Grandes Mestres da Ciência Brasileira André Dreyfus

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 grandes mestres da
ciência brasileira
André Dreyfus
(1897-1952)
genética animal e evolução
1
editorial
ciência brasileira: história com
sujeito e predicado
Projeto Genoma é um empreendimento
internacional, iniciado formalmente em
1990 e projetado para durar 15 anos,
com o objetivo central de identificar e
mapear os cerca de milhares de genes
que existem no DNA das células do
corpo humano, determinando as
seqüências das três
bilhões de bases químicas que compõem
esse material genético. Paralelamente
estão sendo desenvolvidos estudos com
outros organismos sele­cio­­nados, em
especial microorganismos, visando
desenvolver tecnologia e também como
auxílio ao trabalho de interpretar a complexa função genética humana. O Brasil,
que conta com cerca de 1.700 grupos de
pesquisa em Biotecnologia, é um dos 15
países participantes do projeto, com um
investimento de cerca de R$ 100 milhões
nos últimos dois anos.
“A pesquisa genética, capaz de salvar milhões de vidas em um futuro pró­
xi­mo, hoje limita-se aos países industrializados, e os países em desenvolvimento correm o risco de não ter acesso aos benefícios dessa pes­quisa,
assim como ficaram à margem da revolução informática nos anos 80 e 90.
As únicas exceções são o Brasil, a China, Índia e Cuba, que estão dando
contribuições notáveis ao Projeto Genoma.”
Essa é uma das conclusões do 1º Relatório da Organização Mundial de
Saúde (OMS) sobre “Genoma Humano e Saúde Mundial”, divulgado em 30
de abril de 2002. O Brasil é citado especialmente pela decodificação completa do genoma da Xylella fastidiosa e também pelos avan­ços obtidos no
Projeto Genoma do Câncer, como o desenvolvimento de uma técnica revolucionária de localização e identificação de genes – o chamado seqüenciamento – no DNA humano.
A inclusão do Brasil entre os principais centros de pesquisa genômica é o
reconhecimento mundial do avançado estágio em que se encontram os
estudos de Genética Animal e Humana no país. Esse status atual é, em
essência, fruto de uma história iniciada há exatos 80 anos, quando começa
a se formar um personagem fundamental para a ciência na­cio­nal: o professor e cientista André Dreyfus (1897-1952), o pioneiro da Genética Ani­mal e
da Evolução no Brasil.
Fundador do primeiro curso de Biologia e da primeira escola de genética
no país, numa época em que essa modalidade científica ainda dava seus
primeiros passos em todo o mundo, Dreyfus foi também um dos articuladores e criadores da Universidade de São Paulo (USP), em 1934.
Dreyfus foi, acima de tudo, um cientista curioso, instigante e com
iniguálavel visão de futuro, além de professor apaixonado por seu ofício,
conferencista prestigiado, amante das artes e da música e um dos primeiros
(ou talvez o primeiro) a defender a importância da divulgação científica –
ponte essencial entre a academia e o debate das questões da ciência, da
ética e da moral na arena pública.
Xylella fastidiosa é a bactéria causadora
da Clorose Variegada de Citros (CVC),
doença popularmente conhecida como
“praga do amarelinho”, que causa sérios
prejuízos à produção comercial de
laranja. A conclusão do seqüenciamento
do DNA da bactéria por pesquisadores
brasileiros foi destaque na capa da
revista Nature em 2001, com foto de
Cristiano Mascaro.
grandes
mestres da
ciência
brasileira
2
Apesar da importância de seu trabalho para a genética, a ciência nacional e a divulgação científica junto à sociedade, Dreyfus permanece lamentavelmente incógnito para a maior parte dos estudantes, pesqui­sadores,
jornalistas e do público em geral. Por isso a escolha de seu nome para iniciar a série Grandes Mestres da Ciência Brasileira, cujo objetivo é ajudar a
preencher a grave lacuna que persiste na história do país, mos­trando um
pouco da vida e da obra dos principais pioneiros da ciência brasileira, em
suas mais diversas modalidades.
A série Grandes Mestres da Ciência Brasileira é uma publicação relativa ao Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) da aluna
Cely da Silva Carmo (nº USP 121.412), da graduação em Jornalismo. Edição nº 1 – Junho de 2002 (André Dreyfus).
[Pesquisa, Entrevistas, Textos, Projeto Gráfico, Diagramação, Edição e Revisão] [Fotos] [Colabo­ra­ção][Orientador] [Unidade]
[
A
g
r
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d
e
c
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m
e
n
t
o
s
]
primeiros passos
novas fronteiras
Antes de partir para as pesquisas de
Genética e Evolução, André Dreyfus ajuda a
fundar as bases da Biologia brasileira
A história da Genética e da Evo­ amostra do autoritarismo que logo
lução no Brasil se confunde com a viria a se instaurar.
No meio acadêmico há uma efertrajetória do cientista gaúcho André
Dreyfus, iniciada em 1922, quando, vescência em diversos campos da
aos 24 anos, ele deixa sua cidade ciência. A partir de 1912, ano da
natal, Pelotas, e parte para a então fundação da Universidade do Pa­raná,
capital federal, onde ingressa na começam a surgir as primeiras unirenomada Faculdade de Medicina do versidades no país. Com a chegada do
progresso nas mais diversas áreas,
Rio de Janeiro.
1922 é um ano sintomático para o como a construção de ferro­vias, a
Brasil, pois muitos fatos começam a expansão da rede de eletricidade e a
prenunciar uma reviravolta na velha implantação do telefone, o Brasil vive
ordem estabelecida. O Levante do um período de flores­cimento tecForte de Copacabana, a fundação do nológico, im­pulsionando a abertura
de novos campos do
Partido Comunista e a
Primeiros
conhecimento.
Se­m a­n a
de
Arte
experimentos
A carreira médica
Moder­na demonstram
conta com forte status
o esforço multilateral
são feitos num no país no início do
no sentido de romper
século 20. Mas também
com os pa­drões polítilaboratório
enfrenta
inúme­ros
cos, cul­tu­­rais e sócioimprovisado
de­safios, cujas res­
econô­micos vigentes
postas
dependem
até o momento. As
no porão de
totalmente do de­sen­
questões sociais são
uma residência volvimento das ciênagravadas
pela
cias básicas. Diversas
explosão urbana e
industrial, especialmente no Rio de doenças tropi­cais, como febre amarela e tifo assolam o país. A doença
Janeiro e em São Paulo.
A capital da República Velha vive de Chagas co­meça a ser desvendada,
sob o signo da Política do Café-com- com a des­coberta, em 1909, do proleite, apagando as luzes do governo tozoário cau­sador da doença, o
Epitácio Pessoa para receber Artur Trypanozoma Cruzi, pelo médico,
Bernardes, representante da podero- sanitarista e cientista mi­neiro Carlos
sa oligarquia mineira. A posse do Chagas (1878-1934).
novo presidente, em 15 de novemVocação para a Biologia
bro, é marcada pelo início de um
O Rio de Janeiro é, ao lado de São
interminável Estado de Sítio, que perduraria por todo o mandato, durante Paulo, o principal pólo de produção
44 meses. Censura à im­prensa, com o científica do país. Ainda no pri­mei­ro
fechamento dos jornais de esquerda, ano de graduação na Facul­dade de
e proibição ao fun­cionamento dos Medicina, André Dreyfus descobre
sindicatos são algumas de suas sua vocação para a pes­quisa em ciênprimeiras medidas, dando uma cias biológicas, mas ainda não há no
arquivo ib-usp
do conhecimento
André Dreyfus nasceu no dia 5 de julho
de 1897, na cidade de Pelotas, Rio
Grande do Sul. Seus pais, franceses,
vieram para o Brasil fugindo da Guerra
Franco-Prussiana, em 1870, que assolou
sua cidade de origem, Estrasburgo, a
qual acabou sendo transferida da
França para a Alemanha, junto com as
províncias Alsácia-Lorena. Os Dreyfus
eram donos de uma joalheria e relojoaria em Pelotas, mas o negócio foi
fechado quando o filho André resolveu
seguir a carreira de medicina e prestou
concurso para a Faculdade de Medicina
do Rio de Janeiro. Os quatro membros
da família, incluindo a irmã caçula do
cientista, Jenny Dreyfus, mudaram-se
para a então capital federal. Logo os
pais faleceram, e a irmã começou a trabalhar no Museu Nacional do Rio de
Janeiro, tornando-se especialista em
cerâmica e tapeçaria. André e Jenny
não tinham parentes no Brasil e nunca
se casaram, não deixando descendentes. André Dreyfus faleceu em São Paulo,
no dia 16 de fevereiro de 1952, e seu
corpo foi enterrado no Cemitério São
João Batista, no Rio de Janeiro.
3
primeiros passos
cronologia
andré dreyfus
5 de julho de 1897 Nasce na
cidade de Pelotas (RS), filho de
pais franceses, naturais de
Estrasburgo.
1922 Após o término do colegial,
em Pe­lotas, muda-se para a então
capital federal, com os pais e a
irmã Jenny. Ingressa na Facul­dade
de Medicina do Rio de Janeiro.
1923 Conhece Miguel e Álvaro
Osório de Almeida, precursores
da Fisiologia no Brasil e pesquisadores
do Instituto Man­guinhos, e
começa a fazer experimentos
científicos em um laboratório
improvisado no porão da casa
deles.
1925 Monta um curso de
Histologia pa­ra estudantes de
Medicina, que
é fre­qüentado por mais de mil
alunos. Já in­clui em suas aulas
noções de Genética e Evolução.
Ciência no porão
Logo que se instala no Rio de
Janeiro e começa a cursar Medi­cina,
o jovem André Dreyfus co­nhece um
grupo de pes­quisadores do Instituto
Man­guinhos (mais tar­de transformado em Fundação Os­waldo Cruz) e
começa a participar das reuniões que
Caricatura de Dreyfus, feita em 1951
1927 Forma-se em Medicina e
por Pacheco para o jornal “A Manhã”
torna-se professor da Faculdade
de Medicina do Rio de Janeiro, conquistando a cátedra efetiva poucos anos
depois.
1932 Muda-se para São Paulo, como professor do curso preparatório da
Fa­culdade de Medicina de São Paulo. Participa ativamente do grupo que
planeja a criação da Universidade de São Paulo (USP).
1934 Ajuda a fundar a USP e a Faculdade de Filosofia, Ciências e Le­tras, tornando-se chefe do Departamento de Biologia Geral. Publica o livro Vida e
Universo e Outros Ensaios pela editora Nacional, em São Paulo.
1935 Participa da criação do primeiro curso de História Natural do país, que
reúne
disciplinas de Biologia, Geologia e Mineralogia.
1937 Presta concurso e é efetivado na cadeira de Biologia com a tese de cátedra “Contribuição para o Estudo do Cyclo Chromosomico e da Determinação
do Sexo de Rhabdias fulleborni Trav. 1926”.
1938 A Faculdade de Filosofia é transferida das dependências da Faculdade
de Medicina, na avenida Dr. Arnaldo, para prédio na alameda Glete, no
Centro.
1942 Recebe a visita de Harry Miller Jr., representante da Fundação
Rockfeller,
que está disposta a investir em laboratórios científicos no Brasil.
1943 Chegada do cientista Theodosius Dobzhansky, um dos maiores geneticistas do mundo, que fica por quatro meses no laboratório de Dreyfus e ministra
um curso para pesquisadores de todo o país sobre Genética Moderna e
Evolução.
Inicia os estudos de citogenética com moscas do gênero Drosophila.
1944-5 Viaja para os Estados Unidos, onde estagia no laboratório de
Dobzhansky, e segue para a Europa, visitando diversos laboratórios de pesquisa.
1947 Publica o livro Condições para o Trabalho Científico no Brasil.
1948-9 Recebe novamente a visita de Dobzhansky em seu laboratório.
16 de fevereiro de 1952 Morre em São Paulo, vítima de hipertensão arterial
e complicações cardíacas. É enterrado no Rio de Janeiro.
4
Brasil nenhum curso es­pe­cífico para
essa área.
“Até o início da década de 1930,
quando foram criados os primeiros
cursos de História Natural, englo­
bando Biologia, Geologia e Mine­
ralogia, praticamente só existiam os
cursos de Medicina, Direito e
En­genharia. Por exemplo, eu sempre
quis ser botânico, mas, para isso, tive
de cursar Medicina. Quem qui­sesse
ser astrônomo, devia fazer En­­genharia
e, para ser historiador ou escritor, era
preciso ir para uma fa­culdade de
Direito”, lembra o ci­en­tista carioca
Oswaldo Frota-Pes­soa, que trabalhou
numa pes­qui­sa de sistemática de
moscas no la­bora­tório de Dreyfus
nos anos 40.
o início
No período colonial bra­sileiro, a
medicina era exercida no Brasil por
pajés, feiticeiros, curandeiras, par­
teiras, jesuítas e cirurgiões portu­
gueses, hispânicos e holandeses.
Não havia ensino superior no país, o
que era considerado uma ame­aça
ao poder exercido por Por­tugal. Os
poucos médicos que atuavam no
país eram formados na Europa.
Com a transferência da Corte por­
tuguesa para o Brasil, em 1808,
fo­ram criadas as duas primeiras
escolas de Medicina no Brasil, em
Salvador (fevereiro de 1808) e no
Rio de Janeiro. A atual Faculdade de
Medicina da Uni­versidade Fe­deral
do Rio de Ja­neiro (UFRJ) foi fundada
por D. João VI, por meio de Carta
Régia assinada em 5 de novembro
de 1808, a qual determinava o estabelecimento, no Hos­pital Militar do
Morro do Castelo, de uma Escola de
Anatomia, Medi­cina e Cirurgia.
Em 3 de outubro de 1832, du­rante
primeiros passos
acontecem sema­nalmente na residência dos ir­mãos Álvaro e Miguel Osório
de Al­meida, precursores da Fisio­logia
no Brasil.
“A casa dos Osório de Almeira ti­nha
um porão amplo, onde eles
im­provisaram um laboratório. Toda
semana, o grupo, incluindo Dreyfus,
montava uma série de experimentos,
que iam da Biologia à Astronomia, e
passava horas e horas discutindo
so­bre ciência, especialmente Fisiolo­
gia, Citologia e Histologia, matérias
básica da Medicina”, diz Frota-Pessoa.
Até os anos 1960, essas reuniões de
intelectuais são comuns no Rio de
Janeiro e em São Paulo. São grupos
inspirados no tradicional chá inglês,
que se encontram para dis­cutir um
pouco de tudo. “Havia um grupo
as­sim no Instituto Biológico, em São
Paulo, que se reunia todas as sextasfeiras, do qual participaram, na dé­ca­
da de 1940, eu, Dreyfus, José Reis e
Otto Bier, por exemplo”, conta o
geneticista Crodowaldo Pavan.
Entusiasmado com as perspectivas
de desenvolvimento das ciências bio­­
lógicas, Dreyfus, ainda em seus pri­
meiros anos de graduação, abre um
curso de atualização em Histo­logia e
Embriologia, para dar aulas particulares para seus colegas e para estudantes de Medicina em geral. Nessa
época, praticamente ainda não se fala
de Genética e Teoria da Evo­lução no
Brasil, mas Dreyfus – autodidata no
as­sunto – já inclui em seu curso
no­ções básicas dessas áreas.
O curso continua quando Dreyfus se
forma em Medicina, em 1927, e suas
aulas são disputadas. “Mais de mil
universitários freqüentaram o cur­so e,
desses, muitos se tornaram grandes
pesquisadores”, diz Pavan.
Com o sucesso dessa empreitada,
Drey­fus começa a se firmar como um
brilhante professor e conferen­cista.
Torna-se professor-assistente da
Faculdade de Medicina do Rio de
Janeiro assim que conclui a gradua­ção
e pouco tempo depois é efetivado na
cátedra de Histologia, ficando assim
até o final de 1932, quando se transfere para a Faculdade de Me­dicina de
São Paulo.
O médico, cientista, professor e divulgador científico Miguel Osório de Almeida
(1890-1953), carioca, formou-se pela
Faculdade de Medicina do Rio de
Janeiro, concluindo o doutorado em
1911. Um
dos precursores da pesquisa científica
em Fisiologia Animal e Humana, atuou
no Instituto Oswaldo Cruz, no Instituto
de Biologia Animal do Ministério da
Agricultura, na Escola Superior de
Agricultura e Medicina Veterinária
e foi, ainda, professor e reitor da
Universidade do Distrito Federal (hoje
UFRJ). Publicou, entre outras obras,
Homens e Coisas de Ciência (1925),
A Vulgarização do Saber (1931) e
Tratado Elementar de Fisiologia (1937),
sendo eleito em 1935 para a Academia
Brasileira de Letras, instituição por
ele presidida no ano de 1949.
da medicina brasileira
a fase da Regência, foi sancionada a
lei que transformava es­sas Academias
Médi­co-Cirúrgicas em Faculdades de
Medi­cina. O pri­meiro prédio próprio
da Facul­dade de Medicina do Rio de
Ja­neiro foi erguido na Praia Vermelha
e inaugurado em 12 de outubro de
1918. Nesse local funcionou co­mo
escola independente até 7 de
se­tembro de 1920, quando foi incorporada à Uni­ver­sidade do Rio de
Janeiro, cri­ada por meio de decreto.
No ano de 1937, com a inauguração da Uni­versi­dade do Brasil, constituída por 15 faculdades e 16 institutos de pesquisa, a escola pas­­sou a
se cha­mar Faculdade Na­cio­nal de
Medi­cina.
A Universidade do Brasil, por sua
vez, passou a ser denominada Uni­
versi­dade Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ) em 1965 e, no ano de 1973,
foi determinada a transferência das
instalações da Medi­cina da Praia
Vermelha para a nova Cidade Uni­
Antigo prédio
da Faculdade
Nacional de
Medicina,
na Praia
Vermelha,
demolido
em 1975.
versitária da UFRJ, localizada na Ilha
do Fundão – onde permanece até
hoje. O prédio da Praia Ver­me­lha
acabou sendo demolido dois anos
mais tarde.
A Faculdade de Medicina do Rio
de Janeiro formou grandes perso­na­
lidades brasileiras, que se desta­
caram não apenas na Medicina, mas
também em outras áreas do conhecimento. Alguns exemplos: Carlos
Chagas, Miguel Couto, Vital Brazil,
Dante Pazzanese, e Edgar RoquettePinto, fundador da Rádio Sociedade
do Rio de Janeiro, a pri­meira emissora de rádio do país.
5
universidade
impulso às
ciências básicas
Armando de Salles Oliveira (1887-1945),
engenheiro e jornalista, foi o fundador
da Universidade de São Paulo em 1934,
quando governava o Estado de São
Paulo como Interventor Federal
(21/08/1933 a 11/04/1935). Formado
pela Escola Politécnica em 1905,
especializou-se na instalação de usinas
hidrelétricas em várias cidades paulistas.
Foi diretor do jornal O Estado de S.
Paulo em 1915. Após a promulgação da
Constituição Estadual, em 1935, foi
eleito governador de São Paulo
(11/04/1935 a 29/12/1936) pela
Assembléia Constituinte, mas renunciou
ao cargo para disputar a Presidência da
República pela União Democrática
Brasileira (UDB), contra José Américo de
Almeida (PRP) e o integralista Plínio
Salgado (UIB). Com a implantação do
Estado Novo, foi preso e exilado,
voltando ao país poucos meses antes de
sua morte.
Escreveu, entre
outros livros, Para
Que o Brasil
Continue: São
Paulo (1937) e
Diagrama de
Nossa Situação
Política:
Manifestos
Políticos do Exílio
(1945).
Atualmente, a Universidade de São
Paulo (USP) é a maior instituição de
ensino superior e de pesquisa do país, a
3ª da América Latina e está classificada
entre as 100 primeiras organizações
similares dentre as cerca de 6 mil
existentes no mundo. Conta com 35
unidades de ensino distribuídas por 6
campi universitários: em São Paulo,
Bauru, Piracicaba, Pirassununga,
Ribeirão Preto e São Carlos. A Cidade
Universitária Armando de Salles
Oliveira, no bairro do Butantã, em São
Paulo, é o maior campus, contendo a
infra-estrutura administrativa da
universidade e 23 unidades de ensino.
Há bases científicas e museus também
em outras cidades, como Anhembi,
Anhumas, Araraquara, Cananéia,
Itatinga, Itirapina, Piraju, Salesópolis,
São Sebastião, Ubatuba e Valinhos (SP),
além de Marabá (PA).
6
O clima de transformações sociais, funções téc­­nicas, políticas e culturais,
econômicas e culturais prenunciado lhes faltava a universalidade e a prono começo dos anos 1920 reflete-se fundidade, que levariam à certeza do
também na área educacional: diver- progresso e à cultura livre e desintersos setores da sociedade civil come­ essada”.
çam a se organizar para promover a
Após a publicação dos resultados do
renovação do ensino no país, desde o Inquérito sobre a Instrução Pú­blica, a
primário até o nível superior. Esse idéia de criação de uma universidade
contexto culmina com a criação do paulista ganha ainda mais força com
Ministério da Educação e Saúde e do as Conferências Nacionais de
Conselho Nacional de Educação, no Educação, realizadas pela Asso­ciação
ano de 1931. São instituídos também Brasileira de Edu­cação nos anos de
a obrigatoriedade do ensino primá­rio 1927, 1928 e 1929, e com dois novos
e o ensino profissionalizante pa­ra as estudos, O Problema Uni­versitário
classes sociais menos favorecidas, e Bra­sileiro (1928) e o Inquérito do
abertas as pri­meiras
Rotary Clube de São
univer­si­da­­des brasilPaulo (1929).
Divulgação das
eiras.
Essas iniciativas,
ciências ao grande ao lado da campa­
Em São Paulo, o
jornal O Estado de S.
nha patrocinada por
público – ou sua
Paulo inicia, em
Júlio de Mes­quita
“vulgarização” – é Fi­lho no Esta­do de S.
1923, uma ampla e
ostensiva campanha
e a chegada
um dos propósitos Paulo
a favor da criação de
de Armando de
uma universida­de
da USP desde sua Salles Oliveira ao
em São Paulo. A
poder, como Inter­
pedido de seu dire- criação, por decreto ventor Federal de
tor, Júlio de Mes­qui­
São Paulo, nomeado
ta Filho, um grupo de professores e pelo presidente Ge­túlio Vargas, forpesquisado­res, liderados por Fer­ mam o contexto propício para a
nando de Azevedo, desenvolvem em fundação da Uni­versidade de São
1926 o Inquérito sobre a Instrução Paulo (USP), o que finalmente ocorre
Pública em São Paulo, publicado no no dia 25 de ja­nei­ro de 1934, pelo
jornal durante quatro meses e res­ decreto esta­dual nº 6.283, assinado
pondido por centenas de professores pelo in­ter­ventor.
das escolas públicas e das faculdades
de Medicina, Direito e Engenharia de
A participação de Dreyfus
todo o território nacional.
O cientista André Dreyfus, já consaDe acordo com o professor Erasmo grado no Rio de Janeiro como profesGarcia Mendes, professor do Insti­tuto sor e conferencista e em 1933 do­cente
de Biociências e conselheiro editorial da Faculdade de Medicina de São
da revista Estudos Avança­dos, da USP, Paulo, na avenida Doutor Ar­nal­do,
uma das conclusões des­sa pesquisa é participa das inúmeras dis­cus­sões em
a de que “o ensino superior no Brasil tor­no da criação da universidade e
precisava se des­prender dos limites acaba sendo convidado a integrar a
estreitos da pre­paração profissional, comissão res­pon­sável pela elabora­
pois, ainda que as escolas profission- ção do texto final do decreto de
ais existen­tes tivessem ocupado papel fundação da USP.
de gran­de expressão, concentrando
Dreyfus se transfere do Rio de
universidade
bob pauli-
A abertura da USP e, com ela, dos primeiros cursos de Biociências
e Geociências do país, dá forte impulso à pesquisa básica
brasileira: essa é uma das metas de André Dreyfus,
que ajuda a definir as diretrizes da nova universidade
Ja­neiro para São Paulo em 1932 e
atua inicialmente como professor do
cha­mado “pré da Medicina”, ou seja,
o curso preparatório da Faculdade de
Medicina, feito pelos candidatos à
carreira médica em dois anos após o
término do colegial.
Nesse ano, o cientista contribui pa­­
ra a fundação da Escola Paulista de
Medicina (hoje Univer­sidade Fe­deral
de São Paulo), inclusive com a doação
de cinco contos de réis – muito dinheiro na época – e, nesse ínterim,
integra o movimento pela criação da
Faculdade de Filosofia, Ciências e
Letras – escola que seria um dos prin­
cipais centros de articulação pa­ra a
formação da USP e que definiria seu
perfil inovador, crítico e compromissado com a reflexão e a pluralidade,
tornando-se o núcleo ca­­ta­­li­sador da
universidade, em torno da qual se
agregaram a Fa­culdade de Medicina,
a Faculdade de Direito, a Escola
Politécnica e as de­mais escolas incorporadas à USP (veja box na página 8).
Inicialmente, de 1934 a 1937, a
Fa­culdade de Filosofia, Ciências e
Letras funciona nas dependências
da Faculdade de Medicina da USP, no
antigo prédio da avenida Dr. Ar­naldo.
Ali, em 1935, Dreyfus ajuda a criar o
pri­meiro curso de História Natural do
país, integrando disciplinas biológicas
e geológicas nos seguintes departamentos: Minera­logia e Petrografia,
Geologia e Pa­leontologia, Biologia
Geral, Zoolo­gia, Botânica e Fisiologia
Geral e Animal.
Assim que a universidade inicia suas
atividades, sob o comando do reitor
Reynaldo Porchat, da Facul­dade de
Direito, André Dreyfus é convidado a
se tornar professor ca­te­drático da
História Natural
O curso de História Natural da USP
permaneceu com esse nome até 1957,
quando foi desmembrado em Ciências
Biológicas e Ciências Geológicas, mas
ainda pertencentes à Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras. Com a
Reforma Universitária, em 1971, essa
faculdade ganhou o nome atual –
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências
Humanas (FFLCH) –, e as disciplinas de
Biologia e Geologia foram, então,
transferidas para novas unidades: o
Instituto de Biociências e Instituto de
Geociências. Atualmente, o Instituto de
Biociências ocupa três prédios principais
na Cidade Universitária, na rua do
Matão, sendo que os Departamentos de
Biologia e Botânica estão alojados no
Edifício André Dreyfus (foto acima).
7
universidade
o decreto de
fundação da USP O decreto estadual nº 6.283, de 25 de janeiro de 1934, que criou
a Universidade de São Paulo (USP), foi preparado por uma
comissão de pesquisadores e intelectuais. Além de André Dreyfus,
integraram essa comissão os cientistas Agesilau Bittencourt (Instituto
Biológico), Almeida Júnior (Instituto de Educação),
Raul Briquet (Faculdade de Medicina), Rocha Lima (Instituto Biológico)
e Vicente Rao (Faculdade de Direito), bem como o
diretor do jornal O Estado de S. Paulo, Júlio de Mesquita Filho. Confira,
abaixo, a fundamentação da criação da USP,
de acordo com os artigos 1º a 3º do documento:
“O doutor Armando de Salles Oliveira, Interventor Federal do Estado de São
Paulo, usando das atribuições que lhe confere o decreto nº 19.398, de 11 de
novembro de 1930; e considerando que a organização e o desenvolvimento da
cultura filosófica, científica, literária e artística constituem as bases em que se
assentam a liberdade e a grandeza de um povo; considerando que somente
por seus institutos de investigação científica de altos estudos, de cultura livre,
desinteressada, pode uma nação moderna adquirir a consciência de si mesma,
de seus recursos, de seus destinos; considerando que a formação das classes
dirigentes, mormente em países de populações heterogêneas e costumes
diversos, está condicionada a organizações de um aparelho cultural e universitário, que ofereça oportunidade a todos e processe a seleção dos mais capazes;
considerando que em face do grau de cultura já atingido pelo Estado de São
Paulo, com Escolas, Faculdades, Institutos, de formação profissional e de investigação científica, é necessário e oportuno elevar a um nível universitário a
preparação do homem, do profissional e do cidadão, decreta:
Art. 1º – Fica criada, com sede nesta Capital, a Universidade de São Paulo.
Art. 2º – São fins da Universidade:
a) promover, pela pesquisa, o progresso da ciência;
b) transmitir, pelo ensino, conhecimentos que enriqueçam ou desenvolvam
o espí­rito ou sejam úteis à vida;
c) formar especialistas em todos os ramos de cultura, e técnicos e profissionais em todas as profissões de base científica ou artística;
d) realizar a obra social de vulgarização das ciências, das letras e das artes,
por meio de cursos sintéticos, conferências, palestras, difusão pelo rádio,
filmes científicos e congêneres.
Para atingir os fins acima, o artigo 3º do decreto dispôs sobre o agrupamento
das seguintes instituições:
Faculdade de Direito, pertencente ao Governo Federal e criada em 1827;
Escola Politécnica, do Governo do Estado de São Paulo, criada em 1893;
Faculdade de Farmácia e Odontologia, do governo estadual, criada em
1899;
Faculdade de Medicina, do governo estadual, criada em 1913;
Escola de Medicina Veterinária, do governo estadual, criada em 1934;
Instituto de Educação de 1933, originário do antigo Instituto Caetano
de Campos, que participaria da USP por meio de sua escola de professores;
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, criada pelo decreto em questão;
Instituto de Ciências Econômicas e Comerciais, efetivamente criado em
1946;
e a Escola de Belas-Artes.
8
USP e chefe do departamento de
Biologia Geral. “A princípio, ele recusou esse convite, pois achava que não
tinha preparo suficiente – uma
modéstia, pois, na verdade, ele tinha
um preparo fanstástico. Depois,
acabou aceitando o car­go e, em 1937,
prestou concurso, obtendo um resultado indefectível, e se tornou o
primeiro professor catedrático de
Biologia da USP”, conta o geneticista
Antônio Brito da Cunha, livre-docente
da USP e, junto com Crodowaldo
Pavan e Rosina de Bar­ros, um dos
primei­ros assistentes do laboratório
de Dreyfus.
Os demais departamentos da seção
de biociências da Faculdade são ori­gi­
nalmente chefiados pelos pesqui­
sadores Felix Rawitscher (Bo­tânica),
Ernst Marcus (Zoologia) e Paulo
Sa­waya (Fisiologia Geral e Animal).
Primeiros biólogos
A primeira turma de História Na­tural
da USP, iniciada em 1935, é também
pioneira no ensino superior de biologia e geologia: pela primeira vez na
história do Brasil, as ciências básicas
ganham status de curso universitário,
reunindo notáveis biológos e geólogos egressos das faculdades de
Medicina, Engenharia e Agronomia
do país e também vindos do exterior,
o que representa um grande impulso
à pesquisa científica no país.
No ano de 1938, a Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras é transferida para o prédio situado no Centro de
São Paulo, onde as seções de
Biociências, Geologia, Física e Química
permanecem até a cons­tru­ção da
Cidade Universitária “Arman­do de
Salles Oliveira”, no bairro do Butantã,
em 1955, para onde os de­partamentos
vão sendo paulatinamente transferidos.
As demais áreas da faculdade – os
cursos de Filo­sofia, Letras e História
– são insta­ladas em 1949 no prédio
da USP na rua Maria Antônia, na
Consolação, até a mudança defini­tiva
para a Cidade Universitária, em 1968
– ano em que esse edifício é
in­cendiado em represália ao mo­vi­
men­to estudantil, que lutava contra a
ditadura militar.
início da genética
geneticistas de primeira
geração
fotos: bob paulino
A esquina da alameda Glete com rua
Guaianases foi o primeiro endereço da
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (FFCL)
da USP, onde André Dreyfus atuou em grande
parte de sua carreira como professor e
pesquisador. A escola foi instalada em um
casarão que pertencera ao industrial Jorge
Street (1863-1939), produtor de sacos de juta
para grãos de café. Com a crise de 1929, a firma
faliu e o palacete foi entregue ao governo
estadual. As seções de Biociências e Química da
FFCL funcionaram nesse local até o
fim dos anos 1950, quando o prédio virou uma
delegacia, sendo mais tarde vendido para o
Grupo Folha da Manhã. Ficou abandonado e
acabou demolido na década de 1970. Agora, o
terreno, localizado bem em frente ao Terminal
Princesa Isabel, dá lugar a um estacionamento,
e a única coisa que sobrou da época da FFLC foi
a enorme figueira, tombada pelo Condephaat
por meio do decreto n° 30.443, de 20 de
setembro de 1989, como patrimônio ambiental
de São Paulo.
Com ajuda da Fundação Rockefeller,
Dreyfus cria no país a primeira escola
científica de Genética e Evolução
Um casarão em estilo industrial inglês, na
es­quina da alameda Glete com a rua Guaianazes,
no Centro de São Paulo, é o cenário onde co­meça
a funcionar efetivamente a primeira escola de
Genética no Brasil. Nesse endereço situa-se a
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP
entre 1938 e 1955, que oferece o pioneiro curso
de História Natural – vinculado a essa fa­culdade
até a Reforma Universitária, em 1971.
Chefe do Departamento de Biologia Geral e pro­
fessor de Histologia, o cientista André Drey­fus
continua incorporando, a exemplo de sua experiência no Rio de Janeiro, noções básicas de Genética
e Evolução em suas aulas e nas disputadas palestras que realiza para platéias formadas por intelectuais de todo o país, mas ainda não há um
departamento especializado no as­sunto, pois os
estudos e a literatura na área são incipientes na
maioria dos países do mundo.
No Brasil, apenas algumas pesquisas em Ge­nética
Ve­getal, sobretudo aquelas voltadas para o desenvolvimento da agricultura nacional, já são pratica-
9
escola de genética
Antes de Dreyfus fundar a primeira
escola científica de Genética no Brasil,
em 1943, e de iniciar as pesquisas em
Genética Animal, o pesquisador
Benedito de Oliveira Paiva, da
Universidade Federal de Lavras (UFLA)
realizou experimentos de Genética
Vegetal e chegou a publicar um livro em
1925, Apontamentos de Genética
Elementar e Aplicada, sendo o pioneiro
nas publicações dessa área. O cientista
foi o precursor dos estudos de
tolerância de plantas ao alumínio tóxico
do solo, trabalhos importantes para o
efetivo uso agrícola dos solos de
vegetação de Cerrado da região CentroOeste.
A Fundação Rockefeller foi criada pelo
industrial John Davison Rockefeller
(1839-1937) (foto), dono da gigante
petrolífera Standard Oil Company. Nas
décadas de 1930 a 1950, a instituição
conduziu uma agressiva política
científica, financiando uma série de
pesquisas em todo o mundo. Entre 1932
e 1959, a Fundação investiu nada menos
que US$ 900 bilhões em projetos nas
mais diversas áreas. Quando Harry Miller
procurou o laboratório do professor
André Dreyfus, no Brasil, a Rockefeller
tinha como chefe da Divisão de Ciências
Naturais o americano Warren Weaver
(1898-1978), um entusiasta da genética
e criador do termo “biologia molecular”,
introduzido em 1938 no texto do
relatório anual da Fundação.
das nessa épo­­­ca, especialmente pelos
professores Benedito de Oliveira
Paiva, da Universidade Fe­de­ral de
Lavras (UFLA), a partir de meados dos
anos 1920; o alemão Friedrich Gustav
Brieger, da Escola Superior de
Agricultura Luiz de Quei­rós (Esalq), da
USP, em 1936; e Alcides Carvalho, do
Instituto Agro­nômico de Campinas
(IAC), pioneiro na se­leção de variedades comerciais de café, algumas
delas cultivadas até os dias de hoje.
recusa, resolve mudar a proposta,
oferecendo uma possibilidade oposta:
a de vir ao Brasil, por seis meses, um
geneticista ucraniano, naturali­zado
americado, que tinha interesse em
realizar estudos na mata ama­zônica:
ninguém menos que Theo­dosius
Dobzhansky, responsável por dar
grande impulso à pesquisa mundial
em Genética de Populações (um ramo
da Genética Evolutiva), ciência criada
em 1900 com a união das idéias de
fatores hereditários de Gregor Mendel
e a Teoria da Evo­lução de Charles
Darwin.
Outra face da moeda
A grande oportunidade para que o
Brasil crie seu primeiro grupo de pes­
Um escola para todos
quisas em Genética Animal surge no
A chegada de Dobzhansky, em 1943,
início dos anos 1940, ironicamente
por conta da Segunda Guerra Mundial. é o marco fundamental para a criação
“Por causa da Guerra, a Fundação oficial da Genética no Brasil. “Nesse
Rockefeller, dos Estados Uni­dos, teve momento, Dreyfus dá mais uma
de suspender seus au­xílios à pesquisa demonstração de seu caráter e,
para os países da Ásia, da África e tomando uma iniciativa que só po­deria
principalmente da Euro­pa. Então, eles partir de uma pessoa altruísta: em vez
resol­veram investir na América Latina”, de tirar proveito da vinda do
con­ta o geneticista Cro­do­waldo Dobzhansky so­mente para seu grupo
de pesqui­sas, como infelizmente é
Pavan.
Com esse intuito, Harry M. Miller Jr., de praxe no meio acadêmico, fez
representante da Roc­kefeller, chega a questão de convidar todos os de­mais
São Paulo no ano de 1942 avisando cientistas in­teressados em Genética
que a po­derosa Fun­dação está dis- no país – especialmente o professor
posta a ajudar os laboratórios científi- Brieger, da Esalq, e Carlos Arnaldo
cos bra­sileiros, e que o de­partamento Krug, especialista em milho e café do
de Biologia Geral da Faculdade de IAC – para cursos com o cientista”,
Fi­losofia, Ciências e Letras da USP é conta Pavan.
Dreyfus prepara o auditório do
um dos escolhidos para receber fi­nan­
ciamento e promover o intercâmbio de De­partamento de Química da Facul­
dade de Filosofia, na alameda Glete,
pesqui­sado­res.
para que Dobzhan­
Dreyfus é, a prin­
shy possa ministrar
cípio, convidado a
passar uma tempo- Dreyfus fez questão o primeiro curso
rada nos Estados de convidar todos os moderno de Gené­
tica e Evolução do
Uni­dos, para atuar
interessados em
Brasil. “Suas aulas
em um labora­tório
estão sempre chei­
de seu interesse e
Genética
no
país
as, repletas de cienvisitar as instituições
de pesquisa que
para aprenderem tistas e graduandos:
durante todo o cur­
desejasse – tu­do
com Dobzhansky
so, muitas pessoas
bancado
pela
levam
cadeiras
Rockefel­ler. Qual­
dobráveis para se
quer cientista teria
aceito a proposta sem pestanejar, mas sentar, e outros assistem às aulas senDrey­fus, peculiaríssimo, recusa o con- tados na es­cadaria do auditório”, lemvite, sob a alegação de que não pode bra Pa­van. Junto com Dreyfus e seu
aban­donar seu laboratório no Brasil, colega An­tônio Brito da Cunha, Pavan
deixando seus dois jovens estagiá­rios também ajuda o russo-americano a
– Crodowaldo Pavan e sua pri­meira- aprender português nos dias que
assistente Rosina de Barros – sem an­tecedem o curso, e é no idioma
orientação. (Confira o depoimen­to de nacional que Theodosius Dobz­hansky
profere to­das as suas palestras.
Pavan nas páginas 12 a 17)
O curso enfatiza como tema central
Harry Miller, diante da inesperada
escola de genética
Feodosy Grigorievich Dobzhansky (1900-1975) – cujo
prenome foi mais tarde latinizado para Theodosius – foi um
dos maiores geneticistas de todos os tempos, responsável
pelo desenvolvimento, na primeira metade do século 20,
da Genética Evolutiva, ciência que fundiu as teorias de
hereditariedade do monge Gregor Mendel (1823-1884),
elaboradas a partir de um estudo com ervilhas, com a
Teoria da Evolução, do inglês Charles Dar­win (1809-1882).
Sua presença no Brasil, em 1943, foi fundamental para a
criação da primeira escola científica de Genética e Evolução
do país: seu curso, organizado por André Dreyfus no
auditório da Faculdade de Filo­sofia, Ciências e Letras reuniu
pesquisadores que viriam a formar a recente elite acadêmica nessas duas áreas.
Dobzhansky nasceu na cidade de Nemirov, na Ucrânia, e
naturalizou-se norte-amerciano em 1937. Filho de um professor de matemática, graduou-se em Biologia pela Uni­­
versidade de Kiev, onde foi professor de Zoo­logia até se
mudar para Leningrado (hoje São Petes­burgo) em 1924.
Três anos mais tarde, emigrou para os Estados Unidos, por
não concordar com a interferência política do governo
soviético sobre seus estudos de genética.
Nos Estados Unidos, logo se uniu, em 1928, ao grupo de
pesquisas do renomado zoólogo e geneticista Thomas Hunt
Morgan, na Columbia University, em Nova York, trabalhando com ele até 1936. Nesse ano, tornou-se professor de
Zoologia em Pasadena, onde escreveu sua obra clássica,
Genetics and the Origin of Species (1937).
Em 1940 retornou à Universidade Columbia, onde pro­
pôs uma definição para população em termos de pa­tri­
mônio genético (1950). Trabalhou para a Uni­versidade
Rockefeller (1962-1971) e passou seus últimos anos (19711975) como professor adjunto na Universidade da Cali­
fornia, em Davis.
Autor de mais de 400 trabalhos científicos (papers), em
especial sobre teorias da evolução – inclusive a evolução
humana, que acreditava ser fruto não só da evolução
biológica, mas também de fatores sócio-culturais – e re­ve­
o primeiro e célebre livro de Dobzhansky, Genetics and the
Origin of Species (1937), cujo lançamento causa um
impacto junto à comunidade científica comparável ao provocado pela obra-prima de Darwin, On the Origin of
Species (1859), no século 19. “Com esse livro, Dobzhansky
coloca a Teoria da Evolução e a Genética de Mendel na
crista da onda, com muito sucesso. Muita gente chega a
afirmar na época que o próprio Darwin gostaria de tê-lo
escrito”, testemunha Pavan.
Paralelamente, Dobzhansky também dá um curso de
especialização em Genética de Populações para os integrantes do novo laboratório de Genética da USP: André
Dreyfus, Crodo­waldo Pavan, Rosina de Barros e Antônio
Brito da Cu­nha convivem diariamente com o geneticista
americano durante quatro meses, dando início a diversos
arquivo ib-usp
o mestre dos mestres
renciado pesquisador de laboratório, nunca perdeu o gosto
pelo trabalho de campo: tinha orgulho de ter coletado centenas de espécimes do Alasca à Terra do Fogo e em todos
os continentes, exceto a Antártica.
Publicou outras obras complementares a Genetics and
the Origin of Species, a exemplo de Evolution, Genetics and
Man (1955), The Biological Basis of Human Freedom
(1956), Mankind Evolving (1962) e Genetics of Evolutio­nary
Process (1970).
estudo de moscas do gênero Drosophila (popularmente
co­nhecidas como moscas-das-frutas) existentes no país:
essas moscas são um modelo biológico amplamente empregado nas pesquisas básicas e avançadas de Genética de
Populações até os dias atuais.
Com o estímulo e a visão de futuro de Dreyfus e as
inestimáveis contribuições de Dobzhansky, funda-se aí a
primeira escola científica de Genética e Evolução bra­
sileira, que posteriormente daria origem ao atual Depar­ta­
mento de Citologia, Genética e Evolução do Instituto de
Biociências da USP e começaria a formar toda uma gera­
ção de cientistas res­ponsável pela alto padrão de qualidade hoje alcançado pelos laboratórios brasileiros de pes­
quisa genômica.
11
discípulos
Os geneticistas Crodowaldo Pavan, Antônio Brito da Cunha e
Osvaldo Frota-Pessoa, colaboradores diretos
de André Dreyfus durante anos, relatam como foi o
início da Genética no Brasil e falam da vida, do
trabalho e da personalidade do grande mestre
“Dreyfus era extraordinário, sob todos os aspectos: como professor, como
ser humano, como pesquisador...” “Suas aulas eram absolutamente perfeitas, pois ele era apaixonado pela arte de lecionar.” As frases, declaradas
respectivamente pelos professores Crodowaldo Pavan, 82 anos, e Antônio
Brito da Cunha, 77 anos, dão uma pequena amostra da admiração que
eles, mais o colega Osvaldo Frota-Pessoa, 85 anos – três dos maiores
geneticistas da atualidade –, sempre nutriram pelo mestre André
Dreyfus.
Pavan e Brito da Cunha foram alunos das primeiras turmas do curso de
História Natural da USP, e ambos iniciaram a carreira científica como esta­
giários de Dreyfus, tornando-se assistentes de seu laboratório e, mais
tarde, professores do Instituto de Biociências. Frota-Pessoa formou-se no
Rio de Janeiro, mas também estagiou no laboratório de Dreyfus, durante a
estadia do geneticista Theodosius Dobzhansky no Brasil.
Os três cientistas testemunharam os primórdios da pesquisa científica em
Genética e Evolução no Brasil, participando ativamente dos primeiros
estudos desenvolvidos nessa área, nos laboratórios da Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras da USP, no antigo prédio da alameda Glete.
Eles ajudaram a perpetuar o trabalho iniciado por Dreyfus, transmitindo e
aprimorando seus ensinamentos e formando novas gerações de pesqui­
sadores em Genética Aanimal, Evolutiva e Humana. Hoje, mesmo apo­senta­
dos, continuam na ativa, como livre docentes da USP, colaborando com
estudos essenciais para aprofundar o conhecimento sobre a vida e pa­ra o
Como vocês se interessaram por Biologia e como conheceram André Dreyfus?
A Vida de Louis Pasteur
Filme de 1936, cujo título original é
Story of Louis Pasteur. Dirigido por
William Dieterle e estrelado por Paul
Muni, conta a trajetória do químico
francês Louis Pasteur (1822-1895),
fundador da Microbiologia. Paul Muni –
consagrado pela primeira versão de
Scarface (1932), de Howard Hawks –
ganhou Oscar de melhor ator
por A Vida de Louis Pasteur e foi
indicado em 1937 por outra biografia: A
Vida de Emile Zola (Eu Acuso), também
de Dieterle. Além desses dois filmes,
Dieterle dirigiu ainda Corcunda de
Notre-Dame (1939), baseado na obra de
Victor Hugo; Omar Khayyam (1957),
biografia do poeta persa do século 12; e
Salomé (1953), história bíblica estrelada
por Rita Hayworth.
12
Crodowaldo Pavan – Conheci Dreyfus em 1937, de forma muito interessante. Eu
estava fazendo o “pré” da Escola Politécnica, curso de dois anos, logo após o ginásio. Antes de existir colegial, era assim. O curso era duro, puxado, mas consegui me
sair bem. Queria fazer Engenharia Geológica, pois meu pai, Hen­rique Pavan, era
industrial de porcelana e, na empresa, ele precisava trabalhar com materiais brasileiros, como argila, feldspato e caulim. Mas havia um pro­ble­ma no Brasil: os métodos de extração usados na Europa não funcionavam para esses materiais, e eu
queria estudar novas técnicas.
Eu estava muito animado com o curso, mas quando assisti ao filme sobre a vida do
Pasteur, A Vida de Louis Pasteur, com Paul Muni, fiquei apaixonado pelo trabalho
desse cientista. Uma semana depois de ver o filme, fui a uma palestra do André
Dreyfus na Biblioteca Municipal, na qual ele falava sobre vários temas, inclusive
genética. Dreyfus era um conferencista muito conhecido e suas pales­tras eram
extraordinárias, ficavam cheias de gente.
No fim da palestra, fui conversar com ele. Falei: “quero fazer o que o Pasteur fa­zia”.
Ele perguntou o que eu estava cursando, e contei que estava na Poli­técnica, mas
queria mudar de área. Ele disse que, para fazer o que Pasteur fazia, eu deveria fazer
Medicina. Como fiz uma cara meio atrapalhada e disse que Medicina eu não queria
fazer, ficamos conversando, e o Dreyfus disse: “você tem uma possibilidade de
fazer História Natural, um curso novo da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras,
discípulos
fiéis companheiros
cely
bob pauli-
de jornada
Os geneticisitas Crodowaldo Pavan e Antônio Brito da Cunha, primeiros assistentes de Dreyfus
com uma vantagem: além de Biologia, o curso tam­bém tem Mineralogia,
Petrografia, Geologia e Paleontologia. Se você desistir dessa área, pode voltar para
a Politécnica e continuar a Engenharia”.
Prestei vestibular no mesmo ano, tirei o segundo lugar e comecei o curso em 1938.
Praticamente só havia professores estrangeiros, exceto Dreyfus, que era meu ídolo.
Logo nos primeiros anos, fui estagiário dele, depois me tornei assistente.
Infelizmente tive apenas 11 anos de contato direto com Dreyfus, como seu assistente, porque ele morreu em 1952. Fui contratado como funcionário do
Departamento de Biologia da USP em 1951.
Antônio Brito da Cunha – Comecei a me interessar pela Biologia aos 12 ou 13 anos,
com leitura de dois livros: A Ciência da Vida, dos dois Wells, pai e filho, e do Julian
Huxley, que foi publicado pela José Olympio; e depois “Caçadores de Micróbios”,
do Paul de Kruif, uma biografia dos grandes microbiologistas, em especial Louis
Pasteur.
Fiquei sabendo da existência do curso de História Natural e resolvi fazer. Meu pai,
Antônio Paulo da Cunha, era advogado e estranhou muito a escolha, porque
naquela época a pessoa tinha que ser ou médico ou advogado ou engenheiro.
Então ele foi conversar com o Julio de Mesquita Filho, um dos criadores da USP. O
Julio lhe indicou o professor Paulo Sawaya, da Biologia, o qual lhe recomendou que
me deixasse fazer o curso e, se eu não gostasse, teria tempo de sobra para fazer
outra coisa.
Prestei vestibular, entrei na universidade em 1941, aos 15 anos, e foi aí que co­nheci
Dreyfus, como aluno da História Natural. Depois fui estagiário dele e, quando me
formei, tornei-me assistente do laboratório, trabalhando ao lado do Pavan e da
Rosina de Barros.
A Ciência da Vida
Publicado na Inglaterra em 1929, sob o
título The Science of Life, e em 1941 no
Brasil, foi escrito por H.G. Wells (um dos
maiores escritores de ficção científica de
todos os tempos), seu filho G.P. Wells e
o amigo Julian Huxley, neto do
evolucionista Thomas Huxley, defensor
da Teoria da Evolução de Charles
Darwin. H.G. Wells (1866-1946) publicou
obras memoráveis, como A Ilha de Dr.
Moreau (1895) e Guerra dos Mundos
(1898).
Escritor americano, Paul de Kruif (18901971) atuou como bacteriologista na
Universidade de Michigan de 1912 a 1917,
quando resolveu se dedicar à literatura.
Em Caçadores de Micróbios (Microbe
Hunters, 1926), faz crônicas sobre a
descoberta dos micróbios no século 19,
a partir de personagens fundamentais
para a história da Microbiologia, como
Louis Pasteur, Robert Koch, Emile Roux e
Emile Behring. Escreveu também The
Fight for Life (1938) e Hunger Fighters
(1939).
13
discípulos
Nessa época, ainda não havia o Regime de Tempo Integral para os professores, de
modo que Dreyfus lecionava também na Escola Paulista de Medicina, na Faculdade
de Odontologia, na Escola Livre de Sociologia e Política, além da Faculdade de
Filosofia da USP, onde desenvolvia diversas pesquisas.
O Regime de Tempo Integral só foi criado em 1947, quando o biólogo José Reis era
diretor do Departamento de Administração de Serviços Públicos (Dasp), órgão do
Estado que se ocupava do funcionalismo público. Até então, os professores, para
sobreviver, precisavam dar aulas em diversos lugares, o que dificultava as pesquisas. Com o Tempo Integral, André Dreyfus largou as outras facul­dades e se concentrou apenas na Faculdade de Filosofia da USP, para se dedicar à pesquisa.
Nascido em Angra dos Reis (RJ) em 2 de
julho de 1890, Lauro Travassos formouse pela Faculdade de Medicina do Rio
de Janeiro e trabalhou no Instituto
Manguinhos a maior parte de sua vida.
Iniciou a carreira científica depois de
participar da campanha de combate à
febre amarela no Rio de Janeiro e em
Belém (PA). Tornou-se estagiário no
Laboratório de Helmintologia de
Manguinhos, sob a orientação de
Gomes de Faria, com quem publicou,
em 1913, uma monografia sobre
ancilostomídeos, parasitas do intestino
humano, causadores da ancilostomíase,
verminose popularmante conhecida por
“amarelão”. Em 1915 acompanhou os
trabalhos da Fundação Rockefeller, em
Minas Gerais, relativos ao controle
dessa doença. Em 1926, tornou-se
professor catedrático de Parasitologia
da Faculdade de Medicina
de São Paulo e, na década de 1930,
da Universidade Federal Rural do Rio
de Janeiro. Faleceu aos 80 anos.
Osvaldo Frota-Pessoa ­– Tive a oportunidade de conhecer Dreyfus em 1943, com a
vinda do Dobzhanshy ao Brasil. O primeiro trabalho que eles realizaram juntos,
com a participação do Pavan, foi um levantamento das espécies de Droso­phila
existentes no Brasil, identificando as espécies já conhecidas e classificando as que
eles iam descobrindo, por meio da Sistemática. Eles descobriram várias espécies
novas.
Esse episódio explica porque acabei vindo para São Paulo. Eu havia terminado os
cursos de Biologia, em 1938, e de Medicina, em 1941, na Universidade do Distrito
Federal, no Rio de Janeiro. O Dreyfus era amigo dos pesquisadores de Manguinhos,
entre eles o Lauro Travassos, professor de Zoolo­gia, que ajudou o grupo do Dreyfus
e do Dobzhansky na classificação de Drosophila. Eles fizeram uma chave de classificação para identificação das espécies e, então, queriam pessoas não pertencentes
ao grupo para verificar se aquela chave funcionava bem. O Travassos, então, indicou o meu nome e do meu colega Luiz Emydio de Mello Filho (mais tarde professor
de Botânica da Universidade Federal do Rio de Janeiro), porque já trabalhávamos
com Sistemática de insetos no Rio de Janeiro. Viemos para São Paulo e passamos
quinze dias no prédio da USP na alameda Glete, trabalhando no laboratório do
Dreyfus, com ele, Dobzhansky e Pavan.
Como eram as aulas do Dreyfus no curso de História Natural da USP?
Pavan – Ele era extraordinário, sob todos os aspectos: como professor, como ser
humano, como pesquisador...
Brito da Cunha – Dreyfus era um professor fantástico e suas aulas, absolutamente
perfeitas: estive em muitos lugares e nunca vi um professor tão bom. Ele tinha
muito conhecimento e era capaz de expor os problemas com uma clareza fantástica. Nas aulas de Histologia, por exemplo, ele não só dava anatomia micros­cópica
dos tecidos, mas também explicava o funcionamento do órgão e sua ori­gem embrionária. Ou seja, dava uma visão completa do órgão, expondo tudo com uma facilidade impressionante. Nunca deu uma aula sequer sem se preparar antes, marcando trechos dos livros e separando ilustrações para projetar. Foi o melhor professor que tive, um professor apaixonado pela arte de lecionar.
Como se deu a criação do primeiro grupo de pesquisas em Genética?
Pavan – Ironicamente, o Brasil teve sorte com uma desgraça mundial, a Segunda
Guerra. A Fundação Rockefeller, por causa da guerra, não podia dar auxílio para a
Ásia, para a África e muito menos para a Europa, então decidiram ajudar a América
Latina. Em 1942, veio ao Brasil um representante da Fundação, Harry Miller Jr, diretor de Ciências Biológicas do órgão, e pude acompanhar de perto os primeiros
contatos dele com Dreyfus. Recém-formado, eu trabalhava como assistente de
Dreyfus e participei de dois almoços com o Miller, realizados no Automóvel Clube
de São Paulo, na rua Formosa, do qual Dreyfus era sócio.
Lá, o Miller explicou que a Rockefeller estava disposta a ajudar o Departamento de
Biologia da USP, e o primeiro passo era uma bolsa para que o Dreyfus fosse para os
Estados Unidos, para uma temporada de um ano em laboratórios de seu interesse,
tudo bancado pela Fundação. Dreyfus ficou animado, e eu muito mais, pois pensei:
“o Dreyfus vai agora e, depois, quem vai sou eu”.
No dia seguinte, porém, o Dreyfus chega ao laboratório e diz: “um ano é muita
coisa, não dá para passar tanto tempo fora, isso não vai dar certo”. Como ele era
solteiro, tentamos todo jeito demovê-lo dessa idéia, dizendo que essa viagem seria
importante para ele e para o laboratório.
Nesse dia, o Miller havia ido à Argentina e, na volta, fizemos um novo almoço no
14
discípulos
Automóvel Clube para que o Dreyfus desse sua resposta. O Miller quis saber o
porquê da recusa, e ele respondeu: “O Pavan, que está aqui, e a Rosina, minha
primeira-assistente, são muito jovens, e eles não podem tomar conta do la­bo­
ratório durante um ano. Um semestre a gente pode ajeitar, mas um ano não dá”.
O Miller fez uma série de considerações e disse: “Vamos fazer o seguinte: tem um
americano, na verdade um russo naturalizado americano, que está interessado em
vir para a América Central, para ver a mata amazônica. Se vocês facilita­rem a vida
dele na Amazônia, talvez eu consiga que ele venha para cá por seis meses”. O
Dreyfus disse: “Isso é ótimo. Muito bem: quem é esse russo?”. O Miller respondeu,
para surpresa do Dreyfus: “É o Theodosius Dobzhansky”.
arquivo ib-
Nós tínhamos acabado de dar um curso sobre o livro que ele havia publicado,
Genetic and the Origin of Species, uma das obras mais célebres e polêmicas da
época. Então o Dreyfus disse ao Miller: “Se você mandar o Dobzhan­shy para cá, eu
não preciso ir para os Estados Unidos”.
Ficou combinado as­sim: o Dobshansky
viria passar seis meses no Brasil, depois
o Dreyfus passaria uma temporada nos
Estados Uni­dos. No ano seguinte, 1943,
o Dobz­hansky chegou ao Brasil, dando
início à pesquisa em Genética e
Evolução.
Frota-Pessoa – Antes da vinda do Dobz­
hansky, não existia pesquisa genética
no Bra­sil. O Dreyfus conhecia o as­sunto
so­mente com base nos livros. Mesmo
assim, ele já havia inaugurado o
Departamento de Biologia da USP
dando ênfase à Genética. Tenho a
im­pressão de que a Genética era,
naquele tem­po, como a Biologia
Molecular é hoje: fica todo mundo
assanhado com as novas possibilidades.
A Genética foi criada em 1900, com a
redescoberta dos trabalhos de Mendel,
mas as pesquisas propriamente ditas só
co­meçaram a deslanchar no início dos
anos 1940. O Dobzhansky era um líder
internacional na área, de modo que o
Brasil reuniu o que havia de melhor –
Dreyfus e Dobzhansky – no momento
certo, para o estabelecimento da
primeira escola de Ge­nética e Evolu­ção,
com estudos de moscas de gênero
Drosophila.
Dreyfus já fazia algum estudo em
Ge­nética antes da vinda do
Dobzhansky?
Brito da Cunha – Sim. Em 1937, por
exemplo, publicou um trabalho sobre o
verme parasita Rhabdias fulleborni,
intitulado “Contribuição para o estudo
do cyclo chromosomico e da determinação do sexo de Rhabdias fulleborni”.
Mas, embora Dreyfus tenha sido “o pai
da Genética Animal” no Brasil, cri­ando
uma escola científica da área, seu trabalho acadêmico mais im­por­tante não
foi em Genética: foi com uma vespa
chamada Telenomus fariae, que parasita o ovo do barbeiro transmissor da
Dreyfus “em família”
A foto foi tirada em 5 de julho de 1947, na porta de uma das salas do
laboratório de Dreyfus, na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP.
O laboratório era praticamente a segunda casa de Dreyfus, e seus
colaboradores, como membros da “família”. Na primeira fila, da esquerda
para a direita, encontram-se a bibliotecária Cândida Paula Souza, André
Dreyfus, Ruth Morretes (hoje dona-de-casa, casada com Bussamara Neme,
professor de Obstetrícia da Faculdade de Medicina da USP) e o chileno Juan
Nacruz. Na fila de trás, estão Gualberto Nogueira (estagiário de Dreyfus,
tornou-se dentista), Henrique Serafim de Oliveira (assistente), Anita Schrel
(secretária, casou-se com o cientista Hans Burla), Crodowaldo Pavan, Marta
Breuer e Newton Freire-Maia.
15
discípulos
Doença de Chagas e, por is­so, tinha grande interesse
para a Me­dicina e a Saúde Pública. Dreyfus descobriu
coisas muito interessantes sobre essa ves­pa: por exemplo, que a fecundação das fêmeas pelo macho é feita
ainda dentro do ovo do barbeiro, de modo que, quando a vespinha sai do ovo do barbeiro – que morre –,
ela já sai fecundada. Esse trabalho foi desenvolvido
junto com a assistente Marta Breuer.
1
2
3
A Drosophila, popularmente conhecida
como mosca-das-frutas ou mosca-dovinagre, ou ainda como “fruit fly”, no
meio acadêmico internacional, é um
modelo biológico amplamente utilizado
para análises genéticas. A espécie D.
melanogaster (acima, ilustraçao 1) é a
mais utilizada, mas as brasileiras D.
milleri (2) e D willistoni (3) se mostraram
bons modelos para os estudos de
variabilidade genética propostos por
Dobzhansky e estudados pela equipe de
Dreyfus.
Há várias vantagens na utilização de
Drosophila nesse tipo de estudo: uma
delas é a rapidez na reprodução da
espécie. Exemplo: cruzando indivíduos
que diferem em características
facilmente visíveis (como o tamanho das
asas e a cor dos olhos ou do corpo) e
estendendo essa análise até a geração
dos netos (chamada geração F2), é
possível determinar, ao
final de apenas um mês, quantos genes
estão envolvidos, quais são os genes
dominantes e os recessivos e se o
padrão de herança está, ou não, ligado
ao sexo. A Drosophila é intensivamente
pesquisada há cerca de um século, e seu
genoma foi completamente
seqüenciado no ano 2000.
Pavan – Esse foi um trabalho extraordinario, com
re­percussão internacional. A Marta era uma pessoa
in­teressantíssima: havia sido membro da Escola Bau­
haus e mulher do Marcel Breuer, o arquiteto mais
famoso dessa escola. Infelizmente, vários trabalhos do
Dreyfus se perderam na biblioteca do Instituto de
Biologia da USP, acho que inclusive esse. Certa vez,
uma bibliotecária resolveu jogar fora uma porção de
trabalhos “velhos”. O material ficou jogado no corredor
do Instituto, quando o Brito da Cunha soube e foi lá
fazer um escândalo, mas já tinham levado muita coisa,
muitos trabalhos do Dreyfus.
Que trabalhos Dreyfus desenvolveu junto com Dobzhansky?
Frota-Pessoa – Dobzhansky dedicava-se à Genética de Populações, ciência que une
aspectos da Genética com a Teoria da Evolução. Para se estudar um animal ou uma
planta por essa ciência, é preciso estudar a variabilidade da espécie, ou seja, como
os genes de indivíduos da mesma espécie variam em diferentes lo­cais. Dobzhansky
havia trabalhado com moscas Drosophila nos Estados Unidos, primeiro na
Califórnia, depois ao longo das regiões montanhosas: estudava as diferenças genéticas que a espécie ia apresentando, e as relacionava com o me­canismo de
evolução. O convite para visitar o Brasil veio a calhar para esse estudo, pois ele
poderia avaliar a variabilidade genética de Drosophila da América do Sul. Já havia
um estudo prévio de Sistemática de Drosophila da América do Sul, feita por um
cientista alemão, e essa bibliografia era um bom começo para ajudá-lo a identificar
as espécies brasileiras.
Brito da Cunha – Com a chegada do Dobzhansky e a decisão de estudarmos
Drosophila, o primeiro passo foi a descrição de dezenas de espécies dessa mosca
no Brasil e, então, a seleção das que potencialmente tinham mais interesse para os
estudos de evolução. Drosophila willistone foi a mais estudada: eu e o Pavan
começamos com estudos de variabilidade genética e, mais tarde, de variabilidade
cromossômica. O Pavan estudava a parte genética e eu, a citológica, e fizemos
descobertas interessantes. Descrevemos também novas espécies, como D. miller e
D. dreyfusi, batizadas em homenagem a Harry Miller e a Dreyfus.
Paralelamente, o Pavan também estava desenvolvendo sua tese de doutoramento,
sobre evolução dos bagres cegos, sob a orientação do Dreyfus. Antes de sua pes­
quisa, pu­bli­cada em 1945, os bagres cegos eram descritos como sendo de gêne­ros
dife­ren­tes do bagre comum. Pavan mostrou que o bagre cego nada mais é do que
o resultado de uma mutação do bagre comum: eles sobrevivem em rios de cavernas, onde a visão não é necessária, sendo naturalmente selecionados pe­lo pro­
cesso evolutivo.
O Dobzhansky veio uma segunda vez ao Brasil...
Pavan – Sim, mas antes disso o Dreyfus foi para os Estados Unidos, onde atuou no
laboratório do Dobzhansky, em Nova York, na Universidade Columbia.
Brito da Cunha – O Dobzhansky voltou ao Brasil entre 1948 e 1949. Ficou aqui por
um ano, dirigindo pesquisas sobre populações naturais de Drosophila. Pes­
quisadores de vários lugares do Brasil vieram para a USP nessa ocasião, para apren­
der com o Dobzhansky, todos com bolsa da Rockefeller: o Cordeiro, do Rio Grande
do Sul, o Hans Burla (da Suíça, mas que atuou também no Brasil), a Sha­na
Malagovkin e o Lagden Cavalcanti, da UFRJ, além de Newton Freire-Maia, que
acabou se dedicando mais à Genética Humana, montando um laboratório em
Curitiba, com grande produção científica nessa área. No prédio da alameda Glete,
as condições físicas eram precárias: não cabia mais gente nos laboratórios. A
16
discípulos
Biologia ocupava até o sótão do prédio, que havia sido moradia dos empregados
do industrial Jorge Street. Então, para receber o Dobzhansky dessa vez, eu e o
Pavan conseguimos verba para escavar o porão, montando um laboratório lá, para
que o Dobzhansky pudesse trabalhar com tanta gente.
Frota-Pessoa – Eu estava no Rio de Janeiro nessa época e visitei o Dobzhansky em
São Paulo, mas não fiquei trabalhando com o grupo. Quando ele voltou para os
Estados Unidos, daí começou uma série de viagens de pesquisadores bra­sileiros
para lá, todos com bolsa da Fundação Rockefeller: Pavan (1945-46), Brito da Cunha
(1949-51), Lagden Cavalcanti e muitos outros tiveram essa oportunidade. Eu fui em
1953, após a morte de Dreyfus, e fiquei um ano e meio no laboratório do
Dobzhansky, ainda trabalhando com Drosophila.
Brito da Cunha – A Fundação Rockefeller também financiou a montagem dos laboratórios desses pesquisadores. Uma das exigências que ela fazia aos laboratórios
em que aplicava recursos era a de que os professores deveriam traba­lhar em
Regime de Tempo Integral, para que pudessem se dedicar à pesquisa. Antes disso,
só a USP tinha o Tempo Integral e, diante dessa exigência, os Estados do Paraná,
Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro passaram a adotar esse regime, o que foi um
ganho para a ciência.
Dreyfus também foi um dos primeiros pesquisadores a defender a importância da
divulgação científica. Qual foi sua contribuição nessa área?
Pavan – Quem conviveu com o Dreyfus sabe que ele foi um dos mais extraordinários divulgadores da ciência no Brasil. E fez mais: como diz o Frota-Pessoa, Dreyfus
divulgou a divulgação da ciência. Ele não perdia um oportunidade de divulgar o que
sabia. De vez em quando, ia engraxar os sapatos só para conversar com o engraxate: contava as coisas mais incríveis do mundo, inclusive teorias de Genética, de
uma forma que o sujeito entendia. Quando tinha uma novidade qualquer, contava
pro ascensorista, dava uma aula para os garçons dos restaurantes que freqüentava,
e todo mundo o admirava muito.
José Reis
Cientista e jornalista, José Reis (foto) foi
o grande mestre da divulgação científica
no Brasil. Nascido em 12 de junho de
1907, cursou a Faculdade Nacional de
Medicina, no Rio de Janeiro, de 1925
a 1930, onde conheceu André Dreyfus,
tornando-se seu amigo. Em 1929, foi
contratado como bacteriologista do
Instituto Biológico. Fez estágio no
Instituto Rockefeller, nos Estados
Unidos, entre 1935 e 1936. A partir de
1943, dirigiu o Departamento de
Administração do Serviço Público do
Estado de São Paulo (Dasp). Em 7 de
abril de 1947, iniciou o trabalho de
divulgação científica na Folha da Noite e
na Folha de S.Paulo. Em 1948,
participou da fundação da Sociedade
Brasileira para o Progresso da Ciência
(SBPC). Aposentou-se do Instituto
Biológico em 1958 e, no mesmo ano,
fundou a Editora Ibrasa, que funcionou
até 1978. De 1962 a 1967, atuou como
diretor de redação da Folha de S.Paulo.
Recebeu o Prêmio Kalinga, da Unesco,
em 1975 e, três anos mais tarde, o CNPq
instituiu no Brasil o Prêmio José Reis de
Divulgação Científica. Em 1992, a Escola
de Comuni­cações e Artes da USP criou o
Núcleo José Reis de Divulgação
Científica. Escreveu a coluna
“Periscópio”, na Folha, até sua morte,
em 16 de maio de 2002.
O que ele gostava mesmo era de dar aulas e fazer palestras. Era convidado para
falar em todo canto do país, e estava sempre à disposição. Essa também é uma
forma de divulgação científica, em que o cientista se expõe ao grande público.
Dreyfus era capaz tanto de fazer uma palestra especializada, como fazia no Ins­
tituto Biológico e na própria Faculdade de Filosofia, quanto uma palestra popu­lar,
em linguagem para leigos. Um exemplo é que ele era apaixonado pela Psicanálise,
e dava belas aulas sobre o assunto, discutindo as idéias de Freud com maestria,
mesmo sem nunca ter a intenção de atuar na área. Era fantástico: sua vocação
natural era explicar as coisas, transmitir conhecimentos.
Na imprensa, ele fazia muitos artigos para a Revista Anhembi, entre outras pu­bli­
cações de divulgação científica, mas não teve oportunidade de escrever regu­
larmente para a grande imprensa – o que começou efetivamente com José Reis. No
primeiro número dessa revista, em 1951, ele escreveu um belo artigo chamado
“Amas de Sangue”, no qual discorreu, pela primeira vez na história da ciência
brasileira, sobre a possibilidade das barrigas de aluguel.
Frota-Pessoa – Dreyfus escreveu para dois grandes jornais nas décadas de 30 e 40:
em 1938, publicou o primeiro artigo de divulgação científica do país em um jornal
popular: “Por que os filhos se parecem com os pais”, no Jornal do Brasil, em uma
coluna chamada “A Ciência em Marcha”. Em 1948 e 1949, publicou diversos textos
no jornal A Manhã , que contava com um suplemento chamado “Ciência para
Todos”, no qual vários pesquisadores publicavam artigos sobre assuntos diversos.
Professor Frota-Pessoa, sua especialidade hoje é a Genética Médica. Esse inte­resse
surgiu na época em que trabalhou com Dreyfus?
Frota-Pessoa – Não, foi depois de sua morte. Mas, sem dúvida, sem a base apreendida com o Dreyfus, eu não teria me interessado pela Genética humana. Quando
voltei dos Estados Unidos para o Rio, aparentemente iria continuar a trabalhar com
Drosophila. Mas com o início das pesquisas sobre cromossomos humanos, junto
com o Paulo Henrique Saldanha, na USP, acabei me voltando para a Genética
Médica. Estudamos doenças causadas pela falta, pelo excesso ou por alterações
nos cromossomos, como a Síndrome de Down e a Doença do X Frágil, descrita por
mim e que hoje continua sendo estudada na USP.
Genética Médica
Atualmente, há quatro laboratórios
importantes de Genética humana no
Instituto de Biociências da USP: os
grupos coordenados por Ângela
Morganti (Doença do X Frágil e
Síndrome de Down), Ruth Novinsky
(hemofilias), Paulo Otto (genética de
populações humanas) e Mayana Zatz
(distrofias musculares e Projeto Genoma
do Câncer) – este ligado à Rede ONSA,
que reúne centenas de laboratórios de
pesquisa brasileiros ligados ao Projeto
Genoma. O Projeto Genoma do Câncer
no Brasil é fruto de convênio assinado
em 1999 entre o Instituto Ludwig de
Pesquisa sobre o Câncer e a Fundação
de Amparo à Pesquisa do Estado de São
Paulo (Fapesp), que destinaram até
agora uma verba de US$ 20 milhões
para 39 laboratórios, com o objetivo de
seqüenciar genes de tumores de grande
interesse científico e alta incidência no
Brasil.
17
arquivo ib-usp
memória
turma da glete
A Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP formou alguns dos maiores cientistas
brasileiros das áreas de Biologia e Geologia, que em sua maioria acabaram se tornando
professores dos Institutos de Biociências, Biomédicas e Geociências. Muitos desses
foram alunos de André Dreyfus. Em 1948, professores e alunos que saíam de uma aula
especial no prédio da alameda Glete posaram para a foto acima – um dos raros
registros dos integrantes das primeiras turmas do curso de História Natural.
Sentados, da esquerda para a direita:
Reinaldo Saldanha da Gama (professor de Mineralogia, um
dos primeiros a pesquisar o urânio no Brasil);
Ettore Onorato (1899-1971, professor de Paleontologia
e Petrografia, famoso na Itália); Félix Rawitcher (botânico,
principal responsável pelos estudos de uso agrícola do
Cerrado); Eveline Du Bois Reymond (esposa do Ernst Marcus
e sua assistente); Ernst Marcus (professor de Zoologia);
André Dreyfus (Chefe do Departamento
de Biologia), e Paulo Sawaya (professor de Fisiologia).
De pé, na primeira fila:
José Camargo Mendes (assistente do professor Otaviano De
Fiori); Michel Pedro Sawaya (assistente de Ernst Marcus);
Rosina de Barros (assistente de Dreyfus);
18
técnica do laboratório de Marcus, nome não-identificado;
Gilda Correia (mais tarde Gilda Fleury); Mercedes Rachid
(assistente de Marcus); Raquel Melo Teixeira; Maria Helena
Matoso; Diva Diniz Correia (assistente de Marcus); Erasmo
Garcia Mendes (estagiário da área de Fisiologia Animal, falecido em 2001), e Mário Guimarães Ferri
(trabalhou com Rawitcher nas pesquisas sobre Cerrado; foi
reitor da USP e faleceu em 1985).
De pé, na segunda fila:
João Queiroz Marques; Crodowaldo Pavan (assistente
de Dreyfus); Ruy Ribeiro Franco (assistente de Ettore
Onorato); Domingos Valente (assistente de Paulo Sawaya;
fundador do Centro de Biologia Marinha da USP); Alexandre
Dias de Moraes, e Nelson Barros.
herança
sonho derradeiro
Dreyfus economizou cada centavo nos últimos anos de sua vida para
criar um prêmio de genética: incentivo à produção científica
bob pauli-
Há 50 anos, em 16 de fevereiro de
1952, a ciência brasileira perdia um de
seus maiores entusiastas, com a morte
de André Dreyfus. Vítima de hi­pertensão
arterial, ele começou a sen­tir as conseqüências da doença a partir de 1946.
“Dreyfus era médico, portanto sabia o
que estava havendo com ele nos últimos anos”, lembra An­tonio Brito da
Cunha. O pri­meiro golpe veio em 1949,
quando teve he­morragias na retina,
que lhe rouba­ram parte da visão.
Problemas cardíacos também passaram
a se manifestar.
Mesmo diante das complicações de
saúde, Dreyfus não parou de lecio­nar
e de preparar suas aulas com a mesma
dedicação de sempre. “Com dificuldades para enxergar, teve de restringir as pesquisas, mas nunca se afastou
da Faculdade”, conta Brito. Devia fazer
repousos ao longo do dia e, para isso,
colocou um sofá-cama em sua sala,
mas só descansava no in­ter­valo para
al­moço, entre 12h30 e 14 horas,
quando retomava suas ati­vidades de
rotina.
Cabeça de Dreyfus esculpida
pelo amigo Bruno Giorgi
Consciente de que não teria muito
tempo, ainda empreendeu grande
es­forço para deixar um novo legado à
pesquisa genética. “Percebendo que as
coisas marchavam mal, decidiu fazer
um fundo para criar um prêmio de
genética, e isso virou obsessão. Jun­tou
todas suas economias e, com sa­cri­fício
danado, passou a economizar cada
centavo para deixar esse prê­mio”, conta
Crodowaldo Pavan.
Até então, Dreyfus nunca havia li­ga­
do para dinheiro. “Ele ajudava todo
mundo, pagava chope para os amigos,
dava dinheiro para os pobres”, diz.
“Todos os sábados, nos reuníamos na
Cantina Capri, um restaurante que
ha­via na Santa Ifigênia, ele convidava
cientistas amigos e pagava a conta”,
completa Brito da Cunha.
A partir da idéia do prêmio, a rotina
mudou. “Ele, que sempre gostou de ir a
bons res­taurantes, mal comia, e não
tinha jeito de demovê-lo dessa
maluquice”, diz Pavan. “Não trocava
nem o óleo do carro, para não gastar.
De vez em quando ia viajar, eu o leva­va
até o aeroporto e voltava com o carro
dele, daí trocava o óleo e não dizia
nada. Depois ele vinha e queria me
pagar, mas eu dizia que não havia feito
nada. Ele estava numa situa­ção...”, relata Pavan, emocionado.
Devorado pela inflação
Dreyfus conseguiu juntar 1 milhão de
cruzeiros, uma fortuna para a época.
“Em seu testamento, indicou uma
comissão para tratar do prêmio, e esse
grupo não soube defender o ca­pital
que ele deixou contra a in­fla­ção”, diz
Brito. O país vivia um período de escalada inflacionária, e a taxa anual pulou
de 11%, em 1950, para 21% em 1952.
O Prêmio André Dreyfus foi concedido apenas duas vezes. O primeiro foi
recebido pelo cientista Hans Kalmus,
em 1953. O segundo foi oferecido pa­ra
o geneticista Warwick Kerr, da Es­cola
Superior de Agricultura Luiz de Queirós
(Esalq/USP), em 1954.
Warwick Estevam Kerr
Nascido em 1926 em Santana do
Parnaíba (SP), Warwick Kerr é doutor
em Genética pela Esalq/USP, uma das
autoridades mundiais em genética de
abelhas e o primeiro cientista brasileiro
eleito na Academia de Ciências dos
Estados Unidos. Foi professor da UnespRio Claro e da Universidade Federal de
Uberlândia (UFU), diretor científico da
Fapesp (1962-4), criador do
Departamento de Genética da
Faculdade de Medicina da USP de
Ribeirão Preto (1964) e diretor do
Instituto
Nacio­nal de
Pesquisas da
Amazônia (INPA).
Nos anos 60 e 70,
foi preso duas
vezes por protes­
tar contra
a persegui­ção de
colegas cientistas
e a violação dos
direitos humanos
pelos militares.
Hans Kalmus
Nascido em Praga, em família de origem
germânica, Hans Kalmus (1906-1989) se
exilou na Inglaterra durante a Segunda
Guerra Mundial. Em 1940, tornou-se
assistente de John Burdon Sanderson
Haldane (criador, junto com Aleksandr
Oparin, da teoria vigente para a origem
da vida) na Universidade College de
Londres, onde permaneceu até sua
aposentadoria, em 1973. Fez diversas
excursões científicas a países como o
Brasil, a Índia, a Argentina e a Nigéria
e, entre 1949 e 1950, foi professor
da Universidade McGill, em Montreal,
Canadá. Em 1945, publicou importante
estudo, fazendo a correlação entre o
olfato e o vôo dos insetos. Cinco anos
mais tarde, publicou o artigo “Aspectos
Cibernéticos da Genética”, fazendo uma
interessante correlação entre o gene
e a informação. Contudo, seu tema de
pesquisa favorito, desde que se
interessou pela genética, em 1923,
foram os grupos sangüíneos. Publicou o
livro “Odyssey of
a Scientist: An Autobiography” em 1991.
19
circuito intelectual
paixão
pela arte
bob paulino
O pintor
Mario Zanini
(1907-1971).
cely carmo
Acima, Casas na Praia, pintura
de Alfredo Volpi (1896-1988)
de 1952. Junto com Zanini,
Volpi foi um dos membros do
Grupo Santa Helena, composto por artistas de origem proletária que representavam a
ala
moderada do Modernismo
paulista. O grupo foi o
embrião da chamada Família
de Artistas Paulistas, dos anos
1940. Abaixo, frente e verso
da tela de Pancetti resgatada
por Pavan no depósito da
Biologia, quando o departamento é transferido da
alameda Glete para a Cidade
Universitária.
20
A extremada dedicação de André
Dreyfus ao trabalho e à ciência não
impedia que ele se entregasse com a
mesma paixão a outros interesses. o
cientista foi um amante das artes e da
música e, também nessa área, gostava
de passar seus conhecimentos para
todos que o cercavam. “Gostava mui­to
de música e pintura, e fazia de tudo
para que nós também aprendêssemos
arte”, conta Crodowaldo Pavan.
Nos anos 40 e 50, Dreyfus convive
com alguns dos maiores nomes das
artes plásticas nacional, como José
Pancetti, Mario Zanini, os italianos
Alfredo Volpi e Ernesto De Fiori e o
escultor Bruno Giorgi. Reúnem-se com
freqüência no apartamento de Dreyfus,
uma cobertura alugada no Prédio
Guajara, situada à rua Bri­ga­deiro Tobias,
55, com uma bela vista para o Vale do
Anhangabaú e o Via­duto Santa Ifigênia,
no centro de São Paulo. O grupo passa
tardes e noites discutindo arte, política
e ciência.
Nesse apartamento – hoje va­­zio –
há uma cúpula, e é nesse local privilegiado pela luz que Dreyfus instala sua
rica coleção de pinturas e esculturas,
“inclusive a cabeça feita por Giorgi, que
agora encontra-se no cor­redor do
Instituto de Biociências, no prédio Harry
Miller”, diz Antônio Bri­to da Cunha.
Os artistas nutrem grande admiração por Dreyfus, que exibe uma cultura
geral e um conhecimento de artes dignos de bons especialistas. “O Pan­cetti
costumava deixar alguns de seus
quadros no apartamento de Dreyfus
por um tempo, para depois vendê-los.
Ele dizia que essas telas seriam bem
vendidas, pois contavam com o ‘pedigree’ de ter pertencido à Dreyfus, figura
respeitada pela elite intelectual de São
Paulo”, lembra Pavan.
Pavan guarda duas lembranças des­
se tempo. Ao defender sua tese de
doutorado, em 1945, recebe de presente do mestre uma paisagem de
An­tônio Parreiras (1860-1937), que até
circuito intelectual
bob paulino
Apartamento de Dreyfus, no centro
de São Paulo, era ponto de encontro de
artistas de renome no cenário paulista,
que se reuniam para falar
de arte, ciência, música e política
Acima, Esfinge, obra
de Bruno Giorgi
(1905-1993). À
esquerda, caricatura
do escultor nascido
em Mococa, no
interior de São
Paulo.
Na página ao lado e acima, o Prédio Guajara, na rua
Brigadeiro Tobias, 155, visto a partir do Viaduto Santa
Ifigênia. É na cobertura com a cúpula, alugada, que
Dreyfus reside durante todo o tempo em que vive em
São Paulo,
de 1933 até sua morte, em 1952. A cúpula abrigava sua
coleção de arte e de discos de compositores clássicos.
hoje fica exposto em sua casa, no
Butantã, ao lado de um quadro de
Pancetti, com paisagem em um lado da
tela e, no verso, um retrato inaca­bado.
“Encon­trei esse quadro jogado no
depósito do laboratório da Biolo­gia, e
acabei trazendo para minha coleção”,
diz.
Na música, a predileção de Drey­fus
é pelos clássicos, gênero predomi­nante
em sua coleção de bolachas de 78 rotações. “Ele amava os três bês: Bach,
Beethoven e Brahms. Ia a concertos no
Teatro Municipal, sabia os movimentos, conhecia os libretos e da­va verdadeiras aulas de música pa­ra mim e o
Brito da Cunha”, finaliza.
Auto-retratos
de José Pancetti
(1903-1958),
acima e à esquerda.
No alto, Praça
Clóvis Bevilácqua,
quadro de 1949.
21
testemunha ocular
dreyfus por
dobzhansky
André Dreyfus recebeu uma homenagem póstuma na Biblioteca
Municipal de São Paulo em 1952, promovida por iniciativa
da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
Theodosius Dobzhansky foi um dos cientistas que participaram da
cerimônia. A seguir, a transcrição de parte de seu discurso:
“O professor Dreyfus era um ativo pesquisador no campo
entes é a mais promissora, para seu tempo e para seu
da Biologia Geral. A lista de seus trabalhos de pesquisa
trabalho. Dreyfus conseguiu tal decisão e o mínimo que
impressiona pela extensão. Todavia, a pesquisa biológica
se poderia dizer é que ela foi sustentada por, e esteve de
cons­titui uma só parte – e a parte relativamente menos
acordo com o que havia de mais progressivo.
importante – da contribuição de Dreyfus ao progresso da
Alguns cientistas preferem trabalhar sós. Sentem-se
ciência biológica. O trabalho mais importante deixado por
mais felizes quando podem se fechar em seus laboratóriDreyfus não foi pu­blicação alguma, foi a ativa escola de
os e gastar todo o tempo e energia em seu trabalho prepesquisa biológica que criou e o Departamento de Biologia
dileto. Outros desejam não só transmitir seus conheciGeral da Universidade de São Paulo por ele organizado.
mentos a outrem, mas preferem desenvolver um trabalho
A magnitude dos feitos do professor Dreyfus só pode
cria­dor ­– não como indivíduos, mas como membros de
ser aprecia­da com a lembrança de que ele era em grande
um grupo.
parte um autodidata em biologia. Sua formação não era a
Tais cientistas tendem a atrair colabora­dores e a se
de um biologista, mas a de um médico.
tornar fundadores de escolas. Uma escola
Era muito justamente orgulhoso de ter,
científica, se baseada em uma idéia imporDreyfus detes­tava tante
por si mesmo, desenvolvido seu interesse
e viável, pode durar por muito
em biologia, sobrepujando as muitas difi- estar só ou trabalhar tempo após o desaparecimento de seu
culdades de iniciação nesse campo. Mais
fundador. Na verdade, os feitos mais
isolado; sentia-se importantes de uma escola científica
tarde, Dreyfus visitou vários laboratórios
bioló­gicos na França e, em 1944, nos
podem apa­recer uma geração depois de
mais
Estados Unidos. No entanto, não permansua fundação.
eceu por tem­po suficiente longo em nenDreyfus definitivamente detestava
feliz como
hum desses laboratórios para deles se
estar só ou trabalhar isolado; sentia-se
tornar um membro ou adquirir as
mem­­bro de uma mais feliz co­mo membro de uma coletivitradições das escolas bio­lógicas desses
dade. Reuniu ao redor de si um grupo de
coletividade
países.
pesquisadores que se tornou a escola
Sua filosofia científica e, especialbrasileira de Biologia e Genética e que
mente, sua filosofia biológica, foram desenvolvidas por
adquiriu repu­tação e reconhecimento mundial. Eu disse
ele mesmo e em completa independência. Em vista disso,
propositadamente que Dreyfus reu­niu um grupo de
o mais notável é que os pontos de vista científicos de
colaboradores, não um gru­po de alunos. Isso porque
Dreyfus fossem completamente livres de qualquer coisa
Dreyfus não era desses professores que usam os alu­nos
que pudesse ser chamada de provincialismo. Até os últiem seu próprio trabalho, como instrumento altamente
mos anos de sua vida manteve-se bem informado das
eficiente. Ele era a escola, e essa foi a razão de ter sido
pesquisas biológicas em andamento no mundo científibem sucedido. O trabalho de uma escola é fruto da comco.
binação harmoniosa dos esforços criadores de vários
Ainda mais notável, seu julgamento de importância
cien­tistas, e não o de um único cientista ajudado por
relativa dos diferentes tipos de pesquisa biológica era
vários auxiliares sem personalidade própria.
admiravelmente agudo e perspicaz. Seus julgamentos
O trabalho inicial de Dreyfus sobre citologia comparaeram muitas vezes expressos com um grau de veemência
da de vermes, de mamíferos e de himenópteros colocou-o
que poderia, talvez, ser considerado excessivo. De
face a face com os problemas da genética de populações
qualquer forma, é o futuro que deve dar a decisão final a
e da evo­lução. Ele viu claramente que o comportamento
respeito dos méritos re­lativos das diferentes correntes do
dos cro­mossomos só pode ser compreendido na base da
pensamento científico em um determinado tempo.
função que desempenham nos processos evolutivos.
Todavia, nada é mais importante para um cientista
Os cromossomos existem não para a distração dos
criador do que decidir por si mesmo qual dessas corrcitologistas: o comportamento deles é uma parte da
22
arquivo ib-usp
testemunha ocular
André Dreyfus e Theodosius Dobzhansky em foto de 1943, no Departamento de Biologia da USP
adaptação do organismo a seu modo de vida. Dreyfus viu
ainda mais que um grupo de biologistas trabalhando no
Brasil seria muito mais bem sucedido se explorasse as
tremendas vantagens oferecidas pelas notavelmente ricas
fauna e flora de sua terra natal. Existem, na verdade, certos materiais de trabalho e certos problemas que poder
ser igualmente bem estudados em São Paulo, Nova York,
Londres ou Calcutá.
Um biologista de São Paulo pode estudar fisiologia de
bactérias ou de coelhos ou de cobaias, ou ainda genética
de Drosophila melanogaster, tão bem como um biologista
em Estocolmo ou Tóquio. Mas um biologista no Brasil leva
enor­me vantagem se usar como material para seu trabalho as espécies brasileiras de Drosophila, ou animais do
mar tropical ou plantas dos campos cerrados ou das florestas tropicais.
As moscas do gênero Drosophila mostram ser o material mais favorável para pesquisas dos problemas da genética de populações e da evolução. Dreyfus percebeu,
todavia, que não seria interessante tentar desenvolver
trabalho em São Paulo com a espécie clássica para tais
estudos, a Dro­sophila mela­nogaster. Parecia provável que
a fauna bra­sileira contivesse espécies nativas não menos
favo­ráveis do que D. melano­gaster, mas elas ainda eram
completamente desconhecidas.
Ocorria que o único trabalho sobre Drosophila na
América do Sul era o do cientista alemão O. Duda, baseado somente no estudo de material conservado em
museus europeus e coletados diversas vezes por cole-
tores de insetos diferentes, principalmente na Bolívia, no
Peru e Paraguai. O trabalho de Duda men­ciona apenas
três espécies de Drosophila como existentes no Brasil.
Ou seja, um trabalho preliminar era necessário como
base para qualquer trabalho futuro sobre genética e
evolução de Drosophila no Brasil. Esse trabalho foi iniciado no laboratório do professor Dreyfus em 1943, pelo
então doutorando Crodowaldo Pavan. O primeiro trabalho, contendo descrições e chaves para a classificação
de 27 espécies brasileiras, foi publicado por Pavan e por
mim mesmo nesse ano.
Desde então, Pavan, Brito da Cunha, Nacrus e
Magalhães, do laboratório de São Paulo, descreveram
muitas espécies adicionais. Recentemente, esse trabalho
passou a ser desenvolvido também no Instituto de
Pesquisas Genéticas do Rio de Janeiro, pelos Drs. FrotaPessoa e Hans Burla, que foram introduzidos nesse tipo
de trabalho no laboratório do professor Dreyfus.
Como era de se esperar, a fauna de Drosophila no
Brasil mostrou-se imensamente rica – talvez a mais rica
do mundo. A descrição dessa fauna está ainda longe de
ser completada, mas está agora muito avançada. Logo se
viu que várias das espécies brasileiras oferecem grandes
oportunidades como material para estudos de genética e
evolução. Com o auxílio fornecido pela Fundação
Rockefeller ao laboratório do prof. Dreyfus, tornou-se
possível em 1948 iniciar os estudos gené­ticos básicos
sobre essa espécie.”
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nos próximos fascículos:
Zacuto Lusitano Romão Mosia Reinhipo
Filogônio Lopes Utinguassu Carlos Finlay
Oswaldo Cruz Carlos Chagas Eurycledes
de Jesus Zerbini Adolfo Lutz Zeferino Vaz Mário
Schenberg Gleb Wataghin Cesar Lattes José
Goldemberg Gabriel Soares de Souza Roberto
Landell de Moura Emílio Marcondes Ribas Vital
Brazil Amoroso Costa Santos Dumont Manuel
Augusto Pirajá da Silva Ernst Marcus Alberto
Loefgren Carlos Arnaldo Krug Friedrich Gustav
Brieger Miguel Osório de Almeida Simão
Mathias Maurício Peixoto Graziela Maciel
Barroso Herman Lent Nise da Silveira Paulo
Emílio Vanzolini Fernando Lobo Carneiro Otto
Gottlieb Joaquim Mattoso Camara Florestan
Fernandes Boris Fausto Anísio Teixeira Antônio
Houaiss Giberto Freyre Peter Lund Aziz
Ab’Sáber Lauro Travassos José Gomes de Faria
Benedito de Oliveira Paiva Crodowaldo Pavan
Newton Freire-Maia Osvaldo Frota-Pessoa
Antonio Carini Reinaldo Saldanha da Gama
Antônio Brito
da Cunha Félix Rawitcher José Reis
Ettore Onorato Paulo Sawaya e outros
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