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As concepções sobre as teorias evolutivas em
licenciandos em ciências biológicas e suas
implicações para o ensino
Rúbia Amanda Guimarães FRANCO1
Danilo Seithi KATO2
Resumo: O presente artigo analisa as concepções de futuros professores sobre
conceitos específicos de Teorias Evolutivas e suas implicações para a formação
inicial. A pesquisa consistiu na análise de produções textuais realizadas por
estudantes do quinto semestre de ciências biológicas de um Centro Universitário
do Estado de São Paulo ao final da disciplina de Evolução e Biogeografia no
ano de 2011. Além disso, o plano de aula da disciplina foi verificado com o
intuito de identificar objetivos e perspectivas da mediação proposta. Foram
identificadas concepções relacionadas a teorias darwinistas, lamarckistas e
concepções alternativas compostas por um sincretismo de ideias das diferentes
teorias evolutivas. As categorias construídas possibilitaram a discussão sobre as
concepções dos professores em formação inicial e as implicações para a docência
relativa ao ensino de conceitos específicos da Teoria Evolutiva, tal como o de
seleção natural.
Palavras-chave: Concepção de Professores. Ensino de Evolução. Teorias Evolutivas.
1
Rúbia Amanda Guimarães Franco. Especialista em Ensino de Ciências e Biologia pelo Centro
Universitário Claretiano de Batatais (SP). Licenciada em Ciências Biológicas pela mesma instituição.
E-mail: <[email protected]>.
Danilo Seithi Kato. Docente no Instituto de Ciências Exatas, Naturais e Educação (ICENE),
Departamento de Educação em Ciências, Matemática e Tecnologias (DECMT) da Universidade
Federal do Triângulo Mineiro (UFTM). Doutor em Educação Escolar pela UNESP e Mestre em Ensino
de Ciências pela Universidade de São Paulo (USP). E-mail: <[email protected]>.
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The conceptions about the evolutionary
theories in Biological Sciences undergraduates
and their implications for teaching
Rúbia Amanda Guimarães FRANCO
Danilo Seithi KATO
Abstract: The present article analyses the future teachers’ conceptions about
specfic concepts of Evolutionary Theories and their implications for the initial
formation. This research consisted of an analysis of textual productions carried
out by undergraduate students of Biological Sciences at a university center in
the State of São Paulo, at the end of the discipline “Evolução e Biogeografia”, in
2011. In addition, the lesson plan was verified in order to identify the goals and
perspectives of the proposed mediation. Conceptions related to Darwinist and
Lamarckian theories, as well as alternative conceptions consisted of a syncretism
of ideas of the various evolution theories were identified. The constructed
categories allowed a discussion about the conceptions of teachers in initial
formation and the implications for teaching related to the teaching of specfic
concepts of the Evolutionary Theory, such as the natural selection one.
Keywords: Teachers’ Conceptions. Teaching of Evolution. Evolutionary
Theories.
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1.  INTRODUÇÃO
No ensino de ciências e biologia a evolução biológica é um
dos conteúdos de grande importância, pois caracteriza um eixo estruturante do currículo escolar das Ciências Biológicas (EL-HANI;
MEYER, 2005). Contudo, nota-se uma dificuldade de se trabalhar
com esse tema na sala de aula por conta de diversos fatores, dentre
eles: as características epistemológicas desse conhecimento, a falta
de materiais didáticos adequados, bem como a formação deficitária
dos professores em relação a esse conteúdo escolar. O presente trabalho tem o enfoque no aspecto da formação inicial de professores
no que concerne às concepções que possuem sobre a temática da
Evolução Biológica. Mello (2008) relata que por mais que exista
uma infinidade de pesquisas sobre o conceito de evolução biológica, muitas questões relacionadas à evolução ainda não são bem
compreendidas. As concepções dos futuros professores podem revelar aspectos relevantes no processo de formação inicial e suas
implicações para o ensino de biologia.
A hipótese inicial do trabalho era de que o conhecimento dos
licenciandos sobre as teorias evolutivas seria diverso, principalmente por suas características epistemológicas e históricas sobre o
processo de construção desses modelos de pensamento. Aspectos
abstratos de pensar as mudanças nas espécies configuram uma dificuldade na compreensão das concepções científicas sobre o tema.
El-Hani e Meyer (2005) relatam que a evolução biológica
consiste nas mudanças ocorridas nas espécies ao longo do tempo.
Segundo Futuyma (2002, p. 07), “[...] as mudanças nas populações
que são consideradas evolutivas são aquelas herdáveis via material
genético, de uma geração para outra”. Dessa forma, é evidente que
a compreensão dessas teorias exige um pensamento abstrato e complexo que envolva áreas distintas da biologia, tais como genética,
ecologia, paleontologia, entre outras.
No ensino de ciências biológicas, diversos fatores podem interferir na qualidade do aprendizado, destacando a importância do
ensino de evolução biológica. Chaves (1993) relata que além da
escassez de pesquisas sobre as concepções relacionadas ao tema,
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na maioria das vezes, esse conteúdo se encontra nos últimos capítulos dos livros didáticos, e caso o professor não consiga abordá-lo
juntamente com os demais conteúdos, ele acaba sendo deixado de
lado, o que mostra um descaso pelo conteúdo.
As concepções distantes do arcabouço conceitual-científico
identificadas em alunos podem ter origem tanto cultural, como por
meio de uma visão científica distorcida, ou até mesmo podem estar
ligadas diretamente a de seus professores. Dessa questão, surge a
importância de se analisar as concepções de professores em formação inicial, já que a deficiência na formação de docentes está diretamente relacionada com a má formação de alunos, principalmente
quando se leva em consideração a abordagem de assuntos ligados
às teorias evolutivas e outros conceitos afins (CHAVES, 1993).
Oleques, Santos e Boer (2011) destacam que em pesquisas
feitas no Brasil as compreensões acerca das teorias evolutivas de
alguns professores não condizem com a atual teoria científica aceita. Chaves (1993) aponta que as concepções de futuros professores
podem se mostrar muito parecidas com o conhecimento que eles
possuíam quando ingressaram no curso universitário, evidenciando
um outro problema, uma vez que esses professores, mantendo o
mesmo entendimento anterior ao curso e estando em sala de aula,
podem reproduzir concepções distorcidas do conhecimento científico.
Coutinho, Mortimer e El-Hani (2007) analisaram as concepções de “vida” de pós-graduandos em Ecologia e em Genética. Para
isso, construíram perfis conceituais. Segundo esses autores:
A noção de perfil conceitual, ou seja, a idéia de que
um único conceito pode ter diferentes zonas que
correspondem a diferentes maneiras de ver, representar
e significar o mundo, e são usadas pelas pessoas
em contextos diferenciados, foi desenvolvida e está
descrita em Mortimer (1994 1995 e 2000). Segundo esta
noção, qualquer indivíduo pode possuir mais de uma
forma de compreensão de um determinado conceito,
ou seja, diferentes zonas de um perfil conceitual
podem conviver no mesmo indivíduo, correspondendo
a formas distintas de pensar e falar, que podem ser
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usadas em contextos específicos. (COUTINHO,
MORTIMER e EL-HANI, 2007, p. 02).
Assim como o conceito de vida, vários conceitos podem
apresentar diversas concepções; para o presente trabalho, essa noção de perfil conceitual será utilizada para analisar as concepções
acerca das teorias evolutivas.
O objetivo deste trabalho é identificar as concepções sobre
as teorias evolutivas em licenciandos do curso de Ciências Biológicas que frequentaram a disciplina de Evolução e Biogeografia
no último ano de graduação. Além disso, pretende-se discutir as
implicações das concepções para a formação inicial de professores
de biologia.
2.  PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A partir desses fatores destacados que interferem no ensino
de evolução biológica, optou-se por investigar as concepções de
licenciandos em ciências biológicas, durante o curso de Evolução
e Biogeografia. O objeto da pesquisa constituiu-se de trabalhos
desenvolvidos pelos alunos de licenciatura no ano de 2011, com
o objetivo de identificar as concepções dos alunos relacionadas a
algumas das teorias da evolução.
O presente trabalho insere-se no contexto de uma pesquisa
qualitativa em que os dados coletados são descritivos (FLICK,
2004). Foram analisadas 7 produções textuais dos estudantes
que compunham a atividade final e de avaliação da disciplina
mencionada. A exploração desses textos e a construção das
categorias de análise foram realizadas na perspectiva da análise
de conteúdo de Bardin (2011), em que as fases de pré-codificação
e categorização foram realizadas a partir da análise exaustiva do
objeto da pesquisa. Foi realizada, também, uma leitura do plano
de ensino da disciplina a fim de identificar as intenções deste para
auxiliar na compreensão e análise dos trabalhos produzidos pelos
licenciandos.
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3.  RESULTADOS
Análise do plano de ensino
O plano dessa disciplina foi consultado e identificou-se que
a ideia principal era colocar os estudantes em contato com a história do pensamento evolutivo para que estes pudessem identificar
os processos e procedimentos de se pensar as teorias evolutivas.
Além disso, outra intenção era de que os licenciandos pudessem
perceber as diferenças entre as principais teorias e pensamentos dos
autores que pensaram o processo evolutivo, bem como os principais conceitos envolvidos, além de promover a argumentação dos
licenciandos no texto escrito. Sugerindo temas a serem explicados
à luz da teoria evolutiva.
Análises das produções textuais
Seguindo as etapas destacas acima por Bardin (2011), após a
análise dos trabalhos, os dados obtidos foram separados de acordo
com o conteúdo relacionado às teorias evolutivas e aproximação
de ideias, possibilitando a construção de três categorias, sendo elas
relacionadas conforme as ideias de Lamarck, aproximações das
ideias de Darwin, e concepções alternativas – miscelâneas de ideias
das teorias evolutivas, apresentadas no quadro abaixo:
Quadro 1. Categorias das concepções sobre as teorias evolutivas
identificadas nas produções textuais dos licenciandos a partir da
análise de conteúdo.
Categorias
1. Aproximações com as
ideias de Lamarck
Descrição
Destacam-se os trabalhos nos quais foi
possível identificar aproximações com as
ideias de Lamarck
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Categorias
2. Aproximações com as
ideias de Darwin
Descrição
Destacam-se os trabalhos nos quais foi possível
identificar aproximações com as ideias darwinistas
Nesta categoria, enquadram-se os trabalhos
3. Concepções alternativas – que apresentaram ideias de mais de uma teoria
miscelâneas de ideias das evolucionista, além de concepções alternativas para
fenômenos biológicos.
teorias evolutivas
Fonte: adaptado de Bardin (2011).
Aproximações com as ideias de Lamarck
Nesta categoria, apresentam-se trechos em que os discentes
utilizaram o termo Lamarck e/ou lamarckismo em seu trabalho.
No “O desaparecimento de órgãos vestigiais de acordo com a
evolução”, podemos notar uma confusão relacionando a lei do uso
e desuso, que fica clara na seguinte análise:
“O terceiro molar também apresenta grande discussão
entre pesquisadores, pois se apresenta como evidencia
evolutiva, já que para muitos acreditam ser apenas uma
modificação pouco importante, não sendo considerado
processo evolutivo. Já a teoria evolutiva mostra o contrário desse argumento, sendo que este dente está desaparecendo devido a falta de seu uso, em consequência da dieta
alimentar adotada pelo homem”.
A ideia de que o órgão foi eliminado por falta de seu uso
está relacionada à ideia proposta por Lamarck, lei do uso e desuso.
Como já foi destacado anteriormente, a teoria da seleção natural
está relacionada à eliminação das variações desfavoráveis, enquanto
as favoráveis são mantidas (DARWIN, 2004). Dessa maneira, é
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importante notar que o esforço em explicar um fenômeno biológico
– nesse caso o terceiro molar – em uma perspectiva evolutiva é
levado a cabo a partir da perspectiva do indivíduo e não de uma
população induzindo a relação do uso e desuso constituída por
Lamarck. Assim, seria possível o professor utilizar uma explicação
mais próxima das ideias de Lamarck, contudo, é necessário situar
historicamente esse pesquisador e a própria discussão teórica entre
as teorias em questão.
Essa perspectiva pode gerar uma incoerência conceitual caso
o fenômeno em que a explicação ocorra seja realizado a partir do
indivíduo e não da população. Assim, a interpretação restrita às
ideias de Lamarck não é menos científica que a darwinista. Contudo, precisa ser situada no âmbito da discussão histórica em que
essas ideias estão postas.
O trecho a seguir também relata sobre Lamarck:
“De acordo com Lamarck, em sua obra Philosophie
zoologique (Filosofia Zoológica) publicada em 1809,
a “progressão” ou aperfeiçoamento” das espécies se
devia a uma sequência de fatos, sendo eles: as mudanças
ambientais originam novas necessidades; as necessidades
determinadas pelas mudanças ambientais conduzem
ao uso e desuso de uns ou outros órgãos levando estes
a se desenvolverem ou atrofiarem-se e finalmente, os
caracteres adquiridos são transmitidos de geração em
geração através da hereditariedade.”
Assim como foi descrito pelos discentes no trabalho, El-Hani
e Meyer (2005) descrevem que, segundo Lamarck, o ambiente forçaria mudanças de hábitos, e essas mudanças viriam a interferir no
padrão de uso e desuso dos órgãos; essas alterações seriam transmitidas aos seus descendentes.
Mello (2008) relata que Lamarck destacou-se por sua lei dos
caracteres adquiridos com o exemplo do pescoço da girafa, mas
o que poucos sabem é que Lamarck também propôs outras
leis pouco divulgadas. As leis de Lamarck são: tendência para o
aumento da complexidade, surgimento de órgãos em função das
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necessidades e que acabam mantendo, lei do uso e desuso, herança
dos caracteres adquiridos.
Aproximações com as ideias de Darwin
Na segunda categoria foram selecionados trechos que abordavam ideias aproximadas àquelas propostas por Darwin.
Destaca-se no trabalho 1, sendo ele uma redação:
Seleção Natural: atua sobre a variabilidade genética de
uma população, que podem resultar de mutações, migração (fluxo-genico) e recombinação genética. Isso significa que os indivíduos que possuem fenótipos favoráveis as
condições do meio tem maior chances de sobrevivência e
de sucesso reprodutivo, é um processo permanente e está
em todas as populações.
Santilli (2011, p. 195) relata que:
[...] a evolução é descrita como um processo de mudanças
nas frequências gênicas em uma população e há consenso
sobre ser a seleção natural um dentre outros mecanismos
de evolução. Mas não há consenso sobre o papel das
entidades envolvidas na seleção.
Essa concepção coloca a seleção como uma entidade isolada
que atua e age sobre a variabilidade genética. Por isso, ao pensar a
seleção natural, o licenciando remete-se à ideia de um elemento ou
força maior que escolhe o mais apto, deixando as relações complexas entre ser vivo e ambiente à margem.
Já no trabalho 2 o discente utiliza a conceituação darwinista
para explicar os fatores que interferem no crescimento populacional:
[...] Darwin através de observações supôs que fatores
alimento espaço controlariam o tamanho de todas as
populações. Sendo assim os descendentes de um casal
de animal haveria uma seleção natural, sobrevivendo os
mais aptos e se reproduzindo apenas os que vencessem
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a competição por espaço e alimento. Nessa competição
seriam favorecidos os indivíduos de uma população que
melhor se adaptassem as condições ambientais. Os outros
seriam eliminados. [...].
Nessa produção, o licenciando evidencia a ideia dos fatores
externos limitantes do crescimento populacional. Nesse caso, a seleção natural não aparece como uma “entidade” ou uma ferramenta
de escolha da diversidade, mas sim um conjunto de condições ambientais e variações biológicas que se integram em uma perspectiva
de morte diferencial.
Essa morte diferencial significa que a morte é a condição
dominante, e a sobrevivência, condicionada por um emaranhado
de relações complexas entre o ambiente e as populações. Darwin
(2004, p. 93) relata que:
[...] não há exceção nenhuma a regra segundo a qual todos
os seres vivos, aumentando naturalmente a uma velocidade alta, se não forem destruídos, cobrirão a terra em tão
pouco tempo pela descendência proveniente de um único
casal.
El-hani e Meyer (2005, p. 40) descrevem, ainda, que “[...] o
aumento da disponibilidade de recursos naturais não acompanha o
crescimento populacional”. A luta pela existência ocorre devido ao
grande número de populações e poucos recursos disponíveis, ocorrendo uma disputa na natureza.
Essa concepção se diferencia daquela apresentada na primeira categoria na medida em que traz não só o pensamento de que a
população é a unidade evolutiva, mas também o papel das interações entre ambiente e variação biológica na definição do conceito
de seleção natural. Contudo, podemos identificar ideias diferentes
sobre esse conceito, em que ora se apresenta como entidade externa, ora como fruto de um conjunto de relações entre os seres vivos
e o meio em constante mudança e que limita o crescimento populacional.
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No trabalho 3, destaca-se:
“O conceito básico de seleção natural é que as características favoráveis hereditárias tornam-se mais comuns em
gerações sucessivas de uma população de organismos que
se reproduzem e que características desfavoráveis hereditárias se tornam menos comuns”.
Segundo El-hani e Meyer (2005 p. 41), as populações dos organismos apresentam variabilidades e estas podem ser transmitidas
aos descendentes por meio da hereditariedade.
Também no trabalho 3, destacamos:
“A seleção natural age no fenótipo, ou nas características ou nas características observáveis de um organismo,
de tal forma que indivíduos com fenótipos favoráveis têm
mais chances de sobreviver e se reproduzir do que aqueles
com fenótipos menos favoráveis”.
Futuyma (2002, p. 69) descreve que fenótipos correspondem
“[...] a(s) característica(s) observável(is) de um organismo, p.ex.,
cor dos olhos, frequência respiratória, número de descendentes produzidos. O fenótipo é frequentemente determinado tanto por fatores genéticos como ambientais”.
Já no trecho abaixo os discentes escolheram uma citação que
relata o seguinte:
“A contínua utilização do controle químico com agrotóxicos não seletivos feitos pelo homem, sem rotação de culturas pode causar desequilíbrios mediante a eliminação
de insetos benéficos, explosões populacionais de pragas,
principalmente a perda de eficácia de inseticidas mediante a seleção natural de linhagem de insetos resistentes a
estes compostos químicos. Produtos como pesticidas sintéticos aceleram o crescimento de resistência genética a
pesticidas nas pragas, pois através da seleção natural as
pragas sobreviventes darão origem a pragas mais potentes (MILLER, 2007)”.
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No trabalho 5 a aluna utiliza a seleção artificial do homem na
eliminação de insetos com o uso de inseticidas. No segundo momento, destaca que mesmo com o uso de inseticidas aqueles insetos
resistentes a estes não serão eliminados; fazendo referência à ação
da seleção natural.
Destacando ainda a variação genética, Futuyma (2002, p. 37)
exemplifica:
[...] populações de uma mosca varejeira que ataca ovelhas
desenvolveram resistência ao inseticida diazinon. Inicialmente, as populações resistentes apresentaram atraso
de desenvolvimento e anormalidades físicas, mas, mais
adiante, esses traços diminuíram devido à seleção de outros genes que melhoraram os efeitos deletérios.
Entre as teorias de Darwin apresentadas pelos alunos, a seleção natural, umas das teorias centrais da biologia evolutiva proposta por Darwin, foi abordada em diversos aspectos pelos licenciandos, conceitos e termos de diferentes áreas das Ciências Biológicas
aparecem nas explicações, bem como definições do conceito analisado neste trabalho, tais como fluxo gênico, populações, variação,
reprodução, diversidade, entre outros.
Apesar de quase sempre vinculada a Darwin, Carmo, Bizzo
e Martins (2009) relatam que Wallace também foi um grande contribuinte em seus estudos sobre a seleção natural, pois ele também
descreveu sobre a luta pela existência, em que sobrevive e mantêm
o maior número de descendentes os mais aptos, embora Wallace
não tenha utilizado o termo “seleção natural”.
De acordo com as análises dos trabalhos dos discentes que
abordaram a teoria da seleção natural, nota-se que houve trechos em que os alunos abordaram aspectos hereditários, variação genética, entidades que são atingidas, a seleção natural e a ideia
de seleção artificial juntamente com a seleção natural.
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Concepções alternativas – miscelâneas de ideias das teorias
evolutivas
Na terceira categoria foram identificadas produções textuais
que apresentam aproximações com as ideias de Lamarck e de
Darwin em um mesmo argumento. Além disso, evidenciam não só
modelos concorrentes, mas concepções alternativas não científicas
para os fenômenos estudados.
[...] Dentro de suas premissas Darwin defendeu que a sobrevivência dos mais aptos, era a forma mais elaborada
para sua teoria da seleção natural das espécies. Dentre
as teorias auxiliares que explicam o embasamento dos
fundamentos darwinianos, há de se considerar: a ação do
meio ambiente como causa das variações, o uso e desuso
das partes dos órgãos do organismo atuam de modo independente no processo de seleção natural e a hereditariedade dos caracteres adquiridos onde através da observação de diversas plantas e animais Darwin concluiu que a
mudança de hábitos produz efeitos hereditários.
Neste excerto, nota-se a apropriação de ideias das teorias de
Darwin e Lamarck, com o objetivo de entender a oposição criada
entre ambos, com uma visão científica. Assim como visões científicas e não científicas vindas do meio social, cultural e religioso,
encaramos também conflitos entre diferentes teorias evolutivas na
compreensão dos conceitos.
Outro aspecto importante é notar que as intenções do autor,
que inicia falando sobre seleção natural, enveredam para argumentos teleológicos para a explicação do fenômeno analisado.
O fato do plano de ensino do curso prever a explicação de
fenômenos biológicos sob a óptica das teorias evolutivas promove
a argumentação por parte dos licenciandos. Essa argumentação explicita um perfil conceitual e, neste caso, uma miscelânea de ideias
próprias e também científicas.
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Implicações das concepções dos professores para o ensino
Diante dos objetivos do plano de aula da disciplina, em que
se encontra o de argumentar sobre um fenômeno natural qualquer
à luz da evolução e das teorias evolutivas utilizadas pelos alunos,
nota-se que estes se apoiam nessas ideias evolutivas para justificar
seus argumentos. Ou seja, a argumentação foi pedida pelo professor, mas a articulação entre o tema biológico e a explicação evolutiva foi por conta do licenciando. Nesse processo a construção do
argumento expõe sua concepção da teoria evolutiva; fica claro que
a argumentação é fundamental no ensino de ciências e biologia,
na formação e aprendizagem de conceitos. A forma como o licenciando constrói seus argumentos acerca das teorias evolutivas fica
em evidência, pois a partir dela é possível discutir como a prática
desses futuros docentes será influenciada por essas concepções. A
construção de categorias e a identificação da lógica argumentativa
dos estudantes auxiliam também no planejamento e avaliação de
cursos de formação de professores.
4.  CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com a presente pesquisa podemos notar dificuldades diversas
em relação ao ensino e aprendizagem das teorias evolutivas. A ideia
de perfil conceitual empregada por Mortimer (1996) foi utilizada
como referencial de análise para identificar como os professores
em formação inicial podem conceber essas ideias e em que medida
se aproximam ou se afastam do conceito científico. Indica-se, assim, a necessidade de uma aproximação das ideias científicas para
o professor. Além disso, a má compreensão dos conceitos ligados à
evolução biológica e suas teorias são um dos principais fatores que
dificultam o ensino desse conteúdo. Investigando as concepções de
professores em formação inicial por meio das análises de suas produções textuais, podemos perceber o que eles compreendem sobre
o tema. É importante saber as concepções dos professores, uma vez
que elas estarão diretamente ligadas à mediação de ensino – aprendizagem nas aulas de Biologia.
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Essa análise permite observar qual a noção de determinados
conteúdos que esses professores em formação inicial possuem;
abre, ainda, a possibilidade de investigar a necessidade de uma
possível mudança conceitual, como essas concepções atuais podem
interferir na atuação desses docentes em sala de aula e como isso
interfere na aprendizagem dos futuros alunos.
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