UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS CURSO DE GEOLOGIA GILCIMAR DOS SANTOS MACHADO GEOLOGIA DA PORÇÃO SUL DO COMPLEXO LAGOA REAL, CAETITÉ, BAHIA Salvador 2008 ii GILCIMAR DOS SANTOS MACHADO GEOLOGIA DA PORÇÃO SUL DO COMPLEXO LAGOA REAL, CAETITÉ, BAHIA Monografia apresentada ao Curso de Geologia, Instituto de Geociências, Universidade Federal da Bahia, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Geologia. Orientadora: Profª. Dra. Simone Cerqueira Pereira Cruz Co-orientadores: Prof. Dr. Johildo Salomão Figueiredo Barbosa Prof. Dr. Léo Rodrigues Teixeira Salvador 2008 iii TERMO DE APROVAÇÃO GILCIMAR DOS SANTOS MACHADO GEOLOGIA DA PORÇÃO SUL DO COMPLEXO LAGOA REAL, CAETITÉ, BAHIA Monografia aprovada como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Geologia, Universidade Federal da Bahia, pela seguinte banca examinadora: Simone Cerqueira Pereira Cruz - Orientadora Doutora em Geologia Estrutura e tectônica pela Universidade Federal de Ouro Preto Universiadade Federal da Bahia Violeta de Souza Martins Mestre em Geologia pela Universidade Federal da Bahia Companhia Baiana de Pesquisa Mineral Ângela Beatriz de Menezes Leal Doutora em Geologia pela Universidade Federal da Bahia Universidade Federal da Bahia Salvador, 5 de dezembro de 2008 iv A minha mãe Maria Eliete. v AGRADECIMENTOS A toda minha família, principalmente a minha mãe Maria Eliete, Meu Pai Jorge, minha irmã Gilcimara e ao meu irmão Cláudio. A professora Dra. Simone C. P. Cruz, pela orientação, compreensão, pela amizade, pelos ensinamentos e principalmente pela paciência. Professor Dr. Johildo e Geólogo Dr. Léo Teixeira pela co-orientação e apoio durante todo trabalho. CBPM pela concessão da bolsa de pesquisa, pela confecção das lâminas e pelas análises químicas. Ao Laboratório de Metalogênese pelas liberação do mesmo para tirar as fotomicrografia. A Denise, Eraldo, Fernanda, Gisele, Jofre, Jailma, pelo apoio na confecção deste trabalho. A todos os professores e funcionários do instituto, principalmente a professora Ângela pelo carinho e amizade com os alunos. Ao NGB pelo apoio logístico. Aos amigos Ana Luiza, André, Andreza Carlito, Carol, Diego, Eraldo, Fernanda, Gisele, Jailma, Jofre, Joilma, Lucas, Marcelo, Natanael, Rose, Samia e Valdirene, e pela amizade sincera e pelos momentos de alegria durante os quase seis anos de faculdade. Um agradecimento especial para minha amiga-namorada-noiva Denise pela amizade, companheirismo, apoio e principalmente pelo amor de todas as horas. vi RESUMO A área de estudo está localizada geograficamente na região sudoeste do Estado da Bahia. Do ponto de vista tectônico, está posicionada na porção centro-sul do Bloco Gavião e no domínio meridional do Corredor do Paramirim, na zona de inversão do Aulacógeno homônimo. O Contexto geológico regional é dominado por unidades do embasamento arqueano-paleoproterozóico, por intrusivas ácidas e básicas e por um conjunto de rochas metassedimentares de idades meso e neoproterozóica. O objetivo deste trabalho foi realizar o mapeamento, a caracterização petrológica, estrutural multiescalar e litogeoquímica de uma área selecionada na porção sul da área de ocorrência do Complexo Lagoa Real. Este complexo, de idade 1,7 Ga, hospeda a Suíte Intrusiva Lagoa Real e um conjunto de ortognaisses, anfibolitos, albititos, oligoclasitos, microclinitos e enclaves de rochas charnoquíticas. Como metodologia adotou-se a pesquisa bibliográfica, os trabalhos de campo, os estudos petrográficos e os litogeoquímicos. Durante os trabalhos de campo foram descritos trinta afloramentos, cujas características estruturais, especialmente às relacionadas com a intensidade de deformação, permitiram identificar cinco tectonofácies, estas divididas em três grupos de acordo com classificação de (Sibson, 1977): protomilonitos (granitóide com pouca deformação e granitóide foliado), milonitos (augen-gnaisse e ortognaisses com foliação descontínua) e ultramilonitos (ortognaisses com foliação contínua). Em termos modais, essas tectonofácies são rochas de composição essencialmente sienítica. Os dados de campo e petrográficos mostram que as rochas da Suíte Intrusiva Lagoa Real passaram por processos deformacionais no estado sólido transformando-se em gnaisses. Tal processo ocorreu em função da nucleação de um conjunto de zonas de cisalhamento compressionais, de idade brasiliana. Associadas a essas zonas desenvolve-se uma foliação milonítica (S’1) que está paralelizada ao bandamento composicional dos gnaisses e posicionada, em geral, segundo N180/04 W. A lineação de estiramento mineral é marcada pela biotita, anfibólio e aglomerados de quartzo e feldspatos recristalizados e posiciona-se com máximo em 21p/225. Os indicadores de movimento recuperados ma macro-escala revelam um contexto compressional para a deformação F’1. Os estudos microestuturais sugerem a atuação de processos plásticos de deformação associados esse estágio, com a recristalização sintectônica de feldspatos e quartzo, levando à destruição da trama primária das rochas em condições de temperatura supeiores aos 550º C. Truncando a trama gnáissica, um conjunto de fraturas de cisalhamento ocorre e levaram à fragmentação dos feldspatos e a recristalização do quartzo. Tais fraturas hospedam clorita e epidoto. A partir da análise microestrutural, sugere-se temperaturas de deformação variando entre 300 e 500º C. Os dados geoquímicos mostram que as rochas estudadas são alcalinas, metaluminosas, de alto a muito alto potássio, com características de granitóides anorogênico, derivação crustal e formadas ambientes intra-placa continental. Palavras-chave: Aulacógeno, Complexo Lagoa Real, Petrologia e Geoquímica. vii SUMÁRIO LISTA DE FIGURAS................................................................................................... ix LISTA DE FOTOMICROGRAFIA .............................................................................. xii LISTA DE FOTOGRAFIAS....................................................................................... xiii LISTA DE TABELAS ................................................................................................ xiv CAPÍTULO I ..............................................................................................................15 1.2. OBJETIVO ..................................................................................................17 1.3. LOCALIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO.....................................................18 1.4. JUSTIFICATIVA ..........................................................................................20 1.5. MÉTODO DE TRABALHO ..........................................................................21 1.5.1. Levantamento de Acervo Bibliográfico .................................................21 1.5.2. Trabalhos de Campo ............................................................................21 1.5.3. Estudo Petrológico................................................................................21 Figura 1.5 – Mapa de pontos..........................................................................22 1.5.4. Estudo Litogeoquímico .........................................................................23 1.5.5. Organização e Tratamentos dos Dados ...............................................23 1.6. ORGANIZAÇÃO DA MONOGRAFIA ..........................................................23 CAPÍTULO II .............................................................................................................24 2. GEOLOGIA REGIONAL ....................................................................................24 2.1. Unidades litoestratigráficas .........................................................................24 2.1.1. Embasamento.......................................................................................25 2.1.2. Complexo Lagoa Real ..........................................................................28 2.1.3. Supergrupo Espinhaço .........................................................................29 2.1.4. Rochas Intrusivas Máficas ....................................................................30 2.1.5. Supergrupo São Francisco ...................................................................31 2.2. Arcabouço Estrutural Regional....................................................................32 2.3. Evolução Tectônica do Bloco Gavião..........................................................33 2.4. O Orógeno Araçuaí – Oeste Congo Ocidental ............................................38 CAPÍTULO III ............................................................................................................43 3. GEOLOGIA LOCAL E PETROGRAFIA .............................................................43 3.1. Caracterização dos litotipos ........................................................................43 3.2. Granitóides com pouca deformação e foliados ...........................................47 3.3. Gnaisses .....................................................................................................52 viii 3.4 Arcabouço Estrutural da Área de Trabalho .................................................57 3.5 – Síntese da Geologia da área de trabalho..................................................60 CAPÍTULO IV ............................................................................................................63 4. LITOGEOQUIMICA............................................................................................63 4.1 Elementos Terras Raras ..............................................................................64 4.2 Elementos Maiores.......................................................................................66 4.3 Elementos Traços ........................................................................................70 4.4. Síntese da Litogeoquímica..........................................................................77 CAPÍTULO V .............................................................................................................78 5. CONCLUSÕES..................................................................................................78 CAPÍTULO VI ............................................................................................................80 6. REFERÊNCIAS .................................................................................................80 ix LISTA DE FIGURAS Figura 1.1 – Cráton do São Francisco destacando as faixas orogênicas, o Corredor do Paramirim e o novo limite do Cráton proposto por Cruz (2004). ..........................16 Figura 1.2 – Mapa geológico do Complexo Lagoa Real, destacando área de trabalho. Fonte: Cruz (2004). ....................................................................................18 Figura 1.3 – Mapa de situação da área de trabalho. .................................................19 Figura 1.4 – Mapa de localização da área de trabalho..............................................20 Figura 1.5 – Mapa de pontos.....................................................................................22 Figura 2.1 – Mapa geológico simplificado (Modificado de Cruz, 2004). BG:Bloco Gavião; BJ: Bloco Jequié; SRP: Saliência do Rio Pardo; ES: Espinhaço Setentrional; e CD: Chapada Diamantina. Fonte: Cruz (2004).......................................................25 Figura 2.2 – Mapa Geológico do Estado da Bahia simplificado, mostrando os principais terrenos Greenstone Belt e Seqüências Vulcanossedimentares. Fonte: Modificado de Silva & Cunha (1999). ........................................................................26 Figura 2.3 – Mapa geológico simplificado do Bloco Gavião na região de Brumado, destacando os granitóides estudados (Adaptado de Basto-Leal, 1998). ..................27 Figura 2.4 – Mapa Geológico e estrutural do Aulacógeno do Paramirim, destacando as principais estruturas tectônicas de idade brasiliana. BG- Bloco Gavião, BJ- Bloco Jequié, ZCBC- Zona de cisalhamento Brumado-Caetité, ES- Espinhaço Setentrional, CD- Chapada Diamantina, FRP- Faixa Rio Preto, SRP- Saliência do Rio Pardo (Faixa Araçuaí), VRP- Vale do Rio Paramirim e SG- Serra Geral. Fonte: Cruz (2004). ..................................................................................................................................34 Figura 2.5 – Interação entre os três blocos arqueanos com a estruturação do Orógeno Itabuna-Salvador-Curaçá. Fonte: Barbosa & Sabaté (2003). .....................35 Figura 2.6 – Modelo evolutivo durante o Arqueano/Paleoproterozóico (Arcanjo et al., 2000). ........................................................................................................................36 Figura 2.7 – Modelo evolutivo durante o Paleoproterozóico/Neoproterozóico (Arcanjo et al., 2000). ..............................................................................................................37 Figura 2.8– Orógeno Araçuaí-Congo Ocidental no contexto do Paleocontinente Gondwana. FA – traços estruturais da Faixa de dobramentosAraçuaí; ZI – zona de interferência do Orógeno Aracuaí com o Aulacógeno do Paramirim. Crátons: A – Amazônico; K – Kalahari; PP-RP – Paraná-Paranapanema-Rio de La Plata; SF-C – x São Francisco-Congo; SL-AO – São Luís-Oeste Africano. Fonte: Alkmim et al., (2006). .......................................................................................................................39 Figura 2.9 – Ilustração da evolução do Orógeno Araçuaí-Congo Ocidental pelo por Alkmim et al. (2007)...................................................................................................40 Figura 2.10 – Compartimentos tectônicos do Ogógeno Araçuaí-Congo Ocidenta: SE –Cinturão de Cavalgamento da Serra do Espinhaço Meridional; CA – Zona de cisalhamento da Chapada Acauã; S – Zona de dobramento de Salinas; MN – Corredor transpressivo de Minas Novas; RP – Saliência do Rio Pardo e zona de interação com Aulacógeno do Paramirim; BG – Bloco de Ganhães; DS – Zona de Cisalhamento de Dom Silvério; I Zona de Cisalhamento de Itapebi; NC – núcleo cristalino; OC – Faixa Oeste-congolesa. Fonte: Pedrosa-Soares et al., (2007). .......41 Figura 3.1 – Mapa Geológico preliminar da área de estudo. Fonte: Modificado de Cruz et al., (2007)......................................................................................................47 Figura 3.2. Classificação modal das rochas estudas. Campos e nomenclatura segundo Streckeisen (1976)......................................................................................51 Figura 3.3 – Diagrama estereográficos (Hemisfério inferior) para a foliação metamórfica e lineação estiramento, com o calculo da Lb das rochas da porção sul do complexo Lagoa Real...........................................................................................58 Figura 3.4 – Distribuição esquemática dos principais tipos de rochas encontradas em zonas de cisalhamento. Os quadros a e b representam o comportamento do feldspato/plagioclásio e do quartzo, respectivamente, em função da temperatura/profundidade. Em c, estão discriminados os tipos de zonas em função de a e b. em d, observa-se os quatro possíveis tipos de materiais encontrados em zonas de cisalhamento. Fonte Cruz (2004)...............................................................61 Figura 3.5 – Modelo esquemático para explicar a variação da temperatura de deformação durante a evolução deformacional da área. PL- Pressão litostática. .....61 Figura 4.1 – Padrões de elementos terras raras para as rochas da área de estudo.66 Figura 4.2 – Mapa Geológico da área de estudo. Fonte: Modificado de Cruz et al., (2007). .......................................................................................................................66 Figura 4.3 – Diagrama Tas (álcalis versus sílica) para classificação de rochas plutônicas, segundo Cox et al., (1979), aplicado às rochas estudas.........................68 Figura 4.4 – Índice de saturação em alumina, segundo Shand (1943), das rochas estudadas..................................................................................................................68 xi Figura 4.5 - Diagramas de Harker mostrando a variação geoquímica dos elementos maiores das rochas da porção sul do Complexo lagoa Real. Legenda igual à da figura 4.4. ..................................................................................................................72 Figura 4.6 – Diagramas de Harker mostrando a variação geoquímica dos elementos traços das rochas da porção sul do Complexo lagoa Real. Legenda igual à da figura 4.4. ............................................................................................................................73 Figura 4.7 – Diagramas de multi-elementos das rochas estudadas..........................74 Figura 4.8 – Diagrama de discriminação tectônica para as rochas estudadas (Pearce et al., 1984). ..............................................................................................................75 Figura 4.9 – Diagramas discriminantes de Whalen et al., (1987), separando os campos dos granitos A, I, S e M para as rochas estudadas......................................76 Figura 4.10 – Diagrama discriminante mostrando a subdivisão das rochas com relação a sua fonte, de acordo com Eby et al., (1992); A1-granitos manto-derivados e A2 – granitos crustais................................................................................................76 xii LISTA DE FOTOMICROGRAFIA Fotomicrografia 3.1 – Exibe cristal de plagioclásio (Pl) com vênulas quartzo (Qtz), constituído a microestrutura mimerquítica. Nicóis cruzados, amostra E-16 (783608/8438084). ....................................................................................................46 Fotomicrografia 3.2 - Mostra Fenocristal de feldspato alcalino (Afs) orientando, marcando a microestrutura anisotrópica. Nicóis cruzado, amostra E - 27 (778020/8440826). ....................................................................................................46 Fotomicrografia 3.3 – Exibe Microstrutura coroa de reação, marcada por minerais opacos (Op) coroados por agregados de titanita (Ti). Nicóis cruzado, amostra E-17 (784863/8439784). ....................................................................................................46 Fotomicrografia 3.4 – Mostra Porfiro de feldspato alcalino (Afs) com inclusões de mica branca (Mb) e quartzo (Qtz), caracterizando a microestrutura pseudopoiquilítica. Nicóis cruzado, amostra E-31 (776864/8444738).......................46 Fotomicrografia 3.5 – Mostra Microestrutura faneritica grossa em feldspato alcalino (Afs). Nicóis cruzado, amostra: E-17 (784863/8439784)...........................................46 Fotomicrografia 3.6 – exibe grãos de anfibólio (Anf) e biotita (Bt) orientados constituído a Microestrutura nematoblástica/lepidoblástica. Nicóis cruzado, amostra E- 31 (776864/8444738)............................................................................................46 Fotomicrografia 3.7 – microestruturas miloníticas com porfiroclasto de feldspato alcalino (Afs) envolto por manto de novos grãos, caracterizadouma microestrutura manto-núcleo. Ng- Novos grãos poligonais. Pf- porfiroclasto. Amostra E-17 (784863/8439784). ....................................................................................................59 Fotomicrografia 3.8 – Rocha ultramilonítica com grãos poligonais de microclina como produto da recristalização de porfiroclastos de feldspato alcalino (Afs). NgNovos grãos poligonais. Nicois cruzados, amostra E-48 (791068/8448120). ...........60 xiii LISTA DE FOTOGRAFIAS Fotografia 3.1 – Afloramento que exibe fenocristais de feldspato alcalino com até sete centímetros. Foto em planta. Ponto E-17 (784863/8439784)............................48 Fotografia 3.2 – Aspecto geral do granitóide indeformado. Foto em perfil. Ponto E-20 (783980/8444840). ....................................................................................................48 Fotografia 3.3 – Aspecto isotrópico e granulomeria grossa do granitóide pouco deformado. Foto em planta. Ponto E-03 (776144/8441470). ....................................49 Fotografia 3.4 – Granitóide pouco deformado, cortado por zona de cisalhamento. Ponto E-19 (784603/8439936). .................................................................................49 Fotografia 3.5 – Ortognaisse exibindo foliação descontinua dobrada. Foto em perfil. Ponto E-16 (783608/8438084). .................................................................................54 Fotografia 3.6 – Augen-gnaisse exibindo porfiroclastos contornados pela foliação. Foto em perfil. Ponto E-31 (776864/8444738). ........................................................54 Fotografia 3.7 – Transição entre augen-gnaisse e gnaisse com foliação continua. Foto em perfil. Ponto TA19 (791219/8431950). ........................................................54 Fotografia 3.8 – Gnaisse com foliação continua paralelizada ao bandamento composicional. Foto em perfil. Ponto E-49 (786329/8443796)..................................54 xiv LISTA DE TABELAS Tabela 3.1 – Classificação de Sibson (1977), para as tectonofácies da área de estudo........................................................................................................................44 Tabela 3.2 - Classificação modal, as tectonofácies e o nome das rochas estudadas. ..................................................................................................................................50 Tabela 4.1 – Resultados das analises químicas dos elementos maiores (%), traços (ppm) e terras raras (ppm) para as rochas da porção sul do Complexo Lagoa real. 65 15 CAPÍTULO I 1. INTRODUÇÃO O Cráton do São Francisco, segundo Almeida (1977), consiste de um segmento da crosta continental estabilizado no final do Paleoproterozóico, cujas rochas mais velhas que 1.8 Ga não foram envolvidas nas deformações durante os eventos tectônicos do Meso e Neoproterozóico (Cruz, 2004). Este segmento é circundado por cinco orógenos estruturados durante a orogênese Brasiliana, quais sejam: Araçuaí, Brasília, Sergipano, Formosa do Rio Preto e Riacho do Pontal. Em particular, o Orógeno Araçuaí ocupa a porção sudoeste do Cráton do São Francisco, cujo limite setentrional proposto por Almeida (1977) é o Arco do Rio Pardo. A partir de argumentos estruturais e geocronológicos, Alkmim (2004), Cruz (2004), Cruz & Alkmim (2006), Alkmim et al., (2007), Cruz et al., (2007) e PedrosaSoares et al., (2007) propuseram uma modificação na configuração original do limite setentrional do orógeno Araçuaí, estendendo-o até a região de Borquira, na Bahia. Neste contexto, toda a porção do Bloco Gavião (Barbosa & Sabaté, 2002) que anteriormente vinha sendo incluída como Cráton do São Francisco foi recentemente inserida por Cruz & Alkmim (2006), Alkmim et al., (2007) e Pedrosa Soares et al., (2007) na porção Setentrional do Orógeno Araçuaí, cujos compartimentos são a Saliência do Rio Pardo e o Corredor do Paramirim. É neste contexto tectônico que hospeda-se o Complexo Lagoa Real, em especial a sua porção sul, principal foco desse trabalho (Figura1.1). O Complexo Lagoa Real hospeda uma importante mineralização de urânio, que está associada a zonas de cisalhamento submeridianas (Costa et al., 1985; Lobato, 1985; Lobato & Fyfe, 1990; Cruz, 2004; Cruz et al., 2007). Controvérsias 16 existem a cerca da gênese desse depósito. Para Costa et al., (1985), Lobato (1985), Lobato & Fyfe (1990), Cruz (2004); Cruz et al., (2007), os depósitos de urânio desse complexo estão relacionados com processos de alteração metassomática envolvendo fluidos mineralizantes ricos em sódio e cálcio, fluidos esses que chegaram na crosta em 0.9 Ga, cuja estruturação atual reflete o Evento Brasiliano na região (Pimentel et al., 1994; Cruz & Alkmim, 2006; Cruz et al., 2007). Para Caby & Arthaud (1987), Maruèjol (1989) e Chaves et al., (2007), entretanto, a mineralização de urânio está associada com fluidos tardios associados com a evolução magmática do Complexo Lagoa Real. Costa et al., (1985), Arcanjo et al., (2000) e Cruz (2004) procederam ao mapeamento geológico do Complexo Lagoa Real. Esse trabalho visa somar esforços para a cartografia do complexo em foco, especialmente com os aspectos relacionados com a petrologia, com a geoquímica e com o arcabouço estrutural. Figura 1.1 – Cráton do São Francisco destacando as faixas orogênicas, o Corredor do Paramirim e o novo limite do Cráton proposto por Cruz (2004). 17 1.1. CONTEXTUALIZAÇÃO E APRESENTAÇÃO DO PROBLEMA O Complexo Lagoa Real compreende a Suíte Intrusiva Lagoa Real, representada por um conjunto de sienitos, sienogranitos e granitos, esses em menor proporção, denominados genericamente por Granito São Timóteo por Fernades et al., (1982), além de ortognaisses, albititos, oligoclasitos, epidositos, microclinitos e anfibolitos, e enclaves charnoquíticos (Costa et al., 1985; Lobato, 1985; Cruz, 2004; Cruz et al., 2007). Apesar dos trabalhos de mapeamento já existentes, dúvidas ainda persistem sobre as relações texturais e estruturais entre os sienitos e os ortognaisses desse complexo. Além disso, os aspectos petroquímicos associados ao mapeamento geológico também carecem de maiores aprofundamentos. Diante do exposto, surgem as seguintes questões: quais as relações de afloramento, microestruturais e litogeoquímicas entre os granitóides e os gnaisses do Complexo Lagoa Real? Qual a estruturação tectônica dominante e suas relações com a geração dos ortognaisses? Do ponto de vista litogeoquímico, nesse complexo é possível diferenciar mais de um tipo de granitóide? Para responder a essas perguntas, escolheu-se uma área de trabalho posicionada na porção sul da área de ocorrência do Complexo Lagoa Real (Figura 1.2), que posiciona-se geograficamente nas cercanias da cidade de Caetité. 1.2. OBJETIVO O objetivo geral deste trabalho foi realizar a caracterização petrológica, estrutural multiescalar e litogeoquímica de uma área selecionada na porção sul da área de ocorrência do Complexo Lagoa Real. Como objetivos específicos, têm-se: i) proceder ao mapeamento geológico da área selecionada para estudo; ii) realizar estudos petrológicos para a caracterização das rochas aflorantes; iii) realizar a análise estrutural clássica, multiescalar; iv) proceder ao estudo petroquímico das rochas cartografadas. 18 Figura 1.2 – Mapa geológico do Complexo Lagoa Real, destacando área de trabalho. Fonte: Cruz (2004). 1.3. LOCALIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO A área de trabalho localiza-se na região sudoeste do Estado da Bahia, distante cerca de 650 km da cidade de Salvador. O acesso à região de estudo é feita pela BR – 324, de Salvador até Feira de Santana, e pela BR – 116 até o entroncamento de Jaguaquara. Em seguida, segue-se pela estrada que dá acesso às cidades de Itiruçu-Maracás-Contendas do Sincorá-Tanhaçu e Brumado. A partir dessa cidade, toma-se a BR-030, seguindo por cerca de 100 km até Caetité (região de trabalho). As figuras 1.3 e 1.4. mostram os mapas de situação e o de localização da área de trabalho. 19 Figura 1.3 – Mapa de situação da área de trabalho. 20 Figura 1.4 – Mapa de localização da área de trabalho. 1.4. JUSTIFICATIVA O Complexo Lagoa Real, nos últimos 30 anos, vem sendo alvo de pesquisas científicas visando, sobretudo, o mapeamento geológico, além do entendimento da distribuição e gênese da mineralização de urânio. O principal controle da mineralização são zonas de cisalhamento submeridianas nucleadas durante o Neoproterozóico (Pimentel et al., 1994; Cruz, 2004), que levaram à deformação do sienito/sienogranito São Timóteo e a redistribuição da mineralização de urânio. Diversos estudos já foram realizados no sentido de avaliar a evolução geológica da área. Entretanto, algumas controvérsias ainda existem principalmente as relacionadas com a evolução petrológica e a caracterização química do complexo. Neste sentido, acredita-se que esse trabalho vem contribuir com o entendimento dos 21 processos geológicos, ígneos e metamórficos que culminaram com a transformação do sienitos/sienogranito São Timóteo em gnaisses e com a caracterização litogeoquímica dessas rochas. 1.5. MÉTODO DE TRABALHO Visando atingir os objetivos propostos, procedeu-se as atividades que serão descritas a seguir. 1.5.1. Levantamento de Acervo Bibliográfico O estudo bibliográfico contemplou o levantamento de artigos e resumos que tratem sobre a área de trabalho. Além disso, livros foram consultados para levantar o arcabouço teórico a cerca da evolução estrutural de terrenos poli-deformados, bem como sobre caracterização petrológica e litogeoquímica de rochas ígneas e metamórficas. 1.5.2. Trabalhos de Campo Os trabalhos de campo totalizaram sessenta dias efetivos. Primeiramente, esses trabalhos tiveram como objetivo reconhecer o contexto geológico e estrutural das unidades litoestratigráficas que hospedam o Complexo Lagoa Real. Os trabalhos de reconhecimento geológico ocorreram durante quatro etapas de campo, totalizando cinqüenta e dois dias de atividades na área. O mapeamento geológico foi realizado durante uma etapa de campo, que totalizou oito dias 50 pontos (Figura 1.5). Durante os trabalhos foi realizada a identificação dos litotipos aflorantes, a análise estrutural clássica e a coleta de amostras. A análise estrutural foi realizada através da identificação, hierarquização e posicionamento espacial dos elementos identificados. 1.5.3. Estudo Petrológico Neste trabalho foram descritas um total de dezesseis seções delgadas visando à caracterização mineralógica e a análise modal, o estudo textural e microestrutural, bem como a caracterização do metamorfismo e a identificação dos 22 protólitos das rochas gnaissificadas. A classificação modal foi realizada utilizando o triângulo de Streckeisen (1976). Os estudos o petrogréficos foram realizados no Laboratório de Mineralogia e Petrografia do IGEO/UFBA utilizando o microscópio binocular Olyimpus modelo BX41 e para as fotomicrografias foi utilizado o fotomicroscópio binocular de fabricação NIKON, modelo Japan Optiphot-pol, do Laboratório de Metalogênese/ instituto de Geociências/UFBa. Figura 1.5 – Mapa de pontos 23 1.5.4. Estudo Litogeoquímico A análise litogeoquímica foi realizada em onze amostras, incluindo granitóides e gnaisses. Tais análises foram realizadas para obtenção das concentrações de elementos maiores, menores e traços visando à caracterização das rochas. Essas amostras foram analisadas pela empresas GEOSOL. Para a determinação das concentrações dos elementos foram utilizados os seguintes métodos: digestão multiácida/absorção atômica, acima de 1% por fusão com tetraborato de lítio – fluorescência de raio-x e pó prensado – fluorescência de raio-x. 1.5.5. Organização e Tratamentos dos Dados Os dados estruturais e litogeoquímicos foram organizados em planilhas eletrônicas do programa Excell (for windows). Com relação ao primeiro, os dados foram levados ao programa Word Pad (for windows) e, em seguida foram tratados utilizando o programa Stereonet (versão 3.0, for windws). Por sua vez, os dados litogeoquímicos foram tratados utilizando os programas Excell, Minpet e GCDKit. 1.6. ORGANIZAÇÃO DA MONOGRAFIA A presente monografia foi organizada em quatro capítulos. No primeiro capítulo apresenta-se a introdução, problema, objetivos, justificativa e método de trabalho. No segundo capítulo apresenta-se a Geologia Regional, ao passo que no terceiro capítulo apresenta-se o objeto de estudo, em seus aspectos petrológicos, estruturais e litogeoquímicos. No quarto capítulo apresentam-se as conclusões. 24 CAPÍTULO II 2. GEOLOGIA REGIONAL A área de estudo está posicionada na porção centro-sul do Bloco Gavião (Sensu Barbosa & Sabaté, 2002) e no domínio meridional do Corredor do Paramirim (Alkmim et al.,1993), na zona de inversão do Aulacógeno homônimo (Pedrosa Soares et al., 2001). Recentemente, Cruz (2004), Cruz & Alkmim (2006), Alkmim et al., (2007) e Pedrosa-Soares et al., (2007) a incluiu na Saliência do Rio Pardo, uma estrutura regional que é o produto da interação entre o Aulacógeno do Paramirim e o Orógeno Araçuaí-Oeste Congo Ocidental. O Contexto geológico regional é dominado por unidades do embasamento arqueano-paleoproterozóico, por intrusivas ácidas e básicas e por um conjunto de rochas metassedimentares de idades meso e neoproterozóicas. 2.1. Unidades litoestratigráficas No Corredor do Paramirim as unidades litoestratigráficas (Figura 2.1) marcam o conjunto de eventos geológicos que se sucederam desde o Arqueano ao Neoproterozóico. 25 Figura 2.1 – Mapa geológico simplificado (Modificado de Cruz, 2004). BG:Bloco Gavião; BJ: Bloco Jequié; SRP: Saliência do Rio Pardo; ES: Espinhaço Setentrional; e CD: Chapada Diamantina. Fonte: Cruz (2004). 2.1.1. Embasamento O embasamento do Corredor do Paramirim está totalmente inserido no Bloco Gavião (sensu Barbosa & Sabaté, 2002), sendo constituído por: i) gnaisses, por vezes migmatizados, de composição tonalítica, trondhjemítica e granítica, metamorfisados sedimentares anfibolito de e na fácies anfibolito; meta-vulcanossedimentares idades ii) seqüências metamorfisadas arquena-paleoproterozóica; iii) na metafácies granitóides do Paleoproterozóico (Bastos-Leal et al., 1996; Bastos-Leal, 1998). As seqüências metassedimentares e metavulcanossedimentares (Figura 2.2) estão agrupadas no Complexo Licínio de Almeida nos grenstone belts de, Urandi, Boquira, Ibitira-Brumado, Guajeru, Riacho de Santana-Urandi, Contentas Mirante, Umburanas e Mundo Novo respectivamente (Cunha et al., 26 1996 a,b; Barbosa et al., 1996; Bastos-Leal et al., 1997; Bastos-Leal et al., 1998; Silva & Cunha, 1999; Barbosa et al., 2003). Figura 2.2 – Mapa Geológico do Estado da Bahia simplificado, mostrando os principais terrenos Greenstone Belt e Seqüências Vulcanossedimentares. Fonte: Modificado de Silva & Cunha (1999). Bastos-Leal, (1998), através dos métodos U/Pb, Pb/Pb, Rb/Sr, Sm/Nd e K/Ar, datou um série de corpos plutônicos (Figura 2.3), que estão associados a três eventos magmáticos distintos. O primeiro inicia no Paleoarqueano com desenvolvimento de núcleos de granitóides (granitos e TTG’s) através de episódios sucessivos de plutonismo, com idades variando entre 3.25 e 3.40 Ga 27 Figura 2.3 – Mapa geológico simplificado do Bloco Gavião na região de Brumado, destacando os granitóides estudados (Adaptado de Basto-Leal, 1998). 1- Coberturas fanerozóicas. Neoproterozóico: 2- Supergrupo São Francisco (Grupo Una). Mesoproterozóico: Supergrupo Espinhaço (SGESP), 3- Grupos Paraguaçu e Chapada Diamantina, 4- Complexo ígneometamórfico Lagoa Real. Paleoproterozóico: 5- Granitóides (granitos, granodioritos e monzogranitos); CA= Caculé, ES= Espírito Santo, IG= Iguatemi, RP= Rio do Paulo, SF= Serra da Franga, UM= Umburanas, GA= Gameleira, RPE= Riacho de Pedras. Arqueano: 6Greenstone belt de Contendas Mirante, 7- Seqüências greenstone belt do Bloco Gavião (GBU= Greenstone belt de Umburanas, IB= Complexo Ibitira-Brumado), 8- Granitóides (tonalitos, granitos e granodioritos); LM= Lagoa da Macambira, MP= Malhada de Pedras, SE= Serra do Eixo, MA= Mariana, SV= Sete Voltas, SP= Serra dos Pombos, LMO= Lagoa do Morro, JU= Jussiape; 9- Terrenos gnáissicos-migmatíticos da suíte TTG (tonalitos, trondhjemitos e granodioritos) com a presença subordinada de paragnaisses. Z.C.= Zonas de cisalhamentos. Falhas de empurrão. (Maciços de Sete Voltas, Boa Vista/Mata Verde). O segundo evento plutônico teria sido causado por processos de reciclagem continental, com idades variando entre 3.15 e 3.20 Ga, que formam rochas de composição granítica e granodioríticas (Sete Lagoas e Serra do Eixo). O terceiro evento, também de composição granítica e granodiorítica, com idade de cristalização em torno de 2.8 Ga, é considerado como produto da reciclagem continental dos terrenos TTGs formados durante o Paleoarqueano (Maciços de Serra dos Pombos e 28 Malhada de Pedra). Ainda de acordo com aquele autor, os TTG’s do Bloco Gavião apresentam graus variáveis de migmatização, coloração variando de cinza a rosa, texturas granoblástica, blastoporfirítica e hipidiomórfica (com menor freqüência), intensa deformação e recristalização. Além disso, tais rochas foram metamorfisadas na fácies anfibolito. 2.1.2. Complexo Lagoa Real Essa unidade é formada pela Suíte Intrusiva Lagoa Real e por um conjunto de gnaisses, albititos, epidositos, oligoclasitos anfibolitos, diabásios e charnoquitos (Cruz, 2004). A Suíte intrusiva compreende um conjunto de sienitos, sienogranitos, alcali-feldspatos e granitos (Cruz et al., 2007), que foram genericamente denominados de Granito São Timóteo por Fernandes et al., (1982). Por ação dos processos deformacionais e metamórficos durante o Ciclo Brasiliano, essas rochas passam lateralmente para granitóides foliados, gnaisses, augen-gnaisses e gnaisses fitados, que hospedam corpos lenticulares de albititos mineralizados em urânio (Lobato et al., 1982 e 1983; Brito et al., 1984; Raposo et al., 1984; Costa et al., 1985; Caby & Arthaud, 1987; Maruejol, 1989; Lobato et al., 1990; Cruz, 2004; Arcanjo et al., 2000; e Cruz et al., 2007). Segundo esses autores, tais rochas posicionam-se em zonas de cisalhamentos compressionais. A Suíte Intrusiva Lagoa Real foi datada por Pimentel et al., (1994), Cordani et al., (1992) e Cruz et al., (2007), tendo sido encontrado idade de cristalização para essas rochas em torno de 1.7 Ga. Recentemente, Chaves et al. (2007) encontrou idade em torno de 1.904 +/- 44 Ga. A mineralização de urânio também apresenta controvérsias. Stein et al., (1980) obteve idade U/Pb de 820 Ma (U/Pb em uraninitas, ao passo que Chaves et al., (2007), obtiveram dados de mesma natureza em 1.868 +/- 69 Ga. A colocação dessas rochas no Bloco Gavião está associado à fase pré a sin-rift do Aulacógeno do Paramirim (Arcanjo et al., 2000). Arcanjo et al., (2000) caracterizaram a Suíte Lagoa Real como sendo o produto de cristalização de um magma metaluminoso e calcialcalino de alto potássio, que foi produzido pela fusão parcial de uma crosta ígnea com provável contribuição sedimentar. Contudo, a assinatura geoquímica de alguns 29 elementos-traços indica que também houve a participação de material mantélico alcalino na fonte desse magma. Ainda segundo aqueles autores, o magma que gerou o granito São Timóteo é o mesmo que produziu as vulcânicas do Grupo Rio dos Remédios, que estão na base do Supergrupo Espinhaço Oriental. 2.1.3. Supergrupo Espinhaço O Supergrupo Espinhaço é constituído por rochas metavulcânicas ácidas a intermediária na base, que são sobrepostas por rochas metassedimentares originadas de sedimentos predominantemente terrígenos (Inda & Barbosa, 1978; Barbosa & Dominguez, 1996). As unidades que compõem esse supergrupo foram depositados em uma bacia (Bacia do Espinhaço, Aulacógeno do Paramirim) tipo rifte, intracratônica, cuja evolução de uma maneira geral, se deu desde o período Estateriano, há cerca de 1.750 Ma, até o Toniano, em torno de 850 Ma (Schobbenhaus, 1996; Danderfer-Filho, 2000; Danderfer-Filho & Dardene, 2002). De acordo com Barbosa & Dominguez (1996) e Rocha et al., (1998), o Supergrupo Espinhaço é formado pelos Grupos Borda Leste e Serra Geral na parte baiana da serra do Espinhaço (região do Espinhaço Setentrional) e pelos grupos Rios dos Remédios, Paraguaçu e Chapada Diamantina na região da Chapada Diamantina. Segundo Dominguez & Rocha, (1989); Barbosa & Dominguez, (1996); Rocha et al., (1998), o Grupo Borda Leste é representado pela Formação Mosquito. Essa formação é constituída da base para o topo por quartzito com laminações paralelas metapelitos ricos em e filitos, óxidos xistos de granadíferos ferro e interestratificados, manganês e camadas ferromagnesíferas. O ambiente deposicional é de plataforma marinha rasa com ocorrência de tempestades. O Grupo Serra Geral é representado pelas formações Salto e Sítio Novo. A Formação Salto é constituída por quartzitos finos a médios, por vezes conglomeráticos, com estratificação cruzada acanalada e por quartzitos também finos a médios bem selecionados, estes com estratificação plano- 30 paralela e estratificação cruzada de grande porte. Esta formação é caracterizada como um sistema deposicional fluvio-eólico (Rocha et al., 1998). Por outro lado, a Formação Sítio Novo é constituída por quartzitos médios, sericíticos, com estratificações cruzadas dos tipos acanalada e espinha-de-peixe; por quartzito avermelhado de granulação fina, sericítico, com intercalações centimétricas de filito grafitoso, cinza, com laminação planoparalela; e por quartzito de granulação média a fina com estratificação cruzada do tipo Hummocky. Essa formação foi caracterizada como um sistema deposicional litorâneo com fases de tempestade (Rocha et al., 1998) Guimarães et al., (2006) propuseram que, para a região da Chapada Diamantina, a Bacia do Espinhaço evoluiu a partir de duas bacias sedimentares ensiálicas, superpostas e diacrônicas. A primeira do tipo rifte-sag (Bacia do Espinhaço Oriental), e segunda do tipo sinéclise (Bacia Chapada Diamantina). De acordo com esses autores, a Bacia do Espinhaço Oriental evoluiu segundo as fases pré-rifte, representada pela seqüência deposicional Serra da Gameleira; sin-rifte, formada pela tecnossequências Novo Horizonte e Lagoa de Dentro-Ouricuri do Ouro; e pós-rifte, definida pela seqüência MangabeiraAçuruá (Grupo Paraguaçu). Já a Bacia Chapada Diamantina, armazenou os depósitos das Formações Tombador e Caboclo, pertencentes ao Grupo Chapada Diamantina. 2.1.4. Rochas Intrusivas Máficas As rochas intrusivas máficas ocorrem em forma de diques e sills, com a ampla distribuição regional e intrudem todo o conjunto de rochas metavulcanossedimentares do Supergrupo Espinhaço (Guimarães et al., 2006). Tratam-se de gabros/diabásio e dioritos cinza-escuro a esverdeado, de granulação média a fina, que mostram quase sempre textura ofítica a subofítica. Em geral, esses corpos são isotrópicos com foliação de fluxo magmático paralelos às paredes das intrusões (Arcanjo at al., 2000). A colocação destas rochas teria ocorrido em ambiente transtrativo sinistral antecedendo a deposição das formações Morro do Chapéu e Bebedouro, na 31 Chapada Diamantina e da Formação Santo Onofre, no Espinhaço Setentrional (Turnner de Oliveira & Correa-Gomes, 1996). Guimarães et al., (2006) propuseram duas gerações para essas rochas. A primeira, representada por leucogabro fino, foliado, deformado, são intrusivos nas unidades inferiores do Supergrupo Espinhaço. A segunda é constituída por gabro isotrópico que cortam as formações Tombador e Caboclo. Brito (2007), estudou um conjunto de diques que afloram na região da Chapada Diamantina. Segundo essa autora tais rochas são de cor cinzaesverdeada, com granulação variando entre fanerítica média a grossa, com variações locais de fluxo magmático. As rochas estudadas apresentam características típicas de toleítos continentais diferenciados de um magma primitivo. Ainda de acordo com aquela autora, essas rochas foram datadas por pelo método U-Pb na localidade Lagoa do Dionísio, tendo sido obtida idade de 1.5 Ga. 2.1.5. Supergrupo São Francisco No domínio do Corredor do Paramirim, o Supergrupo São Francisco ocorre na Serra do Espinhaço e na Chapada Diamantina. Esse supergrupo compreende um conjunto de rochas terrígenas e essencialmente carbonáticas, depositadas em ambiente marinho com influência glaciogênica. Na Serra do Espinhaço, o Supergrupo São Francisco encontra-se representado pelo Grupo Santo Onofre (Schobbenhaus, 1996) e na Chapada Diamantina pelo Grupo Una (Inda & Barbosa, 1978). O Grupo Santo Onofre é constituído por metarenitos, filitos carbonosos e metaconglomerados polimíticos basais (Arcanjo, et al., 2000). Danderfer & Dardenne (2002) propuseram que o Grupo Santo Onofre, seja constituído por três formações distintas, denominado Canatiba, Boqueirão e João Dias. A Formação é constituída por metapelitos, em geral carbonosos, com intercalações de arenitos em direção ao topo. A Formação Boqueirão, por sua vez, é composta por pelitos, carbonosos ou não, e arenitos de granulação fina a muito grossa, até microconglomerados. A Formação João Dias é constituída por brechas sedimentares, conglomerados, às vezes, interestratificados com arenitos grossos a muito 32 grossos, raros pelitos carbonáticos e chert laminados. A sua deposição ocorreu em discordância e angular sobre os sedimentos do Supergrupo Espinhaço envolvendo fluxos gravitacionais em ambiente lacustre e marinho profundo (Guimarães et al., 2006). Na Chapada Diamantina, por sua vez, o Grupo Una subdividi-se nas formações Bebedouro e Salitre. A Formação Bebedouro compreende diamictitos, ardósias laminadas, arenitos argilosos e arenitos finos formados sobre influência glaciogênica (Guimarães, 1996; Dominguez, 1993 e 1996). A Formação Salitre, por sua vez, é constituída por litofácies carbonáticas, intercaladas com pelitos, todas depositadas, ou em ambiente marinho raso, com constante agitação de ondas, ou em ambiente do tipo planície de maré (Leão & Dominguez, 1992; Leão et al., 1992). Através de correlações estratigráficas regionais, Danderfer (2000) e Danderfer & Dardenne (2002) propuseram uma evolução conjunta para o Supergrupo São Francisco na Chapada diamantina e na serra do Espinhaço Setentrional. Segundo esses autores, tanto o Grupo Santo Onofre, na Serra do Espinhaço Setentrional, quanto o Grupo Una, na Chapada Diamantina seriam o registro de uma bacia transtrativa instalada em torno 800 Ma. 2.2. Arcabouço Estrutural Regional Cruz (2004) e Cruz & Alkmim (2006), reconheceram três famílias de estruturas no Corredor do Paramirim: i) estruturas exclusivas do embasamento do Aulacógeno do Paramirim; ii) estruturas distensivas relativas à formação do aulacógeno e iii) estruturas que refletem a sua inversão (Figura 2.4). As estruturas restritas ao embasamento foram reunidas em dois grupos por Cruz (2004) e Cruz & Alkmim (2006). O primeiro, ocorre a oeste da cidade de Ibitira, onde a estruturação dominante é marcada por uma foliação gnáissica cuja orientação preferencial N170/56 SW. O segundo grupo posiciona-se a leste da cidade de Ibitira, onde a estruturação principal envolve um conjunto de estruturas dômicas desenvolvidas sobre a foliação gnáissica. As estruturas relativas à formação do Aulacógeno do Paramirim de acordo com aquela autora, são representadas por um conjunto de zonas de 33 cisalhamento com orientação NNW/SSE e movimento normal a normal-destral, que ocorrem a norte da cidade de Macaúbas. As estruturas associadas a inversão do aulacógeno foram divididas em duas fases diferentes chamadas de Da, Dp. A fase Da, corresponde a um conjunto de zonas de cislhamento WSW-ENE e dobras com vergência para norte. A fase Dp está marcada por zonas de cisalhamentos reversas, reversasdextrais e dextrais-reversas, com orientação preferencial segundo NNW-SSE, além de zonas de transferências sinistrais de orientação geral E-W. 2.3. Evolução Tectônica do Bloco Gavião O Bloco Gavião é um segmento crustal, cuja evolução tectônica é ainda matéria de controvérsia. Para Barbosa & Sabaté (2003), nesse bloco ocorrem dois grupos de TTG’s, metamorfisados na fácies anfibolitos. O primeiro grupo é constituído pelos TTG’s Sete Voltas, Boa Vista/Mata Verde e pelo tonalito Bernarda, com idades entre 3.4-3.2 Ga. As modelagens geoquímicas mostram que essas rochas se originaram pela fusão de basaltos toleiíticos, deixando anfibolitos ricos em granadas ou eclogitos como resíduos. O segundo grupo é composto pelos Granitóides Serra do Eixo, Mariana e Piripá com idades 3,23,1Ga, e tem origem similar ao primeiro, porém ele foi submetido à contaminação crustal. Para esses autores, as seqüências vulcanossedimentares foram formadas em bacias intracratônicas, na crosta antiga TTG, com a produção inicial de rochas vulcânicas continentais com idades em torno de 3,4 Ga, que depois da separação das bordas das bacias e oceanização foram cobertos por komatiítos basais, basaltos toleiíticos com pillow-lavas, rochas piroclásticas e sedimentos químicos-exalativos com idade de 3.2Ga. O segundo grupo representa a crosta granítica-granodioríticamigmatítica equilibrada na fácies anfibólito e com idades de 2,8-2,7Ga, que predomina no Bloco Gavião. Essa crosta é interpretada como produto da fusão parcial da crosta continental antiga (TTG). Ainda para Barbosa & Sabaté (2002), o Bloco Gavião tem se comportado como uma entidade única durante o Paleoproterozóico, cujo retrabalhamento tectônico teria ocorrido apenas em seu limite leste, na sua zona de interação com os blocos Jequié e Serrinha. Tais interações teriam 34 levado à estruturação do orógeno Itabuna-Salvador-Curaçá (Figura 2.5), o mais importante registro paleoproterozóico do Estado da Bahia. Figura 2.4 – Mapa Geológico e estrutural do Aulacógeno do Paramirim, destacando as principais estruturas tectônicas de idade brasiliana. BG- Bloco Gavião, BJ- Bloco Jequié, ZCBC- Zona de cisalhamento Brumado-Caetité, ES- Espinhaço Setentrional, CD- Chapada Diamantina, FRP- Faixa Rio Preto, SRP- Saliência do Rio Pardo (Faixa Araçuaí), VRP- Vale do Rio Paramirim e SG- Serra Geral. Fonte: Cruz (2004). 35 Figura 2.5 – Interação entre os três blocos arqueanos com a estruturação do Orógeno ItabunaSalvador-Curaçá. Fonte: Barbosa & Sabaté (2003). Por outro lado, Arcanjo et al., (2000) propuseram uma evolução arquena-palaoproterozóico para o Bloco Gavião em seis estágios sucessivos (Figura 2.6 e 2.7). De acordo esses autores, no Arqueano ocorreram três estágios. O primeiro estágio corresponde à formação da crosta siálica primitiva, com idade superior a 3.3 Ga, constituída por protólitos do complexo GnáissicoMigmatítico. O segundo estágio ocorreu entre 3.3 e 3.2 Ga e está relacionado com a fragmentação da crosta siálica primitiva, com a estruturação de sistema de riftes na direção preferencial WNW-ESSE e com a deposição das associações vulcanossedimentares (protólitos dos complexos Ibitira-Ubiraçaba, Ibiajara, Boquira e Riacho do Santana). Já o terceiro estágio ocorreu entre 3.0 e 2.7 e está relacionado com orogênese (subducção de placa oceânica sob placa oceânica para N-NE), fusão parcial da placa oceânica subductada, produção de plútons TTG (protólitos de porções dos complexos Santa Isabel e Paramirim), formação de prisma acrecionário, deformação tangencial e metamorfismo nos fácies xisto-verde e anfibolito. Ainda de acordo com aqueles autores, no Paleoproterozóico ocorreu o quarto estágio, sendo este subdividido em duas fases. Na primeira fase ocorreu orogênese, deformação tangencial com cavalgamentos para W-SW e 36 reorientação das estruturas existente para NNW-SSE. Na segunda fase houve espessamento crustal com fusão parcial da parte inferior da crosta siálica e retrabalhamento de litologias existente. Um período de relaxamento póscompressional do orógeno com geração de magmatismo híbrido (componente mantélica de natureza alcalina somados aos produtos da fusão parcial da crosta TTG) produziu intrusões de granitóides metaluminosas de filiação calcialcalina de alto potássio (batólito de Guanambi e granitos Boquira e Veredinha). Neste estágio houve a inflexão das estruturas NNW-SSE, que tendem a contornar os corpos graníticos. 1 – Crosta siálica primordial; 2 – Crosta oceânica; 3 – Associação vulcanossedimentar; 4 – Associação sedimentar; 5 – Associação TTG; 6 – Fusão parcial da crosta inferior; 7 – Granitos; 8 – Fusão mantélica. Figura 2.6 – Modelo evolutivo durante o Arqueano/Paleoproterozóico (Arcanjo et al., 2000). 37 1 – Crosta siálica; 2 – Formação Pajeú; 3 – Grupo Rio dos Remédios; 4 – Grupos Paraguaçu e Chapada Diamantina; 5 – Grupo Oliveira dos Brejinhos; 6 – Grupo Santo Onofre; 7 – Intrusivas Básicas; 8 – Suíte Intrusiva Lagoa Real; 9 Discordância. Figura 2.7 – Modelo evolutivo durante o Paleoproterozóico/Neoproterozóico (Arcanjo et al., 2000). No Mesoproterozóico, Moutinho da Costa & Inda (1982) reconheceram a instalação do Aulacógeno do Espinhaço, que foi posteriormente denominado de Aulacógeno do Paramirim por Pedrosa-Soares et al., (2001). Para Arcanjo et al., (2000), esse evento está relacionado com a implantação do Rifte Espinhaço que aproveitou os lineamentos estruturais de direção NNW-SSE. A sua instalação estaria associada com a fusão parcial da crosta inferior, que origina magmatismo calcialcalino de alto potássio, metaluminoso (Suíte Intrusiva Lagoa Real) e peraluminoso (Vulcanismo Rio dos Remédios), provavelmente com contribuição localizada de material mantélico e que se 38 associam a sedimentos dentríticos continentais. Além disso, um conjunto de intrusivas básicas se posiciona cortando o embasamento e as unidades sedimentares do Supergrupo Espinhaço. Um evento hidrotermal- metassomático produzindo corpos de albititos com concentrações econômicas de urânio na Suíte Lagoa Real teria ocorrido na transição entre o Meso e o Neoproterozóico (Pimentel et al., 1994; Schobbenhaus, 1996; Arcanjo et al., 2000; Cruz, 2004 e Cruz et al., 2007). Esse evento foi acompanhado por intrusões de rochas básicas e pela instalação do rifte Santo Onofre, com deposição dos sedimentos do grupo homônimo e do rifte Macaúbas (schobbenhaus, 1996). No Neoproterozóico, o Rifte Espinhaço ou o Aulacógeno do Paramirim foi invertido em função de esforços reflexos gerados pelas colisões que culminaram com a estruturação do Supercontinente de Gondwana (Alkmim et al., 1993; Danderfer-Filho, 2000; Cruz, 2004; Cruz & Alkmim, 2006; Alkmim et al., 2007). 2.4. O Orógeno Araçuaí – Oeste Congo Ocidental O Orógeno Araçuaí-Congo Ocidental (Figuras 2.8), corresponde a um conjunto orogênico de idade neoproterozóica-cambriana inserido na grande reentrância delineada pelos crátons do São Francisco e Congo (PedrosaSoares at al., 1998; Pedrosa-Soares & Wiedemann-Leonardos, 2000; PedrosaSoares et al., 2001). Esse orógeno é identificado por um conjunto de componentes tectônicos que caracterizam um orógeno colisional sucessor de um orógeno acrescionário de margem continental ativa, com depósitos de margem passiva, lascas ofiolíticas, zona de sutura, arco magmático, granitos sin-colisionais e plutonismo pós-colisional (Pedrosa-Soares et al., (2007). Segundo esses autores a evolução do orógeno em questão segue os seguintes estágios: a) pré-colisional (subducção da litosfera oceânica ativa, geração de arco magmático cálcio-alcalino); b) sin-colisional (interação direta entre as partes em colisão, espessamento crustal, fusão parcial e geração de magma tipo S); c) tardi-colisional (escapes laterais e geração de granito S por fusão parcial sob descompressão adiabática); gravitacional e plutonismo tipo I e A). e d) pós-colisional (colapso 39 Figura 2.8– Orógeno Araçuaí-Congo Ocidental no contexto do Paleocontinente Gondwana. FA – traços estruturais da Faixa de dobramentosAraçuaí; ZI – zona de interferência do Orógeno Aracuaí com o Aulacógeno do Paramirim. Crátons: A – Amazônico; K – Kalahari; PP-RP – Paraná-Paranapanema-Rio de La Plata; SF-C – São Francisco-Congo; SL-AO – São LuísOeste Africano. Fonte: Alkmim et al., (2006). De acordo com Alkmim et al., (2006; 2007), o mecanismo de evolução tectônica do Orógeno Araçuaí-Congo Ocidental seria semelhante ao fechamento de um quebra-nozes (Figura 2.9). Para esses autores, o orógeno 40 em apreço poderia ser dividido em dez compartimentos tectônicos (Figura 2.10), que se diferenciam em função da orientação espacial, do significado cinemático, e da história de nucleação das estruturas dominantes. São eles: 1) Cinturão de Calvagamentos da Serra do Espinhaço Meridional; 2) Zona de Cisalhamento da Chapada Acauã; 3) Zona de Dobramentos de Salinas; 4) Corredor Transpressivo de Minas Novas; 5) Saliência do Rio Pardo e sua interação com o Aulacógeno do Paramirim; 6) Bloco Guanhães; 7) Zona de Cisalhamento de Dom Silvério e estruturas associadas; 8) Zona de Cisalhamento de Itapebi e estruturas associadas; 9) Núcleo Cristalino; e 10) Cinturão Oeste-Congolês. Figura 2.9 – Ilustração da evolução do Orógeno Araçuaí-Congo Ocidental pelo por Alkmim et al. (2007). Segundo Alkmim et al., (2007) e Pedrosa-Soares et al., (2007), a porção brasileira do Orógeno Araçuaí-Congo Ocidental, ou Orógeno Araçuaí, engloba 41 o vasto domínio orogênico compreendido entre o Cráton do São Francisco e a margem continental leste brasileira. Esse orógeno constitui um domínio brasiliano de deformação, metamorfismo e granitogênese desenvolvido como uma incisão de forma linguóide entre os crátons São Francisco e Congo (Pedrosa-Soares et al., 1992 a,b; Pedrosa-Soares & Wiedemann-Leonardos, 2000; Cruz et al., 2007). A interação entre esse Orógeno e o Aulacógeno do Paramirim forma uma grande curvatura com concavidade voltada para norte chamado Saliência do Rio Pardo (Cruz, 2004; Cruz & Alkmim, 2006; Alkmim et al., 2007). Figura 2.10 – Compartimentos tectônicos do Ogógeno Araçuaí-Congo Ocidenta: SE –Cinturão de Cavalgamento da Serra do Espinhaço Meridional; CA – Zona de cisalhamento da Chapada Acauã; S – Zona de dobramento de Salinas; MN – Corredor transpressivo de Minas Novas; RP – Saliência do Rio Pardo e zona de interação com Aulacógeno do Paramirim; BG – Bloco de Ganhães; DS – Zona de Cisalhamento de Dom Silvério; I Zona de Cisalhamento de Itapebi; NC – núcleo cristalino; OC – Faixa Oeste-congolesa. Fonte: Pedrosa-Soares et al., (2007). 42 O Aulacógeno do Paramirim (Pedrosa-Soares et al., 2001) corresponde a um par de riftes superpostos desenvolvidos na parte norte do Cráton do São Francisco, limitados pelas Faixas Brasilianas, Riacho do Pontal, Rio Preto e Faixa Araçuaí (Cruz, 2004). Esse aulacógeno teria evoluído desde o Paleoproterozóico até Neoproterozóico e engloba a Serra do Espinhaço Setentrional, os vales do Paramirim e do São Francisco e a Chapada Diamantina (Danderfer Filho, 2000; Cruz, 2004; Cruz & Alkmim, 2006; Cruz at al., 2007). Durante a evolução do Orógeno Araçuaí, o Aulacógeno do Paramirim sofreu um processo de inversão que originou o Corredor de Deformação homônimo. Esse corredor pode ser definido como uma faixa de deformação, com orientação geral NNW-SSE, que envolve substrato mais velho que 1.8 Ga do Bloco Gavião, um conjunto de rochas plutônicas com idades em torno de 1.7 Ga (Complexo Lagoa Real), rochas intrusivas maficas e rochas sedimentares do Supergrupo Espinhaço e São Francisco (Cruz, 2004). 43 CAPÍTULO III 3. GEOLOGIA LOCAL E PETROGRAFIA No período de 2 a 9 de agosto de 2007 foi realizado o estágio de campo na região de Caetité com objetivo de identificar, descrever e caracterizar as unidades lito-estruturais que afloram na área de ocorrência do Complexo Lagoa Real. Durante as expedições de campo foram descritos trinta afloramentos, dos quais 90% eram de rochas do Complexo Lagoa Real. As características estruturais, especialmente às relacionadas com a intensidade de deformação, permitiram identificar cinco tectonofácies, denominadas de granitóide com pouca deformação, granitóide foliado, augen-gnaisse, ortognaisses com foliação descontínua e ortognaisses com foliação contínua (Tabela 3.1). Nesta tabela foi feita uma comparação entre a intensidade de deformação observada em afloramento e a classificação proposta por sibson (1977), para ser aplicada as rochas da série milonítica gerada em zonas de cisalhamento. Paralelizadas às rochas do Complexo Lagoa Real foram encontrados diques de rocha básica, não deformadas, alojados segundo a foliação da rocha. Os 10% dos afloramentos restantes foram descritos como rochas do embasamento cristalino (gnaisses migmatítico e anfibolito), encaixante do complexo em foco. 3.1. Caracterização dos litotipos A caracterização dos litotipos identificados foi feita do ponto de vista macro e microscópico. A seguir, em cada seção serão descritas as 44 características macroscópicas dessas rochas. Entretanto, inicialmente, serão descritas as microestruturas que são comuns a todos os tipos de rochas verificadas e que compõem as tectonofácies indicadas na tabela 3.1, para que se possam evitar repetições desnecessárias. Vele ressaltar que a nomenclatura utilizada neste trabalho seguiu as orientações da International Union of Geological Science Subcommision the Systematics of Metamorphic Rocsks, apresentada em Fettes &Desmons (2007). Tabela 3.1 – Classificação de Sibson (1977), para as tectonofácies da área de estudo. Em afloramento, as tectonofácies descritas são cortadas por veios de quartzo e de epidoto e por fraturas de cisalhamento com clorita. De uma maneira geral, as rochas menos deformadas, ou seja, as protomiloníticas (granitóides e granitóides foliados) e as miloníticas (augengnaisses) ainda preservam microestruturas ígneas, ou seja, apresentam microestruturas reliquiares do protólito ígneo, quais sejam: 1) Poiquilítica – marcada pela inclusão inclusões de biotita, plagioclásio, apatita, quartzo, anfibólio, apatita nos cristais de feldspato alcalino; inclusões de quartzo, minerais opacos, titanita alanita nos cristais de anfibólio. 2) Porfirítica – marcada pela presença de grãos tabulares (fenocristais) de feldspato alcalino, com granulação média a grossa imersos em matriz fanerítica. 45 3) Mimerquítica – caracterizada pelo intercrescimento entre grãos de plagioclásio e feldspato alcalino e vênulas de quartzo, em forma de bastões (Fotomicrografia 3.1). 4) Holocristalina – as rochas são apenas constituídas por material cristalino. 5) Anisotrópica – as rochas apresentam orientação preferencial marcado pelo alinhamento dos fenocristais de feldspatos (Fotomicrografia 3.2). 6) Isotrópica – marcada por domínios sem orientação preferencial dos minerais. 7) Inequigranular – os cristais apresentam dimensões variáveis. 8) Faneritica grossa a pegmatoidal – rochas constituídas por cristais de tamanho superior a 10 mm (Fotomicrografia 3.5). Na medida em que a deformação avança, nos termos miloníticos a ultramiloniticos, ocorrem microestruturas pós-mgmáticas, tais como: 1) Coroa de reação – caracterizada pelos minerais opacos coroados por agregados de titanita (Fotomicrografia 3.3). 2) Núcleo-Manto – marcada pela formação de novos grãos poligonais envolvendo a recristalização dos fenocristais de feldspato alcalino, plagioclásio e quartzo. 3) Pseudopoquilítica – marcada por inclusões metamórficas de epidoto, mica branca e calcita no feldspato alcalino e no plagioclásio (Fotomicrografia 3.4). 4) Porfiroclástica – marcada por cristais de feldspato alcalino imerso em matriz de grãos recristalizados. 5) Lepidoblástica/Nematoblástica – caracterizada pela orientação preferencial de biotita e anfibólio, respectivamente, que marcam a foliação nessas rochas (Fotomicrografia 3.6). 6) Milonítica – marcada por porfiroclastos de feldspato alcalino envolvidos por grãos poligonais e recristalizados. 7) Inequigranular – marcada pela variação granulométrica nas rochas. 46 Fotomicrografia 3.1 – Exibe cristal de plagioclásio (Pl) com vênulas quartzo (Qtz), constituído a microestrutura mimerquítica. Nicóis cruzados, amostra E-16 (783608/8438084). Fotomicrografia 3.2 - Mostra Fenocristal de feldspato alcalino (Afs) orientando, marcando a microestrutura anisotrópica. Nicóis cruzado, amostra E - 27 (778020/8440826). Fotomicrografia 3.3 – Exibe Microstrutura coroa de reação, marcada por minerais opacos (Op) coroados por agregados de titanita (Ti). Nicóis cruzado, amostra E-17 (784863/8439784). Fotomicrografia 3.4 – Mostra Porfiro de feldspato alcalino (Afs) com inclusões de mica branca (Mb) e quartzo (Qtz), caracterizando a microestrutura pseudopoiquilítica. Nicóis cruzado, amostra E-31 (776864/8444738). Fotomicrografia 3.5 – Mostra Microestrutura faneritica grossa em feldspato alcalino (Afs). Nicóis cruzado, amostra: E-17 (784863/8439784). Fotomicrografia 3.6 – exibe grãos de anfibólio (Anf) e biotita (Bt) orientados constituído a Microestrutura nematoblástica/lepidoblástica. Nicóis cruzado, amostra E31 (776864/8444738). 47 A seguir serão descritas as características macro e microscópicas associadas a cada um dos litotipos encontrados. A partir das descrições de campo e dos estudos petrológicos foi possível produzir, de forma preliminar, o mapa da figura 3.1. Neste estágio de conhecimento puderam ser diferenciados granitóides e gnaisses. Figura 3.1 – Mapa Geológico preliminar da área de estudo. Fonte: Modificado de Cruz et al., (2007). 3.2. Granitóides com pouca deformação e foliados Essa unidade ocupa a porção oeste da área de trabalho, representa 3% do mapa (Figura 3.1) e ocorre em forma de lajedos. As rochas possuem coloração bege a cinza azulado, granulometria grossa a muito grossa, contendo porfiros de feldspatos com até sete centímetros de comprimento (Fotografia 3.1). Em geral, neste grupo predomina as fácies porfirítica e cumulática. Os termos menos deformados variam entre isotrópicos (Fotografia 48 3.2 e 3.3), sem orientação preferencial nos termos cumuláticos, a anisotrópico, com orientação de fluxo magmático, especialmente nos termos porfiríticos. Os granitóides foliados, por sua vez, apresentam a anisotropia marcada pela foliação deformacional. Essas rochas apresentam-se pouco ou nada deformadas em zonas de cisalhamento, ocorrendo imersos em gnaisses, descritos a seguir. Em afloramento, essa deformação ocorre em domínios localizados e está representada por uma foliação descontinua marcada pela biotita e pelo anfibólio, além de estreitas zonas de cisalhamento (Fotografia 3.4). Neste caso, constituem os granitóides foliados. Ao microscópio, são rochas holocristalinas, mesocráticas, inequigranulares, com granulometria média a grossa. Fenocristais de feldspato alcalino imerso em matriz com feldspato alcalino, plagioclásio e quartzo são observados em amostras de todos os afloramentos descritos. Os granitóides sem deformação e os foliados são constituídas por feldspato alcalino, plagioclásio e quartzo, como minerais essenciais, e por biotita, anfibólio, granada, titanita, minerais opacos, apatita, mica branca, zircão e alanita como minerais acessórios (Tabela 3.2). Como minerais de alteração metamórfica podem ser encontrados a biotita verde, a titanita granular, a calcita, o epidoto e a mica branca. Fotografia 3.1 – Afloramento que exibe fenocristais de Fotografia 3.2 – Aspecto geral feldspato alcalino com até sete centímetros. Foto em indeformado. Foto em perfil. planta. Ponto E-17 (784863/8439784). (783980/8444840). do granitóide Ponto E-20 49 Fotografia 3.3 – Aspecto isotrópico e granulomeria Fotografia 3.4 – Granitóide pouco deformado, cortado grossa do granitóide pouco deformado. Foto em por zona de cisalhamento. Ponto E-19 planta. Ponto E-03 (776144/8441470). (784603/8439936). Os granitóides em foco apresentam texturas magmáticas reliquiares e, nos granitóides foliados possuem texturas metamórficas pré/sin-deformacional, ambas listadas anteriormente. De acordo com classificação modal utilizando o diagrama de Streckeisen (1976), essa unidade pode ser classificada como álcali feldspato quartzo sienito com granada (Figura 3.2). A presença dos plagioclásios e de álcali-feldspato formando minerais individualizados permite classificá-los como granito subsolvus (Winter, 2001). Os grãos de feldspato alcalino (58% a 67%) são tabulares, apresentamse subédricos com tamanho variando de 1,5mm a 7cm. Ocorrem como porfiroclastos em sua grande maioria e, subordinadamente, distribuídos na matriz. A extinção ondulante é comum. Essas se alinham segundo a clivagem do mineral. Os contatos entre os cristais de feldspato alcalino e os demais minerais são curvos, porém também se observa contatos retos. Nesses minerais ocorrem inclusões primarias de biotita, plagioclásio, apatita, quartzo, anfibólio e titanita. A alteração para a mica branca é comum. A geminação é polissintética e segundo a lei periclina. A maioria dos porfiroclastos apresentase pertítico, com feições de ex-solução posicionadas segundo a clivagem do mineral. Nas bordas desses porfiroclastos ocorrem incipiente formação de novos grãos pela recristalização desses porfiroclastos em função do estágio inicial de deformação. Em alguns fenocristais foi observada a presença de microestruturas do tipo pertitas em chamas, conforme Spry (1979). 50 O plagioclásio (5% a 8%) mostra-se anédrico a subédrico, tabular com tamanho variando de 0,04mm a 2 cm. Ocorre distribuído na matriz e/ou incluso no feldspato alcalino. Esse mineral, freqüentemente, exibe extinção ondulante. Os contatos entre os cristais de plagioclásio e os demais minerais são curvos e lobados. A geminação principal é segundo a lei albita, mais a albita-calrsbad pode ser encontrada. Tabela 3.2 - Classificação modal, as tectonofácies e o nome das rochas estudadas. Os grãos de quartzo (10% a 12%) são anédricos com tamanho variando de 0,03mm a 3 cm. Apresentam extinção ondulante regular e ocorrem distribuídos na matriz, preenchendo microfraturas em feldspatos e inclusos nos feldspatos alcalinos e anfibólios. Os contatos entre os cristais são curvos e lobados. Como minerais acessórios, tem-se por biotita, anfibólio, granada, titanita, minerais opacos, zircão, apatita, alanita. Os grãos de biotita (0% a 5%) são subédricos, às vezes euédrico, tabulares com tamanho variando 0,02mm a 3 cm. Ocorrem na matriz e inclusos nos cristais feldspato alcalino. Ao microscópio, apresentam pleocroísmo que 51 varia em tons de castanho. Esse mineral ocorre, na sua maioria, formando aglomerados com anfibólio, opacos e titanita. Figura 3.2. Classificação modal das rochas estudas. Campos e nomenclatura segundo Streckeisen (1976). O anfibólio (3% a 6%) apresenta-se anédrico a subédrico, com tamanho variando de 0,04mm a 3 cm. Estão distribuídos na matriz e/ou inclusos no feldspato alcalino. Apresentam forte pleocroismo variando entre verde oliva e verde musgo. Esses minerais apresentam inclusões primarias de quartzo, minerais opacos, titanita e alanita. A granada (0% a 2%) é anédrica, granular. Apresenta-se incolor a levemente amarronzada, sendo encontrada distribuída na matriz e inclusa nos feldspatos alcalinos. O tamanho dos grãos desse mineral pode variar de 3mm a 5,6mm. A titanita (2% a 3%) exibe coloração castanha e está distribuída na matriz ou associado com a biotita, anfibólio, granada e minerais opacos. Apresenta-se euédrica a subédrica, com hábito prismático. O seu tamanho varia de 0,04mm a 0,7mm e ocorre como grãos isolados ou formando agregados juntamente com o anfibólio. 52 A apatita (0% a 1%) é incolor, tabular, euédrica, prismática com tamanho variando de 0,03mm a 0,15mm. Está distribuída na matriz ou inclusa em feldspato, biotita e anfibólio. O zircão (0% a 1%) possui coloração castanha, é euédrico, com hábito prismático e com tamanho em torno de 0,2mm. Ocorre distribuído na matriz e/ou inclusos em plagioclásio, feldspato alcalino e biotita. Os minerais opacos (0% a 2%) apresentam-se como cristais anédricos a subédricos, com tamanho variando de 0,04mm a 2mm. Esses minerais apresentam-se coroado pela titanita e estão associados com a biotita, anfibólio ou distribuído na matriz. A alanita (0% a 1%) apresenta-se com coloração amarelada, ocorrendo desde anédrica até euédrica e com tamanho variando de 0,04mm a 0,2mm. Os minerais metamórficos, pós-magmáticos, são constituídos pela biotita verde, titanita, mica branca e calcita. A biotita verde (0% a 2%) possui pleocroismo variando entre verde claro a verde-acastanhado, é subidioblástica, tabular. Apresenta-se com tamanho variando entre 0,07mm e 5,8mm. Ocorre associada coma biotita castanha e o anfibólio. A titanita metamórfica castanha clara e ocorre em agregados granulares juntamente com a biotita verde. O seu tamanho varia entre 0,07mm a 1mm. A mica branca (1% a 3%) apresenta-se subidioblástica, tabular com tamanho variando de 0,05mm a 4,2mm. Esse mineral é produto da alteração hidrotermal do plagioclásio e do feldspato alcalino. Ocorrem inclusos nesses minerais ou distribuídos na matriz. A calcita (1% a 2%) é xenoblástica, com tamanho variando de 0,15mm a 2,74mm. Ocorre substituído plagioclásio e anfibólio. 3.3. Gnaisses Essa unidade ocorre com maior freqüência na parte leste da área de trabalho e representa 97% do mapa (figura 3.1). As rochas ocorrem como lajedos e em corte de estrada, sendo representadas por augen-gnaisse, ortognaisses com foliação descontínua e ortognaisses com foliação contínua. Essas rochas possuem coloração bege, laranja, cinza alaranjado e cinza claro. 53 A granulometria varia de média a grossa, sendo constituídos principalmente por feldspato, quartzo, biotita e anfibólio. A foliação dos gnaisses é marcada pela orientação preferencial da biotita, do anfibólio e do quartzo estirado. Essa estrutura pode ocorrer dobrada (Fotografia 3.5), principalmente nos afloramentos de ortognaisse com foliação descontinua. Nos afloramentos foi possível verificar que os granitóides são progressivamente transformados em augen-gnaisse (Fotografia 3.6). Com o aumento da deformação, os augen são gradativamente estirados e a rocha torna-se um ortognaisse com foliação continua (Fotografias 3.7). Nessas rochas, o bandamento composicional é bem desenvolvido e marcado pela alternância de níveis ricos biotita e anfibólio e niveis ricos em quartzo e feldspato (Fotografia 3.8). Esse bandamento é paralelo à foliação principal. Ao microscópio, são rochas holocristalinas, mesococráticas, com granulométria variando de fina a grossa. A presença de porfiroclastos é comum nos termos menos deformados. Neste caso, a rocha apresenta-se inequigranular e com coexistência de microestruturas magmáticas reliquiares e metamórficas/sin-deformacional. Nos termos mais deformados, predomina a microestrutura equigranular, com a quase inexistência de porfiroclastos e sem microestruturas reliquiares do protólito ígneo. Os gnaisses são constituídos por feldspato alcalino, plagioclásio e quartzo como minerais essenciais e por biotita, anfibólio, titanita, minerais opacos, apatita, zircão, alanita como minerais acessórios e pela mica branca, titanita e calcita como minerais metamórficos (Tabela 3.2). O feldspato alcalino (55% a 77%) é subidioblástico, às vezes xenoblástico, tabular, com tamanho variando de 0,6mm a 7cm. Apresenta-se como porfiroclasto e/ou formando grãos poligonais, produtos da recristalização sintectônica. Esses novos grãos podem estão distribuídos na matriz ou como agregados formando a microestrutura núcleo-manto. Os contatos feldspato alcalino-feldspato alcalino e deste mineral com os demais variam de retos a curvos, podendo em alguns lugares serem lobados. Nesses minerais ocorrem inclusões de biotita, plagioclásio, apatita, quartzo, anfibólio, apatita e zircão. A passagem do porfiroclasto para o manto de subgrãos é gradual, podendo ser verificada a presença da extinção ondulante e de subgrãos. A geminação predominante é a polissintética, segundo a lei periclina, mas a geminação 54 carlsbad pode ocorrer. O feldspato pode ocorrer metamorficamente alterado para a mica branca. Fotografia 3.5 – Ortognaisse exibindo foliação Fotografia 3.6 – Augen-gnaisse exibindo descontinua dobrada. Foto em perfil. Ponto E-16 porfiroclastos contornados pela foliação. Foto em (783608/8438084). perfil. Ponto E-31 (776864/8444738). Fotografia 3.7 – Transição entre augen-gnaisse e Fotografia 3.8 – Gnaisse com foliação continua gnaisse com foliação continua. Foto em perfil. Ponto paralelizada ao bandamento composicional. Foto TA19 (791219/8431950). em perfil. Ponto E-49 (786329/8443796). O plagioclásio (5% a 14%) mostra-se subidioblástico, às vezes xenoblástico, tabular, com tamanho variando de 0,08mm a 3 cm. Ocorre distribuído na matriz, como grãos poligonais, e/ou como pertita em chamas em porfiroclastos de feldspato alcalino. A extinção desses minerais normalmente é ondulante. O contato plagioclásio-plagioclásio e deste com os demais minerais variam entre retos e curvos. A geminação principal é segundo a lei albita, mas a albita-calrsbad pode ser encontrada nos porfiroclastos. Em alguns grãos ainda é possível reconhecer a pertita ígnea. Esse mineral ocorre 55 saussuritizado. Em alguns domínios, é possível observar a presença do epidoto. O quartzo (5% a 12%) ocorre xenoblástico e subidioblástico, com tamanho variando de 0,04mm a 2cm. Apresenta extinção fortemente ondulante. Esse mineral ocorre: (i) distribuído na matriz, formando agregados de grãos poligonais. Às vezes ocorrem estirados e orientados marcando a foliação deformacional; (ii) preenchendo microfraturas em feldspatos; (iii) inclusos nos feldspato alcalino e anfibólio. O contato quartzo-quartzo varia entre curvo, lobado e serrilhado. Os minerais acessórios, constituído por biotita, anfibólio, titanita, minerais opacos, zircão, apatita, alanita, estão distribuídos pela matriz da rocha e inclusos nos minerais essenciais em proporções variáveis. Esses minerais variam de anédrico a euédrico para cristais reliquiares e xenoblástico a idioblástico para os cristais metamórficos. Eles ocorrem como grãos isolados ou formando agregados. A biotita (0% a 9%) é subidioblástica, às vezes idioblástica, tabular, com tamanho variando de 0,03mm a 2 cm. Ocorre na matriz formando aglomerados associados com o anfibólio, minerais opacos e titanita, ou inclusa em feldspato alcalino. Quando na matriz, marca a foliação metamórfica sin-deformacional. O pleocroísmo é forte, variando desde castanho, castanho-esverdeada a verde. O anfibólio (0% a 8%) é subidioblástico a xenoblástico, com tamanho variando de 0,04mm a 3cm. Estão distribuídos na matriz, neste caso formando agregados associados com os cristais de biotita, cristais de minerais opacos e titanita, ou inclusos no feldspato alcalino. Quando na matriz, ocorre orientado e marcando a foliação. Apresentam forte pleocroísmo variando entre verde oliva e verde musgo. Podem apresentar inclusões de quartzo, minerais opacos, titanita e alanita. A titanita (1% a 4%) ocorre como titanita ígnea e metamórfica. A titanita ígnea exibe coloração castanha e está distribuída na matriz ou associado com a biotita, anfibólio e minerais opacos. Apresenta-se como cristais euédricos a subédricos de coloração com hábito prismático, com tamanho variando de 0,07mm a 0,7mm e ocorre como grãos isolados ou formando agregados. 56 A apatita (0% a 2%) é incolor, tabular, idioblástico, prismática com tamanho variando de 0,03mm a 0,15mm. Está distribuída na matriz ou inclusa em feldspato, biotita e anfibólio. O zircão (1% a 2%) possui coloração castanha, é euédrico, de hábito prismático e com tamanho em torno de 0,2mm. Ocorre distribuído na matriz e/ou inclusos em plagioclásio, feldspato alcalino e biotita. Os minerais opacos (0% a 3%) apresentam-se como cristais anédricos a subédricos, com tamanho variando de 0,04mm a 3,8mm. Esses minerais apresentam-se na matriz coroado pela titanita e estão associados com a biotita, anfibólio. A alanita (0% a 2%) apresenta-se com coloração amarelada, pode variar de anédrica a euédrica, com tamanho variando de 0,04mm a 0,5mm. Os minerais metamórficos são constituídos pela biotita verde, titanita, mica branca e calcita. A biotita verde (0% a 4%) é subidioblástica, tabular, com tamanho variando de 0,07mm a 5,8mm. Ocorre associada com a biotita castanha e com o anfibólio. A mica branca (0% a 2,5%) apresenta-se xenoblástica a subidioblástica, tabular com tamanho variando de 0,05 mm a 8 mm. Esse mineral é produto da alteração do plagioclásio, da biotita e do feldspato alcalino. Ocorre incluso nesses minerais ou distribuído na matriz. A titanita metamórfica ocorre como cristais xenoblásticos, granulares, com tamanho variando 0,07mm a 1mm. A calcita (0% a 3%) é xenoblástica, com tamanho variando de 0,15mm a 2,74mm. Ocorre substituído plagioclásio e anfibólio. O epidoto (0% a 14%) apresenta-se como cristais idioblástico, coloração variando de verde a azul. Sua granulação varia de 0,05mm a 0,2mm e ocorrem distribuídos na matriz, formando agregados e em algumas lâminas esse mineral compõe a foliação dos gnaisses. De acordo com classificação modal utilizando o diagrama de Streckeisen (1976), essa unidade pode ser classificada como anfibólio biotita álcali feldspato quartzo sienito ortognaisse, anfibólio álcali feldspato quartzo sienito ortognaisse, biotita álcali feldspato quartzo sienito ortognaisse, anfibólio quartzo sienito ortognaisse, biotita quartzo sienito ortognaisse, quartzo sienito 57 ortognaisse, álcali feldspato quartzo sienito ortognaisse e anfibólio epidoto quartzo sienito ortognaisse. 3.4 Arcabouço Estrutural da Área de Trabalho A análise estrutural da área de estudo foi baseada no tratamento dos dados de foliação e lineação coletadas durante o estagio de campo e dos dados gentilmente cedidos pela professora Simone Cruz. Durante os trabalhos de campo, além das medidas de foliação e lineação, foram coletadas medidas de falhas, fraturas, eixos de dobras e indicadores cinemáticos. Na área de trabalho só foi encontrada uma fase deformacional F1”. Esta fase foi subdividida em dois estágios, F1’ e F1”. O primeiro estágio F1’, foi responsável pela gnaissificação dos granitóides isotrópicos, tendo como elementos estruturais: a) foliação milonítica S1’, que varia desde anastomosada, nos termos menos deformados, a contínua, nos termos mais deformados (Fotografia 3.6, 3.7 e 3.8). Essa foliação é marcada pela orientação da biotita, do anfibólio e pelo bandamento composicional marcado pela alternância entre níveis máficos e félsicos. No diagrama estereográfico (Figura 3.3), ela apresenta um máximo de 81p/090 e um plano máximo de N180/01W. Ainda analisado o diagrama estereográfico, observa-se que o mergulho da foliação varia bastante com valores de baixo ângulo para todos os quadrantes. Tal distribuição sugere a existência de uma estrutura dômica. Apesar da ampla distribuição, foi possível calcular uma guilanda cujo pólo posiciona-se em 01p/184. b) A lineação de estiramento mineral (Lx1’), observada no plano XY, é marcada pela orientação do anfibólio e de agregados policristalinos de quartzo e feldspato alcalino disposto segundo o eixo X do elipsóide de deformação finita. O diagrama estereográfico mostra um máximo de 21p/225 e o pólo da guilanda posicionado em 03p/328 (Figura 3.3). c) Indicadores de movimento, que são os observados no plano XZ, tais como estruturas S/C, estruturas “sigma” envolvendo porfiroclastos de feldspato alcalino, sugerem movimentos compressionais. As distribuições das guilandas, planos máximos e Lx 1’ sugerem tensões principais segundo WSW-ENE a E-W. 58 Figura 3.3 – Diagrama estereográficos (Hemisfério inferior) para a foliação metamórfica e lineação estiramento, com o calculo da Lb das rochas da porção sul do complexo Lagoa Real. Em escala microestrutural, observa-se desde rochas menos deformadas, estas representadas por protomilonitos (granitóides e granitóides foliados) e milonitos (augen-gnaisses), que ainda preservam microestruturas ígneas reliquiares como poiquilítica e Porfirítica, até rochas bastante deformadas, representadas por ultramilonitos (ortognaisses com foliação continua), onde as texturas poligonais predominam e os porfiroclastos de feldspatos não são mais observados. Nos protomilonitos os processos de deformação envolvem a formação de foliação incipiente através da rotação friccional de minerais como biotita e anfibólio, além de deformação plástica de minerais como quartzo e feldspato. A extinção ondulante contínua, assim como a presença de subgrãos e novos grãos poligonais em textura núcleo-manto sugerem a presença de mecanismos de recristalização dos porfiroclastos de feldspato alcalino, plagioclásio e quartzo. Os novos grãos permanecem nas bordas do hospedeiro, que exerce forte controle cristalográfico sobre eles (Fotomicrografia 3.7). Nos milonitos a recristalização passa a ser um mecanismo bastante eficiente. Neste caso, porfiroclastos ainda são encontrados, embora ocorram bastante recristalizados nas bordas. O manto de novos grãos é constituído essencialmente de microclina, sem substituições de pertitas sem chamas, e por 59 plagioclásio. Nessas rochas, inicia-se o desenvolvimento do bandamento metamórfico que se posiciona paralelo à foliação principal. Fotomicrografia 3.7 – microestruturas miloníticas com porfiroclasto de feldspato alcalino (Afs) envolto por manto de novos grãos, caracterizadouma microestrutura manto-núcleo. Ng- Novos grãos poligonais. Pf- porfiroclasto. Amostra E-17 (784863/8439784). Nos ultramilonitos o bandamento metamórfico já está bem desenvolvido e contínuo. Os porfiroclastos já foram praticamente consumidos pela deformação e pela recristalização sin-tectônica (Fotomicrografia 3.8). Os processos deformacionais e de recristalização tectônica envolvendo quartzo e feldspatos nas transições protomilonito-milonito e milonito- ultramilonito são bastante eficientes. A presença de novos grãos poligonais com geometria e tamanho semelhantes à dos subgrãos sugerem a atuação mecanismo de recristalização por rotação de subgrãos. A transição dúctil-rúptil do quartzo ocorre entre 250 e 300°C (Voll 1976, Tullis 1976, 1983, Sibson 1990). Já o limite dúctil-rúptil para o feldspato seria em torno de 500-550°C (Simpson 1986, Vauchez 1987) (Figura 3.4). Os processos deformacionais associados com feldspato e quartzo dos gnaisses gerados pelo estágio F1’ sugerem que a deformação atingiu temperaturas superiores aos 500-550°C, ou seja, em condições de fácies anfibolito e de temperaturas superiores ao limite dúctil-rúptil dos feldspatos (Figura 3.5). Associado ao segundo estágio deformacional (F1”) observam-se fraturas de cisalhamento que cortam a foliação milonítica principal. Essas fraturas são marcadas pela presença de quartzo, clorita e epidoto. Na microescala é comum 60 encontrar grãos de feldspato microfraturados. Neste sentido, de acordo com Simpson (1986) e Vauchez (1987), a segunda fase de deformação ocorreu em condições inferiores aos 500-550°c, porém superiores aos 250 e 300°C, tendo em vista a ausência de feições de deformação rúptil no quartzo (Figura 3.4) Fotomicrografia 3.8 – Rocha ultramilonítica com grãos poligonais de microclina como produto da recristalização de porfiroclastos de feldspato alcalino (Afs). Ng- Novos grãos poligonais. Nicois cruzados, amostra E-48 (791068/8448120). O comparando-se as condições de temperaturas entre os F1’ e F1” (Figura 3.5) pode-se sugerir que as unidades do Complexo Lagoa Real foram deformadas em fácies anfibolito e, em seguida, trazidas para condições de menor temperatura. Tal fato deve ter ocorrido em virtude da existência de zonas de cisalhamento compressionais que promoveram o transporte de massa. 3.5 – Síntese da Geologia da área de trabalho Em suma, pode-se colocar que a Suíte Intrusiva Lagoa Real passou por processos deformacionais no estado sólido em função da nucleação de um conjunto de zonas de cisalhamento compressionais, de baixo ângulo. Tais zonas foram responsáveis pelas transformações das rochas sieníticas em gnaisses. Os variados estágios de deformação configuram as rochas foliadas (protomilonitos), augen (milonitos) e fitadas (ultramilonitos). 61 Figura 3.4 – Distribuição esquemática dos principais tipos de rochas encontradas em zonas de cisalhamento. Os quadros a e b representam o comportamento do feldspato/plagioclásio e do quartzo, respectivamente, em função da temperatura/profundidade. Em c, estão discriminados os tipos de zonas em função de a e b. em d, observa-se os quatro possíveis tipos de materiais encontrados em zonas de cisalhamento. Fonte Cruz (2004). Figura 3.5 – Modelo esquemático para explicar a variação da temperatura de deformação durante a evolução deformacional da área. PL- Pressão litostática. Em seguida, um conjunto de zonas de cisalhamentos dúctil-rúptil foram nucleadas, levando a formação de faixas estreitas de milonitos. Os processos deformacionais observados na microescala sugerem a atuação de mecanismo plásticos, com a recristalização sin-tectônica e destruição da trama primária 62 das rochas. As fases mais tardias de deformação não são expressivas e nem tão pouco apagaram os registros mais dúcteis da deformação. 63 CAPÍTULO IV 4. LITOGEOQUIMICA Como foi descrito no capitulo introdutório dessa monografia, assim como no capítulo 2, o Complexo Lagoa Real é constituído pela Suíte Intrusiva Lagoa Real e por um conjunto de ortognaisses, anfibolitos, charnoquitos, microclinitos e albititos. A suíte intrusiva, por sua vez, compreende um conjunto de sienitos, sienogranitos, alcali-feldspatos e granitos, genericamente chamados de São Timóteo por Fernandes et al. (1982), que por ação dos processos deformacionais e metamórficos em zonas de cisalhamento, durante o evento Brasiliano, foram transformados em granitóides foliados, ortognaisses com foliação descontinua, augen-gnaisses e ortognaisses com foliação contínua, como demonstrado nessa monografia, que em alguns locais hospedam corpos lenticulares de albititos, às vezes mineralizados em urânio (Lobato et al., 1982 e 1983; Brito et al., 1984; Raposo et al., 1984; Costa et al., 1985; Caby & Arthaud, 1987; Maruejol, 1989; Lobato et al., 1990; Cruz, 2004; Arcanjo et al., 2000; e Cruz et al., 2007). Segundo Lobato et al., 1982 e 1983, Lobato (1995), Lobato & Fyfe (1990), Cruz (2004), Cruz et al., (2007), a mineralização de urânio é posterior á colocação dos granitóides genericamente denominados de São Timóteo e está relacionada com frentes de albitização. Para Chaves et al., (2007), entretanto, a mineralização está relacionada com a presença de fluidos magmáticos tardios que enriqueceram a rocha em urânio. Independente do modelo adotado, os processos envolvidos na gênese da mineralização devem 64 ter provocado mobilização de alguns elementos químicos e/ou a introdução de outros. Diante do exposto, na caracterização geoquímica das unidades é preciso levar em consideração a história geológica da área, pois elementos litófilos de raio grande (LILE) tais como Si, Rb, Ba, Sr, Ca, e K, podem ser remobilizados durante processos pós-magmatico relacionados com a interação fluido-rocha. Já os elementos de alto campo de força (HFSE), como Th, Zr, Ti, Nb, Ta e ETR, são teoricamente imóveis, podendo ser usados para caracterizar mecanismo petrogenéticos e ambientes geodinâmicos. A concentração desses elementos é controlada pela química da fonte e pelos processos em que há interação cristal/fundido (cristalização fracionada) que ocorrem durante a evolução da rocha (Scandolara et al., 2006). De acordo esses autores, os elementos considerados imóveis são controlados por minerais individuais. Por exemplo: concentrações de Zr podem ser controladas por zircão, de P por apatita, de Sr por plagioclásio, de Ba por feldspato alcalino, de Ti, Nb e Ta por ilmenita, rutilo ou titanita. Nesse capítulo serão apresentados os aspectos relacionados ao comportamento geoquímico das onze amostras do Complexo Lagoa Real que foram coletadas durante as etapas de campo, cujos dados químicos estão na tabela 4.1. 4.1 Elementos Terras Raras Como os estudos petrográficos não permitiram a diferenciação dos tipos litológicos, tendo em vista que todas as rochas foram classificadas como sienitos (vide figura 3.1 e tabela 3.2), optou-se por iniciar o trabalho com os dados de elementos terras raras, uma vez que os diagramas gerados forneceram bons resultados, como será demonstrado a seguir. A figura 4.1 apresenta os diagramas de distribuição dos elementos terras raras para rochas estudas, normalizados segundo o condrito de Evensen et al., (1978). A distribuição desses elementos permitiu individualizar dois grupos de rochas, os quais foram separados em dois diagramas. O Grupo I, que compreende granitóides pouco deformados e gnaisses, apresenta um padrão com uma forte anomalia negativa em európio. O Grupo II, que 65 compreende gnaisses, apresenta padrão normal ou uma pequena anomalia positiva naquele elemento. Somente a partir dessa subdivisão é que foi possível individualizar dois grupos de rochas no mapa da área de trabalho (Figura 4.2). Ainda analisando esses diagramas, pode ser observado que as rochas dos dois tipos exibem um padrão alcalino, mostrando um forte enriquecimento nos terra raras leves (TRL) em relação aos pesados (TRP). Tabela 4.1 – Resultados das analises químicas dos elementos maiores (%), traços (ppm) e terras raras (ppm) para as rochas da porção sul do Complexo Lagoa real. 66 Figura 4.1 – Padrões de elementos terras raras para as rochas da área de estudo. Figura 4.2 – Mapa Geológico da área de estudo. Fonte: Modificado de Cruz et al., (2007). 4.2 Elementos Maiores 67 Os estudos petrográficos não mostraram fortes evidências de processos metassomáticos nas amostras estudadas que, de acordo com Cruz et al., (2007) estariam relacionados com a presença de pertitas em chamas. Desta forma, as análises dos elementos maiores foram utilizadas para classificação das rochas da área de estudo e construção de diagramas de variação, com objetivo de obter informações sobre a formação e evolução dessas rochas. Além disso, nos casos em que os resultados foram discordantes com aqueles relacionados com a petrografia, preferiu-se manter os gráficos para que se pudesse realizar um exercício a cerca das alterações químicas pósmagmáticas pelas quais as rochas possam ter passado. Para classificação química das amostras foi utilizado o diagrama de Cox et al., 1979 (Figura 4.3), que relaciona as concentrações de K2O + Na2O com a concentração de SiO2. Esse diagrama mostra que as rochas estudadas apresentam caráter ácido e que, em sua maioria, ocupam o campo as rochas alcalinas, com exceção das duas amostras de gnaisse do grupo I, que caíram no campo das rochas subalcalinas. Em termos composicionais, no diagrama em foco esta variou entre sienítica e, principalmente, granítica. As diferenças em termos de composição quando comparada com o que foi verificado nos estudos petrográficos possivelmente reflete alguma alteração na composição química das rochas durante os processos de deformação e ou metamorfismo aos quais foram submetidas, como por exemplo, um enriquecimento em sílica ou perda de potássio. O diagrama de Shand (1943) mostra as razões de Al2O3/(Na2O + K2O) e Al2O3/(CaO + Na2O + K2O), em proporções moleculares. Segundo esse autor as rochas podem ser metaluminosas se (Na2O + K2O) < Al2O3 < (CaO + Na2O + K2O); peralcalinas se Al2O3 <(Na2O + K2O) e peraluminosa se Al2O3 < (CaO + Na2O + K2O) (Figura 4.4). As amostras estudas foram plotadas no campo das rochas metaluminosas (Figura 4.4), significando que há um excesso de alumina em relação aos somatório de sódio e potássio. A presença de minerais como biotita e anfibólio nas rochas possivelmente facilitam essa condição. Os diagramas de Harker (Figura 4.5), de uma maneira geral, amostram uma ampla dispersão para as rochas estudadas. Essa dispersão pode estar relacionada a alguns fatores, tais como, taxas diferenciadas de fusão parcial, 68 envolvimento de material crustal nos processos magmáticos, contaminação crustal do magma e processos de metassomatismo. Figura 4.3 – Diagrama Tas (álcalis versus sílica) para classificação de rochas plutônicas, segundo Cox et al., (1979), aplicado às rochas estudas. Figura 4.4 – Índice de saturação em alumina, segundo Shand (1943), das rochas estudadas. 69 Trabalhos isotópicos mais detalhados deverão ser realizados para determinar qual (is) o (s) fator(es) responsável (is) por essa dispersão. Por esta razão as rochas serão analisadas através de cada grupo, quais sejam I e II, de acordo com a divisão realizada utilizando os padrões dos elementos terras rara. Os diagramas da figura 4.5 mostram as seguintes características geoquímicas para os granitóides e gnaisses do Grupo I: a) Conteúdo de SiO2 varia de 66.3% a 69.6%; b) São rochas enriquecidas em Al2O 3 (14.2% a 15.0%), e empobrecidos em TiO2 (0.29% a 0.31%) e P2O5 (0.041% a 0.060%); c) Apresentam uma correlação negativa para FeOT e K2O, ou seja, diminuição do FeOT e K2O com aumento de SiO2. Apesar do pouco numero de amostra observa-se que a uma significativa perda de FeOT e principalmente de K2O com a deformação (transformação dos granitóides em gnaisses). Estudos mais detalhados com um número maior de amostras serão necessários para comprovação deste processo; d) Mostram uma correlação positiva para Na2O, ou seja, a concentração desse elemento aumento com crescimento do teor de SiO2, principalmente paras para os gnaisses; e) O Fe2O3 permanece relativamente constante para os granitóides com aumento da sílica, e aumenta para as duas amostras de gnaisses sem praticamente variar o teor de sílica. f) O CaO permanece relativamente constante com o aumento da sílica, com exceção de uma amostra gnaisse que apresenta uma forte anomalia positiva neste elemento, provavelmente relacionada a veios de epidoto muito comum na área de trabalho. Já para os gnaisses do grupo II, observa-se as seguintes características: a) O conteúdo de SiO2 varia de 63.9% a 69.9%; b) As rochas são enriquecidas em Al2O 3 (14.2% a 15.0%), e empobrecidas em TiO2 (0.26% a 0.53%) e P2O5 (0.050% a 0.14%); c) Apresentam uma correlação negativa para Al2O3, TiO2 , CaO e P2O 5, ou seja, há diminuição do Al2O3, TiO2 , CaO e P2O5 com o aumento do SiO2. 70 d) Os teores de FeOT diminuem nos domínios mais pobres de SiO2 e, em seguida, permanecem constante com o aumento daquele óxido. e) Em direção ao trend de diferenciação, os teores de Na2O também diminuem num primeiro estágio, mais depois aumentam com o aumento do conteúdo de SiO2. f) As concentrações de K2O praticamente não variam com o aumento de SiO2. g) O Fe2O3 em um estágio mostra um pequeno crescimento na sua concentração e depois diminui com aumento de Si2O. Para esse grupo de rochas, observa-se um comportamento para o titânio que é compatível com o que pode ser esperado para rochas ácidas, uma vez que fases minerais como titanita, são cristalizadas precocemente. Além disso, também verificou-se comportamentos anômalos com relação à diferenciação magmática com relação ao sódio e potássio. Tal comportamento sugere a possibilidade de enriquecimentos associados com processos metassomáticos e/ou com contaminação crustal. O cálcio, por sua vez, apresenta um comportamento compatível o que seria esperado para um processo normal de diferenciação magmática. 4.3 Elementos Traços As análises dos elementos traços foram utilizadas para construção de diagramas de binários e diagramas discriminantes binários e ternários com objetivo de obter informações sobre a formação, evolução, fonte e ambiente tectônico dessas rochas. Os diagramas de Harker para os elementos traços (Figura 4.6) serão tratados da mesma forma dos diagramas para os elementos maiores. Os diagramas gerados mostram que as rochas do Grupo I apresentam correlação negativa para Ba, Rb, Zr, Nb, Th e U com a sílica, ou seja, diminuição dos teores desses elementos com o aumento de SiO2. Esta diminuição provavelmente está relacionada ao fato do Ba e Rb substituir o K nos feldspato alcalino, a correlação negativa é compatível com o que foi observado para o K, no diagrama de elementos maiores (Figura 4.6). A diminuição do Zr, Th e U, 71 por sua vez, possivelmente estão associados com a diminuição dos minerais acessórios como zircão, titanita alanita, que se cristalizam no início. Por outro lado, os granitóides são mais pobres em Si 2O que os gnaisses, ao passo que são mais ricos em Ba e Rb que aquelas rochas. 72 Figura 4.5 - Diagramas de Harker mostrando a variação geoquímica dos elementos maiores das rochas da porção sul do Complexo lagoa Real. Legenda igual à da figura 4.4. 73 Figura 4.6 – Diagramas de Harker mostrando a variação geoquímica dos elementos traços das rochas da porção sul do Complexo lagoa Real. Legenda igual à da figura 4.4. 74 Para os gnaisses do Grupo II observa-se que os teores de Ba, Sr, Y, Zr, Nb e U aumentam em um primeiro estágio e depois diminui com aumento de SiO2. Esse comportamento pode está relacionado com substituição de alguns elementos maiores por estes durante o processo de cristalização fracionada, ou ao processo de contaminação crustal e/ou remobilização desses elementos durante os processos de alteração metassomática sugerida por Lobato (1985), Lobato & Fyfe (1990) e Cruz et al., (2007). Partir das análises tanto dos diagramas dos elementos maiores quanto dos elementos traços pode-se concluir que os gnaisses do grupo II são as rochas mais diferenciadas, pois apresentaram uma maior variação nos teores de sílica e trends que mostram o comportamento desses elementos com evolução da diferenciação. Porém estudos mais detalhados com coletas de muito mais amostras, principalmente do grupo I, é imprescindível para uma melhor caracterização petrogénetica dessas rochas. A figura 4.7 apresenta os diagramas multielementar para os elementos menores, normalizados com relação ao manto primitivo. Os dois diagramas multi-elementos normalizados ao Manto Primitivo apresentados demonstram a existência de fortes anomalias negativas em Sr, P e Ti, suaves anomalias negativas em Ba, U, Nb e Zr, com enriquecimento em Th, K, La e Y. Esse padrão é característico de rochas tipo A, de acordo com Scandolara et al. (2006). Esses padrões são idênticos aos observados nas vulcânicas Rio dos Remédios estudo por Teixeira (2005). Figura 4.7 – Diagramas de multi-elementos das rochas estudadas. 75 O diagrama discriminante para ambientes tectônicos de Pearce et al., (1984), que relaciona Y + Nb versus Rb (Figura 4.8), mostra que as rochas estudadas se distribuem no campo das rochas intra-placa (WPG). Figura 4.8 – Diagrama de discriminação tectônica para as rochas estudadas (Pearce et al., 1984). Por sua vez, o diagrama discriminante binário de Whalen et al., (1987), que relaciona Y+Nb+Ce+Zr versus (K2O+Na2O+CaO), separa os campos dos granitos A, I, S e M (Figura 4.9). As rochas estudas plotam no campo dos granitos A e são enriquecidas em Y+Nb+Ce+Zr. 76 Figura 4.9 – Diagramas discriminantes de Whalen et al., (1987), separando os campos dos granitos A, I, S e M para as rochas estudadas. No diagrama discriminantes de Eby et al., (1992), que utiliza os elementos Nb-Y-Ga, são definidos dois campos para os granitos do tipo A, quais sejam: (i) A1-granitos manto-derivado e (ii) A2-granitos crustais ou mantélicos com forte contaminação crustal (Figura 4.10). As amostras das rochas estudas foram plotadas no campo do tipo A2 (Granitos Crustais). Tal fato pode explicar a presença de granada. Figura 4.10 – Diagrama discriminante mostrando a subdivisão das rochas com relação a sua fonte, de acordo com Eby et al., (1992); A1-granitos manto-derivados e A2 – granitos crustais. 77 4.4. Síntese da Litogeoquímica Os dados geoquímicos das rochas da área de trabalho permitiram: a) Individualizar dois grupos (I e II) de rochas, através dos diagramas de distribuição dos elementos. O Grupo I apresenta um padrão desses elementos com uma forte anomalia negativa em európio, e o Grupo II apresenta um padrão normal ou uma pequena anomalia positiva neste elemento. Esses dois padrões distintos podem está relacionado com o fenômeno da cristalização fracionada diferenciada para cada grupo, fusão parcial, contaminação do magma por material crustal (mais provável), mistura de magmas ou pela presença dois magmas diferentes. Trabalhos posteriores mais detalhados de isótopos e de petrogênese poderão definir qual(is) processo(s) foram responsáveis por esses padrões. b) Os resultados sugerem que as rochas estudadas são de ambientes intra-placa continental, anorogênicas, cujo contexto geotectônico possivelmente reflete à abertura do Aulacógeno do Paramirim, em 1.75 Ga. c) Por fim sugerem que tratam-se de rochas alcalinas de caráter ácido, de composição química sienitica a granítica, diferente do que foi observado em lâmina, em que predominaram termos sieníticos, preferencialmente, e conteúdo de sílica variando de 63.9 a 69.9% em peso. Além disso, são metaluminosas e com características de rochas tipo A de derivação crustal. 78 CAPÍTULO V 5. CONCLUSÕES A partir de dados de campo, petrográfico, estrutural e geoquímico da área de estudo foi possível concluir que: a) Na porção sul do Complexo Lagoa Real podem ser reconhecidos granitóides pouco deformados a foliados, bem como um conjunto de ortognaisses, cuja composição varia entre álcali-feldspato quartzo sienito e quartzo sienito, tendo biotita anfibólio, granada, titanita, minerais opacos, apatita, mica branca, zircão e alanita como minerais acessórios e mica branca, calcita e epidoto como minerais metamórficos. Em todas as escalas de observação pode ser verificado que, em zonas de cisalhamento compressionais, os granitóides são progressivamente gnaissificados, podendo ser recuperadas rochas protomiloníticas (granitóide com pouca deformação e granitóide foliado), miloníticas (augen-gnaisse e ortognaisses com foliação descontínua) e ultramiloníticas (ortognaisses com foliação contínua). b) As análises dos dados estruturais mostraram a existência de uma única fase deformacional, que foi dividida em dois estágios. O primeiro estágio (F’1) foi responsável pela transformação dos granitóides em gnaisses, podendo ser reconhecidos na microescala processos de deformação dúctil envolvendo o quartzo e feldspatos, com recristalização sin-tectônica e destruição da trama 79 primária das rochas. A recristalização do feldspato sugere temperatura mínima de deformação em 550º C. O segundo estágio nucleou fraturas de cisalhamento que cortam a foliação principal das rochas gnáissicas. Na microescala, fraturas em feldspatos e a recristalização sintectônica do quartzo sugerem deformações entre 300 e 550º C. c) Os dados litogeoquímicos permitiram individualizar dois grupos (I e II) de rochas, ambos compreendendo granitos e gnaisses, através dos diagramas de distribuição dos elementos terras raras. O Grupo I, apresenta um padrão com forte anomalia negativa em európio, e o Grupo II, possui um padrão normal ou uma pequena anomalia positiva em európio. As rochas estudadas são alcalinas de caráter ácido, de composição química sienítica a granítica, metaluminosas, com características de rochas tipo A de derivação crustal e formadas ambiente anorogênico intra-placa continental. 80 CAPÍTULO VI 6. REFERÊNCIAS ALKMIM, F. F., BRITO NEVES, B. B., ALVES, J. A. C. Arcabouço tectônico do Cráton do São Francisco – uma revisão. In: Dominguez, J.M. & Misi, A. (eds) O Cráton do São Francisco. Reunião Preparatória do II Simpósio sobre o Cráton o Cráton do São Francisco. 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