Características epidemiológicas e influência da coinfecção por vírus

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Artigo Original / Original Article
Características epidemiológicas e influência da coinfecção por vírus
respiratórios na gravidade da bronquiolite aguda em lactentes
Epidemiological surveillance and influence of co-infection by respiratory viruses
in the severity of acute bronchiolitis in infants
Dionéia A. H. Sparremberger1, Fernanda Luisi2, Adriana V. Azevedo3, Ana Eliza T. Ribeiro3,
Anasthácia F. W. Wiemann3, Bruna F. de Conto3, Bruna Z. Munhoz3, Elisa F. M. Morais3,
Gabriela A. Bergmann3, Laura C. Maróstica3, Letícia S. Valiati3, Luís F. Spinelli3, Luís A. O. Sussela3,
Marcela R. Nunes3, Rebeca Regert3, Sílvia L. Lardi3, Leonardo A. Pinto4, Renato T. Stein5
Enfermeira, Mestre pelo Programa de Pós-graduação em Saúde da Criança da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
Fisioterapeuta, Mestre pelo Programa de Pós-graduação em Saúde da Criança da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
3
Acadêmicos da Faculdade de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
4
Médico, Doutor em Saúde da Criança pela Universidade Estadual de Campinas. Professor da Faculdade de Medicina da
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
5
Médico, Doutor em Pneumologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Professor da Faculdade de Medicina e Coordenador do
Programa de Pós-graduação em Pediatria e Saúde da Criança da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
1
2
RESUMO
Objetivos: estudar as características epidemiológicas da bronquiolite viral aguda em uma amostra de lactentes de
Porto Alegre e comparar a gravidade da doença entre pacientes com um ou mais agentes virais.
Métodos: um estudo transversal, realizado entre setembro de 2009 e setembro de 2010, incluiu lactentes de até 12
meses de idade com diagnóstico de bronquiolite viral aguda, que estavam internados nas unidades pediátricas do Hospital São Lucas da PUCRS e haviam iniciado com sintomas de vias aéreas inferiores até 72 horas antes da inclusão. A
pesquisa de vírus respiratórios foi realizada em amostras de secreção nasofaríngea, por imunofluorescência direta.
Resultados: foram coletadas 71 amostras de um total de 73 pacientes, cuja média de idade foi de 3,3 meses. Do total
das amostras coletadas, 61,97% (44/71) foram positivas para vírus. Destas, 70,46% (31/44) foram positivas para
apenas um vírus e 29,54% (13/44) para dois ou mais vírus. O vírus sincicial respiratório foi o mais comum (86,36%),
seguido pelo influenza (27,27%). Utilizando os desfechos tempo de internação e tempo de uso de oxigênio, não foi
observada associação entre presença de coinfecção e gravidade da bronquiolite.
Conclusões: o estudo demonstrou uma positividade geral elevada para vírus, com a predominância do vírus sincicial
respiratório. Foi demonstrado também um alto índice de coinfecção viral. Não houve efeito adicional, pela presença de
mais de um tipo de vírus, na gravidade da bronquiolite. Não se pode excluir a possibilidade de que a combinação com
outros vírus, não identificados neste estudo, possa influenciar a gravidade da bronquiolite viral aguda.
DESCRITORES: BRONQUIOLITE VIRAL/epidemiologia; BRONQUIOLITE VIRAL/etiologia; VÍRUS SINCICIAL RESPIRATÓRIO
HUMANO; LACTENTE; HOSPITALIZAÇÃO; COINFECÇÃO; ESTUDOS TRANSVERSAIS.
ABSTRACT
Aims: To evaluate the epidemiologic characteristics and to compare the seriousness of the infection between one or
more than one viral agents in infants hospitalized with acute viral bronchiolitis.
Methods: A cross-sectional study conducted between September 2009 and September 2010 included infants up to 12
months of age diagnosed with acute viral bronchiolitis, who were admitted to the pediatric units of the Hospital São
Lucas da PUCRS and had started with lower airways symptoms to 72 hours before inclusion. Testing for respiratory
viruses was performed on nasopharyngeal specimens by direct immunofluorescence.
Results: Seventy one samples were collected from a total of 73 patients, whose mean age was 3.3 months. Of the total
samples collected, 61,97% (44/71) were positive for virus. Of these, 70,46% (31/44) were positive for one virus and
29,54% (13/44) for two or more viruses. Respiratory syncytial virus was the most common (86,36%), followed by
parainfluenza (27,27%). Using the outcomes length of hospital stay and time of use of oxygen, there was no association
between the presence of coinfection and severity of bronchiolitis.
Conclusions: The study demonstrated a high overall positivity for viruses, with the predominance of respiratory
syncytial virus. A high rate of viral coinfection was also showed. There was no additional effect of the presence of
more than one type of virus on the severity of bronchiolitis. We can not exclude the possibility that the combination
with other viruses, unidentified in this study, may influence the severity of acute viral bronchiolitis
KEY WORDS: BRONCHIOLITIS, VIRAL/epidemiology; BRONCHIOLITIS, VIRAL/etiology; RESPIRATORY SYNSYTIAL VIRUS,
HUMAN; INFANT; HOSPITALIZATION; CO-INFECTION; CROSS-SECTIONAL STUDIES.
Recebido: junho de 2011; aceito: setembro de 2011.
Endereço para correspondência/Corresponding Author:
Leonardo Araujo Pinto
Hospital São Lucas da PUCRS – Av. Ipiranga, 6690
CEP 90610-000, Porto Alegre, RS, Brasil
Tel.: (51) 3320-3000, ramal 2313
E-mail: [email protected]
Scientia Medica (Porto Alegre) 2011; volume 21, número 3, p. 101-106
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Introdução
A bronquiolite viral aguda (BVA) é uma doença
inflamatória aguda do trato respiratório inferior, resultando em obstrução das vias aéreas de pequeno
calibre.1 É a principal causa de internações de lactentes e é causada por vírus sazonais, sendo o mais comum o vírus sincicial respiratório (VSR). Outros
agentes associados à síndrome clínica da BVA são:
adenovírus (VA), rinovírus (RiV), parainfluenza (VP)
tipos 1, 2 e 3, influenza (VI) e metapneumovírus
humano (MPV-h).2
O diagnóstico de BVA em geral é clínico, caracteriza-se como primeiro episódio de sibilância do
lactente, acompanhado de coriza, tosse e febre, que
pode evoluir com taquipnéia e sinais de dificuldade
ventilatória.2,3 Para confirmação do agente viral, utilizase a técnica da imunofluorescência direta (IFD) ou a
reação em cadeia da polimerase (PCR – polymerase
chain reaction).1,4,5
A maioria dos casos tem um curso leve, porém,
entre 0,5 e 2% dos pacientes desenvolvem quadro
grave, necessitando de hospitalização.6 No Brasil,
foram registradas 1.816.218 internações de crianças
abaixo de cinco anos de idade, decorrentes de doenças
respiratórias, entre os anos de 2003 a 2007.7,8 No Rio
Grande do Sul alguns estudos investigaram a incidência
dos vírus na bronquiolite, demonstrando também que
há um predomínio do VSR.7,8
Considerando que as infecções respiratórias de
vias aéreas inferiores no lactente apresentam elevada
morbidade, a avaliação da prevalência de vírus
respiratórios é importante para o melhor entendimento
das características epidemiológicas destas infecções
em países em desenvolvimento.9,10 Com a utilização
rotineira das técnicas de investigação etiológica tornouse frequente a identificação de mais de um agente viral
numa mesma amostra. O impacto da infecção por dois
ou mais vírus não está bem esclarecida na literatura,
especialmente a relação entre a coinfecção e a gravidade
clínica da doença .11-13
Dependendo da amostra estudada, da época do ano
e do método de identificação viral, existem variações na
prevalência dos vírus e das associações por diferentes
agentes. Apesar dessas variações, o VSR geralmente
é o vírus predominante em frequência na maioria das
amostras.12,14 Alguns estudos investigando a coinfecção
entre VSR e outros vírus demonstram uma maior
gravidade e a necessidade de internação em unidade de
terapia intensiva.15-18 Porém, em contrapartida, outros
trabalhos mais recentes demonstraram que não houve
um aumento na gravidade dos pacientes com coinfecção.
Considerando-se estes dados, não há evidências suficientes
102
Sci Med. 2011;21(3):101-106
para uma definição quanto à relação entre gravidade e
coinfecções virais.19-21
No presente estudo, foram avaliadas a ocorrência
de infecções e coinfecções por vírus respiratórios em
lactentes com BVA, bem como a associação entre
coinfecção e desfechos relacionados à gravidade da
doença.
MÉTODOS
Este foi um estudo transversal, com lactentes de
até 12 meses de idade, com diagnóstico de BVA, que
estavam internados pelo Sistema Único de Saúde nas
unidades pediátricas do Hospital São Lucas da PUCRS
– Emergência, Unidade de Cuidados Especiais Pediátrica
(UCEP), Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP)
e Internação – e que haviam iniciado com sintomas de
vias aéreas inferiores até 72 horas antes da inclusão. O
estudo foi realizado no período entre setembro de 2009
e setembro de 2010. Este estudo está associado a um
ensaio clínico randomizado e controlado por placebo
para avaliar a eficácia da azitromicina no tratamento
da BVA, que está em andamento e terá dois anos de
duração. Foram observados os seguintes critérios de
exclusão: histórico de doenças pulmonares relacionadas
à prematuridade (como displasia broncopulmonar);
episódio prévio de sibilância ou internação por BVA;
cardiopatias; pneumopatias crônicas (em especial
fibrose cística); pacientes com suspeita clínica de
coqueluche ou que haviam feito uso de antibiótico
macrolídeo previamente; pacientes de difícil seguimento
(filhos de mães usuárias de drogas ou com histórico de
doenças psiquiátricas); e pacientes cujos responsáveis
recusaram-se a participar da pesquisa.
Os pacientes que se adequaram aos critérios de
inclusão foram arroladas para o estudo e submetidos
à coleta de dados e do lavado nasofaríngeo para
pesquisa de vírus respiratórios por pesquisadores
devidamente treinados. Foi realizado exame físico
dirigido para avaliação do quadro clínico de cada
paciente (incluindo padrão respiratório, tiragem) e
discutido com a equipe médica da emergência o grau
de gravidade. As coletas para pesquisa de vírus foram
realizadas após a internação da criança, nas primeiras
24 horas. Após, foram realizados registros diários, até
a alta, de dados clínicos e evolução dos participantes,
incluindo sinais vitais, oximetria de pulso, necessidade
de oxigenoterapia e duração da internação. O critério
de alta hospitalar foi melhora do quadro clínico e
saturação em ar ambiente acima de 94%.
A coleta de secreção foi feita por técnica rotineira e
a pesquisa de vírus foi realizada por IFD, que pesquisa
antígenos em células ou tecidos através de um anticorpo
Sparremberger DAH et al. – Características epidemiológicas e influência da coinfecção por vírus ...
específico marcado com fluorocromo (conjugado). Foi
utilizado o kit Respiratory Virus Panel (Biotrin, Dublin,
Irlanda) para a pesquisa de anticorpos monoclonais
grupo-específicos e tipo-específicos, para detecção
direta e confirmação de cultura. Foram pesquisados
os vírus VSR, VI, VP 1, 2 e 3 e VA 1 e 2.
O estudo foi avaliado e aprovado pelo Comitê de
Ética em Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica
do Rio Grande do Sul (registro 09/04678). Um termo
de consentimento livre e esclarecido foi assinado
pelos responsáveis pelos pacientes, manifestando
pleno acordo com sua realização. A identidade dos
participantes foi mantida em sigilo.
Para a análise estatística foram consideradas as
seguintes variáveis: prevalência de infecções por vírus
respiratórios, tempo de internação hospitalar e tempo
de uso de oxigenoterapia, bem como as variáveis
demográficas coletadas através do questionário.
Para descrição dos dados foram utilizadas média
e desvio padrão ou mediana e intervalo interquartil
para as variáveis quantitativas; porcentagem para
as variáveis qualitativas. Para investigar associação
entre as variáveis foi utilizado teste t de Student para
amostras independentes, para comparação de média
das variáveis contínuas entre dois grupos; e ANOVA
para comparar as diferenças (variâncias) entre três
grupos independentes. O nível de significância foi
de p ≤ 0,05. A análise dos dados foi realizada com o
programa SPSS versão 17.0.
RESULTADOS
No período do estudo foram incluídos 73 pacientes,
com média de idade de 3,3 meses (dp ± 2,5 meses),
sendo 57,5% (42/73) do sexo masculino. Com relação
às variáveis clínicas, observamos que 95,89% (70/73)
das crianças apresentavam tiragem (retrações costais,
subcostais e intercostais); e que 98,63% (72/73) das
crianças necessitaram oxigenoterapia, com duração
média de 5,3 dias. O tempo médio de internação
foi de seis dias e o tempo de sibilância durante a
internação hospitalar foi de quatro dias. Com relação
à necessidade de cuidados especiais ou de cuidados
intensivos, verificamos que 8,21% (6/73) dos pacientes
foram encaminhados à UCEP e 4,10% (3/73) à UTIP
(Tabela 1).
Foram coletadas amostras de secreção nasal para
pesquisa de vírus em 97,26% dos pacientes (71/73). O
número de amostras positivas foi de 61,97% (44/71).
Destas, 70,46% (31/44) foram positivas para apenas
um vírus, 18,18% (8/44) para dois vírus e 11,36%
(5/44) para três vírus. Com relação à prevalência
dos vírus pesquisados, o VSR foi o mais prevalente,
sendo seguido do VI e do VP e, por último, do VA (Tabela 2). A Figura 1 mostra a prevalência mensal dos
três principais vírus identificados.
Tabela 1. Características descritivas dos pacientes
incluídos no estudo: variáveis clínicas.
Sexo masculino N (%)
Idade (meses) (média ± dp)
Peso (kg) (média ± dp)
Frequência respiratória (média ± dp)
Nascidos de parto normal N (%)
Sibilância N (%)
Presença de tiragem N (%)
Tipo de tiragem N (%)
Costal
Subcostal
Intercostal
Associações
Gravidade da tiragem N (%)
Leve
Moderada
Grave
Prematuridade (<37 semanas) N (%)
Amamentação N (%)
Tempo de amamentação exclusiva N (%)
Nunca exclusivamente
Menos de 2 meses
Entre 2-4 meses
Entre 4-6 meses
Mais que 6 meses
Tempo de oxigenoterapia (dias) (média ± dp)
Uso de broncodilatador spray N (%)
Uso de corticóide oral N (%)
Tempo de internação hospitalar (dias)
(média ± dp)
Saturação transcutânea de oxigênio na alta (%)
(média ± dp)
N total = 73
42 (57,5)
3,3 ± 2,5
5,630 ± 1,85
50,27 ± 12,13
57 (78,08)
63 (86,30)
70 (95,89)
4/70 (5,71)
48/70 (57,14)
1/70 (1,42)
17/70 (24,28)
18/70 (25,71)
49/70 (70)
3/70 (4,28)
15 (20,54)
68/73 (93,15)
4/68 (5,88)
36/68 (52,94)
20/68 (29,41)
5/68 (7,35)
3/68 (4,41)
5,3 ± 3
28 (38,35)
6 (8,21)
6 ± 3,2
97,54 ± 1,69
Tabela 2. Prevalência de vírus respiratórios e coinfecção nos 71 lactentes nos quais foram coletadas
amostras de secreção nasal para pesquisa de vírus por
imunofluorescência direta (entre 73 pacientes com
primeiro episódio de sibilância, internados pelo Sistema
Único de Saúde nas unidades pediátricas do Hospital São
Lucas da PUCRS em 2010).
Negativo para Vírus
Positivo para Vírus
Presença de 1 vírus
Presença de 2 vírus
Presença de 3 vírus
Vírus Sincicial Respiratório (VSR)
Vírus Influenza (VI)
Vírus Parainfluenza (VP)
Vírus Adenovírus (VA)
N (%)
27/71 (38,03)
44/71 (61,97)
31/44 (70,45)
8/44 (18,18)
5/44 (11,36)
38/44 (86,36)
12/44 (27,27)
10/44 (22,72)
2/44 (4,54)
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Figura 1. Prevalência mensal dos três principais
vírus detectados por imunofluorescência direta
no ano de 2010, em 71 lactentes com primeiro
episódio de bronquiolite viral aguda, internados
pelo Sistema Único de Saúde nas unidades
pediátricas do Hospital São Lucas da PUCRS,
que haviam iniciado com sintomas até 72 horas
antes. Todos os casos de bronquiolite atendidos em
agosto tinham história de sibilância anterior, não
preenchendo os critérios de inclusão no estudo.
VSR: Vírus Sincicial Respiratório.
Os pacientes que apresentaram coinfecção viral
foram 29,54% (13/44). Dentre os 61,53% (8/13)
que apresentaram positividade para dois vírus, as
combinações encontradas foram: VP+VSR em
50% (4/8); VI+VSR em 37,5% (3/8); e VI+VP em
12,5% (1/8) das amostras. Dentre os 38,46% (5/13)
dos pacientes que apresentaram positividade para
três vírus, verificamos as seguintes combinações:
VI+VP+VSR em 60% (3/5); VI+VP+VA em 20%
(1/5); e VI+VA+VSR em 20% (1/5) das amostras
analisadas. Utilizando os desfechos tempo de internação
e tempo de uso de oxigênio, não foram observadas
associações entre a presença de coinfecção e gravidade
da BVA (p > 0,05; Tabelas 3 e 4). Quando utilizamos
o desfecho internação em UCEP e UTIP, também não
foram observadas diferenças significativas. Quanto
às variáveis que poderiam ser fatores de risco para
coinfecção (tempo de amamentação, número de
irmãos, frequência em creches), não houve diferença
significativa entre coinfectados e controles.
DISCUSSÃO
Neste trabalho foram investigados quatro vírus
respiratórios através da técnica IFD, que conferiu
positividade de 61,97% do total das amostras coletadas,
indo ao encontro da literatura, que refere uma taxa de
identificação viral de 45 a 70%, com esta técnica.9,10
Dos vírus pesquisados, o VSR, habitualmente, é o
mais prevalente em lactentes hospitalizados com
BVA.12 Calegari et al. descreveram uma taxa de
positividade para VSR de 54% em suas amostras de
crianças menores de um ano, com diagnóstico de BVA
ou pneumonia.13 Esta informação pode ser comparada
aos nossos achados, que identificaram infecção por
VSR em 84,44% das amostras positivas.
Com relação à incidência das infecções por vírus
respiratórios em diferentes períodos do ano, mostrada
na Figura 1, fica evidente o fato da bronquiolite ser
uma doença sazonal, com ocorrência maior nos meses
de outono e inverno. Este estudo confirma que a BVA
Tabela 3. Relação entre coinfecção e gravidade da bronquiolite (avaliada pelo tempo de internação e
necessidade de oxigenoterapia), comparando pacientes com resultado negativo (grupo A), com detecção de
apenas um vírus (grupo B) e com coinfecção (detecção de dois ou mais vírus, grupo C).
Internação (dias)
Oxigenoterapia (dias)
Grupo A
N=27
(Negativo)
5,30 ± 3,68
4,96 ± 4,30
Grupo B
N=31
(Positivo 1 vírus)
6,26 ± 2,88
5,87 ± 2,54
Grupo C
N=13
(Coinfecção)
5,23 ± 2,94
5,31 ± 2,72
Significância
(p)*
0,605
0,748
* Teste ANOVA, SPSS.
Tabela 4. Relação entre
coinfecção e gravidade da
bronquiolite, comparando
pacientes com coinfecção
versus todos os outros
pacientes incluídos
no estudo.
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Internação (dias)
Oxigenoterapia (dias)
Controles
N=58
(51% placebo*)
5,81 ± 3,2
5,45 ± 3,47
Coinfecção
N=13
(46% placebo*)
5,23 ± 2,9
5,31 ± 2,72
Significância
(p)**
0,561
0,892
* Este estudo está associado a um ensaio clínico randomizado e controlado por placebo para avaliar a eficácia da azitromicina
no tratamento da bronquiolite viral aguda, não havendo diferença no número de pacientes randomizados para receber placebo ou
intervenção nos grupos comparados nesta análise.
** Teste t de Student, SPSS.
Sparremberger DAH et al. – Características epidemiológicas e influência da coinfecção por vírus ...
constitui-se em um problema de saúde pública, devido à
alta demanda de pacientes em emergências pediátricas
e hospitalizações durante o período de inverno. Note-se
que o estudo recrutou apenas pacientes com o primeiro
episódio de sibilância. Em agosto houve casos de
bronquiolite, porém todos os pacientes apresentavam
sibilância recorrente ou início dos sintomas há mais
de 72 horas (critérios de exclusão). Provavelmente, a
explicação para este achado está relacionada ao período
final do inverno, quando a maior parte dos pacientes
já teve contato com os vírus em meses anteriores.
Além disso, também é importante considerar que a
temporada de VSR iniciou cedo em 2010, o que se
reflete no número de vírus identificados em março.
Nossos resultados mostraram que o VSR esteve
presente tanto em lactentes com infecção por um
único agente viral como nos casos de coinfecção. Com
relação à prevalência dos demais vírus pesquisados, o
VI foi o segundo vírus mais prevalente, seguido do VP
e, por último, do VA. Dado este que contraria outros
estudos, que identificaram o VA como o segundo vírus
mais prevalente.15,17
A importância da detecção de agentes virais
múltiplos em secreção de nasofaringe é um assunto
relevante e controverso. Geralmente, consideramos
um quadro de coinfecção quando os agentes virais
envolvidos são conhecidamente patogênicos.16-18 A
literatura nos mostra que a ocorrência de coinfecções
por vírus respiratórios é variável (15 a 30%).17-19, 24
Os resultados deste estudo mostram que quase 30%
das crianças infectadas apresentaram coinfecção
viral, confirmando dados dos estudos citados anteriormente.
O significado clínico da codetecção de dois ou
mais agentes virais ainda é motivo de investigação
na literatura científica, principalmente no que diz
respeito às formas mais graves da BVA. Atualmente, os
efeitos da coinfecção sobre o organismo das crianças
ainda são pouco conhecidos. Muitos são os fatores
estudados como possíveis determinantes da gravidade
das infecções respiratórias virais, bem como a variação
da resposta imunológica frente à presença de um único
ou mais agentes virais.21-22
Alguns estudos relatam uma relação positiva entre
coinfecção e gravidade. Greensill22 estudou, durante
um ano, crianças com BVA por VSR, em ventilação
mecânica, e constatou que 70% destas apresentaram
coinfecção MPV-h, sugerindo que a associação entre
VSR e MPV-h possa ser um determinante na gravidade
da doença. Semple et al.23 também sugeriram que
coinfecção entre MPV-h e VSR foi indicativa de
gravidade da doença, aumentando a necessidade
de cuidados intensivos e uso de VM. Nos estudos
de Richard19 também foram encontradas relações
entre coinfecção e gravidade da doença, visto que
a necessidade de internação em uma unidade de
tratamento intensivo foi maior nas crianças coinfectadas
do que nas que tiveram infecção por um único agente
viral. No estudo de Paranhos-Baccala24 a associação
do VSR ao MPV-h e/ou ao RiV também determinou
maior severidade na doença.
Por outro lado, Canducci24 relata maior gravidade
de infecções únicas por VSR quando comparadas às
infecções por VSR e MPV-h em crianças hospitalizadas.
As infecções únicas por VSR foram associadas à maior
tempo de hospitalização e hipóxia. 12,13 Em trabalho
publicado recentemente, Nascimento21 encontrou um
índice de 40% de coinfecções em seu estudo, porém
não encontrou relação entre gravidade da doença e
infecção por mais de um agente viral.
Nosso estudo não observou diferenças significativas
com relação à gravidade da doença entre crianças
infectadas por um único agente viral e coinfectadas.
Resultados semelhantes em alguns trabalhos têm
sugerido que a presença simultânea de mais de um
patógeno viral em doença respiratória aguda pode não
estar relacionada com uma manifestação clínica mais
grave.21-25 Estes dados são comparáveis aos de Marguet
et al.,20 que demonstraram que a gravidade da infecção
concomitante RiV/VSR foi comparável à observada
nas crianças com infecção única por VSR.
O avanço tecnológico tem contribuído para o desenvolvimento de técnicas de diagnóstico e tratamento
cada vez mais rápidas, precisas e eficientes como a
PCR.10 Contudo, apesar de nosso estudo não encontrar
associação entre detecção de agentes virais múltiplos e
gravidade da doença, encontramos uma elevada taxa de
coinfecção mesmo utilizando somente a técnica de IFD,
o que pode ser consequência da presença de um grande
número de lactentes em um pequeno espaço físico,
tanto em casa como no ambiente hospitalar. Estes dados
chamam a atenção para a importância do isolamento de
contato nas infecções respiratórias agudas.
Como limitação, podemos citar que a técnica da
IFD utilizada para detecção dos agentes virais neste
estudo, mesmo sendo um teste rápido e eficiente
para detecção de VSR (sensibilidade 87-91% e
especificidade 96-100%),26 não é capaz de detectar
alguns agentes frequentes e relevantes das infecções
respiratórias na infância, como o RiV e o MPV-h. Além
disso, o fato de os pacientes participarem de um ensaio
clínico randomizado poderia introduzir um viés de
confusão na avaliação da gravidade. Porém, não houve
diferença no número de pacientes randomizados para
receber placebo ou intervenção nos grupos comparados
no presente estudo.
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Sparremberger DAH et al. – Características epidemiológicas e influência da coinfecção por vírus ...
A técnica de PCR permite a detecção simultânea de
um amplo espectro de vírus e possibilita o diagnóstico e
avaliação da codetecção viral nas infecções respiratórias
agudas.20 Mesmo sem dados de PCR, encontramos um
alto índice de coinfecção e conseguimos demonstrar que
a coinfecção pelos vírus pesquisados neste estudo não
afeta a gravidade da doença. É importante considerar
que a técnica de PCR também possui limitações, como
as taxas de codetecção mesmo sem associação de
infecção por mais de um vírus.27
Em adição, as altas taxas de coinfecção em lactentes
internados na emergência deste hospital sugerem que a
condição socioeconômica e a aglomeração de pessoas
no mesmo ambiente, bem como a pequena distância
entre os leitos na emergência, podem ser fatores
importantes para o achado de coinfecção por vírus
respiratórios. Concluindo, os resultados apresentados
sugerem que a combinação do VSR com outros vírus
respiratórios (especialmente VP) na BVA não modifica
a gravidade do quadro clínico dos pacientes.
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