Cadernos de Ecologia Aquática 1 (1)

Propaganda
INVESTIGANDO OS PEIXES NOS LIVROS DIDÁTICOS DE CIÊNCIAS
DO ENSINO FUNDAMENTAL
Berenice Vahl VANIEL & Marlise de A. BEMVENUTI
a
RESUMO: Neste trabalho é feita uma análise dos livros didáticos de Ciências (6 série),
recomendados pelo MEC. À luz dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), elaborados pelo
MEC com o objetivo de nortear a educação, realizou-se a análise dos aspectos pedagógicos. O
assunto escolhido foi peixes pela sua relevância social e econômica para a cidade do Rio Grande,
RS. Foi feita a análise conceitual de cada livro e elaborado um texto de apoio para os professores,
utilizando-se bibliografia específica sobre o assunto.
Palavras-chave: livros didáticos, peixes, educação.
A cidade do Rio Grande, por estar localizada em um ambiente circundado por águas, teve
a pesca como um dos fatores de seu desenvolvimento, embora atualmente, apresente uma
situação social e econômica bastante diferente, com indústrias de pesca fechadas e muitos
pescadores desempregados. Observa-se, porém, que o assunto "peixes" relevante do ponto de
vista social, cultural e científico, não possui a devida importância nas escolas da região. Diante
dessa realidade torna-se válida a análise de como este assunto é abordado nos livros didáticos de
ciências do ensino fundamental.
Pretendeu-se, neste trabalho, analisar os livros didáticos recomendados pelo MEC,
especialmente os de 6ª série de Ciências do ensino fundamental, que abordam o tema peixes, em
busca de maiores conhecimentos, tendo como referencial teórico os PCNs. Considerando sua
extrema importância, foram elaborados textos de apoio que possam contribuir para o
melhoramento do processo de ensino-aprendizagem do tema proposto e, também, auxiliar os
professores em suas reflexões para o planejamento das aulas.
Para a realização desse trabalho, foram feitas leituras dos critérios usados pelo MEC para
classificação dos livros didáticos, Programa Nacional do Livro Didático (PNLD); estudos dos
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs); análise do assunto peixes nos livros didáticos de 6ª
série de Ciências do ensino fundamental, recomendados pelo MEC, Gowdak & Martins, 1996;
Lopes, 1996, 1999; Cruz, 1998; Cesar, Sezar & Bedaque, 1999; Barros & Paulino, 1999 e Mattos
& Gowdak, 1991 e consultas em bibliografias específicas da área de ictiologia, Evans, 1993;
Paxton & Eschmeyer, 1994; Hildebrand, 1995; Moyle & Cech, 1996; Poug, 1999; Helfman et al,
1999.
ANALISANDO E COMENTANDO OS LIVROS DIDÁTICOS
GOWDAK, D. & MARTINS, E. 1996. Ciências: Natureza e Vida. FTD.
Ao analisar esta obra observou-se, na página 180, no item 2.2 que os autores dizem
“Todos os peixes possuem escamas”, nesse caso, é importante salientar que muitos peixes não
possuem escamas, como os agnathas viventes (as lampréias e feiticeiras) bem como alguns
teleósteos (bagre) e algumas raias.
Na página 82, no ítem “Circulação respiração e excreção” os autores colocaram em
apenas um parágrafo, três nomenclaturas novas, tornando o texto de difícil compreensão para
a
alunos que estão cursando a 6 série. O assunto tornar-se-ia mais interessante, caso o conteúdo
“circulação” fosse apresentado sem usar, em um primeiro momento as palavras átrio, ventrículo e
sangue venoso. Pela prática pedagógica, percebe-se que, quando se inserem palavras que o
aluno não compreende o significado, ele passa a decorá-las não entendendo o mais importante
que é o fenômeno em questão. Só após a compreensão do conteúdo “circulação”, os termos
devem ser inseridos, caso necessário.
Na página 183 no item 2.6 “Reprodução” o texto dos autores é meramente descritivo,
começando assim: “Os sexos são separados e a fecundação pode ser interna ou externa...”, não
explica o que é fecundação interna, nem externa. Acredita-se que poderia se aguçar mais a
curiosidade do aluno se fosse dado um outro enfoque, abordando inclusive as diversas estratégias
Cadernos de Ecologia Aquática 1 (1): 1-14, jan - jul 2006
2
B. V. Vaniel & M. A. Bemvenuti
que os peixes utilizam para manter a espécie viva, relacionar a quantidade de ovos que cada uma
coloca, com o tipo de cuidado parental que elas desenvolvem.
No que se refere à flutuação os autores dizem “Quando essa bolsa, denominada bexiga
natatória, está cheia de gás, a densidade do peixe diminui e ele flutua facilmente. Quando ela está
com menos gás, o peixe afunda”. E mais abaixo complementa “Ela funciona de modo semelhante
aos tanques de lastro de um submarino. Quando estão cheios de ar, o submarino flutua; quando
estão cheios de água, o submarino afunda”.
Em primeiro lugar, este é um assunto muito delicado, pois para entender flutuação dos
peixes, o aluno precisa, antes, ter bem claro, os conceitos de massa, peso, densidade, empuxo,
pressão, flutuação e compressão de gases. O professor deverá com cuidado e astúcia, perceber
se o aluno já tem incorporado a capacidade de abstração, pois os autores tentam simplificar e não
utilizam uma situação dinâmica para explicar, complicando a vida dos alunos e professores.
É importante salientar que bexiga natatória existe na maioria dos peixes ósseos, e que ela
tem realmente a função de ajudar na flutuação. Portanto, aqueles peixes que vivem no fundo não
precisam de bexiga natatória como é o caso do linguado. Essas relações com o ambiente são
necessárias, pois elas esclarecem bastante a função de determinado órgão e o tipo de vida que o
peixe leva, ao fazer estas correlações o conteúdo torna-se significativo para o aluno.
Em relação ao funcionamento da bexiga natatória, quando o peixe desce na coluna d’água
a pressão externa aumenta e o gás da bexiga natatória é comprimido, tendendo a diminuir o
volume da bexiga natatória, como a massa corporal permanece a mesma, a densidade (relação
massa/volume) aumenta, isso faz com que o peixe fique mais pesado e tenda a afundar mais
rapidamente do que ele quer. Para isso não acontecer, a bexiga natatória precisa encher de
gases.
Quando o peixe sobe na coluna d’água a pressão externa diminui e o volume da bexiga
natatória aumenta, aumentando o empuxo para cima; então, a bexiga natatória precisa eliminar
gases para manter sua flutuabilidade neutra.
Segundo o (PNLD) o tema principal de cada unidade desta obra é abordado de maneira
clara e seqüencial, há preocupação em discutir alguns saberes prévios e experiências
socioculturais. Mencionam alguns problemas relacionados ao conteúdo, mas apesar disso, “o livro
possui propostas interessantes de atividades experimentais, possibilitando um trabalho didático
em sala de aula, desde que o professor esteja atento para superar as deficiências apontadas”.
MATTOS, N. S. & GOWDAK, D. 1991. Aprendendo Ciências: seres vivos, saúde e ecologia. FTD.
Estes autores trazem em seu livro, o conteúdo peixes, incluindo os exercícios em apenas
4 páginas (52 até 55). O assunto está muito resumido e de forma superficial, além de jogar muitas
frases soltas, sem explicação dos termos novos que vão aparecendo, favorecendo a “decoreba”.
Na página 52 eles citam as principais características dos peixes:
“Os Peixes são animais vertebrados que apresentam:...
• respiração branquial;
• pecilotermia;
• apenas duas cavidades no coração: um átrio e um ventrículo;
• em geral, oviparidade, com fecundação externa;
• linha lateral, órgão sensorial que percebe mudanças de pressão na água”
Em nenhum momento eles explicam o processo de respiração, circulação e regulação da
temperatura, tampouco dizem por que é importante o peixe perceber a mudança de pressão na
coluna d’água, e como isso vai influir na sua sobrevivência.
O livro traz alguns conceitos que podem ser interpretados de maneira errada, como por
exemplo “No início do verão, os peixes sobem rio acima, nadando muitos quilômetros contra
correnteza, até alcançarem águas mais tranqüilas e límpidas das cabeceiras dos rios. Nisso
consiste a piracema”.
Este parágrafo transmite a idéia de que todos os peixes sobem o rio para desovar, o que
não é verdade, são poucas as espécies de peixes que realizam a piracema.
Outros aspectos que merecem destaque são os conceitos que, trabalhados teoricamente,
são totalmente descritivos e não vinculam a forma com a função e o modo de vida do peixe.
Os exercícios de uma maneira geral não estimulam o espírito investigativo, o raciocínio do
aluno. Ao contrário, ele apenas deve transportar diretamente parte do texto para responder as
questões na página seguinte, este tipo de exercício não contribui para que o aluno construa o seu
conhecimento.
Cadernos de Ecologia Aquática 1 (1): 1-14, jan - jul 2006
Investigando os peixes nos livros didáticos...
3
Segundo a análise do (PNLD), “o livro reúne qualidades: a linguagem é clara, objetiva e
adequada a faixa etária do público alvo. Os conteúdos são satisfatórios em termos quantitativos.
Há vários capítulos e itens que oferecem boas sínteses dos temas a serem estudados”.
Diz também que o livro estudado possui problemas conceituais, imprecisões e
inadequações que precisam ser observadas pelo professor.
CRUZ, D. 1998. Os seres vivos. Ática.
Em relação à flutuabilidade, este autor, diz que: “... para subir na coluna d’água, por
exemplo, a bexiga natatória se enche de ar proveniente de um órgão localizado em sua base”. Na
realidade, o que acontece é exatamente o contrário. Quando o peixe sobe na coluna d’água o ar
dentro da bexiga natatória vai sendo expelido para manter o volume constante. O autor, na
tentativa de simplificar a explicação do fenômeno, omitiu relações importantes, pois o
funcionamento da bexiga natatória está relacionado com o ambiente em que o peixe está inserido,
neste caso, a influência é da pressão, pois à medida que o peixe sobe na coluna d’água, a
pressão vai diminuindo e a tendência é ocorrer a expansão dos gases dentro da bexiga natatória,
causando um desequilíbrio em sua flutuabilidade neutra. Para retornar a uma situação de
equilíbrio, ele precisa expulsar parte do ar de sua bexiga natatória e, quando o peixe desce na
coluna d’água a pressão externa aumenta, comprimindo os gases da bexiga natatória, diminuindo
seu volume. Como sua massa corpórea continua a mesma, o peixe fica mais denso tendendo a
afundar, para isso não acontecer, ele deve encher a bexiga natatória de gases.
Quando o autor faz referência “... o ar é proveniente de um órgão localizado em sua
base.”, nesta frase também sentimos a necessidade de comentar que existem duas maneiras dos
peixes colocarem ou retirarem o ar de suas bexigas natatórias. Os peixes mais primitivos como as
sardinhas, carpas, enguias e outros, o ar pode ser introduzido ou expelido através da boca, pois a
bexiga natatória possui uma ligação com o esôfago, estes peixes que possuem esta ligação da
bexiga natatória com o trato intestinal, são ditos physostomos (physa = bexiga + stoma =boca).
Já nos physoclistos (physa =bexiga + kleitos =fechados) a única maneira de variar a
quantidade de gás dentro da bexiga natatória é através do Reta Mirabilis da Glândula de Gás, que
tem a função de transportar os gases dos vasos sangüíneos para a bexiga natatória e vice-versa.
Quando o autor diz que “A bexiga natatória é encontrada somente nos peixes ósseos,
como a sardinha, o dourado e a tainha, etc.”, é bom salientar que nem todos os peixes ósseos
possuem bexiga natatória. Ex: Os linguados, geralmente, não apresentam bexiga natatória,
porque vivem em contato com o fundo e são sedentários.
Na página 83, o autor
afirma que: “...o tubarão é um
peixe cartilaginoso e portanto não
possui bexiga natatória.” E, na
mesma página, mostra uma figura
com os órgãos internos dos
peixes cartilaginosos indicando,
erroneamente, o lobo superior do
fígado como a bexiga natatória,
além de omitir o útero, estrutura
própria de animais vivíparos
(Fig.1).
Realmente,
uma
das
principais características
dos
elasmobrânquios é a ausência de
bexiga natatória, mas esta falta é Figura 1. Órgãos internos do tubarão indicando, erroneamente, o
compensada através de outras lobo superior do fígado como sendo a bexiga natatória, obtido de
adaptações, tais como: natação Cruz 1998.
contínua e fígado muito grande.
O fígado ocupa, aproximadamente, 25% do total do peso do animal, com grande
quantidade de óleos, que por serem de baixa densidade, diminuem a densidade total do peixe.
Provavelmente, o que o desenho mostra é, justamente, o fígado muito grande, aparecendo acima
e abaixo do estômago.
Cadernos de Ecologia Aquática 1 (1): 1-14, jan - jul 2006
4
B. V. Vaniel & M. A. Bemvenuti
Em relação ao texto sobre reprodução, o autor é claro, objetivo e faz considerações
importantes, porém, ressalta-se, novamente, a importância em abordar as diferentes estratégias
utilizadas pelos peixes para a perpetuação da espécie, as relações existentes entre o cuidado com
a prole e a quantidade de ovócitos liberados. Aqueles peixes que nutrem certo cuidado com sua
prole podem colocar menos ovócitos, pois a possibilidade de predação é bem menor na primeira
etapa da vida. Como exemplos, podemos citar a traíra, que pode liberar de 2500 a 3000 ovócitos,
faz ninhos no fundo do ambiente e fica vigiando os filhotes. O muçum, também desova em tocas
no fundo de lagos lodosos, e os lambaris escondem seus ovos no fundo do substrato.
Quanto aos exemplos de peixes vivíparos de nossa região, podemos citar o barrigudinho
(Jenynsia multidentada), que possui fecundação interna e desenvolvimento direto. As fêmeas
podem ter várias gestações, gerando em média 40 a 50 embriões. Por serem vivíparos, os
machos apresentam nadadeira anal modificada, com função de órgão copulador, chamado
gonopódio.
Quando o autor cita um exemplo de peixe que não cuida da prole, cita o bacalhau. Com
certeza, seria bem mais produtivo, se fosse feita uma citação de peixes de nossa região, tais como
a corvina e a pescada.
O PNLD faz o seguinte comentário sobre este título:
“Do ponto de vista editorial, nota-se o mesmo cuidado dedicado ao nível conceitual. A
revisão do livro é muito cuidadosa. Uma nota de mérito deve se dar as ilustrações, que não
apenas auxiliam na compreensão dos assuntos tratados, como são de muito boa qualidade,
reproduzindo com fidelidade as estruturas e organismos que pretendem representar.”
Salienta ainda o mérito de tratar o assunto seres vivos evolutivamente, além de apresentar
o conteúdo com a profundidade adequada.
Como conclusão, a análise feita pelo PNLD, diz que: “... apesar do livro apresentar poucas
imperfeições, que merecem a atenção do professor, o livro tenta criar nos alunos um espírito
observador e crítico, através do desenvolvimento do raciocínio e da capacidade de
argumentação”.
CESAR, SEZAR & BEDAQUE, 1999. Entendendo a natureza: Os seres vivos no ambiente.
Saraiva.
Em relação ao assunto bexiga natatória, os autores citam que a bexiga natatória tem a
função de regular a flutuabilidade e apresentam uma figura sem legenda na pagina 87, causando
algumas dúvidas.
O que se pode observar através da interpretação da figura é que quanto mais profundo o
peixe se encontra, mais esvazia sua bexiga natatória, pois seu tamanho vai diminuindo com a
profundidade, o que, sem dúvida, é um conceito equivocado a respeito do assunto.
O mérito dos autores está em colocar, ao longo do capítulo, pequenos textos com
curiosidades a respeito do assunto tratado.
A abordagem do texto sobre “circulação e respiração” está clara, objetiva e simples. Para
melhorar a compreensão, os autores colocam um esquema possibilitando ao aluno fazer as
relações necessárias para o entendimento.
Pela leitura que se fez do PNLD, observou-se que são feitos inúmeros elogios ao livro
didático tais como: “... o livro atende de maneira muito satisfatória aos requisitos necessários para
o ensino correto e eficaz, trabalha conceitos teóricos de maneira eficiente, ...apresenta tratamento
conceitual cuidadoso.” As críticas realizadas se resumem a falta de escala para as figuras.
BARROS, C. & PAULINO W. R. 1999. Os Seres Vivos. Ática.
Os comentários feitos para esta obra são os mesmos já feitos para as outras, ou seja,
quanto ao texto sobre bexiga natatória, os autores dizem o seguinte: “Ao descer, o peixe diminui o
volume da bexiga, através dessa glândula, que passa o ar da bexiga para o sangue”.
O que está inadequado nessa frase? Na realidade onde os autores dizem que “...ao
descer o ar passa da bexiga para o sangue...” é justamente ao contrário, pois, como já foi dito,
quando o peixe está descendo a pressão sobre ele está aumentando e, em conseqüência dessa
pressão, a bexiga natatória tenderia a diminuir, e para o peixe manter sua flutuabilidade neutra ele
necessita colocar mais ar para dentro da bexiga.
Esta obra pela análise do PNLD salienta-se pela estimulação de hipóteses, incentivo a
pesquisa, além de destacar a proximidade dos aspectos teóricos com o cotidiano dos alunos,
dizendo que isto facilita o aprendizado dos mesmos.
Cadernos de Ecologia Aquática 1 (1): 1-14, jan - jul 2006
Investigando os peixes nos livros didáticos...
5
Outra observação feita pelo PNLD é que os conceitos são utilizados, de uma maneira
geral corretamente, pois as inadequações existentes são relacionadas com a “denominação de flor
para estruturas reprodutivas das gimnospermas”. Classificando a obra como de boa qualidade.
LOPES, S. G. B. C. 1996. A vida. Atual.
Nesta obra, há um aspecto muito interessante, pois à medida que o conteúdo vai sendo
apresentado, a autora vai relacionando as diversas adaptações sofridas pelo grupo dos peixes
para sobreviverem no ambiente aquático. Outra qualidade do livro é contemplar o caráter evolutivo
dos seres vivos.
Os conteúdos são apresentados com profundidade e clareza, além de propor desafios que
estimulam o raciocínio. Porém, ao mesmo tempo em que tenta apresentar estes conteúdos de
forma interligada, exagera na nomenclatura, nos detalhes e na grande quantidade de informações.
Vale a pena ressaltar que, de todos os livros analisados, este foi o único que encontramos
uma discussão clara e eficiente sobre o funcionamento da bexiga natatória.
É destaque na análise do PNLD, a forma criativa e inovadora com que esta obra apresenta
seus textos, sem deficiências significativas. Salienta ainda que os temas abordados são
adequados para a série e faixa etária do público alvo.
COMENTÁRIO FINAL
Foram analisados seis livros de Ciências 6ª série, dos oito recomendados pelo MEC, pois
um não foi encontrado e outro não continha o assunto peixes.
Após a análise observou-se que o maior problema conceitual existente foi em relação a
funcionalidade da bexiga natatória, visto que apenas um livro apresentou o conteúdo de forma
adequada.
Alguns livros apresentaram textos longos com uma quantidade exagerada de informações,
tornando-se cansativos e enfadonhos para os alunos. À medida que aparecem novas
nomenclaturas, sem a devida definição, os alunos desestimulam-se a aprender e, simplesmente,
passam a decorar, para despejar na prova uma boa resposta, esquecendo de tudo logo a seguir.
A maioria dos livros não fez a relação necessária da teoria com a prática, sequer mostram
que os conteúdos têm tudo a ver com seu dia a dia, por que eles são importantes e, tampouco
dizem como utilizar esses conteúdos numa situação real.
O PNLD, em sua análise salientou as várias qualidades do livro didático, e após citou que
existem alguns problemas conceituais, imprecisões, inadequações que precisam ser observadas
pelo professor.
De certa forma, o livro didático tem sido destaque nos últimos anos, haja visto o grande
número de trabalhos publicados a respeito. Muitos desses trabalhos apontaram algumas
impropriedades, neste trabalho foram citadas outras. Mesmo assim, acredita-se que o livro
didático pode constituir-se num subsídio de apoio para o professor, desde que este fique atento
as questões referidas acima e não se restrinja só a ele.
REGO (2000) ao responder se o livro didático deve ser ou não abolido fez o seguinte
comentário:
“ Muitas das obras são
extremamente
problemáticas
caracterizadas
por um tratamento
descontextualizado e
fragmentado do conhecimento e por uma concepção de
aprendizagem ligada ao acúmulo e a memorização de informações.
Mas não se pode generalizar – Existem publicações de boa
qualidade, que podem servir como ferramenta de trabalho –
principalmente se estiverem articuladas a outros recursos de igual
importância.”
Enfim, é necessário organizar atividades com outros recursos, tais como, reportagens de
jornais locais, revistas, livros pára-didáticos, incrementando, assim, as atividades em sala de aula,
e para ir além das quatro paredes o interessante mesmo é organizar saídas de campo onde o
aluno possa vivenciar as situações. Por exemplo, levá-los para visitar o trapiche da Barra, mostrar
a eles os diferentes tipos de embarcações e a função de cada um, a organização dos tripulantes,
modo de conservação dos peixes na embarcação, diferentes tipos de redes utilizadas, quais os
impactos que elas causam. A seguir, visitar uma fábrica de peixe, com discussão de outros
aspectos importantes, desde o desembarque até a forma de industrialização, observação dos
Cadernos de Ecologia Aquática 1 (1): 1-14, jan - jul 2006
6
B. V. Vaniel & M. A. Bemvenuti
peixes, seus formatos, tamanhos, qual o tipo de vida de cada um, problemas enfrentados pela
indústria pesqueira e quais as causas desses problemas.
Entende-se que trabalhando dessa forma estaremos colaborando para que os alunos
construam seu conhecimento, possibilitando o despertar da capacidade cognitiva, do saber,
contextualizando as informações. Com isto os alunos poderão, posteriormente, conseguir resolver
com eficiência os problemas que surgirão ao longo de suas vidas, e estarão aprendendo a “fazer”
através do desenvolvimento de competências e habilidades.
Por outro lado, sabe-se que o professor não dispõe de tempo para procurar bibliografia
sobre o assunto, organizá-lo e estruturar um trabalho que tenha as qualidades que foram
salientadas acima. O professor sabe que são atividades importantes, e muitas vezes se angustia
por não poder fazer melhor como gostaria.
Preocupados com o perfil deste professor e sabedores dos problemas que os livros
didáticos apresentam, entendeu-se a necessidade de produzir um material de apoio, que supra
algumas das necessidades encontradas, além de subsidiar um conhecimento mais profundo.
TEXTOS E ILUSTRAÇÕES PARA PROFESSORES
(informações obtidas em Evans, 1993; Paxton & Eschmeyer, 1994; Hildebrand, 1995; Moyle &
Cech, 1996; Poug, 1999; Helfman et al, 1999)
CARACTERÍSTICAS DOS CORDADOS
São chamados cordados os animais que possuem notocorda, um cordão nervoso dorsal e
aberturas branquiais faringeanas em algum momento de seu ciclo vital. As aberturas branquiais
nos cordados inferiores são utilizadas para alimentação e intercâmbio de gases. Nos peixes, elas
servem apenas para trocas gasosas.
A notocorda é uma estrutura correspondente a um bastonete, maciço delgado e flexível. É
o órgão responsável pela sustentação do corpo dos cordados primitivos. Nos mais evoluídos ela
ocorre em alguma etapa de seu desenvolvimento, depois é substituída por uma coluna vertebral
de osso ou cartilagem, que faz sua sustentação.
CARACTERÍSTICAS GERAIS DOS PEIXES
Os peixes são vertebrados que vivem na água e respiram geralmente por brânquias. São
sustentados por coluna vertebral de cartilagem (que é firme, porém flexível), ou de osso (mais forte
e menos flexível). São ectotérmicos, sua temperatura flutua de acordo com a temperatura do meio.
Estão adaptados para viver na água doce ou salgada. A maioria tem nadadeiras, sustentadas por
raios ou espinhos. Quase todos possuem escamas, que tem a função de proteger e cobrir o corpo.
Existem três classes de peixes: Agnatha, Cartilaginosos e os Ósseos (Fig. 2).
Figura 2. Peixes dos grupos Agnatha, Cartilaginosos e Ósseos.
AGNATHA
A classe Agnatha é a mais primitiva das três. Eram abundantes nos mares há 400 ma.
(milhões de anos), mas na fauna atual ocorrem somente 85 espécies.
Os agnathas atuais também são chamados de ciclostomados, o que quer dizer boca
circular, sem mandíbulas. São representantes as lampréias e as feiticeiras. O corpo é fino e
redondo, com ausência de dentes verdadeiros, escamas e nadadeiras pares (Fig. 3).
Cadernos de Ecologia Aquática 1 (1): 1-14, jan - jul 2006
Investigando os peixes nos livros didáticos...
7
As brânquias encontram-se dentro de bolsas
branquiais onde são realizadas as trocas gasosas.
Estas bolsas têm poros para o exterior em número
variado, conforme o grupo.
Feiticeiras são exclusivamente marinhas,
possuem o corpo alongado, sem escamas, vivem
entocadas no fundo a grandes profundidades.
Alimentam-se de restos de animais, são necrófagas
ou de pequenos poliquetas escavadores.
Lampréias são geralmente parasitas, têm
parte de sua vida entre o oceano e o rio. Algumas
são encontradas somente na água doce.
PEIXES CARTILAGINOSOS
Figura 3. Feiticeira (acima) e lampréia (abaixo).
Os peixes cartilaginosos pertencem à Classe Condrichthyes, cujo esqueleto é
basicamente cartilaginoso, flexível como uma borracha. Este grupo mantém muitas características
primitivas, surgidas nas eras passadas. Os condricties podem ser classificados em dois grupos, os
Elasmobranchii e os Holocephali. Atualmente são 850 espécies de peixes entre tubarões, raias e
quimeras.
Os Elasmobranchii estão representados pelos tubarões e raias, que possuem cinco pares
de fendas branquiais, laterais nos tubarões e ventrais nas raias. São peixes com mandíbulas,
nadadeiras pares e escamas placóides. As escamas possuem um espinho dérmico, cuja
composição é semelhante ao dente do tubarão, que contem uma cobertura de esmalte, a dentina
e uma cavidade de polpa (Fig. 4).
Os tubarões aspiram a água pela boca e
expelem pelas aberturas branquiais (5 ou 7 pares), já
as raias aspiram a água por espiráculos, orifícios
atrás dos olhos. Quando os espiráculos se fecham a
água sai pelas aberturas branquiais.
A maioria dos tubarões tem a forma fusiforme
que lhes possibilita nadar rápida e constantemente
para manterem-se na coluna d’água, apesar de
utilizarem o fígado, com grande quantidade de óleo,
para sua flutuabilidade.
Uma raia não se parece com um tubarão. As
Figura 4. Desenho de escama placóide.
raias possuem o corpo achatado, com nadadeiras
peitorais em forma de asas (Fig. 5). A maior parte das raias vive enterrada no fundo do mar,
comem peixes e invertebrados.
Tanto nos tubarões como nas raias, os sexos são separados e a reprodução é com
fecundação interna. Os espermatozóides que se produzem nos testículos dos machos passam
para a fêmea por estruturas especiais chamadas cláspers situados nas nadadeiras pélvicas (Fig.
6). A maior parte dos tubarões e raias é ovovivípara, com ovos e embriões desenvolvendo-se
dentro do corpo da fêmea durante todo período embrionário.
Figura 5. Morfologia externa da raia.
Figura 6. Pedúnculo caudal de um tubarão macho.
Cadernos de Ecologia Aquática 1 (1): 1-14, jan - jul 2006
8
B. V. Vaniel & M. A. Bemvenuti
Algumas espécies são ovíparas, os ovos
fecundados se desenvolvem em cápsulas fora do
corpo da fêmea.
Os Holocephali estão representados pelas
quimeras, possuem as fendas branquiais protegidas
por opérculo, cauda longa e flexível, olhos muito
grandes e corpo sem escamas (Fig. 7).
PEIXES ÓSSEOS
Os peixes ósseos pertencem à Classe
Osteichthyes,
com
esqueleto
composto Figura 7. Quimera.
principalmente de ossos. Há mais de 23.000 espécies
de peixes ósseos, que vivem em água doce, estuário e mar.
Eles respiram por brânquias, quase todos possuem escamas e nadadeiras que podem se
apresentar de maneiras diferentes. As nadadeiras peitorais e pélvicas ajudam o peixe a ter direção
e equilíbrio ao deslocar-se pela água.
Os peixes ósseos são formados por diferentes grupos: os que possuem nadadeiras com
raios e os que possuem nadadeiras lobuladas.
Os que possuem nadadeiras com raios são a grande maioria dos peixes. Esse grupo
possui nadadeiras com raios e espinhos ósseos; as narinas não fazem parte do sistema
respiratório, nem apresentam comunicação interna com a boca.
Os que possuem as nadadeiras lobuladas são os peixes dipnóicos e o celacanto, com
nadadeiras sustentadas por ossos recobertos por músculos.
Peixes dipnóicos (di =duplo; pnoi =respiração), são exclusivamente de água doce. No Brasil
existe uma espécie que vive na Amazônia, chamada pirambóia, Lepidosiren paradoxa
(Fig.8).
Características dos dipnóicos:
- presença de pulmões utilizados no processo
de respiração, juntamente com as brânquias. No
caso da pirambóia, as brânquias sozinhas não
fornecem oxigênio suficiente para a respiração,
principalmente quando estão estressados e ou
em períodos de seca;
- narinas que possuem ligação com o sistema
respiratório.
- nadadeiras peitorais filamentosas parecidas Figura 8. Peixes dipnóicos atuais.
com pernas que ajudam o peixe a se locomover
em época de seca.
Este grupo vive em rios e lagos, que secam em uma
determinada época do ano. Pode sobreviver no momento em que as
chuvas diminuem, cavando galerias no fundo do ambiente,
protegendo-se em um casulo produzido por ele, para diminuir a perda
de água do corpo e também como isolante térmico.
Ele fica nessa galeria sem comer e com suas atividades
metabólicas reduzidas para evitar o gasto de energia. A respiração
nesta época se dá através dos pulmões que recebem o ar dos
pequenos túneis de ventilação que ligam sua galeria à superfície (Fig.
9).
Celacanto: este é um verdadeiro fóssil vivo, pois se
acreditava em sua extinção até 1938, quando um pescador africano
capturou um exemplar. Eles são encontrados entre Madagascar e a
costa de Moçambique, no Oceano Índico, próximos ao fundo do mar
(250-300m). Podem chegar até 2 m de comprimento total, são
predadores muito agressivos e alimentam-se principalmente de
Figura 9. Galeria onde vive o
outros peixes e cefalópodes.
peixe dipnóico (pirambóia) na
época de seca.
Cadernos de Ecologia Aquática 1 (1): 1-14, jan - jul 2006
Investigando os peixes nos livros didáticos...
9
REPRODUÇÃO DOS PEIXES
Tipos de reprodução (bissexual, partenogênese e hermafrodita).
Bissexual são indivíduos dióicos, macho e fêmea separados. É o tipo de reprodução da
maioria dos peixes. Nos teleósteos a fêmea põe óvulos aos milhares e à medida que vão saindo, o
macho lança seu esperma, fecundando-os no ambiente. Todos os elasmobrânquios e alguns
teleósteos de água doce têm fecundação interna, protegendo os ovos assegurando assim a
reprodução.
Partenogênese forma de reprodução assexual que ocorre em alguns teleósteos, com
desenvolvimento dos óvulos, sem fertilização pelo espermatozóide, este tipo de reprodução ocorre
em algumas percas, peixes-arqueiro e labrídeos.
Hermafroditas são indivíduos monóicos, que possuem as duas gônadas em um mesmo
organismo. Pelo menos 14 famílias são conhecidas, sendo comum em peixes de recifes de coral,
Scaridae, Serranidae (garoupas) e Labridae. Podem ter os dois sexos ao mesmo tempo, são
hermafroditas simultâneos ou sincrônicos (muito raro), ou o indivíduo muda de sexo (é mais
comum), são os hermafroditas sucessivos ou seqüenciais. Neste caso pode amadurecer primeiro
a gônada macho e mais tarde a fêmea (Gonostoma peixe de profundidade), ou amadurece
primeiro a parte feminina (peixe-anjo, de recife de coral).
Estratégias de Reprodução
Dentro do grupo dos peixes há duas estratégias reprodutivas, aquelas espécies que
possuem um cuidado parental e as que não possuem cuidado parental.
As espécies que não possuem cuidado parental, não apresentam estruturas reprodutivas
especiais, colocam uma grande quantidade de ovos pequenos, praticamente transparentes e com
pouca reserva nutritiva. Deixam os ovos à própria sorte, sem cuidado algum, o que gera enorme
mortalidade dos ovos por predação ou por perigos físicos. O desenvolvimento das larvas, por sua
vez, também acontece da mesma maneira, logo elas necessitam buscar seu próprio alimento e
desprotegidas a maioria acaba morrendo, sobrevivendo apenas algumas que chegarão à idade
adulta. Este grupo é formado pela maioria das espécies marinhas e um pequeno grupo de água
doce, com fecundação externa e que abandonam os ovos no ambiente.
A reprodução das lampréias é sexuada. Na época da desova (que é disparada pela
temperatura), migram do mar para os rios (espécie marinha) ou simplesmente sobem os rios até
suas cabeceiras (espécie de água doce), onde fazem seus ninhos. O ritual de acasalamento das
lampréias é bastante complicado e com enorme gasto energético. Depois de terem migrado,
escolhido o local apropriado para a desova, o casal fixa-se em uma rocha e começam a debaterse e agitar seus corpos com o objetivo de escavar uma toca e murá-la. Tudo é feito com muito
cuidado para que haja uma boa oxigenação da água, as últimas energias do casal são gastas com
a colocação de mais de 200 mil óvulos e espermatozóides. Então o casal morre de cansaço.
Após a eclosão, durante o período larval, que dura entre 2 e 5 anos, as lampréias realizam
a metamorfose. Alimentam-se através do processo de filtração, fazem tocas no lodo ficando
apenas com a cabeça de fora, tomando o alimento enquanto preparam-se para a fase adulta.
Algumas espécies irão parasitar outros peixes, descendo o rio chegando ao oceano. Outras vão
descer o rio mas nele permanecem durante toda a vida.
As espécies que possuem cuidado parental são aquelas que colocam pequena quantidade
de ovos, geralmente apresentam algum tipo de cuidado com os ovos, larvas ou filhotes. Quanto
menor o número de ovos, maior o cuidado, o que gera menor gasto energético na produção de
gametas.
São muitas as estratégias de cuidado parental que os peixes usam. As feiticeiras, por
exemplo, colocam aproximadamente 30 a 40 ovos grandes, e possuem o hábito de protegê-los,
outras espécies constroem ninhos, protegem os ovos ou apenas os colocam em locais protegidos.
O cuidado dos ovos e dos filhotes, algumas vezes exige dos pais uma estrutura anatômica
de proteção, que pode ser na boca, bolsas abdominais, almofadas nos lábios ou ainda cavidades
branquiais.
Em relação às espécies que possuem cuidados com os ovos ou filhotes que vivem na
região sul, há alguns exemplos que podem ser citados:
Cadernos de Ecologia Aquática 1 (1): 1-14, jan - jul 2006
10
B. V. Vaniel & M. A. Bemvenuti
- peixes que desovam em ninhos construídos antes da desova
e defendidos (ou não) por ambos os sexos ou somente pelo pai. A
traíra constrói o ninho no fundo do ambiente e os pais ficam cuidando
dos filhotes. O muçum desova em tocas ou túneis e também cuida
dos ovos, já os lambaris, que escondem seus ovos em buracos, não
dispensam maiores cuidados.
- alguns constroem seus ninhos em fendas ou cavernas, no
lodo, na praia, em bolhas (Betta splendens), em plantas ex: o macho
de esgana-gato (Gasterosteus) constrói o ninho com gravetos (Fig.
10).
- outra estratégia utilizada é a de pôr seus ovos em cavidades
de invertebrados como em moluscos, caranguejos, esponjas,
tunicados, em anêmonas ex: o peixe-palhaço (Amphyprion Figura 10. Ninho de um
epheppium) usa a anêmona para se proteger e se reproduzir.
esgana-gato (Gasterosteus).
- os carregadores externos que levam os filhotes em estruturas
como ventre, fronde, boca (bagres,
ciclídeos e a Tilapia), embaixo dos
lábios
(cascudos),
na
cavidade
branquial, em bolsas abdominais ou
pregas,
ex:
o
peixe-cachimbo
(Syngnathus);
o
cavalo-marinho
(Hyppocamphus) possui uma bolsa
incubadora na região ventral do macho
e nela a fêmea deposita cerca de 200
ovos que ali são fecundados e
incubados por dois meses (Fig. 11).
- a fêmea do acará-disco deposita
os ovos em plantas. Depois que
eclodem mantêm os filhotes aderidos Figura 11. Fêmea do cavalo-marinho depositando os ovos na
junto à pele, onde eles sugam o muco bolsa do macho (esquerda); nascimento dos filhotes (direita).
que ela produz enquanto não possuem capacidade para buscar seu próprio alimento (Fig 12).
Figura 12. Ovos do acará-disco depositados em plantas (esquerda e centro). Filhotes do acará-disco
alimentando-se do muco produzido pela mãe (direita).
- outra espécie de acará fêmea incuba 100 a 300 ovos na
boca, que ficam de 3 a 5 dias, até eclodirem. Eles voltam para a
boca da mãe sempre que surge um sinal de perigo. É uma
quantidade de ovos pequena, mas a superproteção garante a
perpetuação da espécie.
- algumas estratégias são interessantes, como é o caso do
bagre. Após a fecundação o macho coloca os ovos dentro da boca,
evitando sua predação (Fig. 13). Nesse período de proteção ele
não se alimenta para não engolir os ovos. Quando os ovos se
rompem e nascem filhotes, ele os devolve ao meio ambiente,
continuando por perto e protegendo. Ao perceber perigo, coloca-os
novamente na boca. Quando os filhotes crescem um pouco mais e Figura 13. Bagre protegendo os
conseguem se defender sozinhos, o bom mesmo é sair de perto, filhotes na boca.
Cadernos de Ecologia Aquática 1 (1): 1-14, jan - jul 2006
Investigando os peixes nos livros didáticos...
11
pois o pai esquece o parentesco e, num momento de fome, é capaz de devorar os próprios
filhotes.
ALIMENTAÇÃO DOS PEIXES
Para analisar o processo de alimentação devem-se levar em conta as interrelações entre a
dieta alimentar, forma do corpo, trato digestivo, locomoção. O estilo de vida de cada espécie é
determinado pelo conjunto destas características. É de fundamental importância e também
desafiadora a tentativa de relacionarmos a forma com a função que determinado órgão exerce na
vida do animal.
O ambiente aquático é totalmente diferente do terrestre, podemos começar a citar a
densidade, viscosidade do meio, a velocidade em que as ondas se propagam, que é muito maior
no meio aquático do que no terrestre. A conseqüência direta é que o predador ao se aproximar da
presa, poderá afastá-la com seus movimentos, sem contar com a energia gasta para vencer a
resistência da água que é muito maior do que no ambiente terrestre.
Hábitos Alimentares (de que os peixes se alimentam)
Herbívoros
Eles comem plantas, formam uma minoria no oceano e água doce de regiões temperadas.
Porém são importantes em água doce de regiões tropicais, onde inundações sazonais cobrem
florestas e campos e os peixes herbívoros podem comer gramas, vegetações arrastadas e folhas.
Nas regiões de florestas, o material vegetal que cai na água provê uma fonte contínua de alimento
aos herbívoros. Nas florestas marinhas há uma grande diversidade de herbívoros, que se
alimentam de algas calcáreas e corais. Ex: Acanthuridae, Pomacentridae, Scaridae.
Detritívoros
Alimentam-se de detritos no fundo, ex: a taínha é iliófaga, tem estômago triturador
(moela), com paredes grossas e pouco lúmem.
Carnívoros
Dentre os peixes que possuem o hábito alimentar carnívoro, estão aqueles que se
alimentam de pequenos organismos, capturando individualmente
cada presa, ex: Coregonus clupeaformis (água doce) captura
cerca de 600 daphnias em 15 min.
O atum e o tubarão são carnívoros predadores,
alimentam-se de animais macroscópicos, possuem dentes fortes,
comem a presa pela cabeça. Seus estômagos apresentam forte
secreção ácida e o intestino é menor que os herbívoros.
O peixe-arqueiro (Toxotes jaculator), cheio de truques, é
capaz de pular para fora da água e capturar insetos que estejam
desatentos em galhos de árvores acima da superfície da água.
Outro truque é dar uma boa cuspida para derrubá-los.
Atordoados, eles se transformam em uma excelente refeição
para este peixinho tão esperto (Fig. 14).
O peixe-pescador possui o primeiro raio da nadadeira
dorsal transformado em um illicium, que, na verdade, se parece
com uma vara de pesca com sua respectiva isca (fig.15).
Quando peixes menores se aproximam ele ergue e balança o Figura 14. Peixe-arqueiro Toxotes
illicium, transformando-o em um chamariz, atraindo a presa para jaculator.
dentro de sua boca. Nesta função, muitas
vezes o illicium é devorado, mas logo se
regenera.
Parasitas
Alimentam-se diretamente do sangue
de suas vítimas. A lampréia raspa a pele e
músculos do hospedeiro para sugar o
sangue. Os machos de Ceratia, peixe de
Figura 15. Peixe-sapo com seu illicium (seta).
Cadernos de Ecologia Aquática 1 (1): 1-14, jan - jul 2006
12
B. V. Vaniel & M. A. Bemvenuti
profundidade, são obrigatoriamente parasitas das fêmeas, possuem uma papila bucal bastante
desenvolvida. O macho possui 8-10 cm enquanto a fêmea pode medir até 1 m de comprimento
total. Logo que nasce o macho trata de procurar uma fêmea e fixar-se nela, sem jamais se
separar.
Omnívoro
Possuem uma alimentação variada. O bagre utiliza seus barbilhões (Fig. 13), para sentir o
cheiro de seu alimento, para ele tudo parece ser gostoso, pois come de tudo. “Até mesmo o lixo é
uma delícia para ele. Nossa sorte, porque assim ele ajuda a manter os rios limpos.” (Hornblow & L.
1990: 26p).
Como os peixes se alimentam
Pastadores
Alimentam-se através de mordidas; mas a maioria come plâncton ou animais de fundo;
alguns pastam em rochas ou recifes de coral. O peixe-papagaio (Scaridae), por exemplo, tem um
bico e dentes faringeanos cortantes para triturar partes do coral.
Sugadores
São geralmente peixes de fundo que possuem boca ventral, sugadora ex: Loricariidae
(cascuda), o esturjão, as carpas e as percas alimentam-se sugando a água com tanta força que as
presas microscópicas são sugadas junto. Outros sugadores possuem a boca na porção terminal
de um tubo que faz a sucção, como o peixe-cachimbo e o cavalo-marinho (Fig. 11).
Filtradores
Os peixes que se alimentam por filtração não necessitam de dentes fortes e grandes, nem
locomoção rápida, porém precisam ter uma estrutura filtradora eficaz, formada por rastros das
brânquias, que retêm as partículas alimentares movendo o alimento até a faringe. É um tipo de
alimentação, utilizada pelas larvas de lampréia, savelha, sardinha, arenque, alguns tubarões,
dentre outros. Esse tipo de alimentação exige um gasto de energia muito grande, pois o meio
aquático é pobre em partículas suspensívoras, de plâncton. O alimento é selecionado pelo
tamanho e não pelo grupo; alguns se alimentam durante toda a vida de fitoplâncton, outros apenas
na fase juvenil.
FLUTUABILIDADE DOS PEIXES
Os peixes são mais densos que a água, isto faz com que eles tendam a afundar, para
solucionar este problema necessitam utilizar diferentes estratégias.
Alguns se movimentam constantemente com as nadadeiras, para se manterem na posição
que desejam, não é uma maneira muito econômica, gasta muita energia além de ser cansativa.
Outros produzem em seu corpo substâncias que possuem densidade menor que a água,
diminuindo assim a densidade total do corpo e igualando-se com a densidade da água, facilitando
a flutuabilidade.
Outra estratégia é a incorporação da bexiga natatória, que é uma bolsa cheia de gases,
localizada na parte superior do corpo debaixo da coluna vertebral (Fig 16). Sua função original foi
de órgão respiratório, mas na maioria dos peixes atua na flutuabilidade.
A bexiga natatória pode manter a
conecção com a boca, característica dos peixes
mais primitivos, são os fisóstomos - physostomos
do grego physa (bexiga) e stoma (boca). Eles
enchem a bexiga natatória com os gases da
superfície (O2, N2 e CO2), com proporções
diferentes entre os peixes; ex: sardinhas, salmão,
osteoglossideos, ciprinídeos, catfishes, enguias.
A grande maioria dos teleósteos perdeu a
conecção da bexiga natatória com o tubo
digestivo já desde os primeiros estágios larvais.
Nos adultos, a bexiga natatória é inteiramente
fechada são os chamados fisoclistos physoclistos do grego physa (bexiga) e kleitos
Figura 16. Bexiga natatória de um peixe.
(fechado).
Cadernos de Ecologia Aquática 1 (1): 1-14, jan - jul 2006
Investigando os peixes nos livros didáticos...
13
NECESSIDADE OU NÃO DA BEXIGA NATATÓRIA
A bexiga natatória está ausente em peixes cartilaginosos, tubarões e raias, pois eles
controlam sua flutuabilidade através da grande quantidade de hidrocarbonetos (esqualene)
presente no fígado, que ocupa (25%) do total do peso do peixe, tornando-o menos denso,
facilitando sua flutuabilidade.
Nas espécies de teleósteos bentônicos a bexiga natatória tem pouca função, pois eles
vivem sempre no fundo, neste caso ou está reduzida ou ausente.
Em ambientes de pouca profundidade ou rios de corredeiras, onde a movimentação se
restringe de rocha em rocha, a bexiga natatória também está ausente ou reduzida.
Espécies que habitam grandes profundidades e possuem ampla migração vertical a
bexiga natatória está bem desenvolvida, pois necessitam variar sua densidade para se manterem
em equilíbrio nas diferentes profundidades.
FUNCIONABILIDADE DA BN
Para que os peixes possam encher ou esvaziar a bexiga natatória é necessário um
conjunto de capilares presente na parede da bexiga natatória. Eles são responsáveis pela
secreção, transporte e absorção dos gases, fazendo as trocas necessárias com a corrente
sanguínea.
Quando o peixe nada para baixo (desce) a pressão externa aumenta e o gás da bexiga
natatória é comprimido, tendendo a diminuir o volume da bexiga natatória. Como a massa corporal
permanece a mesma, a densidade (relação massa/volume) aumenta. Isto faz com que o peixe
fique mais pesado e tenda a afundar mais rapidamente. Para isto não acontecer é preciso a
bexiga natatória encher-se de gases.
Quando o peixe nada para cima (sobe) a pressão externa diminui e o volume da bexiga
natatória aumenta, aumentando o empuxo para cima; então, a bexiga natatória precisa eliminar
gases.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARROS, C. & PAULINO W. R. 1999. Os Seres Vivos. São Paulo : Ática, 279p.
BEMVENUTI, M. de A & FISCHER, L. G. 1998. Guia dos Principais Peixes da Região Estuarina da
Lagoa dos Patos e Área Adjacente, RS, Brasil. Rio Grande : Salisgraf, 43p.
BRASIL 1998. Parâmetros Curriculares Nacionais: Ciências Naturais/ Secretaria de Educação
Fundamental. – Brasília: MEC/SEF, 138 p.
CESAR, SEZAR & BEDAQUE 1999. Entendendo a Natureza: Os seres vivos no ambiente. São
Paulo : Saraiva, 87p.
COOPER, A. 1980. Peixes do Mundo. São Paulo : Melhoramentos, 158p.
CROFT, J. 1977. Vida Marinha. São Paulo : Melhoramentos, 158p.
CRUZ, D. 1998. Os Seres Vivos. São Paulo : Ática, 208p. (6ª série).
EVANS, D. H. 1993. The Physiology of Fishes. Florida : CRC Press, Inc., 592p.
FRACALANZA, H., AMARAL, I. A. & GOUVEIA, M. S. F. 1986. O Ensino de Ciências no Primeiro
a
Grau. 8 ed. São Paulo : Atual, 124p.
FRANCO, M. L. P. B. 1982. O Livro Didático de História no Brasil: a versão fabricada. São Paulo :
Global, 105 p.
GUIA ILUSTRADO O MUNDO DOS ANIMAIS. 1985. Peixes l. São Paulo : Nova Cultural, 59p.
GUIA ILUSTRADO O MUNDO DOS ANIMAIS. 1985. Peixes III. São Paulo : Nova Cultural, 180p.
GOWDAK, D. & MARTINS, E.1996. Ciências: Natureza e Vida. São Paulo : FTD, 255p. (6ª série).
Cadernos de Ecologia Aquática 1 (1): 1-14, jan - jul 2006
14
B. V. Vaniel & M. A. Bemvenuti
HELFMAN, G. S, COLLETTE B. B. & FACEY D. E. 1999. The Diversity of Fishes.
Massachusetts: Blackwell Science, 528p.
HILDEBRAND, M. 1995. Análise da Estrutura dos Vertebrados. (tradução) São Paulo : Atheneu,
700p.
HORNBLOW, L. & HORNBLOW, A. 1990. Peixes - Truques, Artes e Manhas dos Animais. São
Paulo : Melhoramentos, 64p.
a
LOPES, S. G. B. C. 1996. A Vida. São Paulo : Atual, (6 série).
LOPES, S. G. B. C. 1999. Bio. São Paulo : Saraiva, 607p.
MACQUITTY, M. 1994. Tubarões – Aventura Visual. São Paulo : Globo, 63p.
MATTOS, N. S. de & GOWDAK, D. 1991. Aprendendo Ciências - Seres Vivos, Saúde e Ecologia.
São Paulo : FTD, 187p. (6ª série).
MEC/ PNDL. 1998. Guia de Livros Didáticos. Brasília.
th
MOYLE, P. B. & CECH. J. J. Jr. 1996. Fishes: An Introduction to Ichtyology. 3 ed., N. York : John
Wiley & Sons, 506p.
PAXTON, J.R. & ESCHMEYER, N.W. 1994. Encyclopedia of Fishes. San Diego : Academic Press
Inc., 240p.
POUG, F.H. 1999. A Vida dos Vertebrados. (tradução) São Paulo : Atheneu, 2ª ed. 776p.
REGO, T.C. 2000. Nova Escola. A Revista do Professor. (Dezembro 2000).
Endereço dos autores:
Berenice Vahl VANIEL
Secretaria Municipal de Educação e Cultura
Núcleo de Tecnologia Educacional
Rio Grande, RS 96.200-400
Marlise de A. BEMVENUTI
Departamento de Oceanografia, FURG, C. Postal 474
Rio Grande, RS, 96.201-900
Email – [email protected]
Cadernos de Ecologia Aquática 1 (1): 1-14, jan - jul 2006
Download