Aplicação de ondas electromagnéticas na auto

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Aplicação de ondas electromagnéticas na
auto-suficiência de circuitos electrónicos
1
Nuno Sousa1, Pedro Pinho1,2, Miguel Fernandes1
Instituto Superior de Engenharia de Lisboa (ISEL), Rua Conselheiro Emídio Navarro, 1, 1959-007 Lisboa
2
Instituto de Telecomunicacções (IT) – Aveiro, Campus Universitário de Santiago, 3810-193 Aveiro

Resumo — Neste artigo é validado o conceito de RF Energy
Harvesting, na banda de frequências do GSM900, como fonte de
energia para circuitos electrónicos de baixo consumo, permitindo
desta forma o aproveitamento das ondas electromagnéticas
existentes. É abordada a topologia de conversor RF-DC Modified
Dickson e tida em conta a maximização de transferência de
energia. São construídos dois protótipos de conversor RF-DC,
com e sem malha de adaptação de impedâncias, sendo avaliado o
rendimento e performance de cada um deles. O protótipo com
malha de adaptação atinge valores de eficiência superiores em
15%, relativamente ao protótipo sem malha de adaptação, para
2dBm de potência de entrada. Com o protótipo com malha de
adaptação desenvolvido conseguiu-se alimentar um sensor de
temperatura digital, através da energia proveniente de uma
chamada telefónica de um telemóvel.
Hoje em dia esta técnica de obtenção de energia é utilizada,
por exemplo, em elementos passivos de identificação de
radiofrequência RFID (Radio Frequency Identification) que
são alimentados através da energia radiada por um emissor
[1]. A abordagem seguida neste artigo consiste no
dimensionamento de um dispositivo passivo que funciona
apenas com recurso a energia electromagnética captada no
meio envolvente.
Na figura 2 está representado o diagrama de blocos do
sistema de RF Energy Harvesting proposto. O diagrama é
composto por quatro blocos: antena, malha da adaptação de
impedâncias, multiplicador de tensão e bloco de
armazenamento de energia.
I. INTRODUÇÃO
E
redes de telecomunicações, nomeadamente em redes
sem fios, a atmosfera é utilizada como meio de
propagação, onde uma quantidade considerável da energia
electromnagnética é desperdiçada. A potência disponível,
proveniente de estações emissoras na banda de frequência
GSM (Global System for Mobile Communications), Televisão
e Rádio, pode inclusivamente chegar a algumas dezenas de
µW. Por este motivo, a possibilidade de se poder aproveitar
essa energia de maneira a fornecê-la a dispositivos
electrónicos evidencia-se como uma das possíveis soluções a
adoptar como fonte de energia. O conceito de RF
(Radiofrequência) Energy Harvesting, ilustrado na figura 1,
consiste na captação de energia electromagnética presente no
meio ambiente e na sua conversão numa tensão eléctrica DC
(Direct Current), através de um circuito electrónico. Esta
energia pode ser utilizada por uma carga ou conduzida para
um bloco de armazenamento de energia, possibilitando que
dispositivos electrónicos se tornem auto-suficientes
energeticamente.
M
Emissor de
Potência RF
Conversor RF-DC
Dispositivo/Carga
Receptor de
Potência RF
Fig. 1. Topologia abordada no cenário de RF Energy Harvesting
Fig. 2. Diagrama de blocos do dispositivo de RF Energy Harvesting
Este artigo está organizado da seguinte forma: na secção II
é abordada sumariamente a antena utilizada neste projecto e
são apresentadas as medições de potência efectuadas no
campus ISEL; na secção III é abordado o circuito
multiplicador de tensão; na secção IV são apresentados os
principais resultados medidos e na secção V são apresentadas
as principais conclusões deste trabalho.
II. MEDIÇÕES DA P OTÊNCIA D ISPONÍVEL
Uma vez que a energia que se pretende captar se encontra
no meio envolvente, é necessário uma antena com a finalidade
de promover a captação de ondas electromagnéticas para que
estas possam ser entregues da melhor forma possível ao
circuito multiplicador de tensão. Do ponto de vista do circuito,
a antena comporta-se como uma fonte de tensão AC
(Alternating Current) com frequência e amplitude definidos
pelas ondas electromagnéticas captadas.
No caso concreto, será utilizada uma antena de dupla banda
que funciona nas bandas GSM900 e GSM1800 [2].
A fim de identificar qual a banda de frequências mais
adequada para a demonstração do conceito de RF Energy
Harvesting, foi efectuada, no campus ISEL, uma campanha de
medidas de potência em função da frequência. Para este efeito
2
recorreu-se a um analisador de espectros Prolink 4C
PROMAX. Feito um varrimento em frequência em vários
pontos do campus ISEL, o valor máximo de potência
detectado foi de -19dBm@958MHz, correspondente à banda
GSM900, e como tal optou-se por utilizar esta banda para a
demonstração do conceito. Adicionalmente, foram ainda
efectuadas medições recorrendo ao analisador de espectros
Advantest R3131A Spectrum Analyzer de modo a perceber
qual o valor de potência captada quando é efectuada uma
chamada telefónica a partir de um telemóvel a 5cm de
distância da antena, tendo-se verificado o valor máximo de
15dBm em torno da frequência 892MHz.
III. MULTIPLICADOR DE TENSÃO
Uma das peças fundamentais num sistema de RF Energy
Harvesting é o circuito multiplicador de tensão. Este circuito
permite não só efectuar a conversão do sinal de entrada RF
num sinal eléctrico DC, mas também obter um potencial à
saída maior do que o valor de entrada.
=
× 100[%]
Eq.1
B. Díodos utilizados
Para minimizar a queda de tensão nos díodos, optou-se por
usar díodos Schottky Zero Bias HSMS-2850 da Agilent, pois
estes elementos têm uma tensão de polarização
bastante
inferior
à
tensão
nos
díodos
de
junção
( = 150 @0.1
∧ = 250 @1 ).
Adicionalmente, o fabricante descreve este tipo de díodos
como mais apropriado para potências de recepção
<
−20
e frequências de trabalho abaixo de 1.5
.
Portanto, com a utilização destes elementos no circuito
multiplicador de tensão, a eficiência na conversão RF-DC
pode ser maximizada, sendo este tipo de díodos apropriado
para RF Energy Harvesting.
A. Topologia
IV. RESULTADOS EXPERIMENTAIS
Na figura 3 pode observar-se o esquema eléctrico da
configuração multiandar do multiplicador de tensão Modified
Dickson utilizado neste trabalho [3].
Com o objectivo de conhecer a impedância de entrada
experimental do circuito para poder ser dimensionada a malha
de adaptação, o primeiro passo tomado foi a implementação
do circuito multiplicador de tensão. Na figura 4 está
representado o circuito implementado. Neste circuito, as linhas
de transmissão têm impedância característica de 50Ω e a placa
de circuito impresso é do tipo FR4.
Fig. 3. Topologia Modified Dickson
Fig. 4. Circuito multiplicador de tensão implementado
Os resultados da impedância de entrada a 892
, com
recurso a um analisador vectorial HP 8753D Network
Analyzer, é
= 3.55 + 68.3. Na figura 5 está representado
um gráfico da evolução da impedância de entrada do circuito
na banda de frequências 860
a980
.
120
Parte Real
Parte Imaginária
100
80
Ohm
Neste artigo foi utilizada uma configuração multiandar com
cinco andares. O numero de andares utilizado no circuito
deve-se a um estudo feito em [4], que apontava eficiências na
ordem de 70% para potências de entrada em torno de 0dBm.
Além disso, com valores de potência de entrada menores,
mesmo com a utilização de menos andares no circuito, a
eficiência é menor [4].
O valor escolhido para os condensadores foi de 100 uma
vez que, como a energia disponível a captar é reduzida, com
capacidades maiores a tensão obtida é menor. Dado que se
pretende obter tensões suficientes para polarizar circuitos, esta
foi a solução de comprimisso obtida.Para além disso, com
condensadores de capacidade menor a carga destes é reduzida,
inviabilizando a sua utilização nesta aplicação de RF Energy
Harvesting.
Embora a particularidade do circuito funcionar sem recurso
a acumuladores seja energeticamente vantajosa, o
multiplicador de tensão consome sempre parte da energia que
lhe é entregue para que este possa funcionar. O facto deste
circuito consumir parte da energia total que a antena fornece
cria o conceito de rendimento, , do ponto de vista do sistema
dado pela equação 1:
60
40
20
0
860
880
900
920
MHz
940
960
980
Fig. 5. Impedância de entrada do circuito multiplicador de tensão
3
35
3.5
Na teoria de circuitos, à medida que o comprimento de onda
de um sinal se começa a aproximar do comprimento físico do
circuito, começam a revelar-se fenómenos de propagação em
linhas de transmissão. Na presença destes fenómenos, a tensão
e corrente comportam-se como ondas que se propagam no
circuito podendo existir reflexão das mesmas na condição de
desadaptação de impedâncias. Por esta razão interessa
promover a adaptação de modo a permitir a máxima
transferência de potência no circuito.
Tendo em conta os fenómenos de reflexão de onda
incidente, adaptar-se-á a antena ao circuito multiplicador de
tensão para que o coeficiente de reflexão, , seja 0. Desta
forma, o circuito da figura 4 foi adaptado com recurso a Stubs
tal como pode ser observado na figura 6.
Fig. 8. Tensão de saída e eficiência do circuito multiplicador de tensão
com malha de adaptação de impedâncias
Fig. 6. Implementação do circuito multiplicador de tensão com
adaptação de impedâncias
Da análise do gráfico da figura 8, verifica-se que o circuito
com malha de adaptadora não só permite obter tensões mais
elevadas como níveis de eficiência maiores relativamente ao
circuito sem malha de adaptação, sendo que o valor máximo
de eficiência atingido foi de ≈35% para = 9dBm.
Para testar o funcionamento do circuito implementado, foi
realizado um teste que passou por alimentar um sensor de
temperatura digital com o recurso ao sistema de RF Energy
Harvesting com malha de adaptação implementado. O
funcionamento deste dispositivo requer 1.5 de tensão e
≈6
de corrente de polarização. A montagem
correspondente a este teste encontra-se representada na figura
9. Note-se que foram utilizados dois díodos em paralelo com o
sensor para protecção do dispositivo medidor de temperatura.
Efic. S. Malha Adap.
Tensão S. Malha Adap.
Efic. C. Malha Adap.
Tensão C. Malha Adap.
30
3
Eficiencia [%]
2.5
20
2
15
1.5
Tensão de saída [V]
25
10
1
5
0
-6
-4
-2
0
2
dBm
4
6
8
0.5
10
Na figura 7 são apresentados os resultados das medições da
impedância de entrada, de 860
a980
, do circuito
multiplicador de tensão com adaptação de impedâncias.
120
Parte Real
Parte Imaginária
100
80
Fig. 9. Alimentação de um termómetro digital através do dispositivo de
RF Energy Havesting com malha de adaptação implementado
Ohm
60
40
20
0
-20
860
880
900
920
MHz
940
960
980
Fig. 7. Impedância de entrada do circuito multiplicador de tensão com
malha de adaptação
O valor da impedância de entrada do circuito adaptado é agora
de
= 53.2 − 2.74. Uma vez que a impedância de entrada
da antena é
= 50Ω, o coeficiente de reflexão neste contexto
é quase nulo.
Na figura 8 está representada a eficiência e a tensão de saída
dos circuitos, com e sem malha de adaptação, em função da
potência de entrada.
Quando realizada uma chamada telefónica com um
dispositivo celular, o sistema de RF Energy Harvesting é
capaz de captar a energia dela proveniente. Desta forma,
consegue-se a alimentação do sensor com os 1.5 e
6 necessários, verificando-se que a distância máxima a que
se pode colocar o dispositivo celular, mantendo o
funcionamento do sensor, é de 40 .
V. CONCLUSÕES
Uma das principais conclusões que se obtevecom este
trabalho é o facto do conceito de RF Energy Harvesting ser
possível enquanto forma de obtenção de energia. Com recurso
a componentes de baixo custo, é possível implementar este
sistema e atingir valores de eficiência na ordem de 35%.
No contexto de RF Energy Harvesting, o bloco
multiplicador de tensão é uma peça essencial para conseguir
obter níveis de tensão consideráveis (alguns
). Para
4
incrementar a eficiência no sistema, a utilização de uma malha
adaptadora de impedâncias é fundamental. Como se pode
concluir a partir dos resultados experimentais apresentados, a
malha adaptadora de impedâncias permite um acréscimo até
15% na eficiência do sistema. Para além disso, com o uso de
uma malha adaptadora de impedâncias no sistema, é possível
atingir valores de tensão na ordem dos 3
para uma
potência de entrada de 9
.
Ainda que com valores de eficiência relativamente baixos
(< 40%), é possível proporcionar o funcionamento de um
circuito electrónico com recurso aos dispositivos
implementados. Assim, esta técnica de obtenção de energia
demonstra ter viabilidade na alimentação de circuitos de baixo
consumo, podendo ser utilizada em situações em que o uso de
baterias é inapropriado.
REFERÊNCIAS
[1]
[2]
[3]
[4]
Karthik, G., Ajay, S. and Jegadishkumar, K.J., “Harvesting the RF
energy”, in 2011 IEEE International Conference on Microwaves,
Communications, Antennas and Electronics Systems (COMCAS),
November 2011.
João Leite e Amélia Lopes, “Estudo da influência da presença humana
no mecanismo de radiação de uma antena.”, Relatório do Projecto Final
de Curso, Julho 2008
Yuan, Fei; CMOS Circuits for Passive Wireless Microsystems, Springer,
1st Edition, 2011, XVII, 279 p. 100 illus., Hardcover. ISBN: 978-14419-7679-6. (http://www.springer.com/978-1-4419-7679-6).
Nintanavongsa, Prusayon; Muncuk, Ufuk; Lewis, David Richard and
Chowdhury, Kaushik Roy; Design Optimization and Implementation for
RF Energy Harvesting Circuits, IEEE Journal on emerging and selected
topics in circuits and systems,Vol.2, No.1, March 2012.
(http://indigo.ece.neu.edu/~krc/papers/JETCAS12_Energy.pdf).
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