraniano às suas agendas
geopolítico-estratégicas
na
região,
consubstanciadas na lógica da Doutrina
dos Pilares Gêmeos da Administração
Nixon. A Doutrina buscava, através do
estabelecimento de um aliado ocidental
na
região
do
Golfo,
o
contrabalanceamento das projeções de
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poder soviéticas no Oriente Médio e a
contenção de levantes que ameaçassem
os interesses norte-americanos na
região, sem que os Estados Unidos
precisassem agir diretamente no
território (Lima 2016).
apoiar Israel mesmo este sendo detentor
de armamentos nucleares. De qualquer
maneira, a tecnologia nuclear compele
os Estados Unidos a negociarem com o
Irã de forma prudente, levando em conta
a sua força na região (Leverett e Leverett
2013).
No âmbito regional, a República
Islâmica do Irã passou a apoiar
abertamente a nação Palestina e,
também, movimentos rebeldes contra os
governos do Afeganistão e do Iraque,
além de apoiar forças de oposição na
Arábia Saudita - país simbolicamente
alinhado ao interesse ocidental na
região. Apesar de haver um apoio
majoritariamente retórico, esta postura
degradava progressivamente a imagem
iraniana frente a governos vizinhos e ao
Sistema Internacional, que passou a
considerar a nova postura iraniana como
intransigente. Combinava-se este clima
de desconfiança às capacidades navais e
aéreas iranianas, que poderiam causar
problemas às rotas de petróleo na região
caso uma ofensiva fosse efetivamente
iniciada (Halliday 1980).
O programa nuclear do Irã teve
início ainda na década de 1960, durante
o regime de Pahlevi e com amplo apoio
do Ocidente. Os Estados Unidos
contribuíram com a doação de reatores
nucleares para fins de pesquisa à
Universidade de Teerã, e a Alemanha
auxiliou na construção da Planta Nuclear
de Bushehr. Após a Revolução, o
programa nuclear é temporariamente
cancelado devido à oposição do Aiatolá
ao projeto, até o seu posterior
falecimento em 1989. A ascensão do
atual líder supremo, Ali Khamenei,
possibilitou uma nova investida. Durante
a presidência de Mahmoud Ahmadinejad
(2005-2013), o destino do programa
nuclear iraniano passa a ser questionado
pelo Ocidente, embora oficialmente o
projeto fosse orientado para fins
pacíficos (Bandeira 2013).
Um segundo fator identificado
como determinante para a consolidação
das tensões entre o Irã e os países
ocidentais, central pela relação direta
com a existências das recentes sanções
econômicas, é a formação de seu
programa nuclear. O desenvolvimento
dessa tecnologia teve motivações
extremamente estratégicas para o Irã.
Por um lado, somente o potencial de
criação de armamentos nucleares já lhe
confere significativo poder dissuasório
frente a ameaças internacionais. Por
outro, serve para evidenciar a hipocrisia
com que os Estados Unidos conduzem
sua política externa no Oriente Médio, ao
Em
2002,
um
jornalista
denunciou a existência de atividades
secretas de enriquecimento de Urânio
nas bases de Natanz e Arak, provocando
desconfiança sobre a finalidade do
projeto iraniano. A Agência Internacional
de Energia Atômica (AIEA) passou a
pressionar o governo local a providenciar
provas concretas de que as atividades
estariam sendo realizadas com fins de
pesquisa. Em 2005, a AIEA alegou que
tais evidências ainda não haviam sido
disponibilizadas. No mesmo ano, a
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agência
lançou
uma
resolução
condenando o programa nuclear iraniano
e solicitando a ação do Conselho de
Segurança das Nações Unidas (CSNU) e,
em definitivo, “abriu caminho para o
endurecimento do debate entre o Irã e a
comunidade internacional” (Lampreia
2014 p.59).
entanto, somente quando as sanções e
seus impactos convergiram com um
reajuste conjuntural no Oriente Médio, o
Irã e os Estados Unidos inclinaram-se a
formação do Acordo Nuclear, em 2015.
Foi com essas bases que se
estabeleceram as diversas sanções
sobre a economia iraniana. Essas
medidas sobre a economia do país foram
tentativas de transferir as pressões
diplomáticas internacionais para a sua
população, a fim de que se forçassem
mudanças na sua política externa. No
Entre os anos 2006 e 2010, por
meio de resoluções do CSNU e de ações
unilaterais dos Estados Unidos e da
União Europeia, foram adotadas diversas
medidas para isolar o Irã da economia
internacional, conforme mostra Lampreia
(2014):
Das Sanções ao Acordo Nuclear
1ª Rodada
Res. 1731 CSNU
2006
2ª Rodada
Res. 1747 CSNU
2007
3ª Rodada
Res. 1803 CSNU
2008
4ª Rodada
Res. 1929 CSNU
2010
-Proibição de comércio
de
bens
que
pudessem contribuir
com
o
programa
nuclear.
- Congelamento de
ativos de pessoas e
entidades ligadas ao
programa nuclear
- Prazo de 60 dias para
abandono
do
programa nuclear.
- Ampliação da lista de
congelamento
de
ativos, incluindo o
banco estatal Sepah e
companhias
administradas
pela
guarda revolucionária.
Proibição
de
exportação de armas
de qualquer tipo.
- Restrição à importaão
de todos os itens e
tecnologias com uso
“dual” (civil e mlitar).
- Ampliação da relação de
pessoas e entidades com
ativos congelados.
- Expansão das restrições
financeiras de pessoas
ligadas ao programa
nuclear.
- Proibição de várias
categorias de armamentos
pesado
ao
Irã
(helicópteros de ataque,
navios de guerra, etc.)
- Ampliação da relação de
pessoas e entidades com
ativos congelados.
- Aumento da rigidez nas
inspeções nos aeroportos
dos itens a caminho do Irã.
Fonte: Lampreia, 2014, p. 67-68. Tabela confeccionada pelos autores.
Em 2011, os Estados Unidos
estabeleceram uma série de sanções
contra empresas ligadas ao setor
petrolífero iraniano, e em 2012 a União
Europeia organizou um embargo às
exportações iranianas da commodity.
Como resultado disso, teve-se uma
limitação da capacidade do país em
vender seu produto internacionalmente,
uma vez que a União Europeia era o
maior mercado consumidor do petróleo
iraniano. Consequentemente, houve uma
queda da produção interna - de 3.7
milhões de barris por dia, em janeiro de
2011, para 2.7 milhões de barris por dia,
em janeiro de 2013 (EIA 2016). Assim,
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considerando o papel do petróleo como
responsável por aproximadamente 80%
das receitas do governo, estima-se que
US$ 32 bilhões em receita tenham sido
perdidos em apenas um ano (SFGATE
2016).
Os efeitos dessa queda nas
exportações iranianas têm significativa
importância para o seu mercado
monetário e financeiro. Os bloqueios
comerciais dificultaram a entrada de
dólares na economia do Irã, diminuindo a
sua quantidade de reservas líquidas, mas
foi o bloqueio bancário e financeiro dos
Estados
Unidos
que
derrubou
significativamente o valor da moeda
nacional. O Dólar passou a representar,
portanto, um investimento estável frente
às constantes desvalorizações da moeda
nacional, e os consumidores cada vez
mais operavam através da compra e
venda da moeda a fim de gerar lucros.
Como o governo iraniano tentou fixar o
valor do Rial em uma taxa de câmbio
artificial baixa com relação ao dólar,
formou-se um mercado clandestino no
qual as operações desenvolveram-se
com ainda mais força. Sem demora o
governo iraniano teve que flexibilizar a
sua política cambial e aceitar a realização
das trocas aos níveis do mercado ‘extraoficial’ (Gladstone 2012; Peterson 2012)
inflação, portanto, está associada à
instabilidade de preços internos, aos
cortes de verbas governamentais, aos
altos índices de desemprego e à
concentração de renda no país. Como
resultado, temos a formação de um ciclo
econômico nocivo associado à falta de
controle estatal efetivo da situação.
Entretanto, os resultados destas sanções
têm sido evidenciados muito mais nas
questões econômicas do país do que no
questionamento de suas instituições
políticas, colocando em dúvida a
eficiência do mecanismo de sanções
como potencializador do desgaste do
regime iraniano (Peterson 2012).
Somado
aos
impactos
econômicos,
há
uma
alteração
conjuntural que culmina com a retomada
do canal de negociações entre Estados
Unidos e Irã. Por um lado, a invasão do
Afeganistão e do Iraque e o consequente
enfraquecimento dos Estados Unidos
resultaram em uma mudança de
estratégia norte-americana para o
Oriente
Médio,
concretizada
na
Administração Obama pela sua proposta
de desengajamento. Somado a isso, os
Estados Unidos passam a ver o Irã como
um fator estabilizador para a região, dada
a sua influência sobre pontos sensíveis
na região como a Guerra Civil Síria, a
estabilidade do governo xiita no Iraque, e
as ações dos grupos não estatais Hamas
e Hezbollah (Roberto 2015; Visentini e
Roberto 2015).
Alguns dos resultados mais
evidentes
destas
sanções
são
encontrados nos índices inflacionários do
país, sentidos tanto pela população, que
perde poder seu poder de compra,
quanto pelas empresas, que encontram
na desvalorização da moeda uma
barreira para a importação de insumos
básicos aos seus processos produtivos. A
Por outro lado, tem-se uma
deterioração da posição regional do Irã
com o início da Guerra Civil na Síria e o
apoio saudita aos opositores do regime
de Bashar al-Assad, iniciando uma guerra
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proxy e ameaçando a derrubada de um
importante aliado de Teerã12. Além disso,
o estrangulamento econômico do Irã e os
impactos negativos das sanções sobre a
sua população levaram à eleição do
moderado Hassan Rouhani. Desde 2013,
o presidente buscou revigorar a
economia do país através da retomada
das relações econômicas com o
Ocidente, iniciando o processo de
negociações e levando à inclinação do
país em aceitar as determinações do
acordo (Roberto 2015; Visentini e
Roberto 2015).
As ações internacionais contra a
economia iraniana duraram até o ano de
2015, quando iniciaram as negociações
que levaram ao chamado Acordo Nuclear
entre o país e o grupo P5+1. O Acordo
prevê, entre outras coisas, a redução da
capacidade iraniana de enriquecimento e
armazenamento de Urânio, além de
inspeções periódicas às instalações
iranianas de enriquecimento nuclear,
centrífugas de produção e minas de
urânio feitas pela Agência Internacional
de Energia Atômica (AIEA). Em troca,
prevê a gradual suspensão das sanções
impostas à República Islâmica (TIMES
2016).
Nuclear, o governo iraniano organiza a
reabertura de sua economia. Assim,
houve o descongelamento de seus ativos
- no valor de US$ 100 bilhões - e o fim do
embargo europeu sobre suas vendas de
petróleo. Considerando o levantamento
das sanções sobre o Irã e a sua posterior
reinserção na economia mundial, tem-se
como
efeito,
primeiramente,
a
emergência de um debate interno acerca
do modelo econômico a servir de base
para esse processo.
A Reabertura da Economia
Iraniana
Por um lado, há a posição ‘linhadura’ do regime, encabeçada pelos
membros da Guarda Revolucionária
Iraniana, beneficiários da economia
fechada pelos contratos previamente
estabelecidos no setor energético e pela
possessão de grandes conglomerados e
holdings no país. Sendo os mais
prejudicados pela reinserção global,
pregam pela chamada Economia de
Resistência, com crescimento do
comércio focado no mercado interno e
regional, e manutenção de poucos
vínculos financeiros internacionais.
Dessa forma, o país não só tornar-se-ia
menos vulnerável a novas ameaças
econômicas do Ocidente, com uma
economia mais robusta e estável, mas
principalmente conseguiria preservar os
aspectos ideológicos básicos do regime
(Takeyh 2016).
Desde
o
chamado
implementation
day,
aceito
o
comprometimento do Irã com as
diretrizes estabelecidas pelo Acordo
Por outro lado, há a posição
‘pragmática’, liderada pelo Presidente
Hassan Rouhani, que prega pelo
chamado Engajamento Construtivo e que
12
Segundo Visentini e Roberto (2015), a estreita relação entre Teerã e Damasco pode ser corroborada através
da formação do Eixo de Resistência, o qual confirma o alinhamento de visões e objetivos políticos entre os dois
países, como a resistência às políticas hegemônicas norte-americanas e israelenses no Oriente Médio. A crise na
Síria, e a internacionalização deste conflito, portanto, representa uma possível substituição do governo de Assad
por um governo sunita, podendo romper as relações do Eixo e deteriorar a situação estratégica do Irã na região.
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assume uma posição de destaque com a
assinatura do Acordo Nuclear. Segundo
essa
vertente,
a
característica
fundamental da economia iraniana
enquanto exportadora de petróleo e
outros recursos naturais não permite o
seu total isolamento dos mercados
globais. Assim, advogam pela reinserção
do país na economia mundial,
aumentando os níveis de comércio e
recebendo cada vez mais investidores
internacionais para criar uma situação de
interdependência
econômica,
principalmente com países europeus e
asiáticos, que pode blindar o país contra
novas políticas de sanções no futuro e,
inclusive, fortalecer o regime (Takeyh
2016).
exploração offshore no campo South
Pars, no Golfo Pérsico, acrescentando
200.000 barris p/d a produção global
desse recurso. Com o consumo dessas
commodities estável no mercado interno,
a expansão produtiva será absorvida por
consumidores internacionais (EIA 2016).
Externamente, portanto, o aumento da
produção de petróleo diminuirá o preço
da commodity, prejudicando os países
exportadores do produto como um todo,
mas servindo de plataforma para o
aumento
geral
das
exportações
iranianas, em decadência desde os
boicotes (World Bank 2015).
Além do retorno das potências
ocidentais ao mercado iraniano, esperase que haja uma expansão nas suas já
consolidadas relações comerciais com a
China. Com uma relação baseada na
exportação de bens manufaturados
diversos e na construção de obras de
infraestrutura e transporte em troca de
enormes quantidades de petróleo - sendo
atualmente o maior comprador iraniano a China sairá muito beneficiada com o
acordo. Com o levantamento das
sanções, os chineses terão maior
liberdade
e
legitimidade
para
expandirem seus negócios em toda a
região, como a retomada da exploração
de gás conjunta entre a Zhunai Zhenrong
Corporation e a National Iranian Oil
Company, e a construção das ferrovias e
oleodutos e gasodutos que ligariam a
China ao Golfo Pérsico (Bliler 2015).
Dada a atual prevalência desta
segunda
linha
de
pensamento,
evidenciada pela vitória dos seus
representantes nas últimas eleições
parlamentares, espera-se que a abertura
da economia do Irã tenha impacto direto
sobre o mercado de petróleo e gás.
Internamente,
estima-se
que
o
levantamento das sanções incentive um
crescimento na produção de petróleo13
para 3.1 milhões p/d, em 2016, e 3.7
milhões
p/d,
em
2017
aproximadamente 10% do total da
produção da OPEP - e mais um impulso
na produção de aproximadamente
200.000 barris p/d em campos recém
construídos por companhias chinesas no
país (EIA 2016).
Em termos de gás natural, a
abertura para novos investidores deve
acelerar
o
desenvolvimento
da
13
A reinserção do Irã no mercado de
petróleo representa, também, uma
A título de comparação, em 2015 a produção de petróleo foi de 2.8 milhões de barris p/d (EIA 2016).
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16
ameaça para a sua tradicional rival na
região, a Arábia Saudita. Os sauditas vêm
adotando uma política de redução dos
preços do petróleo com o objetivo de
solapar os produtores de gás de xisto nos
Estados Unidos. Caso a entrada do Irã
não seja compensada por uma política de
controle da produção pela OPEP, os
preços devem cair ainda mais no médio
prazo.
exploração de recursos. Nos próximos 5
anos, devem entrar entre US$230 e
US$260 bilhões nos setores extrativistas
do país, além de empresas de
computação - como Hewlett-Packard e
Lenovo - e construção de automóveis principalmente da Europa e do Japão –
que já demonstram interesse no seu
mercado (Economist 2016; Paivar 2015).
Ademais, grandes instituições
bancárias, principalmente da Inglaterra e
da Alemanha, vêm realizando suas
prospecções para futuros projetos de
financiamento em larga escala. A maior
parte destes projetos estão ligados à
construção de infraestrutura e aquisição
de produtos de altíssimo valor agregado,
à exemplo da compra de aeronaves da
companhia Airbus. Enquanto isso, vão
gradualmente se inserindo no país
instituições bancárias de menor porte
para a reaproximação do consumidor
médio com o sistema de finanças (Paivar
2016).
Considerando que a receita
pública da Arábia Saudita é composta em
90% pela exportação de petróleo, o
déficit na economia saudita deve
alcançar a taxa de 20% de seu PIB ainda
em 2016 e, segundo estimativas do FMI,
mantendo-se suas políticas econômicas,
as reservas estrangeiras do país podem
se exaurir nos próximos 5 anos. Isso
afetaria
diretamente
a
posição
internacional de investimento dos
sauditas, que em uma colocação menos
segura, tem visto seus índices de
confiabilidade despencarem (Townsend
2015). Ademais, pode colocar em xeque
o sistema social de subsídios e gastos
públicos que garante a própria
estabilidade política do reino.
Conclusão
Assim,
entende-se
que
a
reinserção global da economia do Irã traz
consigo
uma
ampla
gama
de
oportunidades, tanto para o país quanto
para investidores internacionais. A
entrada de capitais e o estímulo ao setor
privado devem recuperar o crescimento
da renda nacional a taxas significativas,
ao passo que dará liberdade para a
atuação de companhias multinacionais
europeias e estadunidenses. No campo
diplomático, permanecem algumas
tensões e desconfianças entre o Irã e o
ocidente, principalmente em função dos
constrangimentos derivados das
Nesse mesmo sentido, outro
impacto direto do levantamento das
sanções recairá sobre o setor financeiro
da economia iraniana, principalmente
através do recebimento de investimentos
estrangeiros diretos e da sua reinserção
na esfera bancária. Em termos de
investimento, o país é extremamente
atrativo em função de sua enorme
população, com altas taxas de
escolaridade, e de seu potencial de
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tradicionais alianças estadunidenses na
região, como Turquia, Arábia Saudita e
Israel e do discurso dos Estados Unidos
contra o programa de mísseis balísticos
iraniano. No entanto, esse fator não
parece ameaçar o comprometimento de
ambas as partes com o acordo.
A continuidade dessa abordagem
pragmática do Irã com relação aos
Estados Unidos, e da própria abertura de
sua economia, irá depender das eleições
de 2017 e da dinâmica política interna
iraniana nos próximos anos. Enquanto
Rouhani conseguir executar seu projeto
de Engajamento Construtivo e conseguir
conter as ações conservadoras da
Guarda Revolucionária, é de se esperar
que o país continue recebendo capitais
estrangeiros e expandindo, aos poucos, a
sua economia. Não obstante, as questões
estruturais da política externa do país e a
conjuntura da baixa nos preços do
petróleo podem dificultar o processo de
recuperação no médio prazo.
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33
16
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