Ao determinar como o cérebro reagiu às imagens de

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O genoma e a violência
Fernando Becker, professor da UFRGS
Este texto visa a dar continuidade à discussão sobre a pesquisa PUCRSUFRGS que visa a explicar o que leva um jovem a se comportar de maneira
violenta. Ao determinar como o cérebro reage às imagens de violência ou não
violência, os pesquisadores poderão comprovar se o cérebro dos jovens
violentos têm padrão diferente do cérebro dos jovens não violentos (ZH,
28.01.08). E se chegarem à conclusão de que são diferentes? Terá início,
então, uma discussão teórica. Vão aparecer aqueles que acreditam que tais
diferenças são inatas; elas estão nos genes ou no cérebro. Quem assim pensa
só pode esperar que o Estado providencie prisão perpétua ou pena de morte,
pois eles são violentos. Parece-me que é essa a crença dos signatários do
manifesto contra a pesquisa em pauta; crença paradoxal que se esconde atrás
de uma sociologia pouco reflexiva. Um comportamento é determinado pela
biologia, mais particularmente pelo genoma, ou pela sociedade? Tanto se disse
e repetiu que, por exemplo, a sexualidade é resultante de configurações sociais
e vêm a neurologia e a genética e dizem que ela é a expressão da
preferência sexual que se formou na gestação. Falta ao sociólogo considerar
as revelações da neurologia e ao neurologista e ao geneticista considerar as
explicações da sociologia e da psicologia enquanto revelam os processos
formadores da sociedade como um todo e dos indivíduos no seio da totalidade
social. Ponto para o projeto de pesquisa que se propõe à multiplicidade de
olhares para compreender o fenômeno da violência.
Não podemos esquecer que o ser humano é um genoma que se faz
progressivamente social sem deixar de ser biológico – mesmo o mais
avançado modelo científico é produzido por cérebros individuais. Resta saber
como esse processo de interação genoma-sociedade acontece sob os pontos de
vista cognitivo, afetivo e comportamental. E em função de que ele acontece.
Esforçar-se por compreendê-lo como interação é, pois, um bom começo, mas
que cobrará, aos poucos, profundas modificações metodológicas. Como o
cérebro humano é “o objeto mais complexo que o homem conhece”, como diz
John McCrone, e o que ele produz, como a mente, é igualmente de grande
complexidade, são bem-vindas todas as pesquisas científicas, com aval ético,
que ajudem a compreendê-lo.
Sempre que reduzimos a explicação do comportamento humano a um
único fator, seja à biologia, seja à sociedade, pagamos caro por isso. E não se
resolve a questão dizendo que a resposta está na soma dos dois fatores.
Começa-se a acertar quando se afirma que a resposta está na síntese,
infinitamente renovada, dos dois, realizada pelo sujeito. Um recém nascido
nada entende e a criança até os 4 a 5 anos “ignora soberbamente”, conforme
expressão de Piaget, o que a sociedade fala a ela. Com sete anos, compreende
precariamente. O adolescente, aos 12, 15 ou 20 anos ainda acusa
compreensões limitadas do mundo de mensagens que chegam até ele. Por que
isso acontece? Porque o sujeito humano precisa construir os instrumentos
cerebrais necessários para assimilar a complexidade social. Essa construção
demanda toda a infância e a adolescência, podendo prolongar-se pela vida
adulta.
Como a violência é gestada nessa interação? Penso que a pesquisa em
pauta deva ser projetada também longitudinalmente para podermos
compreender como o cérebro vai sendo determinado pela interação entre o
indivíduo e o meio social violento. Acredito, sim, que o cérebro traz marcas da
violência, porém não pela presença dela no genoma nem pela simples pressão
social, mas por um longo processo de interação entre o indivíduo e o meio
social violento. É importante saber, pois, a partir de que momento o indivíduo
começou a reagir com violência à frustração de seus desejos (por exemplo,
matar para garantir a posse de um par de tênis). Comportamentos violentos,
como roubo ou latrocínio, certamente foram precedidos de atos bem menos
graves.
Se a pesquisa encontrar diferenças entre os cérebros dos jovens violentos e
os dos não violentos, deverá determinar, ainda, se essas diferenças provêm de
marcas genéticas ou da interação. A propensão genética não gerará
necessariamente comportamento violento. Já não se pode afirmar o mesmo de
uma marca resultante da interação pois essa é a forma pela qual o sujeito
organizou seu comportamento para sobreviver no meio social violento. Por
outro lado, atribuir o comportamento violento à pressão do meio social não
responde à pergunta: por que tão poucos se tornam violentos num meio social
tão violento?
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