ASSOCIAÇÃO ENTRE OBSERVAÇÕES MACROSCÓPICAS E

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ISSN 1678-6343
Instituto de Geografia
UFU
Programa de Pós-graduação em Geografia
ASSOCIAÇÃO ENTRE OBSERVAÇÕES MACROSCÓPICAS E ANÁLISES
LABORATORIAIS NO ESTUDO GENÉTICO DE SOLOS DO QUADRILÁTERO
FERRÍFERO, MG1
Mariana de Resende Machado
Mestranda em Geografia – UFMG
[email protected]
Amanda Ribeiro de Oliveira
Mestranda em Geografia - UFMG
[email protected]
Fábio Soares Oliveira
Prof. Dr. da UFMG
[email protected]
Adriana Monteiro da Costa
Prof.ª Dra. da UFMG
[email protected]
RESUMO
A evolução pedológica ocorre pela contínua, dinâmica e complexa sucessão e
interação entre os mais diversos fatores ambientais, sendo que tal história evolutiva
é passível de ser resgatada por meio da interpretação dos atributos dos solos. Áreas
com grande diversidade ambiental, como o Quadrilátero Ferrífero, conduzem a um
complexo e rico mosaico pedológico, que necessita de abordagem mais abrangente
e aprofundada das interações dos elementos da paisagem. Nessa perspectiva, este
estudo objetivou investigar a cobertura pedológica de uma vertente cuja justaposição
regular de horizontes sugere a existência de um sistema pedológico em equilíbrio,
mas com organização vertical de horizontes que suscitam questionamentos quanto à
proveniência dos materiais (se eluviais e coluviais), incluindo a possibilidade da
existência de horizontes orgânicos enterrados. Dessa forma foram utilizados
indicadores pedológicos aplicados à análise pedogeomorfológica, tais como
descrição macromorfológica, análises granulométricas, composição química,
mineralógica e teores de carbono orgânico total. Os resultados indicam que, embora
macromorfologicamente, a cobertura na vertente sugerisse a presença de distintos
materiais de origem, essa cobertura revelou, na verdade, um sistema pedológico em
equilíbrio, onde a alteração vertical da rocha foi o principal caminho genético.
Palavras-chave: Pedogênese; Morfogênese; Análise pedogeomorfológica.
ASSOCIATION BETWEEN MACROSCOPE OBSERVATION AND LABORATORIAL
ANALYSIS IN THE GENETICAL STUDY OF SOILS IN QUADRILÁTERO FERRÍFERO, MG
ABSTRACT
The pedological evolution occurs through the succession and continuous, dynamics
and complex interaction between the most diverse factors and processes of
formation, and it’s possible to rescue this evolutionary history through the soil
attributes. Areas with great environmental diversity, such as Quadrilátero Ferrífero,
result in a complex and rich pedological mosaic, which requires a broad and thorough
approach of the interaction of landscape elements. From this perspective, this study
aimed to investigate the pedological cover of a slope whose regular juxtaposition of
horizons suggests the existence of a pedological system in equilibrium, however, with
vertical arrangement of horizons which raise questions regarding the origin of the
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Recebido em 03/07/2014
Aprovado para publicação em 29/04/2015
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materials (if eluvial or collucial with pedogenesis linked to morphogenetic events).
Thus, were used pedological indicators applied to pedogeomorphological analysis,
such as morphological description, granulometric and mineralogical analyzes,
chemical composition and levels of total organic carbon. The results indicate that,
although morphologically the cover in slope suggest the presence of distinct
materials, especially considering the possible presence of a buried paleosol, this
coverage revealed a pedological system in equilibrium, where the vertical rock
alteration was the main genetic route.
Keywords: Pedogenesis; Morphogenesis; Pedogeomorphological analysis.
INTRODUÇÃO
A gênese e evolução do solo englobam diversos processos químicos, biológicos e físicos que
durante a escala temporal atuam sobre o material de origem – que pode ser uma rocha, um
depósito sedimentar, materiais orgânicos ou mesmo outro solo. Tais processos são
influenciados e estão intrinsicamente associados aos demais aspectos da paisagem na qual o
solo se insere, com ênfase especial às formas de relevo e às condições climáticas. A evolução
de um solo, dessa forma, perfaz um contínuo, dinâmico e complexo processo de sucessão e
interação entre os mais diversos fatores e processos de formação. Nessas condições, é
razoável supor que o solo preserve informações referentes a estes processos e fatores,
imprimindo ao longo do tempo características que estão presentes através de seus aspectos
morfológicos, físicos, químicos, mineralógicos e biológicos.
Os aspectos macromorfológicos descritos em campo, em especial, são aqueles mais utilizados
para o estudo dos solos porque permitem inferências reveladoras sobre sua evolução e
comportamento. Isto é, a caracterização dos horizontes pedológicos, sua justaposição lateral e
vertical, e de seus atributos. Tais aspectos são reflexos na paisagem dos processos
pedogenéticos, sendo, justamente por isso, ponto de partida para diversos estudos
pedológicos, tal como a classificação de solos. Ainda assim, tais estudos não devem se
restringir aos procedimentos de campo, uma vez que a complexidade dos processos de
formação em determinadas áreas condiciona o desenvolvimento de solos muito variados,
difíceis de serem compreendidos apenas a partir dos aspectos macroscópicos e, por isso,
passíveis de conduzirem a interpretações preliminares insuficientes, ou mesmo equivocadas.
Nesse contexto se insere o Quadrilátero Ferrífero (QF), uma importante província geográfica
localizada na região central do estado de Minas Gerais, cuja diversidade geológica,
geomorfológica, climática e vegetacional conduzem a um complexo e rico mosaico pedológico.
A multiplicidade do quadro litoestrutural do QF está atrelada a sua evolução geológica e é
responsável pelo condicionamento de muitas paisagens da região, que são formadas incluindo
pacotes rochosos de idades diversas aflorando lado a lado (UHLEIN e NOCE, 2012). Por tais
motivos, os perfis de solos frequentemente expostos em cortes de estradas, obras de
engenharia e estudos de solos chamam atenção pela diversidade de cores e feições, revelando
uma organização de horizontes que, numa perspectiva visual, sugerem perfis muito complexos
e que demandam a necessidade de investigações da relação solo-paisagem mais
aprofundadas.
Nessa perspectiva, considerando o interesse em contribuir com os estudos sobre as paisagens
do QF, e privilegiando uma abordagem pedogeomorfológica, este estudo objetivou investigar a
cobertura pedológica de uma vertente cuja justaposição regular de horizontes (da alta à baixa
vertente) sugere a existência de um sistema pedológico em equilíbrio. Contudo, quando
considerada a organização vertical de tais horizontes no perfil, a presença de seções de cores
brunadas em profundidade suscita a presença de um paleossolo soterrado no pacote pedoestratigráfico (ou, pelo menos, de um horizonte orgânico enterrado); colocando em
questionamento se a cobertura pedológica realmente seria um sistema em equilíbrio com
predomínio da alteração vertical da rocha ou se seria uma cobertura formada por materiais
eluviais e coluviais, com pedogênese associada a eventos morfogenéticos. Como a evolução
da paisagem no QF (VARAJÃO et al., 2009) destaca um importante papel dos processos
erosivos, a presença de um paleossolo soterrado por sedimentos posteriormente submetidos à
pedogênese não causaria estranhamento. Entretanto, como tais observações foram reveladas
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até o momento apenas por observações de campo, justifica-se a necessidade de um estudo
que envolva análises laboratoriais e a busca de contextualizar a vertente e sua cobertura no
contexto geomorfológico regional no qual ela se insere.
ÁREA DE ESTUDO
A vertente, objeto de estudo deste trabalho, está inserida no QF, distrito de Rodrigo Silva,
município de Ouro Preto (Figura 1). As principais vias de acesso à área, a partir de Belo
Horizonte, são a BR040 e a BR356. Acessa-se por uma estrada pavimentada logo após a
Ponte do Funil, saída de Cachoeira do Campo em direção ao distrito sede de Ouro Preto.
O QF apresenta posicionamento geotectônico peculiar por estar entre duas faixas móveis
paralelas e parcialmente superpostas, desenvolvidas durante os eventos Transamazônico e
Brasiliano (NOCE, 1995). Tal cenário é responsável pela complexidade estrutural e litológica da
área, incluindo pacotes rochosos de idades diversas (UHLEIN e NOCE, 2012).
Figura 1. Mapa de localização e acessos da área de estudo no QF.
A vertente tem cavidade aberta, configurando-se como um anfiteatro. Possui como vegetação
nativa o Campo Cerrado, e nas zonas com mais acúmulo de umidade, em especial junto aos
cursos d’água, observa-se a presença de Matas Ciliares. Litologicamente está associada à
Formação Cercadinho, do Grupo Piracicaba, que é constituída por quartzitos ferruginosos,
quartzito, filito ferruginoso, filito prateado, e filito, com lentes de dolomito (DORR, 1969). No
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caso específico predominam os filitos prateados. Estruturalmente, encontra-se sob domínio do
Anticlinal Mariana, localizada na região Sudeste do QF, que juntamente com o domínio
Sinclinal Dom Bosco, caracterizam-se como uma estruturação complexa vinculada ao Sistema
de Cisalhamento Fundão-Cambotas (ENDO, 1997).
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Para a realização deste trabalho foram utilizados indicadores pedológicos aplicados à análise
pedogeomorfológica. Para tanto, priorizou-se, em um primeiro momento, a escala local (a
vertente), a fim de obter dados que auxiliassem na interpretação e caracterização da cobertura
pedológica. Feito isso, os resultados obtidos foram discutidos em escala regional, relacionando
a evolução do contexto no qual a vertente se insere no QF, com destaque para a supracitada
Anticlinal de Mariana. No primeiro caso, fez-se uma pesquisa qualitativa e quantitativa baseada
na obtenção de atributos por análises laboratoriais e de campo. No segundo caso, dados e
informações na literatura subsidiaram as discussões.
Foi selecionada uma única seção vertical na média-baixa vertente, aproveitando-se corte de
estrada, representativa da organização da cobertura pedológica (Figura 2), já que lateralmente
não foram identificadas variações nos materiais nas tradagens exploratórias. Para evitar a
condução das interpretações errôneas, os volumes pedológicos foram identificados apenas
pelo símbolo H, referindo-se a horizonte, e um número correspondente à ordem em que
ocorrem do topo para a base no perfil. Essas medidas foram tomadas para evitar que a
nomeação dos horizontes conforme o SiBCS (EMBRAPA, 2013) induzisse, de imediato, ao
enquadramento do perfil baseado somente na descrição morfológica. O horizonte brunado em
profundidade foi subdividido em topo e base (H5t e H5b) por ser muito espesso e por ser o
horizonte de maior interesse neste estudo.
A partir de tais volumes pedológicos foi realizada sua descrição macromorfológica
considerando critérios paleontológicos e pedológicos. Os critérios paleontológicos estão em
conformidade com o que foi proposto por Andreis (1981) e são utilizados como diagnósticos
para o reconhecimento de paleossolos, com destaque para as feições associadas às raízes. Os
critérios pedológicos estão relacionados aos atributos morfológicos do solo e refletem sua
gênese e evolução, tendo como referência os parâmetros expressos em Santos et al. (2013).
Figura 2. Aspecto geral do perfil de solo estudado. Nota-se o horizonte escurecido concordando com a
topografia, conforme indicado pela seta.
H5t H5t
H5b H5b
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Após descrição dos horizontes, foi realizada a coleta de amostras para análises da
granulometria (textura), composição química, mineralogia e teores de carbono orgânico total.
Essas amostras foram secas ao ar, destorroadas e passadas em peneira de malha de 2mm,
a fim de se obter a terra fina seca ao ar (TFSA). A granulometria foi obtida por peneiramento
e dispersão química através do método da pipeta, conforme recomendação da Embrapa
(1997), sendo os resultados, posteriormente, plotados no diagrama textural. A análise foi
realizada no Laboratório de Geomorfologia do Departamento de Geografia da Universidade
Federal de Minas Gerais.
O Carbono orgânico total do solo foi determinado utilizando-se da oxidação via úmida, em
que o C do solo é oxidado por uma solução oxidante – dicromato de potássio em meio
sulfúrico, sendo o método sugerido pela Embrapa (1997). A partir dos dados de carbono
orgânico é possível determinar os teores de matéria orgânica para um solo. As análises
foram realizadas no Laboratório de Matéria Orgânica do Departamento de Solos da
Universidade Federal de Viçosa.
As análises mineralógica e geoquímica foram realizadas na Terra Fina Seca ao Ar (TFSA),
respectivamente, por Difratometria de Raios-X (DRX) e Espectrometria de Fluorescência de
Raios-X (FRX). No primeiro caso, as amostras desorientadas foram acondicionadas em um
porta amostras e levadas ao Difratômetro Shimadzu modelo XRD-7000 com radiação de
CuKα, no intervalo de 2 a 70o 2θ. Os difratogramas foram interpretados no Software X’Pert
HighScore Plus e através de padrões da literatura (BRINDLEY e BROWN, 1980). No
segundo caso, relacionado à análise por FRX, foi utilizado o espectrômetro da marca
Shimadzu modelo EDX-720 com tubo de ródio (Rh). Tal aparelho fornece um espectro de
fluorescência com os picos de energia liberada por cada elemento, que são posteriormente
identificados e quantificados. Foram analisados os elementos Si, Al, Fe, K, Ti, Mn, S, Ba, Tl e
Zr; todos reportados em óxidos. Tanto a mineralogia quanto a geoquímica foram realizadas
no Laboratório de Difração de Raios-X do Departamento de Engenharia de Materiais do
Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais.
RESULTADOS
ASPECTOS MACROMORFOLÓGICOS E TEXTURAIS
Os resultados da descrição macromorfológica e das análises granulométricas são
apresentados no Quadro 1. Foram identificados seis volumes pedológicos (H1 a H6) no perfil,
que juntos constituem espessura superior a cinco metros. A transição entre os horizontes
ocorre, geralmente, de forma clara e plana, destacando-se as transições do H2 para o H3 e
do H3 para o H4 que foram descontínuas e difusas. Vale salientar também a transição
abrupta do H4 para o H5.
Entre os aspectos macromorfológicos, a variação da cor é o atributo que mais se destaca,
sendo ela norteadora de questões aventadas neste estudo. A cor do H5 (bruno acinzentado
escuro) depõe favoravelmente a sua caracterização como um horizonte orgânico, sobretudo
se comparado aos horizontes sobrejacentes (Quadro 1), majoritariamente mais claros.
Demais atributos, como estrutura e consistência, mantiveram-se semelhantes em todos os
horizontes, inclusive no H5(t e b), predominando estrutura em blocos subangulares e
consistência plástica e pegajosa.
É importante destacar a presença de pontuações escurecidas (de cor preta com porções
avermelhadas) a partir do H3 (Figura 3), com notável nível de acumulação no H5t. Trata-se de
feições com tamanho variando de pequeno a médio e formato arredondado. A princípio, em nível
macroscópico, essas pontuações sugerem a presença de carvão em grandes profundidades no
perfil, já que se desfazem com certa facilidade, são leves e apresentam traço preto.
Com relação à granulometria, todos os horizontes apresentaram mais de 55% de areia, e
nesta, a areia fina correspondeu à fração de maior abundância (Quadro 1). Não houve
mudanças texturais significativas entre os horizontes, resultando na mesma classificação
textural para todo o perfil, qual seja, textura franco arenosa. Quando a textura é
caracterizada como franco, as partículas não estão em proporções iguais, mas exibem
propriedades das três frações (RESENDE et al., 2007).
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Quadro 1. Aspectos macromorfológicos e físicos (texturais) dos horizontes descritos e amostrados.
Granulometria (mm)
Cor
(Münsell)
< 2mm (TFSA)
H*
Profundidade
(cm)
>0,5
0,5-0,25
< 2,5
0,050,002
<0,002
Areia
Grossa
Areia
Média
Areia
Fina
Silte
Argila
Relação
Silte/Argila
Consistência
Classe
Textural
Estrutura
Seca
dag/kg
Úmida
Seco
Úmido
Molhado
Perfil de solo
H1
0-50
3,6
5,8
56,2
26,4
8,0
3,30
Franco
Arenosa
10YR 6/2
7,5YR 4/2
Ligeiramente
Dura
Friável
Ligeiramente
plástica e pegajosa
Moderada pequena a grande
grumos
H2
50-80
1,9
3,9
54,8
30,4
8,9
3,42
Franco
Arenosa
2,5YR 7/3
10YR 4/3
Dura
Firme
Ligeiramente
plástica e pegajosa
Moderada grande a muito
grande laminar e blocos
subangulares
H3
80-98
3,9
4,9
57,5
20,7
12,9
1,61
Franco
Arenosa
10YR 5/6
10YR 4/6
Muito Dura
Firme
Plástica e pegajosa
Moderada grande a muito
grande laminar e blocos
subangulares
H4
98-140
4,0
4,2
56,0
20,2
15,0
1,35
Franco
Arenosa
7,5YR 6/8
10YR 5/8
Muito Dura
Firme
Plástica e pegajosa
Moderada grandes blocos
subangulares
H5t*
140-250
6,6
3,8
51,5
21,0
17,1
1,23
Franco
Arenosa
7,5YR 3/4
10YR 3/2
Ligeiramente
Dura
Firme
Plástica e pegajosa
Fraca média a grandes
blocos subangulares
H5b*
250-350
7,1
4,5
54,7
26,1
12,7
2,06
Franco
Arenosa
7,5YR 3/4
10YR 3/2
Dura
Friável
Plástica e pegajosa
Fraca média a muito grandes
blocos subangulares
H6
350-500+
1,6
2,8
51,9
31,4
12,3
2,55
Franco
Arenosa
10YR 3/4
Ligeiramente
Dura
Friável
Plástica e pegajosa
Fraca muito pequena a
pequena blocos
subangulares
10YR 6/6
H*: Horizonte; H5t*: topo; H5b*: base.
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Figura 3. Pontuações escuras presentes no H5t.
Utilizada como um dos índices do grau de intemperismo do solo (EMBRAPA, 2013), a relação
silte/argila apresentou para os dois horizontes superiores (H1 e H2) valores maiores que 3,3 e
para os demais horizontes valores entre 1,2 e 2,5. A primeira vista, tais dados refletem o baixo
intemperismo do material, sendo consensual a expectativa que solos mais jovens apresentem
elevada proporção de silte em relação à argila. Faz-se, contudo, a ressalva de que o
comportamento ao longo do perfil foi diferente do esperado, com valores menores em
profundidade. Essa anomalia não pode ser considerada isoladamente e sugere alguma
heterogeneidade no perfil, seja de materiais ou de comportamento dos processos de alteração.
Assim, para se compreender com certa propriedade tal inferência é necessário se
complementar o resultado da granulometria com a composição mineralógica das partículas
(FERREIRA, 2010), o que será feito posteriormente.
Como apontado pela literatura (ANDREIS, 1981), a presença de raízes fossilizadas ou mesmo
de canais biológicos (pedotúbulos) em profundidade é um dos critérios mais utilizados para se
identificar um paleossolo. No contexto do perfil estudado, observou-se a presença de raízes até
o H5t, sendo estas comuns no H1 e H2, tornando-se poucas e finas com o aumento da
profundidade. As raízes encontradas no H5 são, porém, continuidade do sistema radicular dos
horizontes superiores, não constituindo rizofeições fossilizadas no perfil.
MATÉRIA ORGÂNICA
A mensuração dos teores de matéria orgânica do solo (MOS) é realizada de forma indireta pela
quantificação do carbono orgânico total (COT), já que esse elemento perfaz cerca de 58% de
sua composição. O teor de matéria orgânica é calculado pela expressão COT x 1,724 em dag
Kg-1. Sabe-se, porém, que o teor de carbono na matéria orgânica varia de um solo para outro e
dentro de mesmo perfil, geralmente decrescendo com a profundidade (RESENDE et al., 2007).
Os resultados da quantificação da matéria orgânica no perfil estão apresentados na Figura 4.
O maior teor de matéria orgânica no perfil ocorre no horizonte superficial H1 (0,9 dag.Kg-1).
Contudo tal valor reflete a condição de baixa concentração para horizontes superficiais. A
despeito de o solo localizar-se em região de temperaturas amenas (clima altimontano, de
altitude), limitando a ação dos micro-organismos na decomposição do material orgânico e
favorecendo seu acúmulo, o solo encontra-se sob domínio dos campos cerrado, com produção
vegetativa relativamente baixa. Em adição, o relevo declivoso favorece o escoamento
superficial da água e, consequentemente, o carreamento de partículas orgânicas coloidais.
Com exceção do H1, todos os horizontes apresentaram exatamente a mesma quantidade de
matéria orgânica, referente a 0,13 dag.Kg-1 (Figura 4). As análises foram, por suspeita de erros
nos resultados, repetidas duas vezes, prevalecendo o mesmo valor. Tais resultados vão de
encontro com as observações em nível macroscópico, desfavorecendo a indicação de um
horizonte orgânico em profundidade.
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Figura 4. Distribuição da matéria orgânica de acordo com a profundidade.
COMPOSIÇÃO QUÍMICA E MINERALOGIA
Em se tratando de QF, mais especificamente sob filitos prateados ricos em hematita da
Formação Cercadinho (DORR, 1969), as altas porcentagens de ferro ao longo de todo o perfil
são comuns (Tabela 1). Destaca-se que a concentração vai aumentando em profundidade,
tendo maior participação na composição nos horizontes H5t e H5b, todos com cerca de 70%. O
segundo elemento com maior concentração é a sílica, presente na composição de inúmeros
minerais no solo. Atinge maior valor no horizonte superficial H1, com 16%, sendo o H5 com o
menor conteúdo, 11,83%. Alumínio e potássio são os outros elementos que se destacam. No
primeiro com teores muito próximos e variando de 8% no H1 para 6% no H4, e no segundo de
8% no H1 para 5% no H5.
Tabela 1. Composição química (% em peso) obtida por FRX dos horizontes descritos.
Horizontes
H1
H2
H3
H4
H5t
H5b
H6
Concreções - H5t
%
Fe2O3
62,93
66,67
67,76
70,41
70,66
70,05
67,74
59,94
SiO2
16,08
13,96
13,59
12,92
11,83
13,52
14,20
11,69
Al203
8,01
8,08
7,72
6,63
7,53
7,16
7,48
5,76
K2 O
8,18
7,50
7,05
6,06
5,22
5,32
6,57
5,07
TiO2
1,95
2,28
2,39
2,46
2,17
1,77
1,57
1,23
MnO
0,73
0,64
0,48
0,25
2,00
1,55
0,95
15,01
SO2
0,61
0,40
0,58
0,53
0,44
0,51
0,52
0,46
Ba2O3
0,88
-
-
-
-
-
0,73
0,78
Tl2O3
0,33
-
-
0,33
-
-
-
-
Zr2O3
0,21
0,22
0,21
0,24
-
-
0,17
-
Cr2O3
0,08
0,07
0,08
0,08
0,08
0,06
0,08
0,06
Legenda: - elementos não identificados
Analisando especificamente as pontuações de cor preta observadas no perfil e concentradas
no H5t, obteve-se um elevado teor de ferro (59,94%) e de manganês, responsável por 15% da
composição química total. Os resultados demonstram que não se tratam de fragmentos de
carvão, mas de concreções ferromanganosas.
Tal constatação é relevante quando se observa os valores de concentração de manganês ao
longo do perfil (Tabela 1 e Figura 5). Nota-se que do H1 ao H4 os teores de manganês vão
decaindo, passando de 0,73% para 0,25%. No entanto, o horizonte de maior concentração das
concreções perfaz também o horizonte de maior concentração de manganês, com 2% na parte
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superior (H5t) e 1,5 na inferior (H5b). O horizonte subposto, H6, também se caracteriza em
sequência por um conteúdo relativamente alto de manganês (0,95%).
Considerando tais resultados, realizou-se um teste puramente qualitativo para reforçar os
dados revelados através da fluorescência de raios-X. Separou-se cada amostra dos horizontes
(H1-H6) e uma concreção do H5, e através de um conta-gotas adicionou-se algumas gotas de
peróxido de hidrogênio (H2O2) em concentração de 20 volumes (SANTOS et al., 2013). O
peróxido de hidrogênio tem um alto poder oxidativo, reagindo com efervescência em processo
exotérmico à presença de manganês. Tal efervescência pode ser: (a) ligeira: efervescência
fraca, somente ouvida; (b) forte: a efervescência já é mais forte e visível, entretanto sem a
ruptura dos agregados; e por fim (c) muito forte: efervescência muito forte, chegando a ruptura
dos agregados (SANTOS et al., 2013).
Notou-se que para o H1 a efervescência foi forte, enquanto em H2 e H3 a efervescência foi ligeira. No
H4 a efervescência foi muito sútil, quase imperceptível. No H5 em compensação, a efervescência foi
muito forte, assim como para H6, perceptível até pelo superaquecimento do recipiente. Nas
concreções ferromanganosas, a efervescência foi extremamente forte. Notou-se para as amostras
H5t, H5b e H6 a ruptura total dos agregados e concreções em decorrência do teste.
Figura 5. Porcentagem de manganês de acordo com a profundidade.
Com relação à interpretação dos difratogramas (Figura 6), foram identificados oito minerais
distintos, quais sejam: quartzo; muscovita; hematita; caulinita; gibbsita; goethita; titanita e
iwakiita. Dentre eles, a Iwakiita foi o único óxido de manganês identificado e apenas nas
concreções do H5.
O quartzo é um dos minerais mais abundantes da crosta terrestre e ocorre como constituinte
essencial de várias rochas sejam elas ígneas, metamórficas ou sedimentares. É um mineral
extremamente resistente à ação do intemperismo, o que lhe garante a característica de ser um
dos principais componentes dos solos, principalmente na composição das frações mais
grosseiras. A estrutura dos cristais de quartzo contribui para maior contagem de reflexões,
aumentando, assim, a intensidade dos seus picos de difração em relação às demais fases
cristalinas presentes. Isso pode fazer com que os argilominerais sejam menos perceptíveis em
análises de TFSA, mesmo que ocorram em quantidade significativa na amostra. Esse parece
ter sido o caso dos resultados aqui apresentados.
A muscovita é um mineral pertencente à família das micas, ocorrendo em grande variedade de
condições geológicas. Sua forma micácea de finíssimas escamas associada a sua composição
química a tornam muito estável, quase tanto quanto o quartzo (BIGARELLA et al., 2007). A
despeito das rochas ígneas serem a principal fonte de micas na superfície, durante o
metamorfismo e a diagênese as micas podem ser transformadas ou formar-se por regeneração
de filossilicatos degradados, assim como por crescimento autigênico. Nessa perspectiva existe
correlação positiva entre o teor de mica dos solos e o seu material de origem, em que solos
originados de filitos, por exemplo, como é o caso da cobertura em estudo, podem conter
minerais micáceos em quantidades significativas (KÄMPF et al., 2009). Segundo os mesmos
autores, as micas são os minerais com maior capacidade de oferecer potássio quando do seu
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intemperismo, o que justifica a porcentagem desse elemento na análise química (Tabela 1). A
presença desses teores de potássio é também um indicativo de um menor grau de alteração, já
que com o avanço do intemperismo ele tende a ser lixiviado. É provável que a caulinita
identificada nos horizontes esteja associada à alteração das muscovitas.
Figura 6. Difratogramas de raios-X (radiação CuKα) referentes aos horizontes e concreções.
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Associada a coloração avermelhada ou amarelada dos horizontes de solo, a presença dos
óxidos de ferro nos difratogramas já era esperada, também justificada pelos altos teores de
ferro ao longo do perfil. A oxidação/redução corresponde a uma das principais reações
provenientes do intemperismo químico, pois através da penetração da água no material, com
oxigênio dissolvido, a oxidação processa-se principalmente nos primeiros metros superficiais
(RESENDE et al., 2007). O oxigênio reage com os minerais contendo ferro, manganês e
enxofre na estrutura. No caso dos óxidos de Ferro, o Fe2+ presente na estrutura de minerais
primários, oxida para Fe³+ precipitando como óxidos e oxihidróxidos, representados
principalmente por goethita e hematita que frequentemente ocorrem associadas (KÄMPF et al.,
2009). Destaca-se a influência da goethita na coloração dos horizontes H3 e H4. Ademais, é
importante citar a presença de gibbsita em algumas amostras, como H2, H5t, H5b e H6, sendo
um indicativo de que, embora ainda incipiente esse solo possa estar, em algumas porções,
evoluindo mineralogicamente; já que se trata de um mineral ausente na rocha de origem e cuja
gênese está associada ao intemperismo direto da muscovita (não parece ser o caso) ou à
perda de sílica por parte da caulinita.
DISCUSSÃO
Os resultados obtidos pelas caracterizações física (textural), química e mineralógica revelaram
aspectos importantes a serem considerados em associação com as especulações
conjecturadas em nível macroscópico. A partir disso, algumas discussões podem ser feitas.
Em primeiro lugar, a textura de um solo depende do material de origem e do grau de
intemperismo deste. Caso a cobertura em questão fosse constituída por materiais autóctones e
alóctones, esperava-se que os resultados texturais sugerissem diferentes classes no contato
entre as diferentes cores. O que se observou, no entanto, foi a similaridade entre as
quantidades das frações granulométricas ao longo do perfil. A relação silte/argila, embora
tenha apontado para o baixo grau de intemperismo de todo o perfil, apresentou anomalia
(menores valores em maiores profundidades) que permite supor a existência de materiais
diferentes. Contudo, ao invés da presença de um paleossolo na base e coluvios
pedogeneizados na porção superior, os menores valores em subsuperfície sugerem que a
alteração da rocha foi mais intensa em profundidade, sobretudo em níveis que podem
representar variações faciológicas ou composicionais da rocha.
As análises mineralógicas e geoquímicas tornaram possível compreender com maior
propriedade o material constituinte do solo. Esperava-se que a correlação dos tipos minerais
presentes nos horizontes e sua distribuição ao longo do perfil apontassem para a evolução dos
diferentes horizontes a partir de alteração de material alóctone e autóctone. Os resultados,
contudo, refletem uma condição oposta. Tanto a distribuição dos elementos químicos, quanto
os tipos mineralógicos sugeriam que a evolução do perfil se deu a partir de mesmo material de
origem, contendo, porém, variações composicionais. Essas variações explicam, tanto
mineralogicamente, quanto geoquimicamente, as diferenças de cores.
Os dados de matéria orgânica sustentaram tais constatações. Em geral, as cores dos
horizontes em paleossolos dependem de suas condições originais de drenagem e
consequentemente da oxidação dos materiais constituintes e da matéria orgânica. Entretanto,
em sua maioria, estão associados às cores marrom e cinza escuro a marrom avermelhado
(ANDREIS, 1981). Esperava-se que os dados de matéria orgânica refletissem o aumento dos
teores em profundidade, ou no mínimo uma anomalia nos valores entre os horizontes. No
entanto, à exceção do H1, todos os outros horizontes tiveram a mesma quantidade de matéria
orgânica, incluindo o H5.
Conforme Resende et al. (2007), apesar da matéria orgânica ter forte relação com cores
escuras, é frequente tal afirmativa se comprovar errônea. E foi exatamente o que os resultados
comprovaram. A composição química total revelou que as pontuações escurecidas
concentradas no H5 correspondiam a concreções ferromanganosas. Ademais, é no H5 que o
teor de manganês quadriplica em relação ao H4 (passando de 0,25% para 2%). Óxidos de
manganês possuem significativa influência nas propriedades físicas e químicas de um solo, e
assim como o ferro, tem grande poder de pigmentação, aderindo uma cor mais brunada ou
acinzentada ao mesmo.
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Geralmente de origem autigênica, os óxidos de manganês são formados pela precipitação
química ou bioquímica através da cristalização de coloides desorganizados, podendo ocorrer
nos solos como partículas dispersas, ou formando concreções ou nódulos. A despeito de
ocorrerem geralmente em pequena proporção, no contexto do QF, a influência do material de
origem na formação dos solos garante elevados teores de óxidos de manganês aos mesmos
(CARVALHO FILHO et al., 2011). Vale acrescentar que a cobertura pedológica encontra-se sob
domínio de filitos prateados da Formação Cercadinho. Sua constituição rica em micas e em
hematita, orientados paralelamente à foliação, explica a presença de muscovita e os óxidos de
ferro na constituição mineralógica do perfil de solo. A ocorrência de vários minerais
epigenéticos está relacionada também à composição destes filitos, estando entre eles os
óxidos de manganês (DORR, 1969).
Como destacaram Carvalho Filho et al. (2011), a mineralogia variada e complexa associada à
baixa cristalinidade desses minerais de manganês dificultam a sua caracterização. Nessa
perspectiva, a baixa detecção de tais óxidos ao longo do perfil através da difratometria da
TFSA está associada à baixa cristalinidade do mineral e ao provável maior destaque do quartzo
e da muscovita na difração. Para maior valorização da presença destes óxidos seria necessário
fazer a difratometria na fração argila e tratamentos geoquímicos específicos.
O fato é que a evolução do perfil estudado parece estar relacionada à alteração deste filito
prateado, que contém, naturalmente, variações composicionais, incluindo níveis ferromanganosos. O avanço do front de alteração por sobre esse nível resulta na geração de uma
fácies de alteração (horizonte no sentido pedológico) que possui cor brunada semelhante a um
horizonte orgânico. Essa alteração tem ocasionado também o concrecionamento a partir de
processos oxidativos, revelando a tendência natural de tais óxidos de serem susceptíveis às
acumulações em nódulos e concreções (CARVALHO FILHO et al., 2011). A formação de
concreções representa uma etapa posterior ao processo de alteração isovolumétrica da rocha,
confirmando que nestes níveis ferromanganosos da rocha o avanço da alteração parece ter
sido maior.
Em termos taxonômicos, infere-se que tal perfil pode ser classificado como Neossolo
Regolítico, de acordo com o Sistema Brasileiro de Classificação de Solos (EMBRAPA, 2013). O
H1 se caracteriza como o horizonte A do perfil e os demais como horizontes C. H2 e H3
demonstraram-se muito semelhantes em todos os atributos e parecem corresponder a um
mesmo horizonte saprolítico. Os horizontes H4, H5 e H6 deixam ainda mais claras as marcas
da xistosidade e variações composicionais da rocha.
Considerando a inserção deste perfil na paisagem na qual ele ocorre, chama atenção a
disposição dos horizontes em relação à vertente. Todos os horizontes concordam com a
topografia. Além do forte controle sobre os atributos da cobertura em questão, a litologia parece
influenciar na configuração da vertente. Com forte orientação estrutural, a inclinação da
vertente concorda com o mergulho NS típico das rochas dobradas da Anticlinal de Mariana.
Nesses termos, a cobertura pedológica em questão representaria o aprofundamento do manto
de alteração controlado por esse mergulho e influenciado pela variação faciológica e
composicional da rocha. Esse aprofundamento da alteração, por sua vez, estaria associado a
uma possível mudança no nível de base local, uma vez que próximo à vertente em estudo
localiza-se a garganta epigênica do Fecho do Funil (PENTEADO, 1983). Esse gap tem sua
gênese ligada à abertura do vale anticlinal do Rio das Velhas. O reentalhe erosivo desenvolveu
uma rede de vales paralelos às dobras, esvaziando determinadas porções da Anticlinal e
expondo rochas mais profundas. Além de expor os filitos, a abertura desses vales parece ter
modificado as condições da dinâmica hidrológica e impulsionado o fluxo vertical possivelmente
orientado pela xistosidade da rocha, gerando a cobertura observada.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os resultados levam a considerar que, embora macromorfologicamente, a cobertura na
vertente analisada sugerisse a presença de distintos materiais de origem, sobretudo
considerando fontes autóctones e alóctones evidenciadas pela presença de um possível
paleossolo ou horizonte orgânico enterrado, essa cobertura revelou, na verdade, um sistema
pedológico em equilíbrio, onde a alteração vertical da rocha foi o principal caminho genético.
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Nesse sentido, as diferenciações verticais observadas, destacadas pelas cores, são, na verdade,
a demonstração da influência litológica e, consequentemente, de suas variações composicionais,
reiterando o importante papel que a geologia possui na evolução da paisagem no QF.
A relação da evolução da cobertura pedológica com a própria vertente é interessante no que
concerne a concepção ultrapassada de antagonismo entre a atuação da pedogênese na
formação do solo e da morfogênese no modelamento do relevo. Pensando no solo como
resultado da alteração do arcabouço litológico, tendo a pedogênese e a morfogênese atuando
simultaneamente, foi possível compreender a relação entre tais fatores.
Por fim, vale destacar a importância que os dados laboratoriais tiveram em associação com as
observações de campo. A cobertura pedológica pode conter por meio de seus atributos físicos,
químicos, mineralógicos e morfológicos (tanto macro quanto micro), importantes registros da
evolução da paisagem e, por isso, deve ser objeto de investigação integrada ao relevo, à
cobertura vegetal, às características e condicionantes climáticos e, da mesma maneira, ao
contexto geológico da área de estudo. Sendo assim, áreas muito complexas de serem
estudadas, como o QF, podem ter suas paisagens destrinchadas, compreendidas, protegidas e
sustentavelmente ocupadas.
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