Trabalhos Preliminares da Ala Central do Pátio de

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Trabalhos Preliminares da Ala Central
do Pátio de Inquisição – Coimbra1
Ana Sofia Gervásio2
Introdução
Em 2011 foram realizados trabalhos arqueológicos prévios à Recuperação da Ala Central do Pátio de
Inquisição, em Coimbra, promovidos pelo Gabinete para o Centro Histórico da Câmara Municipal de Coimbra
(GCH).
Este projeto situa-se no Pátio da Inquisição, freguesia Santa Cruz em Coimbra. O local está abrangido pela
servidão administrativa da Rua da Sofia – Dec. Nº 516/71, DG nº 274 de 22-11-1971. ZEP – Despacho de 1802-2010 do Diretor do IGESPAR, IP; Parecer de 20-01-2010 do Conselho Consultivo a propor que seja
apresentada nova proposta; Proposta de 09-11-2009 da DRCCentro para a ZEP dos imóveis classificados e
em vias de classificação do Centro Histórico de Coimbra.
As suas coordenadas são: latitude 40º12’44.96’’N e longitude 8º25’44.52’’W.
Ao tratar-se de uma zona arqueologicamente sensível, foram necessários trabalhos arqueológicos prévios ao
início da obra, tendo como objetivo minimizar os impactes negativos e prevenir a afetação de vestígios
arqueológicos ou patrimoniais.
Nesta fase realizou-se a escavação de cerca de 30% da área a intervencionar assim como a análise de cerca
de 30% dos paramentos a serem intervencionados, com o respetivo registo fotográfico, gráfico e topográfico.
A escavação foi realizada por unidades estratigráficas naturais segundo o Método de Harris, com recurso a
meios mecânicos nas camadas consideradas contemporâneas. O trabalho foi realizado pela arqueóloga Ana
Sofia Gervásio, com a colaboração dos arqueólogos Joana Garcia e Sérgio Madeira, das arqueólogas Sara
Almeida e Susana Temudo no desenho, e os assistentes operacionais Delfim Almeida e António Monteiro.
Enquadramento histórico do local
O atual projeto situa-se na designada Ala central do Pátio da Inquisição, em plena zona histórica da cidade de
Coimbra. A Ala Oeste foi anteriormente intervencionada, com sondagens arqueológicas de emergência
realizadas pela Dr.ª Helena Frade e Dr. José Carlos Caetano em 1989/92.
Este espaço deve o seu nome ao facto de entre 1566 e 1821 aqui ter funcionado o Tribunal da Inquisição de
Coimbra. No entanto, antes da instalação deste tribunal o espaço foi ocupado pelos colégios de São Miguel,
1
Este artigo tem como finalidade a comunicação sumária dos resultados auferidos da intervenção. Este relatório encontra-se
disponível para consulta no GCH – CMC no Grupo de Arqueologia, tendo sido aprovado pelo IGESPAR através do ofício 18920 de
09 junho 2011.
2 Técnica Superior de Arqueologia do GCH – CMC.
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Todos os Santos e das Artes. Foi uma época de difusão das ideias renascentistas e humanistas europeias,
com a vinda de vários mestres consagrados vindos da Europa. Mais tarde, os mesmos edifícios que
acolheram e propagaram as novas ideias serviram para sede de um dos mais repressivos tribunais da
História, que irá julgar, condenar e reprimir essas mesmas ideias novas (Frade e Caetano;1994:320).
Em pleno século XVI, D. João III realiza a transferência definitiva da universidade para Coimbra (1537). Tal
justifica-se no âmbito de um processo mais alargado de centralização régia, com o objetivo de modernizar as
estruturas académicas. Neste projeto, a universidade e os colégios implantados ao longo da rua da Sofia
teriam um papel determinante (Craveiro, 2006). Assim, a universidade instalar-se-ia ao longo da rua
denominada inicialmente de Santa Sofia (Dias, 1988) sob tutela do Mosteiro de Santa Cruz, organizada em
unidades colegiais de grande coerência formal e numa dimensão programática modularmente repetida
(Rossa, 2001). Extinto o priorado -mor de Santa Cruz em 1543, ao rei permitia-se ainda a tutela do mosteiro e
a ingerência nos seus espaços privados (Craveiro, 2006).
É nos espaços dos colégios crúzios de Todos – os – Santos e São Miguel (local atualmente ocupado pelo
edifício da Caixa Geral de Depósitos) que se acolhe o Colégio das Artes em 1548. Numa carta datada de 9 de
setembro de 1547 o rei pede ao crúzios os dois colégios para aí instalar o Colégio das Artes até à construção
dos novos edifícios (Craveiro, 2006), iniciando-se as aulas a 22 de fevereiro de 1548. Para a direção do
colégio o rei manda chamar o humanista André de Gouveia, principal do Colégio de Guiena em Bordéus.
Consigo trouxe outros mestres do humanismo europeu da época.
É em 1548 que se iniciam as obras de construção do novo edifício, denominado de Lanço Novo, localizado
numa faixa de terreno entre os colégios de São Miguel e de São Bernardo, que ia desde a rua da Sofia até
Montarroio. O terreno estava ocupado por dois caminhos públicos, um para Montarroio e outro para a
Conchada, e por várias casas e quintais de particulares. D. João III mandou avaliar e expropriar as casas e
quintais e ordenou que se fizessem noutro local os caminhos públicos existentes (Frade e Caetano; 1994).
Com uma traça inicial realizada por João de Ruão, os trabalhos acabaram por ser dirigidos por Diogo de
Castilho, embora seja possível que as modificações no projeto inicial não tenham sido significativas. Esta
construção sabe-se que nunca foi concluída (Craveiro, 2006).
Em 1555, devido a constantes problemas com os mestres estrangeiros, o colégio passa para o domínio da
Companhia de Jesus, estando instalados na Alta (Colégio de Jesus).
Embora lhes tenha sido proposto o abandono do Colégio de Jesus, isso nunca aconteceu devido à
insalubridade do Colégio das Artes. Já em 1556 se queixavam a Sto Inácio de Loyola “el sitio deste collegio no
es muy sano, porque estaua aqui un monte y na quitado tanta parte dél quanta basto para o edeficio; y asy por
una parte queda el monte mucho mas alto que los teiados” (Brandão in Frade e Caetano; 1994).
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Em 1566 as instalações são ocupadas pelo Tribunal do Santo Ofício, transferindo-se então o Colégio das
Artes para junto do Colégio de Jesus na Alta da cidade.
A Inquisição introduz profundas mudanças neste edifício quer a nível da reorganização do espaço quer a nível
mental, passando duma atmosfera de difusão de novas ideias para um clima de repressão.
No que diz respeito às obras que se realizaram neste período pouco se sabe. Em 1571 já ali havia presos, o
que significa que as 1ªs obras foram feitas entre 1566 e 1571. Em 1592, na visitação são mandados erigir
mais cárceres e a construção do cano para escoamento dos despejos (Magalhães in Frade e Caetano; 1994).
Em 1634 é realizada para a Inquisição uma planta deste espaço pelo arquiteto Mateus do Couto3 (figuras 1 e
2) onde é possível verificar as várias transformações feitas no edifício até aquela época. É nítida a divisão da
atual galeria do Centro de Artes Visuais (CAV) em várias celas e um corredor por onde os presos entravam e
eram distribuídos pelas várias celas. No refeitório do colégio a Inquisição criou numa das partes a sala do
tormento e abandonou a outra parte (Craveiro, 2006). Os andares altos foram reservados para os inquisidores.
Figura 1 – Planta da Inquisição de Mateus Couto de
1634
Figura 2 – Legenda da Planta da Inquisição de Mateus
Couto de 1634
3
http://ttonline.dgarq.gov.pt/Dserve.exe?dsqServer=calm6&dsqIni=dtematico.ini&dsqApp=Archive&dsqCmd=Overview.tcl&dsqDb=Images&dsqSear
ch=(UserText03='Plantas')&dsqPos=0&dsqNum=05&PF=No
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No edifício estão inscritas outras duas datas, 1784 no poço que abastecia os cárceres, e 1792 numa porta das
dependências dos inquisidores, que poderão ser indicadoras de obras realizadas.
Em 1821 a Inquisição é extinta e em 1885 o edifício já era de particulares. O pátio foi transformado em quintal
e os cárceres em celeiros (Frade e Caetano; 1994).
Em 1915 a Guarda Nacional Republicana ocupa o espaço readaptando-o as suas necessidades. Na década
de 40 a Câmara Municipal de Coimbra instala alguns dos seus serviços. O edifício serviu também ao longo de
séc. XX como instalações do grupo de teatro Escola da Noite.
Atualmente a ala Oeste funciona o CAV, estando o resto do edifício ainda ocupado por serviços camarários.
Descrição dos trabalhos arqueológicos
Escavação arqueológica
Este projeto visa a recuperação da denominada Ala Central que correspondia ao antigo refeitório do Colégio
das Artes. Tratava-se de uma sala ampla, abobadada
sustentada por colunas jónicas. Como anteriormente
descrito, este espaço sofreu profundas e sucessivas
alterações durante os séculos de ocupação pelo Tribunal
do Santo Ofício. A área a escavar foi dividida pelas
colunas, conforme a planta representada pela figura 3.
Nesta fase foram escavados os denominados setores 2,
3 e 4.
A escavação foi realizada por unidades estratigráficas
naturais segundo o Método de Harris, com recurso a
meios
mecânicos
nas
camadas
consideradas
contemporâneas.
Figura 3 – Planta da área a intervencionar (CMC)
O setor 2 corresponde a uma das celas da Inquisição, identificada anteriormente pela sua porta virada para o
claustro do atual CAV. Foi encontrado igualmente um corredor de passagem possivelmente relacionado com a
anteriormente conhecida Ladeira dos Prisioneiros, que era o corredor de circulação pelo qual os presos eram
distribuídos pelas diversas celas (figura 4).
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Esta divisão encontrava-se apenas parcialmente entulhada, pelo que pela porta era visível o tipo de entulho e
o seu teto em betão já em estado de ruína. Quando se iniciou a retirada do piso em cimento este abateu no
local que não estava entulhado.
Figura 4 – Vista geral do setor 2, cela e corredor
dos prisioneiros
Figura 5 – Pormenor dos “buracos” no setor 2
Na cela foi possível verificar que junto ao chão existia na parede Oeste vários buracos que tinham paralelo na
parede (figura 5). É possível que fosse onde se encontrava apoiada uma estrutura tipo estrado.
No setor 3 foi encontrada uma nova cela, mais pequena que a do setor 2, com entrada virada a Norte. Esta
entrada era feita através de uma estrutura igual à porta da cela do setor anterior (figura 6). Colocou-se a
descoberto igualmente a continuação do corredor de circulação pelo qual os presos eram distribuídos pelas
diversas celas e um espaço entre as celas que possivelmente seria de suporte ao corredor das
“espreitadeiras” destas celas. Este pequeno espaço não estaria visível pois as paredes que o delimitam não
são rebocadas nem tão pouco bem rematadas (figura 7).
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Figura 6 – Porta da cela no setor 3
Figura 7 – Corredor entre celas
O setor 4 corresponde à continuação da denominada “ladeira dos prisioneiros” encontrada nos trabalhos
efetuados anteriormente no atual CAV. O pavimento neste
local é em tijoleira, à semelhança do que acontece nos outros
setores. A porta da cela do setor 3 dá para este local. Esta
porta e a parede estão em muito mau estado devido a várias
manilhas de esgotos que estavam no local. Esta ladeira ou
corredor tem ligação ao exterior por duas janelas que
atualmente
estão
parcialmente
soterradas,
uma
sensivelmente em frente à porta da cela e outra na direção do
corredor.
Figura 8 – Pavimento da ladeira dos prisioneiros no setor 4
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Arqueologia vertical
Foi igualmente realizado o trabalho de análise da picagem de algumas paredes, no qual se destacam a
parede exterior Norte, a parede Este do setor 6 (galeria) e a parede Oeste do mesmo setor.
Na análise da parede exterior Norte (figura 9) foram visíveis as múltiplas alterações efetuadas ao longo dos
séculos.
Assim vislumbra-se uma parede atribuível à
construção do próprio colégio, assim como
algumas
janelas
que
se
encontram
no
alinhamento das janelas inseridas atualmente no
CAV imputadas ao Colégio das Artes. Denotamse alterações realizadas entre o séc. XVII e o
XVIII, durante o período de ocupação da
Inquisição, tais como o tamponamento de uma
janela em tijolo de burro, ou um remendo numa
Figura 9 – Parede exterior Norte
parte da parede feito de tijolo e telha. No séc. XX
foram
produzidas
novas
modificações
nomeadamente a abertura de um arco de volta inteira e o seu posterior encerramento em tijolo recente, um
tamponamento de uma janela e uma coluna construída com tijolos e cimento. Durante as obras ocorridas em
2001-2002 para construção do CAV foram efetuadas uma trave e duas colunas de betão de modo a abrir uma
passagem entre o Pátio da Inquisição e a Cerca de São Bernardo, denominada por Galeria.
As paredes desta galeria também foram registadas e analisadas. Assim, a parede Este revela elementos
originais do Colégio das Artes tais como as colunas em pedra calcária com capitéis em volutas que sustentam
os arcos de volta inteira do mesmo material. Verificam-se igualmente alterações com cronologia balizada entre
os séc. XVII e XVIII, no tempo da ocupação do edifício pela Inquisição, como o arranque do teto em abóbada
constituído por tijolo de burro e argamassa amarelada ou um arco de volta inteira também em tijolo de burro.
Este paramento engloba ainda modificações datáveis do séc. XX, nomeadamente uma porta com verga em
betão e o respetivo encerramento em tijolo recente, o fecho de dois arcos em tijolo recente, reboco de cimento
branco e uma parede reconstruída recentemente (figura 10).
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Figura 10 – Desenho da parede Este da Galeria (setor 6) (CMC)
A parede Oeste, à semelhança da parede Este, apresenta vestígios da
construção do Colégio das Artes como uma parede em pedra
aparelhada, as colunas em pedra calcária com capitéis em volutas que
sustentam os arcos de volta inteira do mesmo material (figura 11).
Datáveis da ocupação da Inquisição (entre os séc. XVII e XVIII)
destacamos o arranque do teto em abóbada da Sala do Tormento,
onde é ainda possível observar uma argola em ferro. De cronologia
recente, séc. XX, são, entre outros vestígios, duas portas com
estrutura em madeira, uma parede restaurada com cimento de cal e
pedras e tijolos reutilizados e um piso constituído por blocos de betão.
Figura 11 – Coluna de pedra calcária com
capitéis em volutas na parede Este do setor 6
Conclusão
Como acima referido, o edifício foi construído no séc. XVI com o objetivo de ser instalado o Colégio das Artes.
No entanto, logo na década de 60 desse mesmo século foi ocupado pela Inquisição para aí se instalar o
Tribunal do Santo Ofício, o qual funcionou até 1821. Ao longo destes séculos de ocupação muitas foram as
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modificações realizadas, nomeadamente a divisão do espaço nas várias celas, sala de tormento, aposentos
dos inquisidores, entre outros.
O espaço intervencionado começou por ser um espaço amplo, onde funcionaria o refeitório do colégio. Deste
período ainda são visíveis as colunas, projetadas por Diogo de Castilho, que serviram de “marcos”
delimitadores dos setores neste trabalho.
De acordo com a planta datada de 1634 de Mateus Couto (figuras 1 e 2), nesta altura este ainda era um
espaço amplo, no qual metade era usado como Sala de Tormento e a outra metade não tinha função. Na
intervenção de 1989/90 ainda existiam pinturas a negro à volta dessa argola com florões e emblemas da
inquisição (Frade e Caetano; 1994).
Na intervenção realizada anteriormente por Helena Frade e José Carlos Caetano foram igualmente
encontradas duas celas com teto abobadado, pavimentadas com tijoleiras e no teto tinham pinturas a negro
características do tribunal, atualmente integradas no CAV (figura 12). Uma encontrava-se virada para o
claustro e outra para o corredor, no lado oposto. Entre elas existe um corredor no qual se abrem 4 orifícios (2
para cada lado) que permitiam observar os detidos e escutar as suas conversas sem ser notado, pois estavam
dissimuladas com as pinturas negras das celas. São as chamadas “espreitadeiras” (Frade; Caetano; 1994).
Estas celas e o corredor intermédio são paralelas às
encontradas agora e não se encontram incluídas nesta planta de
1634. Assim, infere-se que estas 4 celas, todas com
espreitadeiras, foram acrescentadas posteriormente, assim como
a “Ladeira dos Prisioneiros” e o corredor de distribuição dos
prisioneiros pelas celas.
Figura 12 – Pormenor do teto de uma antiga cela (atualmente integrada no
CAV) com as espreitadeiras e algumas das pinturas originais encontradas
durante a intervenção de 1989/92
O piso dos setores 2, 3 e 4 era em tijoleira. É possível que fosse
original
do
colégio,
pois
sabe-se
pelas
intervenções
arqueológicas anteriores que a Ladeira dos Prisioneiros encontrada no atual CAV era em calçada. Na cela
encontrada no setor 2 apenas se encontraram restos da argamassa de assentamento da tijoleira.
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Na cela encontrada no setor 3 apenas metade do piso é em tijoleira, sendo o resto em terra batida. Esta zona
(de terra batida) coincide com o local onde é visível nas paredes os buracos, possivelmente de assentamento
de um estrado que serviria de cama. No local de um desses buracos é visível um murete em argamassa e
tijoleira. Calcula-se que os restantes buracos teriam a mesma estrutura. Assim o facto de serem usadas
tijoleiras na composição destes muretes, leva-nos a crer que foi usado o material disponível.
O corredor de distribuição dos prisioneiros pelas celas seria abobadado à semelhança da Ladeira dos
prisioneiros, e teria continuidade para Sul do espaço intervencionado. A determinada altura foi interrompido
por uma parede em pedra assente sobre terra.
O espaço entre duas das paredes do setor 3, conforme referido acima, não deveria ser visível, pois as faces
dessas paredes viradas uma para a outra não são rebocadas, assim como a face da parede que as delimita a
Este. Provavelmente seria o suporte do corredor de acesso às espreitadeiras.
As portas das duas celas são idênticas e coincidem com o de algumas descrições feitas por presos: “e nesta
porta duas grades de ferro distantes uma da outra a grossura da parede, que é de quatro palmos, e por fora
destas uma porta de tábua. No cimo desta porta de tábua fica uma bandeira ou fresta por onde entra no
cárcere a claridade reflexa.” (Mendonça e Moreira in Frade e Caetano; 1994). A porta que dá para o claustro
era visível antes da intervenção e é a melhor conservada. Nela é possível ainda ver os sítios onde estavam
chumbadas as portas de ferro. A fresta acima referida é o espaço de cerca de 20 cm existente entre duas lajes
de granito postas de forma obliqua na parte superior da porta de modo a impedir qualquer contacto com o
exterior. E mesmo nessa fresta existiam barras de ferro.
Durante o séc. XX este espaço foi soterrado. De facto através da análise da estratigrafia e dos materiais
recolhidos conclui-se que este espaço foi abandonado já no séc. XX. Quanto às razões deste abandono,
apenas podemos adiantar algumas hipóteses, como as más condições de habitabilidade do local (humidade,
salubridade) ou o aproveitamento do acesso pela Cerca de São Bernardo (hipótese corroborada pela abertura
de uma porta na parede Norte).
Ressalva-se o facto de estas conclusões deverem ser confirmadas ou não com a continuidade dos trabalhos
arqueológicos conforme previstos no respetivo plano de trabalhos.
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Bibliografia
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Craveiro, Maria Lurdes, 2006. O Colégio das Artes. Monumentos 25, Revista semestral de edifícios e
Monumentos, DGEMN.
-
Frade, Helena e Caetano, José Carlos, 1994. Pátio da Inquisição. Notas Histórico-Arqueológicas, Atas dos
Encontros de Arqueologia Urbana/ 94 Bracara Augusta, vol. XLV, nº 97 (110), Braga.
-
Dias, Pedro, 1988. Coimbra Arte e História, 2ª Ed. Coimbra, Instituto de História da Arte, FLUC.
-
Rossa, Walter, 2001. Diversidade, Urbanografia do Espaço de Coimbra até ao Estabelecimento Definitivo
da Universidade. Dissertação de doutoramento em Arquitetura, FCTUC.
Coimbra, 12 de Novembro de 2012
Ana Sofia Gervásio
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