Anais da XI Jornada de Iniciação Científica da UFRRJ Diagnóstico do vírus da Língua Azul na População Bovina do Estado do Rio de Janeiro através do teste de Imunodifusão em Gel de Agar (IDGA) Aline da Silva Costa1, Ana Elisa da Costa Ferreira1, Tupinambá Mendes de Faria Junior1, Sieberth do Nascimento Brito2 & Cláudio de Moraes Andrade3 1. Aluno de Medicina Veterinária/Laboratório de Viroses Veterinárias/UFRRJ; 2. Professor Assistente/Departamento de Microbiologia e Imunologia Veterinária/IV/UFRRJ; 3. Professor Adjunto/Departamento de Epidemiologia e Saúde Pública/IV/UFRRJ. BR-465 Km7, Seropédica, RJ. CEP: 23890-000. E-mail: [email protected]. Palavras-chave: Bluetongue virus(BTV), gel imunodiffusion(AGID), serum. Abstract componente lipídico essencial em vírus purificados (FIELDS, 1985). O BTV é o agente causador de uma doença infecciosa, porém não contagiosa cuja sintomatologia clássica pode ser observada em ovelhas e principalmente em alguns ruminantes selvagens (CALLIS, et al, 1982). O vírus é transmitido através da ação de insetos do gênero Culicoides que se tornam infectados ao realizar o repasto sangüíneo em vertebrados virêmicos. A transmissão vertical do BTV já foi assinalada através da infecção de bezerros ainda dentro do útero de vacas infectadas; touros infectados também podem transmitir o vírus através de seu sêmem e permanecer como portadores por longo tempo sem qualquer sintomatologia clínica aparente. Em ovelhas, seus sintomas variam desde infecção subclínica até aguda fulminante caracterizada por uma resposta febril com inflamação e congestão que levam a edema facial assim como a hemorragias e ulceração das mucosas; a língua pode mostrar intensa hiperemia, tornando-se edemaciada e protrusa. Geralmente há degeneração muscular e dermatite que pode causar queda da lã. As ovelhas podem começar a claudicar devido a coronite (inflamação da coroa do casco) ou miopatia esquelética e freqüentemente há uma porcentagem substancial de mortalidade, especialmente entre cordeiros (CALLIS, et al, 1982). Todas as raças de ovinos são suscetíveis porém em graus variáveis; as raças nativas da África do Sul são consideradas as mais resistentes, já a raça Merino e raças de carneiros européias são consideradas as mais suscetíveis (ERASMUS, 1980). Neste caso, a porcentagem de morbidade é de 80 a 100% e a mortalidade pode variar de 0 a 50% (CALLIS et al, 1982). O gado exposto ao BTV sob condições naturais de campo ocasionalmente (menos de 5%) desenvolve os sinais clínicos da doença similares aos das ovelhas infectadas, mas na maioria das vezes a doença é Bluetongue virus belongs to Orbivirus genus from Reoviridae family. It’s an moncontagious infection disease generally found in sheep and some wild ruminants. Frequently, there is a substancial percentage of mortality, specially among lambs. Goats and bovine cattle usually develop an inapparent infection or a less severe form of the illness with a low rate of mortality.The present work used the Agar Gel Immunodiffusion (AGID); this tecnique as well as the enzyme-linked immunosorbent assay (ELISA) shows an inability to distinguish between antibodies to viruses in the BT and EHD (epizootichaemorragic disease of deer serogroups) but this last one has not been reported in the region which the sera came from. The tested sera were collected in 1997-1998 by the Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento in seven physiogeographic regions (51 counties) of Rio de Janeiro State. Control sera and antigens were provided by Panaftosa. Two hundred and eighty-two sera were tested until the present moment and 62,06%(169 sera) showed the presence of antibodies against Bluetongue virus. All the seven regions (46 counties) of the state showed positivity. Introdução O vírus da Língua Azul (BTV) pertence ao gênero Orbivirus da família Reoviridae. Este gênero reúne vírus que se distinguem de outros da família Reoviridae por se replicarem tanto dentro de insetos quanto em vertebrados, sendo a infecciosidade deste vírus perdida em presença de ácidos fracos assim como quando expostos a solventes de lipídios e detergentes, apesar de não haver evidência de 173 v. 11, n. 2, p. 173-176, 2001 Anais da XI Jornada de Iniciação Científica da UFRRJ inaparente, sendo a taxa de mortalidade menor que 5% (LUEDKE et al., 1970). Os sinais clínicos em bovinos costumam aparecer cerca de 60 a 80 dias após a infecção, sendo sinais comuns: febre, leucopenia, miosite e salivação. As mucosas orais assim como outras superfícies epiteliais expostas ficam inchadas, hiperêmicas e congestas; também pode ocorrer coronite, laminite, esfoliação da epiderme e crostas nas tetas dos animais em lactação. Problemas reprodutivos como infertilidade, aborto e bezerros débeis e deformados também são associados (CALLIS, et al, 1982). O objetivo deste trabalho é verificar a existência do vírus da Língua Azul na população bovina do estado do Rio de Janeiro considerado até então como exótico ao rebanho brasileiro (apesar de estudos realizados comprovarem a presença de BTV em touros importados do Brasil para os EUA e postos sob quarentena) (GROOCOCK et al, 1982), visto que a pecuária leiteira é a principal atividade econômica em boa parte dos municípios fluminenses. determinado pela mesma instituição, foi utilizada uma solução Agar Noble a 1% em tampão borato (pH= 8,6), sendo esta disposta em placas de Petri em um volume aproximado de 16 ml. Em cada placa, foram feitos 7 grupos de 7 orifícios com o auxílio de um furador padrão para IDGA, conferindo um aspecto como o da figura 1. As placas eram incubadas a temperatura ambiente em câmara úmida por 48 horas e após este período era feita a leitura. Foram testados 21 soros por placa. Soro controle positivo Soro testado Antígeno Material e Métodos Figura 1: Esquema da disposição de orifícios no IDGA realizado. O presente trabalho utilizou a técnica de Imunodifusão em Gel de Agar; essa técnica, assim como a de ELISA demonstram inabilidade em distinguir consistentemente anticorpos para BTV e para o vírus da Doença Hemorrágica Epizoótica dos Veados (EHD) (FIELDS, 1985), mas este último ainda não foi isolado na região da qual os soros testados são provenientes. O teste de IDGA tem sido o teste aprovado e requerido por países como a Itália, Alemanha e Holanda, por exemplo, para a aprovação da importação de sêmem bovino (SAWYER, et al, 1989) e é o teste preconizado pela OIE para o diagnóstico de BTV. A desvantagem deste teste é que ele detecta apenas uma exposição passada ao vírus, não diferenciando infecção passada de infecção corrente (SAWYER, et al, 1989). Outra desvantagem do IDGA é a não diferenciação de sorotipos do vírus presentes na área testada (GUMM, et al, 1984). Foram utilizados antígeno e soros controle provenientes do Centro Panamericano para a Febre Aftosa. De acordo com o protocolo Resultados e Discussão Foram testados 282 soros de bovinos coletados entre 1997 e 1998 pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e uma linha de precipitação positiva foi encontrada em 169 soros, equivalendo a 62,06% dos soros testados. Esta alta porcentagem de positivos é condizente com a porcentagem de positivos encontrada em outros estudos anteriormente realizados, onde também foram encontradas porcentagens altas do vírus tanto em vetores como em animais suscetíveis (MELLOR, et al, 2000). A tabela a seguir mostra os municípios do estado do Rio de Janeiro que apresentaram ou não positividade para o BTV no IDGA. 174 Anais da XI Jornada de Iniciação Científica da UFRRJ Tabela 1: Resultados absolutos obtidos nos testes de IDGA realizados para BT. R egiões M etropolitana Litorânea C entro-sul Serrana Noroeste Norte Sul M unicípios T estados do estado do R io de Janeiro B elford R oxo D uque de C axias G uapim irim Itaguaí J aperi Magé Mangaratiba N ova Iguaçu Paracambi R io de J aneiro São João de M eriti Seropédica T otal R io Bonito R io das O s tras São Pedro da Aldeia Silva Jardim T otal Paraíba do S ul Paty do Alferes R io das Flores Vas s ouras T otal Petrópolis São José do Vale do R io P reto Bom Jardim C antagalo C ordeiro Macuco Santa Maria Madalena São Sebastião do A lto Sumidouro T rajano de Moraes T otal Aperibé Bom Jesus de Itabapoana C ambuc i Itaocara Itaperuna Laje do Muriaé Miracema N atividade Porc iúnc ula T otal C ampos dos G oytacazes Macaé Q uissamã São Fidélis São Francisco de Itabapoana São João da B arra T otal Angra dos R eis Barra do P iraí Barra M ans a Itatiaia Paraty R es ende R io C laro Valenç a T otal 175 S oros T estados 6 2 2 10 3 2 1 3 4 1 2 1 37 3 4 1 5 13 4 1 1 3 9 1 3 1 4 2 1 11 5 1 2 31 2 14 16 4 26 6 10 4 22 104 25 13 8 6 8 5 65 1 2 2 2 1 12 1 2 23 S oros Positiv os 6 0 1 4 2 2 1 2 2 0 0 0 20 1 2 0 4 7 1 0 1 2 4 1 2 0 2 1 0 9 2 1 1 19 1 12 10 3 16 2 8 1 16 69 12 9 4 4 6 3 38 1 2 2 1 0 10 1 1 18 Soros Negativ os 0 2 1 6 1 0 0 1 2 1 2 1 17 2 2 1 1 6 3 1 0 1 5 0 1 1 2 1 1 2 3 0 1 12 1 2 6 1 10 4 2 3 6 35 13 4 4 2 2 2 27 0 0 0 1 1 2 0 1 5 v. 11, n. 2, p. 173-176, 2001 Anais da XI Jornada de Iniciação Científica da UFRRJ Tabela 2: Resultados porcentuais dos testes de IDGA para BTV. M unicípios Testados Metropolitana Litorânea Centro-sul Serrana Noroeste Norte Sul TOTAL Total de Soros Testados/Região 37 13 9 31 104 65 23 282 Porcentagem de Positivos Porcentagem de Negativos 54,00% 53,85% 44,40% 61,30% 66,35% 58,50% 78,30% 62,06% 46,00% 46,15% 55,60% 38,70% 33,65% 41,50% 21,70% 37,94% positivos entre os soros pesquisados (62,06%) é condizente com a porcentagem de positivos verificada em estudos anteriores, visto sua característica de membro do gênero Orbivirus, onde a ação de invertebrados como vetor confere alta presença do vírus dentro de uma população (MELLOR et al, 2000). Conclusões De acordo com nossos achados, de modo distinto ao comumente considerado, o vírus da Língua Azul não é exótico ao rebanho bovino brasileiro. Programas de vigilância contra BT não deveriam então ser limitados a ovinos, mas deveriam preferencialmente estar concentrados nas espécies vetoras e em outros hospedeiros como o gado e animais silvestres. Este tipo de programa permitiria a implementação de medidas de controle relevantes assim como uma imunização profilática influenciaria no início eventual da infecção, devendo-se prever e prevenir epidemias da doença ao invés de tomar medidas uma vez que a epidemia de BT esteja estabelecida (ERASMUS, 1980). O vírus da Língua Azul pode causar grandes perdas econômicas tanto na criação de ovinos como principalmente na criação de bovinos; problemas gestacionais nas matrizes e bezerros débeis ou deformados, e dificuldade de comercialização exterior de sêmem dos touros provenientes de regiões positivas, entre outros fatores, causam uma diminuição da produtividade de rebanhos. Outro aspecto importante é o epidemiológico pois os Culicoides spp. têm demonstrado predileção pelo repasto sangüíneo em bovinos, ganhando o estudo importância ainda maior quando se considera a existência de criações consorciadas de bovinos e ovinos (ERASMUS, 1980). Mesmo não sendo testada neste trabalho a presença de BT em ovelhas, isto não implica necessariamente na ausência do BTV ou de atividade viral em uma região ou país em particular em um dado momento (ERASMUS, 1980).. Epidemias de BT em ovelhas são uma mera representação de algo muito maior. As ovelhas seriam apenas um hospedeiro indicador de BT, realizando o papel secundário na epidemiologia do vírus. Esforços em erradicar a doença através do sacrifício de ovinos infectados seriam então pouco efetivos (ERASMUS, 1980). A alta porcentagem de Referências Bibliográficas CALLIS, J.J., DARDIRI, A.H., FERRIS, D.H., GAY G.J., WILDER, F.W., MASON, J. Manual Ilustrado para el Reconocimiento y Diagnostico de Ciertas Enfermedades de los Animales. Comisión México-Americana para la Prevención de la Fiebre Aftosa. 56-61 pp. 1982. ERASMUS, B.J. The epidemiology and control of Bluetongue in South África. Bull. Off. Int. Epiz., 92 (7-8), 461-467. XLVIII Session Générale, Rapport no 2.1. 1980. 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