A ATIVIDADE PEDAGÓGICA NA EDUCAÇÃO FÍSICA: SENTIDOS E SIGNIFICAÇÕES DA CULTURA CORPORAL Vidalcir Ortigara Universidade do Extremo Sul Catarinense – UNESC Matheus Bernardo Silva Universidade Federal do Paraná Ademir Damazio Universidade do Extremo Sul Catarinense – UNESC Carlos Augusto Euzébio Universidade do Extremo Sul Catarinense – UNESC RESUMO O presente trabalho tem, como objetivo, discutir a função do conhecimento científico para a educação física. O recorte dessa discussão será sobre a educação física e seu objeto de tematização e intervenção pedagógica, isto é, a cultura corporal. Partimos do pressuposto que os sentidos estabelecidos para o significado do conhecimento da cultura corporal são firmados, atualmente, em uma base ideológica/filosófica/epistemológica que reproduz o modelo social vigente, ou seja, em uma ontologia empirista que contribui para a manutenção da sociabilidade do capital. Argumentamos pela necessidade de mudança dos atuais sentidos da cultura corporal no âmbito da educação física, para que possamos torná-la um elemento que contribua para o estabelecimento das possibilidades de transformação da atual realidade social. Palavras-chave: Sentidos/Significações. Educação. Educação Física. Atividade pedagógica. Cultura Corporal. Vidalcir Ortigara; Matheus Bernardo Silva; Ademir Damazio; Carlos Augusto Eusébio THE PEDAGOGICAL ACTIVITY IN PHYSICAL EDUCATION: SENSE AND MEANING OF THE CORPORAL CULTURE ABSTRACT The present study has as objective to discuss the function of the scientific knowledge for physical education. The main point of this discussion will be on the physical education and its thematic object and pedagogical intervention, this means, the corporal culture. We start from the assumption that the senses established for the meaning of the corporal culture knowledge are currently based on an ideological/philosophical/epistemological basis that reproduces the current social model, this means, in an empiristic ontology that contributes to maintenance of the capital sociability. We confirm the need for changes in the current senses of the corporal culture in the physical education sphere, so that we can make it an element that contributes to the establishment of transformation possibilities of the current social reality. Keywords: Senses/Meaning. Education. Pedagogical activity. Corporal Culture. Physical Education. Considerações Iniciais Ao contrário do que em geral se crê, sentido e significado nunca foram a mesma coisa, o significado fica-se logo por aí, é direto, literal, explícito, fechado em si mesmo, unívoco, por assim dizer, ao passo que o sentido não é capaz de permanecer quieto, fervilha de sentidos segundos, terceiros e quartos, de direções irradiantes que se vão dividindo e subdividindo em ramos e ramilhos, até se perderem de vista, o sentido de cada palavra parece-se com uma estrela quando se põe a projetar marés vivas pelo espaço fora, ventos cósmicos, perturbações magnéticas, aflições. (José Saramago, 1997) Rev.Eletrônica Pesquiseduca, Santos, v. 05, n. 09, p.145 – 163, jan.-jul., 2013 146 Vidalcir Ortigara; Matheus Bernardo Silva; Ademir Damazio; Carlos Augusto Eusébio Para início de conversa, sentimos a necessidade de explicitar elementos intrínsecos da realidade social contemporânea para, posteriormente, entrarmos em uma temática mais específica de reflexão sobre a atividade pedagógica a partir do contexto das aulas de educação física. Partimos da premissa de que a atividade educativa – e, por consequência, a educação física – desenvolve-se dialeticamente com e no seio da organização societária. Refletimos sobre a atividade pedagógica, fundamentando-nos em uma aversão visceral, uma repulsa intestina, um descontentamento profundo, uma recusa intransigente do modelo capitalista de expropriação do humano, ou seja, de uma crítica radical ao modo social estabelecido. Assumimos a perspectiva de que a educação física pode contribuir com tal crítica e que, em sua prática pedagógica, deve favorecer a apropriação ativa e consciente do conhecimento da cultura corporal, uma vez que tal apropriação contribui para produzir as condições objetivas de emancipação humana. Posicionamo-nos contrários a essa sociedade burguesa vigente, que se caracteriza como “[…] a mais desenvolvida e diversificada organização histórica de produção […]” (MARX, 2011, p.58), que age de forma contraditória ao desenvolvimento, concebendo o capital como ponto de partida e chegada, conforme afirma Marx (2011, p.58): A “[…] sociedade burguesa é só uma forma antagônica do desenvolvimento; nela são encontradas com frequência relações de formas precedentes inteiramente atrofiadas ou mesmo dissimuladas.” Para Mészáros (2009), é nesta ordem de reprodução sociometabólica do capital que estamos submersos, em meio a uma imperiosa arrogância (sub)humana, no qual os beneficiados são apenas a minoria dominadora que usufrui indiscriminadamente da força de trabalho usurpada da classe dominada: “A potencialidade da tendência universalizante do capital, por sua vez, se transforma na realidade da alienação desumanizante e na reificação.” (MÉSZÁROS, 2009, p. 17, itálicos no original). Marx (2008, p. 80), de maneira interessante e irônica, apresenta a condição do trabalhador perante o seu trabalho estranhado: “O trabalhador se torna tanto mais pobre quanto mais riqueza produz, quanto mais a sua produção aumenta em poder da extensão. O trabalhador se torna uma mercadoria tão mais barata quanto mais mercadorias cria.” Segundo Mészáros (2009, p. 19, itálicos no original), O sistema do capital se articula numa rede de contradição que só se consegue administrar medianamente, ainda assim durante curto intervalo, mas que não se consegue superar definitivamente. Na raiz de todas elas encontramos o Rev.Eletrônica Pesquiseduca, Santos, v. 05, n. 09, p.145 – 163, jan.-jul., 2013 147 Vidalcir Ortigara; Matheus Bernardo Silva; Ademir Damazio; Carlos Augusto Eusébio antagonismo inconciliável entre capital e trabalho, assumindo sempre e necessariamente a forma de subordinação estrutural e hierárquica do trabalho ao capital, não importando o grau de elaboração e mistificação das tentativas de camuflá-la. Para vislumbrarmos as possibilidades de superação dessa subordinação, precisamos compreender o próprio trabalho, ou seja, precisamos compreender a principal atividade do ser social. O trabalho, do ponto de vista ontológico, é atividade vital humana. É nele que o homem busca suprir suas necessidades para a sobrevivência e produção de novas vidas humanas que garantem sua continuidade na existência. Esse processo tem, como momento originário, a relação ser social e natureza. Com a complexificação das relações e interpelações na complexificação social, não se elimina esse momento, mas, para compreendê-lo, é preciso ter presente essa condição da existência humanai. No entanto, esse contato e domínio da natureza remete o indivíduo a dois aspectos aparentemente opostos, podendo, por um lado, manifestar elementos negativos em que, em prol de um objetivo específico, acaba por gerar a destruição, sem refletir sobre as possíveis consequências para as próximas gerações. Por outro, ocorre a interação com a natureza de uma maneira positiva, no qual há a transformação da mesma para poder objetivar os meios de satisfação de suas necessidades, mas ressaltando as possibilidades para a sua conservação. Lukács (2010) expressa com clareza essa situação: É preciso ter sempre em mente que uma fundamentação ontológica correta de nossa imagem de mundo pressupõe as duas coisas, tanto o conhecimento da propriedade específica de cada modo do ser, como o de suas interações, inter-relações etc. com os outros. [...] O ser humano pertence ao mesmo tempo (e de maneira difícil de separar, mesmo no pensamento) à natureza e à sociedade. Esse ser simultâneo foi claramente reconhecido por Marx como processo, na medida em que diz, repetidas vezes, que o processo humano traz consigo um recuo das barreiras naturais. (LUKÁCS, 2010, p. 42) O autor magiar ressalta que o “recuo” significa que tais barreiras não desaparecem no processo histórico, mas que as determinações que permanecem sempre naturalmente fundadas são postas sob o domínio das condições sociais. Não se trata, todavia, de uma visão dualista do ser humano, “[…] o homem nunca é de um lado, essência humana, social, e, de outro, pertencente à natureza; sua humanização, sua sociabilização, não Rev.Eletrônica Pesquiseduca, Santos, v. 05, n. 09, p.145 – 163, jan.-jul., 2013 148 Vidalcir Ortigara; Matheus Bernardo Silva; Ademir Damazio; Carlos Augusto Eusébio significa uma clivagem de seu ser em espírito (alma) e corpo.” (LUKÁCS, 2010, p. 42). Conforme afirmamos, o homem é o único ser capaz de ter o domínio da natureza, isto é, tem a capacidade “consciente” de transformála e, dessa maneira, transforma a si mesmo, mostrando-nos por essa ação a dimensão e a complexidade que pode realizar perante a natureza; ou seja, por meio da objetivação e da apropriação dos diversos elementos encontrados na natureza, dá-se a sua formação . “O homem faz da sua atividade vital mesma um objeto da sua vontade e da sua consciência. Ele tem atividade vital consciente.” (MARX, 2008, p. 80). Portanto, a realidade social se dá pela atividade mediada do homem com a natureza, que é sempre mediada por outros homens, isto é, pelas objetividades produzidas pelos seres humanos no curso da história. Sobre esse fator, Kosik (2010, p. 246-247, itálicos no original) argumenta que A realidade não é (autêntica) realidade sem o homem, assim como não é (somente) realidade do homem. É a realidade da natureza como totalidade absoluta, que é independente não só da consciência do homem, mas também da sua existência, e é realidade do homem que na natureza, e como parte da natureza cria a realidade humano-social, que ultrapassa a natureza e na história define o próprio lugar no universo. O homem não vive em duas esferas diferentes, não habita, por uma parte do seu ser, na história, e pela outra, na natureza. Como homem ele está junta e concomitantemente na natureza e na história. Como ser histórico e, portanto social, ele humaniza a natureza, mas também a conhece e reconhece como totalidade absoluta, como causa sui suficiente a si mesma, como condição e pressuposto da humanização. Marx e Engels (2007), ao explicitarem a gênese da história humana, analisam esse metabolismo do ser social com a natureza, em que a própria produção da vida humana está indissociavelmente ligada a ele. A produção da vida, tanto da própria, no trabalho, quanto da alheia, na procriação, aparece desde já como uma relação dupla – de um lado, como relação natural, de outro como relação social –, social no sentido de que por ela se entende a cooperação de vários indivíduos, sejam quais forem as condições, o modo e a finalidade. (MARX; ENGELS, 2007, p. 34). Rev.Eletrônica Pesquiseduca, Santos, v. 05, n. 09, p.145 – 163, jan.-jul., 2013 149 Vidalcir Ortigara; Matheus Bernardo Silva; Ademir Damazio; Carlos Augusto Eusébio Em debate semelhante, quando busca explicitar o processo de humanização, que elucida a passagem da hominização para o ser social, Leontiev (1964, p. 290, itálicos no original) assevera que As aquisições do desenvolvimento histórico das aptidões humanas não são simplesmente dadas aos homens nos fenômenos objetivos da cultura material e espiritual que os encarnam, mas são aí apenas postas. Para se apropriar destes resultados, para fazer deles as suas aptidões, “os órgãos da sua individualidade”, a criança, o ser humano, deve entrar em relação com os fenômenos do mundo circundante através de outros homens, isto é, num processo de comunicação com eles. Assim, a criança aprende a atividade adequada. Pela sua função este processo é, portanto, um processo de educação. É com esse enfoque que pretendemos realizar o debate neste trabalho, tomando como pressuposto a reflexão da formação humana, ou seja, a formação da consciência baseada nas intervenções na realidade social vigente. Essa análise será realizada (e já está sendo realizada) pela justificativa de termos como interesse final explicitar um esboço da importância que o conhecimento científico possui na atividade pedagógica em educação física, isto é, a tomada de consciência para si das novas gerações em relação à cultura corporal. Como já anunciamos, a consciência está diretamente ligada às ações realizadas na realidade social. A consciência é, naturalmente, antes de tudo a mera consciência do meio sensível mais imediato e consciência do vínculo limitado com outras pessoas e coisas exteriores ao indivíduo que se torna consciente; ela é, ao mesmo tempo, consciência da natureza [...] e, por outro lado, a consciência da necessidade de firmar relações com os indivíduos que os cercam constituem o começo da consciência de que o homem definitivamente vive numa sociedade. (MARX; ENGELS, 2007, p. 35, itálicos no original) Trataremos da importância do conhecimento científico de uma maneira omnilateral, portanto, na sua totalidadeii concreta no âmago da educação física, compreendendo os sentidos e significados que a cultura corporal possui na sociedade capitalista. Sustentando-nos em Vigotsky (2000, p. 241), podemos ressaltar que O desenvolvimento dos conceitos científicos na idade escolar é, antes de tudo, uma questão prática de imensa importância – talvez até primordial – do ponto de vista das tarefas que a escola tem diante de si quando inicia a criança no sistema de Rev.Eletrônica Pesquiseduca, Santos, v. 05, n. 09, p.145 – 163, jan.-jul., 2013 150 Vidalcir Ortigara; Matheus Bernardo Silva; Ademir Damazio; Carlos Augusto Eusébio conceitos científicos. […] É igualmente grande a importância teórica dessa questão, uma vez que o desenvolvimento dos conceitos científicos – autênticos, indiscutíveis, verdadeiros – não pode deixar de revelar no processo investigatório as leis mais profundas e essenciais de qualquer processo de formação de conceitos em geral. Complementando esse posicionamento, o autor adverte que O curso do desenvolvimento do conceito científico nas ciências sociais transcorre sob as condições do processo educacional, que constitui uma forma original de colaboração sistemática entre o pedagogo e a criança, colaboração essa em cujo processo ocorre o amadurecimento das funções psicológicas superiores da criança com o auxílio e a participação do adulto. No campo do nosso interesse, isto se manifesta na sempre crescente relatividade do pensamento casual e no amadurecimento de um determinado nível de arbitrariedade do pensamento científico, nível esse criado pelas condições do ensino. (VIGOTSKY, 2000, p. 244, itálicos nossos). Objetivamos apresentar, como proposição, os motivos necessários para uma significação para si dos sentidos e significados do conhecimento científico da cultura corporal, para podermos contribuir para a formação da consciência de classe. Para que a classe subalterna não permaneça “congelada” nas suas atuais compreensões que envolvem teórica e prática unilateral, reforçando, cada vez mais, o estereótipo da dominação do homem sobre o homem, e aviltando as condições de, ao compreender as determinações históricas concretas, realizar escolhas que perspectivem a transformação social. Portanto, partimos do pressuposto de que uma das funções da educação é possibilitar às novas gerações apropriarem-se da riqueza material e spiritual, na perspectiva de – na dialética de apropriação e objetivação – constituírem-se partícipes do gênero humano. Como afirma Leontiev (1978), o ser humano constitui-se à medida que se apropria da produção acumulada no desenvolvimento sócio-histórico e depositada nas objetividades materiais e espirituais. Na complexificação do desenvolvimento histórico, houve a necessidade de organização institucional desse processo de apropriação, que desencadeou na organização escolar. Na estruturação do currículo escolar moderno, encontramos elencada a educação físicaiii. Os debates em torno das perspectivas teóricometodológicas da educação física abarcam tendências, cujas concepções de ser humano e de corpo variam entre a positivista naturalista até a fenomenológica existencialista. Nossa referência será a perspectiva Rev.Eletrônica Pesquiseduca, Santos, v. 05, n. 09, p.145 – 163, jan.-jul., 2013 151 Vidalcir Ortigara; Matheus Bernardo Silva; Ademir Damazio; Carlos Augusto Eusébio teórico-metodológica crítico superadora (COLETIVO DE AUTORES, 1992)iv, que tem suas bases na pedagogia histórico-crítica de fundamentos teóricos no materialismo histórico. Nessa tendência, o conhecimento tematizado na atividade pedagógica da educação física é a cultura corporal, que aborda as manifestações expressivas corporais como o esporte, a ginástica, os jogos e brincadeiras, a dança, as lutas e outros. Embora estejamos a duas décadas de sua publicação, é consensual a necessidade de aprofundamento de vários de seus aspectos. Um deles, para o qual pretendemos contribuir, é o do sentido e significado que a cultura corporal pode ter no âmbito da tematização pedagógica escolar. Portanto, o desenvolvimento do estudo busca explicitar primeiramente as abordagens que obtiveram maior repercussão acadêmica no âmbito brasileiro para localizar a tendência teórico-metodológica crítico superadora e o sentido e significado da cultura corporal. As perspectivas pedagógicas contemporâneas na educação e na educação física Na educação contemporânea, observamos que existem diversas abordagens em evidência no campo acadêmico e escolar. Essas abordagens, em sua maioria, afirmam estar inseridas em um campo crítico da educação. Porém, a confirmação que de fato se concretizam na atividade pedagógica como uma abordagem crítica se torna algo mais complexo e difícil. Por outro lado, também temos a condição de alerta sobre as formulações pedagógicas que pretendem estar em um campo progressista; no entanto, como alerta Tonet (2005, p. 203), possuem um caráter idealista que “[...] se manifesta na construção de um ideal abstrato [...]”. Essas afirmações “[...] têm um apelo muito grande porque parecem opor uma ação educativa emancipadora a uma ação educativa conservadora, a-crítica, reprodutivista, passiva, alienante [...]”. O autor ainda chama atenção para o fato de que “a falta de uma sólida base metodológica de caráter histórico-ontológico faz com que o seu conhecimento do processo social não consiga ultrapassar o nível da superficialidade” (TONET, 2005, p. 203). Portanto, não permite vislumbrar a superação da imediaticidade da realidade social estranhada. “Essa mistura impossível de empirismo e voluntarismo resulta numa série de recomendações vazias que, ao contrário do que expressamente pretendem, colaboram para a reprodução dessa forma de sociabilidade desumanizadora.” (TONET, 2005, p. 203) Rev.Eletrônica Pesquiseduca, Santos, v. 05, n. 09, p.145 – 163, jan.-jul., 2013 152 Vidalcir Ortigara; Matheus Bernardo Silva; Ademir Damazio; Carlos Augusto Eusébio No cenário da prática educativa, a consequência é o que Moraes (2003, p. 156-157, itálicos nossos) denomina de retração da teoria, ou poderíamos dizer, de um esvaziamento do conhecimento. Procedeu-se a uma verdadeira sanitarização na “racionalidade moderna e iluminista”, vertendo-se fora não só as impurezas detectadas pela inspeção crítica, mas o próprio objeto de inspeção; não apenas os métodos empregados para validar o conhecimento sistemático a arrazoado, mas a verdade, o racional, a objetividade, enfim, a própria possibilidade de cognição do real. [...] O recuo da teoria foi decorrência natural desse processo. Inaugurou-se a época cética e pragmática, dos textos e das interpretações que não podem mais expressar ou, até mesmo, se aproximar da realidade, constituindo-se em simples relatos ou narrativas que, presos às injunções de uma cultura, acabam por arrimar-se no contingente e na prática imediata – uma metafísica do presente, ou, como define Jameson (1988, p. 26), uma história de presentes perpétuos. O ceticismo, todavia, não é apenas epistemológico, mas ético e político. E importa para nós tanto em sua versão conservadora, como peça retórica, consciente ou não, de veneração ao mercado, como igualmente em sua versão “crítica” e “radical”. Entre os efeitos sociais desse “recuo da teoria”, temos uma ressignificação das políticas públicas – com a “emergência de certo ethos neodarwinista” que as banaliza na perspectiva do produtivismo –, a ressignificação dos conceitos como um puro exercício linguístico e o apaziguamento das relações sociais, como única saída para a solução dos conflitos sociais. A retórica é precisa. A negação da objetividade aparece aqui associada à ideia de desintegração do espaço público, do fetichismo da diversidade, da compreensão de que o poder e a opressão estão pulverizados em todo o lugar. Daí resulta a impossibilidade de estabelecer uma base de resistência e enfrentamento da realidade que, queiram ou não, apresentamse aos sujeitos como totalidade da economia e das relações de poder (MORAES, 2003, p. 157). Na educação física, esses discursos plangentes também são persistentes e muito presentes. Lembrando que a educação física, durante seu percurso histórico, substanciou-se em várias tendências ou orientações para constituir suas ações. Atualmente, ainda vem sendo palco para novos debates e reflexões. Podemos citar a querela ou o lamento da pósmodernidadev que, atualmente, encontra-se em destaque tanto nos debates no interior da educação como na educação física. A discussão das Rev.Eletrônica Pesquiseduca, Santos, v. 05, n. 09, p.145 – 163, jan.-jul., 2013 153 Vidalcir Ortigara; Matheus Bernardo Silva; Ademir Damazio; Carlos Augusto Eusébio “viradas” na educação física na atividade epistemológica e ontológica também se fazem presentes em nosso campo de atuação. Sobre essa questão podemos mencionar o texto de Almeida e Vaz (2010) que, em última análise, realizam uma crítica sobre as reflexões realizadas por outros autores da área em relação à falta dos sentidos ontológicos na educação física. Almeida e Vaz (2010) denunciam que esses autores apontam como prioritária a necessidade da ontologia, ao invés da epistemologia; contudo, esquecem-se de um importante detalhe: compreender que a ontologia precede realmente a epistemologia, mas que ambas atuam de uma maneira dialéticavi, não as pontuando e fragmentando por ranking, colocações, etc. A reflexão de Almeida e Vaz (2010) se justifica quando observamos os embasamentos com as quais se referenciam, ligados diretamente aos aportes teóricos de Rorty, ou seja, no neo-pragmatismo. Sobre essa perspective, Duayer (2001, p. 23-24) nos esclarece que A ontologia desse mundo perene do capital estreita o horizonte da prática humano-social. Essa é a proposta explícita de Rorty. No mundo que liquidou a história, a ontologia hegemônica tem que ser anistórica. E tem que impugnar, como metafísica, toda ontologia da sociedade que insistia em sua historicidade. Contra a metafísica do que dominam grande narrativa marxiana, contra esta ontologia que indaga o papel possível do sujeito no curso objetivo, porém não determinista, da história, tais correntes contrapõem a ontologia do existente. Ontologia esta que melhor seria qualificada como metafísica do existente, existente metafísico porque não pode vir a ser outro pela simples razão de que a teoria impugna a priori qualquer prática emancipatória do sujeito. Qualquer outra atitude representaria o abominável desejo de fazer história. Refletir sobre a educação e a educação física dessa maneira nos remete a uma intervenção fragmentada, sem a visão da totalidade, e que reproduz os preceitos do atual modelo social que nos concede unicamente a construção de um homem unilateral, incitando-nos ao estranhamento. Podemos comparar a educação nesse modelo à análise de Engels sobre a educação fornecida pelos burgueses aos proletariados: Engels observava que o ensino transmitido nas escolas criadas pela burguesia aos operários – em resumo, pelas classes dominantes às classes subalternas – ao fazê-lo perder toda a sua “disponibilidade” original, levava-os a uma autêntica e verdadeira atrofia moral e desolação intelectual […]. (MANACORDA, 2007, p. 81, itálicos nossos). Rev.Eletrônica Pesquiseduca, Santos, v. 05, n. 09, p.145 – 163, jan.-jul., 2013 154 Vidalcir Ortigara; Matheus Bernardo Silva; Ademir Damazio; Carlos Augusto Eusébio Contudo, partimos de uma formação de homem que Marx (2009, p. 108, itálicos no original) nos apresenta: O homem se apropria da sua essência omnilateral de uma maneira omnilateral, portanto como um homem total. Cada uma das suas relações humanas com o mundo, ver, ouvir, cheirar, degustar, sentir, pensar, intuir, perceber, querer, ser ativo, amar, enfim todos os órgãos da sua individualidade, assim como os órgãos que são imediatamente em sua forma como órgãos comunitários, são no seu comportamento objetivo ou no seu comportamento para com o objeto a apropriação do mesmo, a apropriação da efetividade humana; seu comportamento para com o objeto é o acionamento da efetividade humana (por isso ela é precisamente tão multíplice […] quanto multíplices são as determinações essenciais e atividades humanas), eficiência humana e sofrimento humano, pois o sofrimento, humanamente apreendido, é uma autofruição do ser humano. Contribuindo com esse posicionamento, Lukács (2010, p. 109) acrescenta: “O ser humano é também um ser fundamentalmente históricosocial, na medida em que seu passado constitui, sob a forma do seu próprio passado, um momento importante do seu ser e atuar presentes.” E podemos concretizar essa questão, explicitando com uma passagem da obra de Leontiev (1978, p. 100): No decurso da sua vida, o homem assimila as experiências das gerações precedentes; este processo realiza-se precisamente sob a forma da aquisição das significações e na medida desta aquisição. A significação é, portanto, a forma sob a qual um homem assimila a experiência humana generalizada e refletida. Por essas condições, temos como proposição a necessidade do debate ontológico (ORTIGARA, 2002) e como o mesmo se manifesta na atividade pedagógica no campo educacional, por conseguinte, na educação física, sob a égide de uma postura e de uma intervenção crítica. E, para que isso se torne eficaz, necessitamos refletir a partir de uma conjuntura predominantemente histórico-social. No entanto, A história não é aqui, porém, um simples saber, mas o esclarecimento dos motivos traduzidos na práxis enquanto passado, daquelas forças motoras do passado que, ao dar expressão plástica à relação presente dos seres humanos com a sua própria generidade, poderiam ser mais eficazes que os simples fatos do presente. (LUKÁCS, 2010, p. 110). Rev.Eletrônica Pesquiseduca, Santos, v. 05, n. 09, p.145 – 163, jan.-jul., 2013 155 Vidalcir Ortigara; Matheus Bernardo Silva; Ademir Damazio; Carlos Augusto Eusébio Torna-se, portanto, impossível pensar a atividade pedagógica, sem basear-se nas fundamentações histórico-sociais. Pensar e agir excluindo esse posicionamento é efetivar a intervenção docente de uma maneira ahistórica e a-dialética. Referimo-nos a uma prática pedagógica, tendo como elemento fundante o conhecimento científico produzido e acumulado historicamente; há, então, a necessidade de compreender que sentido é dado a esse conhecimento científico – no recorte da cultura corporal – no bojo da sociedade capitalista e, com isso, propor que os sentidos da cultura corporal devem atribuir outros conceitos, direcionados para uma mudança societal. Os sentidos das significações da cultura corporal Como já anunciado, nesse momento iremos tratar a respeito dos sentidos que norteiam o conhecimento científico da cultura corporal. Concebendo que a cultura corporal é o objeto de estudo da educação física, compreendemos que a mesma deve ter em seu horizonte uma perspectiva crítica, que possui em sua especificidade “[…] desenvolver uma reflexão pedagógica sobre o acervo de formas de representação do mundo que o homem tem produzido no decorrer da história, exteriorizadas pela expressão corporal […]”, isto é, atribuindo aos elementos “[…] que podem ser identificados como formas de representação simbólica de realidades vividas pelo homem, historicamente criadas e culturalmente desenvolvidas.” (COLETIVO DE AUTORES, 1992, p. 38). Partimos da compreensão de “[…] que a materialidade corpórea foi historicamente construída e, portanto, existe uma cultura corporal, resultado de conhecimentos socialmente produzidos e historicamente acumulados pela humanidade […]”. Esses conhecimentos […] necessitam ser retraçados e transmitidos para os alunos na escola.” (COLETIVO DE AUTORES, 1992, p. 39, itálicos nossos). O retraçar dos conteúdos implica explicitar a orientação em relação ao contexto social cindido em classes, ou seja, estabelecer em defesa de qual grupo social nos posicionamos na “[…] luta entre as classes sociais a fim de afirmarem seus interesses.” (idem, p. 23). Isso exige que reflitamos sobre os sentidos do significado que a cultura corporal possui no âmago da realidade social vigente e que perspectivas temos para uma ressignificação desses sentidos. Nesse contexto, compreendemos que o significadovii é Rev.Eletrônica Pesquiseduca, Santos, v. 05, n. 09, p.145 – 163, jan.-jul., 2013 156 Vidalcir Ortigara; Matheus Bernardo Silva; Ademir Damazio; Carlos Augusto Eusébio A generalização da realidade que é cristalizada e fixada num vetor sensível, ordinariamente a palavra ou locução. É a forma ideal, espiritual da cristalização da experiência e da prática social da humanidade. A sua esfera das representações de uma sociedade, a sua ciência, a sua língua existem enquanto sistemas de significação correspondentes. A significação pertence, portanto, antes demais ao mundo dos fenômenos objetivamente históricos. [...] A significação é, portanto, a forma sob a qual um homem assimila a experiência humana generalizada e refletida (LEONTIEV, 1978, p. 100-101). A prática social, portanto, é a gênese dos significados e dos sentidos, ou seja, o indivíduo situa-se no seio de um processo de assimilação de produções realizadas no decorrer da história pela humanidade. Essa relação ocorre do material real para a consciência humana. A relação apresentada faz com que o indivíduo tenha no seu significado a realidade objetiva. O significado efetiva uma função mediadora do reflexo do mundo pelo homem, no momento em que o mesmo tenha consciência dessa realidade. “O homem encontra um sistema de significações pronto, elaborado historicamente, e apropria-se dele tal como se apropria de um instrumento, esse precursor material da significação.” (LEONTIEV, 1978, p. 96) Os significados e os sentidos possuem uma relação íntima no âmbito da consciência humana; no entanto, partem de uma relação e função distinta. “Eles estão intrinsecamente ligados um ao outro, [...] é o sentido que se exprime nas significações (como o motivo nos fins) e não a significação no sentido” (LEONTIEV, 1978, p. 98). A estrutura que rege a consciência do homem está fundamentalmente ligada à estrutura social humana, na sua atividade vital, na realidade social que o indivíduo encontra-se inserido. A transformação essencial que caracteriza a consciência nas condições do desenvolvimento da sociedade de classes é a modificação que sofre a relação que existe entre o plano dos sentidos e o plano das significações nas quais se produz a tomada de consciência (LEONTIEV, 1978, p. 114). Os sentidos inseridos na ação humana, no bojo da sociedade capitalista, atribuem características dessa realidade social, ou seja, uma formatação retrógada, unilateral, condicionando o homem apenas aos interesses da classe dominante, em torno do capital, da divisão social do trabalho, da propriedade privada. Rev.Eletrônica Pesquiseduca, Santos, v. 05, n. 09, p.145 – 163, jan.-jul., 2013 157 Vidalcir Ortigara; Matheus Bernardo Silva; Ademir Damazio; Carlos Augusto Eusébio Em uma nova perspectiva, os sentidos devem constituir-se em um formato de passagens mais complexas, apresentando-se como uma estrutura integrada. Buscamos explicitar que somos desfavoráveis aos sentidos dados na sociedade capitalista, na qual os indivíduos buscam apenas seu interesse particular, que para eles não guarda uma conexão com seu interesse coletivo, que este último é imposto a eles como um interesse que lhes é “estranho” e que deles “independe”, por sua vez, como um interesse “geral” especial, peculiar; ou, então, os próprios indivíduos têm de mover-se em meio a essa discordância, como na democracia. (MARX; ENGELS, 2007, p. 37, itálicos no original) Dessa maneira, de acordo com Leontiev (1978, p. 139), a consciência humana desenvolve-se, portanto, nas suas duas mudanças qualitativas por definhamento das suas particularidades anteriores que cedem o seu lugar a outras. Na aurora da sociedade humana, a consciência passa pelas diferentes etapas da sua formação inicial; só o desenvolvimento ulterior da divisão social do trabalho, da troca e das formas de propriedade acarreta um desenvolvimento da sua estrutura interna, tornando-a, porém, limitada e contraditória; depois, chega um tempo novo, o tempo de novas relações, que cria uma nova consciência do homem. Os sentidos do conhecimento científico da cultura corporal também devem ser efetivados de uma nova maneira, ou seja, necessitam ter uma ressignificação, para constituirmos elementos para a atividade docente possuir em seu horizonte uma perspectiva crítica frente à realidade social vigente. Nesse caso, Marx e Engels (1934, apud LUKÁCS, 2010, p. 101) explicitam que só no capitalismo apresenta-se a diferença do indivíduo pessoal diante do indivíduo de classe, a causalidade [os sentidos/significado] das condições de vida para o indivíduo. […] A concorrência e a luta dos indivíduos entre si produz e desenvolve essa causalidade como tal. Por isso, na ideia, os indivíduos são mais livres do que antigamente sob domínio da burguesia, porque suas condições de vida são fortuitas; na realidade, naturalmente eles são menos livres, porque mais subsumidos sob a força objetiva. Julgamos, então, a hipótese de que a educação e a educação física não possuem apenas a função de produzir em cada ser humano o que a humanidade produziu histórica e coletivamente, pois, compreendemos que essa produção se torna uma reprodução estranhada do indivíduo. Se Rev.Eletrônica Pesquiseduca, Santos, v. 05, n. 09, p.145 – 163, jan.-jul., 2013 158 Vidalcir Ortigara; Matheus Bernardo Silva; Ademir Damazio; Carlos Augusto Eusébio considerarmos que o papel docente é transmitir o conhecimento, na sua forma mais elaborada, que foi produzida pela humanidade, não levando em consideração os sentidos que são dados aos significados – em uma reificação – que a cultura corporal é refletida e interpretada, estaremos contribuindo para a formação humana atrelada aos preceitos capitalistas. Essa relação do capital com a educação pode ser compreendida na contundente argumentação de Mészáros (2005, p. 25-26, itálicos no original): Poucos negariam hoje que os processos educacionais e os processos sociais mais abrangentes de reprodução estão intimamente ligados. Consequentemente, uma reformulação significativa da educação é inconcebível sem a correspondente transformação do quadro social no qual as práticas educacionais da sociedade devem cumprir as suas vitais e historicamente importantes funções de mudança. Mas, sem um acordo sobre esse simples fato, os caminhos dividem-se nitidamente. Pois caso não se valorize um determinado modo de reprodução da sociedade como o necessário quadro de intercâmbio social, serão admitidos, em nome da reforma, apenas alguns ajustes menores em todos os âmbitos, incluindo o da educação. As mudanças sob tais limitações, apriorísticas e prejulgadas, são admissíveis apenas com o único e legítimo objetivo de corrigir algum detalhe defeituoso da ordem estabelecida, de forma que sejam mantidas intactas as determinações estruturais fundamentais da sociedade como um todo, em conformidade com as exigências inalteráveis da lógica global de um determinado sistema de reprodução. Podem ajustar-se as formas pelas quais uma multiplicidade de interesses particulares conflitantes se deve conformar com a regra geral preestabelecida da reprodução da sociedade, mas de forma nenhuma pode-se alterar a própria regra geral. Todavia, analisamos que devem ser apresentados novos sentidos a esses significados não só da cultura corporal, mas de todos os demais significados que compõem a educação, perspectivando a transformação em nossa realidade social. Conduzindo o processo educacional não para a correção de algo que no momento atual torna-se impossível de corrigir – a ordem social estabelecida –, mas, partindo da premissa inegociável de apresentarmos possibilidades de uma aversão do capital. Estamos mencionando que a educação física escolar tenha, como principal função, ressignificar os sentidos da produção no âmbito da cultura corporal já acumulada histórica e coletivamente pela humanidade, dando direcionamentos a novos sentidos que possam perspectivar aquilo que atribuímos que seja função da educação, da educação física, em suma, Rev.Eletrônica Pesquiseduca, Santos, v. 05, n. 09, p.145 – 163, jan.-jul., 2013 159 Vidalcir Ortigara; Matheus Bernardo Silva; Ademir Damazio; Carlos Augusto Eusébio da atividade pedagógica docente: “presentificar” às novas gerações o conhecimento científico, possibilitando o estabelecimento de novos sentidos. Considerações Finais Nessa explicitação procuramos apresentar uma hipótese de analisarmos essa problemática que rege a compreensão do papel da educação e o nosso recorte no âmago da educação física e da atividade pedagógica. Analisamos que a educação não pode assumir uma função de produzir no aluno apenas aquilo que foi acumulado histórica e coletivamente na sua forma mais elaborada, sem levar em consideração os sentidos que são dados aos significados que permeiam essa produção. O fato de não questionar esse fator e não apresentar novos sentidos a esses significados remete-nos ao erro que várias orientações pedagógicas já efetivaram e vêm efetivando, ou seja, cair novamente nas armadilhas que o sistema capitalista possui, não perspectivando a superação do mesmo. Como Tonet (2005, p. 235) nos apresenta, um dos requisitos para uma prática educativa que perspective a emancipação humana é articular essa prática “[…] com as lutas desenvolvidas pelas classes subalternas, especialmente com as lutas daqueles que ocupam posições decisivas na estrutura produtiva.” Não dar sentido a esse posicionamento nos credencia à reprodução social. Perspectivamos a formação de um “[...] cidadão crítico e consciente da realidade social em que vive, para poder nela intervir na direção dos seus interesses de classe” (COLETIVO DE AUTORES, 1992, p. 36). Pois é no conjunto das relações sociais que os indivíduos se formam enquanto ser social. No interior dessas relações sociais – no confronto das classes sociais – devemos pensar nossa intervenção pedagógica de uma maneira “judicativa” que prevaleça aos interesses dos oprimidos. Concordamos com Libâneo (1985, p. 39), quando afirma que “[…] não basta que os conteúdos sejam apenas ensinados, ainda que bem ensinados, é preciso que se liguem de forma indissociável à sua significação humana e social.” Pois, mesmo transmitindo o conhecimento científico à classe subalterna, no sentido em que o mesmo se encontra, conduz-nos ainda para a formação unilateral, reprodutora da nossa realidade social e, nessa situação, tentando estabelecer um modus vivendi para uma impossível harmonização das classes. Rev.Eletrônica Pesquiseduca, Santos, v. 05, n. 09, p.145 – 163, jan.-jul., 2013 160 Vidalcir Ortigara; Matheus Bernardo Silva; Ademir Damazio; Carlos Augusto Eusébio Referências ALMEIDA, F. Q; VAZ, A. F. Do giro linguístico ao giro ontológico na atividade epistemológica em educação física. Movimento, Porto Alegre, v. 16, n. 03, p. 11-29, jul./set. 2010. BRACHT, V. Educação física e aprendizagem social. Porto Alegre: Magister, 1992. COLETIVO DE AUTORES. 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Porém ele continue a ser o modelo da práxis social. i Segundo Kosik (2010, p. 44), “Totalidade significa: realidade como um todo estruturado, dialético, no qual ou do qual um fato qualquer (classes de fatos, conjunto de fatos) pode vir a ser racionalmente compreendido. Acumular todos os fatos não significa ainda conhecer a realidade; e todos os fatos (reunidos em seu conjunto) não constituem, ainda, a totalidade. Os fatos são conhecimento da realidade se são compreensíveis como fatos de um todo dialético – isto é, se não são átomos imutáveis, indivisíveis e indemonstráveis, de cuja reunião a realidade saia constituída – se são entendidos como partes estruturais do todo.” ii Sobre a inclusão e o desenvolvimento da educação física como componente curricular, ver Soares (1994), Bracht (1992). iii Obra escrita por um coletivo de autores que, para expressar o caráter social e coletivo da obra, optou por fazer a referência dessa maneira, já consagrada no Brasil. Foi escrita por: Carmem Lúcia Soares, Celi Nelza Zülke Taffarel, Elizabeth Varjal, Lino Castellani Filho, Micheli Ortega Escobar e Valter Bracht. iv “[…] o fio principal que perpassa todos […] [os] princípios pós-modernos é a ênfase na natureza fragmentada do mundo e do conhecimento humano. As implicações políticas de tudo isso não são bem claras: o self humano é tão fluido e fragmentado (o ‘sujeito descentrado’) e nossas identidades, tão variáveis, incertas e frágeis que não pode haver base para solidariedade e ação coletiva fundamentadas em uma ‘identidade’ social comum (uma classe), em uma experiência comum, em interesses comuns.” (WOOD, 1999, p. 13, itálicos no original). v Compreendemos que “A dialética trata da ‘coisa em si’. Mas a ‘coisa em si’ não é uma coisa qualquer e, na verdade, não é nem mesmo uma coisa: a ‘coisa em si’, de que trata a filosofia, é o homem e o seu lugar no universo, ou (o que em outras palavras exprime a mesma coisa): a vi Rev.Eletrônica Pesquiseduca, Santos, v. 05, n. 09, p.145 – 163, jan.-jul., 2013 162 Vidalcir Ortigara; Matheus Bernardo Silva; Ademir Damazio; Carlos Augusto Eusébio totalidade do mundo revelada pelo homem na história e o homem que existe na totalidade do mundo.” (KOSIK, 2010, p. 248). Nesse artigo, trabalharemos com a nomenclatura “significado”, embora em algumas traduções apareça como “significação”. Quando for o caso de citações manteremos a forma da referida edição. vii Sobre os autores Vidalcir Ortigara, Doutor em Educação, é professor do Programa de PósGraduação em Educação da Universidade do Extremo Sul Catarinense – UNESC. Matheus Bernardo Silva é Mestrando em Educação na Universidade Federal do Paraná UFPR. Ademir Damazio, Doutor em Educação, é professor do Programa de PósGraduação em Educação da Universidade do Extremo Sul Catarinense – UNESC. Carlos Augusto Euzébio, Mestre em Educação pela Universidade do Extremo Sul Catarinense – UNESC, é professor do Curso de Educação Física da UNESC. Recebido em 02 de outubro de 2012 Aceito em 30 de março de 2013 Rev.Eletrônica Pesquiseduca, Santos, v. 05, n. 09, p.145 – 163, jan.-jul., 2013 163