Fernando Pereira de Almeida COMPORTAMENTO E MOTILIDADE DA BACTÉRIA MAGNETOTÁCTICA ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ SOB CAMPO MAGNÉTICO APLICADO Dissertação de Mestrado Orientador: Drª. Carolina Neumann Keim Co-orientador: Dr. Ulysses Garcia Casado Lins UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE MICROBIOLOGIA PROF PAULO DE GÓES RIO DE JANEIRO MARÇO DE 2009 Livros Grátis http://www.livrosgratis.com.br Milhares de livros grátis para download. Fernando Pereira de Almeida COMPORTAMENTO E MOTILIDADE DA BACTÉRIA MAGNETOTÁCTICA ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ SOB CAMPO MAGNÉTICO APLICADO Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de PósGraduação em Ciências (Microbiologia), Instituto de Microbiologia Prof. Paulo de Góes da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Ciências Biológicas (Microbiologia) Orientador: Drª. Carolina Neumann Keim Co-orientador: Dr. Ulysses Garcia Casado Lins UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE MICROBIOLOGIA PROF PAULO DE GÓES RIO DE JANEIRO MARÇO DE 2009 Almeida, Fernando Pereira de Comportamento e motilidade da bactéria magnetotáctica ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ sob campo magnético aplicado / Fernando Pereira de Almeida – Rio de Janeiro, 2009. v, 106p Dissertação (Mestrado em Ciências Biológicas) Universidade Federal do Rio de Janeiro/ Instituto de Microbiologia Prof. Paulo de Góes, 2009. Orientador: Carolina Neumann Keim Referências bibliográficas: 130 1. Mobilidade bacteriana 2. Bactérias magnetotácticas 3. ‘Candidatus Magnetoglobus Multicellularis’ I. Carolina Neumann Keim. II. UFRJ, Instituto de Microbiologia Prof. Paulo de Góes, Mestrado em Ciências Biológicas. III. Comportamento e motilidade da bactéria magnetotáctica ‘Candidatus Magnetoglobus Multicellularis’ sob campo magnético aplicado. II Fernando Pereira de Almeida COMPORTAMENTO E MOTILIDADE DA BACTÉRIA MAGNETOTÁCTICA ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ SOB CAMPO MAGNÉTICO APLICADO Rio de Janeiro, 31 de Março de 2009. (Orientadora: Carolina Neumann Keim, doutora, IMPPG). (Examinador: Henrique Gomes de Paiva Lins de Barros, doutor, IMPPG). (Examinador: Gilberto Weissmuller, doutor, IBCCF). (Examinador: Daniel Acosta Avalos, doutor, CBPF) (Revisor: Nathan Bessa Viana, doutor, IF-UFRJ) III O presente trabalho foi realizado no Laboratório de Biologia e Ultraestrutura de Procariotos, Departamento de Microbiologia Geral, Instituto de Microbiologia Prof. Paulo de Góes, Centro de Ciências da Saúde (CCS), Universidade Federal do Rio de Janeiro, sob a orientação da Profª Carolina Neumann Keim e co-orientação do Prof. Ulysses Garcia Casado Lins. IV V AGRADECIMENTOS Agradeço a Deus e a todas as pessoas que de alguma forma ajudaram no desenvolvimento dessa dissertação. Espero conseguir lembrar todas elas nesse momento tão importante da minha vida. Agradeço aos meus pais, “Seu Wilson” e “Dona Judite”, as pessoas mais importantes na minha vida. Às minhas tias Neuza e Nenzinha, por toda a ajuda e carinho nos momentos difíceis pelos quais minha mãe passou nesse último ano. Aproveito para dedicar essa dissertação aos meus tios José e Heitor, que faleceram recentemente. É grande a saudade. À minha orientadora, Profª Carolina Keim, por todo apoio, incentivo e compreensão ao longo desses últimos anos. Ao Prof. Nathan Viana, por ter sido o revisor e um co-orientador “não-oficial” dessa dissertação. Sua ajuda foi imprescindível para a realização desse trabalho. Ao Prof. Ulysses Lins, por ter me recebido em seu laboratório e pela sua colaboração ao longo da dissertação. Ao Prof. Marcos Farina, pelas importantes contribuições ao longo de todo o mestrado, e por todo o tempo de convivência e aprendizado que tive em seu laboratório. À Professora Darci Esquivel, minha primeira orientadora, e aos professores Henrique Lins de Barros, Eliane Wajnberg e Daniel Avalos, todos sempre dispostos a ajudar. À Professora Thaís Souto Padrón, pela grande ajuda no processo de aprovação da banca examinadora. À Drª Leida Abraçado, pela ajuda com as bobinas e com a “parte física” da dissertação. VI Aos meus companheiros do LABUP, Drª. Juliana Martins, Karen Silva, Thais Silveira, Fernanda Abreu, Julia Albuquerque, Herval, Iamé, Gisele, Bianca, Tamires, Roberta e Daniele. Obrigado pela amizade e companheirismo. Todos vocês fazem do LABUP um lugar muito prazeroso de se trabalhar. Aos meus ex-colegas do Laboratório de Biomineralização, Mair Oliveira, Leonardo Tavares, Rachel Leal e Leonardo Andrade. Ao Sr. Carlos Van Der Ley e ao Sr. Osmani Bento da Silva pela ajuda na confecção das bobinas. Aos meus colegas de trabalho do CIEP-341 Anne, Patrícia, Priscila, Graça, Lúcia, Sônia, Juraci, Lucimere, Alex, Laudicéia, Valcira, Cilas, Paula e Carlos pelo incentivo, amizade e companheirismo. Vocês são o maior exemplo de como a rede pública de ensino, apesar das péssimas condições de trabalho, ainda conta com profissionais competentes e dedicados. Aos meus amigos Maron, Adriana, Carolina, Luiz, Amanda, e Rodrigo pelas conversas jocosas às sextas-feiras no quiosque do china. Aos membros da banca examinadora, por aceitar participar da minha avaliação e pela compreensão em relação ao pouco tempo entre a entrega da dissertação e a defesa. À SEEDUC por pagar o meu salário. VII Fernando Pereira de Almeida COMPORTAMENTO E MOTILIDADE DA BACTÉRIA MAGNETOTÁCTICA ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ SOB CAMPO MAGNÉTICO APLICADO Orientador: Profª. Drª. Carolina Neumann Keim Co-orientador: Prof. Dr. Ulysses Garcia Casado Lins Resumo da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Ciências (Microbiologia), Instituto de Microbiologia Prof. Paulo de Góes da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários para a obtenção do título de Mestre em Ciências Biológicas. ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ é uma bactéria magnetotáctica multicelular composta por 18 ± 4 células Gramnegativas. Dentro das células, há estruturas intracelulares compostas por cristais magnéticos envoltos por membranas biológicas denominadas magnetossomos. As células são organizadas em um arranjo radial, que resulta em uma estrutura esférica onde cada célula encontra-se em íntimo contato com as células vizinhas e apresenta uma face em contato com um compartimento interno acelular e uma face em contato com o ambiente apresentando múltiplos flagelos. ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ move-se como uma unidade ao longo de linhas de campo magnético. O alinhamento do organismo às linhas de campo se dá de forma passiva, devido ao torque exercido pelo campo magnético sobre os magnetossomos, enquanto a natação se deve à rotação ativa dos flagelos. Além do movimento avante, ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ pode ainda realizar rápidas excursões no sentido inverso, seguido de movimento avante (escape motility). Os objetivos do presente trabalho foram (i) o desenvolvimento de uma metodologia para estudar as trajetórias helicoidais de microrganismos, (ii) a quantificação dos parâmetros que descrevem a natação em trajetórias helicoidais de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ sob ação de diferentes campos magnéticos aplicados e (iii) a observação do efeito de luz ultravioleta sobre a motilidade destes microrganismos. A metodologia aplicada, baseada em vídeo-microscopia e processamento de imagem, permitiu a análise de um grande número de trajetórias. As trajetórias que observamos são bastante alongadas para as bactérias na presença dos campos magnéticos aplicados neste trabalho. Estas trajetórias alongadas sugerem uma otimização do movimento avante. A comparação dos dados obtidos neste trabalho com os dados das trajetórias de outros procariotos de tamanho similar sugere que a forma das trajetórias depende do tamanho e/ou disposição dos flagelos na superfície dos microrganismos. O presente trabalho também analisou o VIII efeito da aplicação de pulsos de laser ultravioleta sobre ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’. Indivíduos diretamente atingidos pelo pulso de laser perderam a sua integridade estrutural, passando a apresentar grupos de células destacadas do arranjo esférico. Um segundo efeito observado foi uma resposta coletiva de “escape motility” nos demais microrganismos não diretamente atingidos pelo pulso de laser. Essa resposta coletiva desapareceu após o terceiro pulso de laser indicando que houve adaptação ao estímulo, o que levou à hipótese de que essa resposta seja uma reação de fototactismo negativo. Palavras-chave: 1. Magnetotaxia 2. Bactérias magnetotácticas 3. ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ 4. Vídeo-microscopia 5. Motilidade bacteriana Rio de Janeiro Março de 2009 IX Fernando Pereira de Almeida COMPORTAMENTO E MOTILIDADE DA BACTÉRIA MAGNETOTÁCTICA ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ SOB CAMPO MAGNÉTICO APLICADO Orientador: Profª. Drª. Carolina Neumann Keim Co-orientador: Prof. Dr. Ulysses Garcia Casado Lins Resumo da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Ciências (Microbiologia), Instituto de Microbiologia Prof. Paulo de Góes da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários para a obtenção do título de Mestre em Ciências Biológicas. ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ is a multicellular magnetotactic prokaryote (MMP) composed by 18 ± 4 Gram-negative cells. In the cells, there are intracellular structures composed of magnetic crystals enveloped by biological membranes, called magnetosomes. The cells are organized in a radial arrangement that results in a spherical shape where each cell has close contact with the adjacent cells and present a face in contact with an internal non-cellular compartment and a face in contact with the environment, displaying multiple flagella. ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ moves as a unit along magnetic field lines. The alignment of organism to the magnetic field lines is passive, due to the torque exerted by the magnetic field on the magnetosomes, while swimming is due to the active flagella rotation. In addition to the forward movement, ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ can also perform fast excursions backwards, followed by a forward movement (escape motility). The aim of this work were (i) to develop a method to study the helical trajectories of microorganisms, (ii) to quantify the parameters that describe the helical swimming of ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ and (iii) to observe the effects of ultraviolet light on the motility of these microorganisms. The methodology applied in this work, based on video microscopy and image analyses, enabled the analyses of a large number of trajectories. The elongated trajectories suggest that the forward movement is optimized. Comparison of the data obtained in this work with data of the trajectories of other prokaryotes of similar size suggests that the shape of the trajectories depends on the size and/or distribution of flagella on the surface of the microorganisms. The present work also analyzed the effect of ultraviolet laser pulses on ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’. Individuals hit directly by the laser lose their structural integrity, presenting groups of cells detached from the spherical array. A secondary effect observed was a collective response similar to the escape motility in the microorganisms not directy X hit by the laser. This collective response disappeared after the third pulse of laser, suggesting that there was adaptation to the stimulus, which lead to the hypothesis that this is a negative fototactism reaction. Key-words: 1. Magnetotaxis 2.Magnetotactic bacteria 3.’Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ 4.videomicroscopy 5.Bacterial motility Rio de Janeiro March, 2009 XI LISTA DE ABREVIATURAS ‘Ca. Magnetoglobus Multicellularis – ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ A – Raio das Trajetórias Helicoidais D – Declinação do campo geomagnético DIC – Contraste por Interferência Diferencial E. coli – Escherichia coli F – Intensidade total do campo geomagnético H - Intensidade horizontal do campo geomagnético I – Inclinação do campo geomagnético IF – Infravermelho LPS – Lipopolissacarídeo MMA – Multicellular Magnetotactic Aggregate MMO – Multicellular Magnetotactic Organism MMP – Multicellular Magnetotactic Prokaryote Nd-YAG – Laser de Neodymium-Doped Yttrium Aluminium Garnet nm – Nanômetro NS – Bactéria magnética north-seeking nT – Nanotesla PVC – Poli-cloreto de vinila SS – Bactéria magnética south-seeking t – Tempo UV – Ultravioleta V0 – Velocidade inicial Vt – Velocidade tangencial X – Componente norte da intensidade horizontal do campo geomagnético X0 – Posição inicial no eixo X Y – Componente leste da intensidade horizontal do campo geomagnético Y0 – Posição inicial no eixo Y Z – Intensidade vertical do campo geomagnético Z0 – Posição inicial no eixo Z θ- Ângulo entre a velocidade angular e a velocidade instantânea λ – Comprimento de onda / passo da hélice µm – Micrômetro ν – Velocidade de natação Τ – Período das trajetórias helicoidais υ – Velocidade Instantânea Φ – Fase arbitrária ω – Velocidade Angular XII XIII 1. INTRODUÇÃO.......................................................................... 1 1.1. FLAGELO BACTERIANO ........................................................................................................................ 3 1.2. QUIMIOTAXIA ....................................................................................................................................... 6 1.3. FOTOTAXIA ........................................................................................................................................... 8 1.4. BIOFÍSICA DO MOVIMENTO DE MICRORGANISMOS ........................................................................... 9 1.5. MOVIMENTO HELICOIDAL ................................................................................................................. 11 1.6. CAMPO GEOMAGNÉTICO .................................................................................................................... 12 1.7. BACTÉRIAS MAGNETOTÁCTICAS........................................................................................................ 14 1.8. MAGNETOSSOMOS E MAGNETOTAXIA .............................................................................................. 18 1.9. MAGNETO-AEROTAXIA ....................................................................................................................... 19 1.10. PROCARIOTOS MAGNETOTÁCTICOS MULTICELULARES .................................................................. 27 1.11. CARACTERÍSTICAS GERAIS DA BACTÉRIA MAGNETOTÁCTICA MULTICELULAR ‘CANDIDATUS MAGNETOGLOBUS MULTICELLULARIS’....................................................................................................... 28 2. OBJETIVOS ........................................................................... 33 2.1. OBJETIVO GERAL ......................................................................................................................... 33 2.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS......................................................................................................... 33 3. MATERIAIS E MÉTODOS........................................................ 34 3.1. COLETA E CONCENTRAÇÃO MAGNÉTICA DE ‘CANDIDATUS MAGNETOGLOBUS MULTICELLULARIS’ ..................................................................................................................................................................... 34 3.2. PRODUÇÃO DE CAMPO MAGNÉTICO APLICADO PARA EXPERIMENTOS DE VÍDEO-MICROSCOPIA. . 36 3.3. VÍDEO-MICROSCOPIA DAS TRAJETÓRIAS DE ‘CANDIDATUS MAGNETOGLOBUS MULTICELLULARIS’ SOB CAMPO MAGNÉTICO APLICADO ........................................................................................................... 39 3.4. AVALIAÇÃO DA RESPOSTA DE ‘CANDIDATUS MAGNETOGLOBUS MULTICELLULARIS’ A PULSOS DE LASER ULTRAVIOLETA E A LUZ ULTRAVIOLETA.......................................................................................... 40 4. RESULTADOS ........................................................................ 43 4.1. TRAJETÓRIAS HELICOIDAIS DE ‘CANDIDATUS MAGNETOGLOBUS MULTICELLULARIS’ SOB CAMPO MAGNÉTICO APLICADO ................................................................................................................................ 43 4.2. RESPOSTA DE ‘CANDIDATUS MAGNETOGLOBUS MULTICELLULARIS’ A PULSOS DE LASER ULTRAVIOLETA ............................................................................................................................................. 45 PRANCHA 1 ......................................................................................................................................... 48 PRANCHA 2 ......................................................................................................................................... 51 PRANCHA 3 ......................................................................................................................................... 54 PRANCHA 4 ......................................................................................................................................... 57 PRANCHA 5 ......................................................................................................................................... 60 PRANCHA 6 ......................................................................................................................................... 63 PRANCHA 7 ......................................................................................................................................... 66 PRANCHA 8 ......................................................................................................................................... 69 PRANCHA 9 ......................................................................................................................................... 72 PRANCHA 10 ...................................................................................................................................... 75 PRANCHA 11 ...................................................................................................................................... 78 5. DISCUSSÃO .......................................................................... 81 5.1. VANTAGENS E DESVANTAGENS DA NOVA METODOLOGIA DESENVOLVIDA PARA O ESTUDO DO MOVIMENTO DE MICRORGANISMOS ........................................................................................................... 81 5.2. QUANTIFICAÇÃO DOS PARÂMETROS DAS TRAJETÓRIAS HELICOIDAIS DE ‘CANDIDATUS MAGNETOGLOBUS MULTICELLULARIS’ NOS DOIS DIFERENTES CAMPOS MAGNÉTICOS APLICADOS, E SUAS IMPLICAÇÕES PARA O MOVIMENTO .................................................................................................. 85 XIV 5.3. COMPARAÇÃO DO MOVIMENTO DE ‘CANDIDATUS MAGNETOGLOBUS MULTICELLULARIS’ COM O DE OUTRAS BACTÉRIAS .................................................................................................................................... 90 5.4. RESPOSTA DE ‘CANDIDATUS MAGNETOGLOBUS MULTICELLULARIS’ A PULSO DE LASER E LUZ ULTRAVIOLETA. ........................................................................................................................................... 94 6. CONCLUSÕES ........................................................................ 97 7. BIBLIOGRAFIA ................................................................... 100 XV XVI 1. INTRODUÇÃO As bactérias podem interagir de diversas formas com o ambiente, tanto o alterando quanto estando sujeitas às suas condições físicoquímicas. O resultado de quatro bilhões de anos de evolução dos organismos procariotos gerou uma diversidade de aproximadamente 7000 espécies reconhecidas, pertencentes aos domínios Bacteria e Archaea, número que pode chegar a centenas de milhares se considerarmos as espécies ainda não descritas (GARRITY, LIBUM & BELL 2005; MADIGAN & MARTINKO, 2006). Tamanha quantidade de espécies se reflete na grande diversidade metabólica observada entre os microrganismos, e na imensa variedade de nichos ecológicos que tais seres podem ocupar. Diferentes espécies necessitam de diferentes nutrientes e condições ambientais para a sua sobrevivência, e tais fatores podem variar no espaço de maneira relevante, mesmo em dimensões tão pequenas quanto poucos micrômetros (MADIGAN & MARTINKO, 2006). A capacidade autônoma de deslocamento observada em indivíduos dos mais diferentes grupos taxonômicos constitui uma das características mais fundamentais da vida, tendo crucial importância nos processos ecológicos e evolutivos (NATHAN, 2008). A capacidade de deslocamento a favor ou contra um estímulo presente no meio pode significar a diferença entre a sobrevivência e a morte de um microrganismo (MADIGAN & MARTINKO, 2006). As bactérias podem apresentar mecanismos de locomoção que lhes permitem explorar diferentes regiões do meio onde se encontram, proporcionando a busca e posicionamento em locais que possuam os nutrientes e condições ambientais necessárias à sua existência. A capacidade de movimentação pode, ainda, evitar a predação das bactérias por outros microrganismos. Nesse sentido, a velocidade de deslocamento e o padrão de natação “run and reversal” observado em bactérias marinhas seriam exemplos de parâmetros determinantes na prevenção da predação (MITCHELL et al., 1995; JÜRGENS & MATZ, 2002). O tamanho pequeno dos organismos procariotos, que torna difícil a percepção de gradientes físico-químicos ao longo do seu corpo (no caso uma ou poucas células), análises teóricas estimam o limite de tamanho de um microrganismo para percepção espacial em menos de 1 µm. Contudo, a maioria das bactérias se orienta no meio ambiente comparando o status físico e/ou químico do meio em função do tempo. Isso significa que, à medida que se desloca, a bactéria compara a presente condição do meio com aquela percebida em um passado recente (DUSENBERY, 1998). A vantagem em possuir capacidade de movimento ativo se torna explícita quando consideramos a velocidade de difusão de moléculas em meio aquoso implícito ao movimento Browniano. Uma molécula se desloca ao longo de uma bactéria de 1 µm em 0,5 ms, mas demora 1000 s para se deslocar 1mm no meio. Isso porque o tempo de deslocamento aumenta com o quadrado da distância (MITCHELL & KOGURE, 2006). Já foram descritos diferentes mecanismos pelos quais as bactérias se deslocam. Muitas bactérias são capazes de se movimentar sobre superfícies sólidas por meio de gliding (deslizamento). Outras possuem mecanismos que permitem regular a sua posição em colunas d’água por meio de vesículas gasosas. Entretanto, a grande maioria das bactérias se desloca devido à rotação de flagelos (MADIGAN & MARTINKO, 2006). 2 1.1. Flagelo Bacteriano O flagelo bacteriano é uma estrutura protéica com formato helicoidal, constituída por subunidades de flagelina, uma proteína codificada pelo gene FlgC. A forma do filamento é determinada em parte pela estrutura e arranjo das moléculas de flagelina e em parte pela reação à rotação da estrutura. A figura 1 mostra a estrutura típica de um flagelo de bactéria Gram-negativa. A base do flagelo difere do filamento flagelar. Trata-se de uma estrutura mais espessa, denominada gancho, formada pelas flagelinas associadas ao gancho, codificadas pelos genes FlgK, FlgL e FliD. Tanto o flagelo quando o gancho são estruturas externas à célula. O flagelo é conectado através do gancho a um motor protéico ancorado à parede celular e à membrana plasmática. O motor consiste em uma haste que atravessa quatro anéis associados a diferentes estruturas do envoltório celular (BERG, 2003). As bactérias Gram-negativas apresentam parede celular contendo pequenas quantidades de peptídeoglicano e uma membrana externa, constituída de lipopolissacarídeo, lipoproteínas e outras macromoléculas complexas. Nessas bactérias, o flagelo é conectado ao envoltório celular de forma que o anel mais externo (anel L) encontra-se associado à camada de lipopolissacarídeo (LPS). Abaixo, encontra-se o anel P, ancorado à camada de peptideoglicanas da parede celular. O anel MS localiza-se na membrana plasmática e o anel C, o mais interno, situa-se na interface entre a membrana plasmática e o citoplasma (Figura 1). O motor do flagelo bacteriano é constituído por aproximadamente 20 tipos de proteínas e possui dimensões que não excedem 50 nm. O motor pode apresentar rotação em frequências da ordem de 100 Hz, 3 cujo torque causa a rotação do flagelo, estrutura responsável pelo deslocamento da célula (BERG, 2003). Flanqueando os anéis mais internos do motor (MS e C), existe uma série de proteínas motoras (Mot), responsáveis pela rotação do flagelo; e um conjunto de proteínas Fli, cuja função é determinar o sentido de rotação do motor em resposta a estímulos intracelulares. Os anéis C, MS e P constituem o corpo basal, atuando como um rotor. Em volta do corpo basal, as proteínas Mot geram o torque para a rotação da estrutura. A fonte de energia que move o motor flagelar provém da passagem de prótons através da membrana plasmática e através das proteínas Mot associadas aos anéis MS e C. A forma como a rotação do motor realmente ocorre ainda não é conhecida. Um modelo proposto para esse fenômeno, “turbina de prótons” (Figura 2), sugere que a passagem de prótons pelas proteínas Mot exerça forças eletrostáticas nas cargas das proteínas do rotor dispostas de forma helicoidal. A atração entre cargas positivas e negativas causaria, então, a rotação do corpo basal. (BERG, 2003; MADIGAN & MARTINKO, 2006). 4 Figura 1: Estrutura do flagelo de bactérias Gram-negativas. O flagelo é conectado à superfície da célula por um gancho ligado à haste do motor rotatório. Associado ao LPS se encontra o anel mais externo (L). O anel P é ancorado à camada de peptídeoglicano da parede celular. O anel S é associado à membrana plasmática e o anel C encontra-se na face interna da membrana plasmática, em contato com o citoplasma. Os anéis P, MS e C constituem o corpo basal, que funciona como um rotor que é impulsionado pelo fluxo de prótons através das proteínas Mot. Entre os anéis MS e C encontram-se proteínas Fli, cuja função é alternar o sentido de rotação do motor em resposta a sinais intracelulares (Adaptado de Madigan & Martinko, 2009). Figura 2: Modelo de “turbina de prótons” proposto para explicar a rotação do flagelo. O fluxo de prótons pelas proteínas Mot exerceriam forças nas cargas presentes nos anéis MS e C, causando a rotação da estrutura (Adaptado de Madigan & Martinko, 2009). 5 1.2. Quimiotaxia Os estímulos que direcionam as bactérias a favor ou contra um determinado micro-ambiente podem ser de natureza física ou química. Os exemplos mais relatados na literatura são as respostas à luz (fototaxia) e a substâncias químicas (quimiotaxia). A quimiotaxia consiste no movimento ativo de células ou organismos em resposta a substâncias presentes no meio. Esse deslocamento pode ocorrer tanto a favor quanto contra o estímulo químico, onde a natureza da substância e a espécie ou tipo celular em questão determinam o tipo de resposta (EISENBACH, 2007). Grande parte dos estudos relacionados à quimiotaxia tem como modelo a bactéria Escherichia coli. Trata-se de uma bactéria comum do trato intestinal humano que tem forma de bastão e possui aproximadamente seis flagelos emergindo de pontos aleatórios da membrana celular. Cada flagelo é propelido por um motor protéico rotatório, ancorado à membrana plasmática e parede celular. Quando os flagelos giram em sentido anti-horário, tendo como referência o plano da superfície onde o flagelo se insere, ocorre a formação de um tufo sincronizado de flagelos, que propele a célula avante, em trajetórias aproximadamente retilíneas (run) (TUNER, RYU & BERG, 2000). Este padrão de movimento não constitui uma trajetória perfeitamente retilínea devido à susceptibilidade da bactéria ao movimento browniano rotacional e translacional, causados pela colisão da bactéria com moléculas presentes no fluido circundante. O movimento browniano é desprezível quando comparado com o movimento de natação translacional da célula. Contudo, o movimento browniano é significativo 6 para o movimento rotacional, causando dispersão angular da trajetória (MITCHELL & KOGURE, 2006). Quando um ou mais flagelos giram em sentido horário, o tufo de flagelos se desfaz e a célula passa a se mover em padrão errático, denominado tumble, que causa a reorientação da célula em nova direção devido à energia térmica do meio. E. coli realiza quimiotaxia executando runs e tumbles alternadamente (TUNER, RYU & BERG, 2000). E. coli possui dimensões muito restritas para detectar diferenças espaciais na concentração das substâncias dispersas no meio. Contudo, é capaz de realizar comparações temporais à medida que nada. A bactéria compara a concentração de substâncias químicas atrativas ou repelentes com aquelas presenciadas há poucos instantes. Isso permite à E. coli modular a taxa de runs e tumbles em função da diferença de concentração da substância presente no meio. Caso E. coli esteja presente em um gradiente químico atrativo, os movimentos randômicos existentes em situações de ausência de estímulos ambientais tornam-se movimentos não aleatórios. À medida que a bactéria avança para zonas com maior concentração da substância atrativa, as corridas tornam-se mais longas e os tumbles menos frequentes. Consequentemente, a tendência é que o microrganismo se desloque para regiões de maior concentração da substância atrativa. Caso o gradiente seja de uma substância repelente, o mesmo mecanismo é aplicado. Entretanto, é a redução da concentração da substância que promove o aumento das corridas e a redução dos tumbles (LOCSEI, 2007). 7 1.3. Fototaxia Diversos microrganismos apresentam alteração no padrão de natação em resposta à condição de luz do ambiente. Existem três tipos conhecidos de resposta à luz. A resposta escotofóbica é caracterizada por uma “fobia ao escuro”: a bactéria entra em tumble, cessa ou reverte a direção de natação quando percebe uma redução na intensidade de luz do meio. A fotocinese é caracterizada por uma alteração na taxa de motilidade do microrganismo devido a diferenças na intensidade de luz do meio. A fototaxia propriamente dita envolve o movimento orientado da célula a favor ou contra uma fonte de luz (OBERPICHLER et al., 2008). A priori, a vantagem da fototaxia seria permitir aos organismos fototróficos se posicionar em regiões onde o comprimento de onda e a intensidade da luz recebida sejam os mais adequados para a fotossíntese. Isso pode ser observado quando se ilumina com um espectro de luz uma lâmina de microscópio com bactérias fototróficas. As bactérias se acumulam na região de máxima absorção de seus pigmentos fotossintetizantes (MADIGAN & MARTINKO, 2006). Entretanto, a resposta à luz pode ser observada em espécies heterotróficas. E. coli responde a pulsos intensos de luz azul realizando tumbles. A fototaxia em E. coli parece estar relacionada com a síntese de ferroquelatase, a enzima que catalisa a etapa final de incorporação de Fe+2 pela protoporfirina IX (YANG, INOKUCHI & ADLER, 1995). A mutação no gene que codifica a ferroquelatase impede a formação do grupamento heme (molécula orgânica com estrutura em anel associada a íons de ferro), causando acúmulo de protoporfirina IX na célula. Cepas mutantes para o gene hemH que codifica a ferroquelatase respondem à luz azul (396-450nm) realizando “tumbles”. A retirada da luz azul faz com que as células passem a apresentar “runs”. As cepas mutantes para 8 hemH são aproximadamente 100 vezes mais sensíveis à luz azul que as cepas selvagens (YANG et al., 1996). 1.4. Biofísica do movimento de microrganismos O deslocamento dos microrganismos em meio aquático possui limitações físicas distintas das observadas na natação de organismos superiores, como peixes e mamíferos aquáticos. O deslocamento dos microrganismos na água é regido pela viscosidade do meio. A inércia, fator relevante na natação de organismos de maior dimensão, torna-se desprezível para microrganismos como as bactérias. Para que um microrganismo seja propelido em meio aquoso, é necessária a atuação ativa e constante de apêndices de superfície, como cílios e flagelos. A interrupção do batimento ou rotação dessas estruturas causa a interrupção imediata do movimento avante. Por outro lado, mesmo que o microrganismo não possua cílios ou flagelos, haverá movimento. Microrganismos em suspensão em meio aquoso estão sujeitos à movimentação passiva, de forma randômica, devido ao movimento térmico das moléculas de água, fenômeno conhecido como movimento browniano. Se considerarmos uma população de células se difundindo a partir de um ponto sobre uma reta, em apenas uma dimensão, observamos que com o passar do tempo, cada indivíduo da população se afasta cada vez mais de sua posição inicial, gerando uma curva de distribuição de posições que é Gaussiana. Com o passar do tempo, a largura da Gaussiana aumenta. Este tipo de distribuição pode ser caracterizado pela medida do desvio quadrático médio das partículas, dado quando se considera apenas uma dimensão por: < r 2 >= 2Dt , onde t é o tempo decorrido e D é o coeficiente de difusão, que depende do tamanho e da 9 forma da célula, dentre outros fatores, e < > significa uma média realizada sobre todos os indivíduos da população. Por exemplo, para uma bactéria com raio de 1µm em meio aquoso à 37ºC, o coeficiente de 5 ×10−9 cm2 / s difusão é igual a Quando consideramos duas e três dimensões, temos < r 2 >= 4Dt e < r 2 >= 6 Dt , respectivamente. Dada a natureza randômica e lenta do deslocamento celular em meio aquoso devido à energia térmica, a capacidade de natação através de propulsão proporcionada por estruturas de superfície celular constitui uma importante vantagem para a sobrevivência dos microrganismos (BRAY, 1992). Quando um microrganismo nada propelido por cílios ou flagelos, ele se depara com duas forças de resistência ao movimento avante: o arrasto causado pela viscosidade do meio e a resistência inercial do fluido. O Número de Reynolds é um parâmetro adimensional determinado pela razão entre as forças de inércia e de viscosidade do meio (NOGUEIRA & LINS DE BARROS, 1995). Números de Reynolds abaixo de 0,001 indicam que o movimento é influenciado basicamente pela viscosidade do meio e que as forças inerciais são desprezíveis (BRAY, 1992). Para a natação de um dado organismo, o número de Reynolds depende da dimensão do organismo, da velocidade de natação e da densidade e viscosidade do meio líquido, sendo dado por: Re = f (inércia ) v 2 L2 ρ vLρ (1) = = η f (vis cos idade ) vLη Onde (L) é a dimensão linear do organismo, (v) é a velocidade, (ρ) é a densidade e (η) a viscosidade do meio. Analisando a equação, temos que para organismos com dimensões grandes (L grande), o número de Reynolds também será grande. Nesse caso, o movimento terá grande influência da inércia. Para o caso de microrganismos, cujas dimensões são muito reduzidas, tem-se um número de Reynolds extremamente 10 baixo. Para uma bactéria de 1µm de comprimento nadando em meio aquoso, o número de Reynolds é igual a 10-5, sendo o movimento dominado pelas forças devido à viscosidade do meio. Uma das conseqüências do movimento sob o regime de baixo número de Reynolds é que o formato da célula não constitui nenhuma vantagem em termos de hidrodinâmica, uma vez que isso só ocorre sob regime inercial, onde a forma do organismo está relacionada com a turbulência gerada durante o movimento (BRAY, 1992). 1.5. Movimento Helicoidal A natação em trajetórias helicoidais é uma característica comum a diversos microrganismos e células com dimensões entre 5 e 500µm (JENNINGS 1901, 1904; CRENSHAW, 1993a), sendo observadas em ciliados, flagelados, células germinativas de animais vertebrados e invertebrados (CRENSHAW, 1993a). Jennings (1901) realizou a primeira análise da cinemática do movimento helicoidal em microrganismos, afirmando que a natação helicoidal envolve dois componentes de rotação: um paralelo e outro perpendicular ao eixo de movimento. Tais análises, entretanto, não forneceram uma descrição completa do movimento helicoidal, nem tampouco discutiram suas consequências. Organismos com natação em padrão helicoidal respondem a estímulos do meio através do alinhamento do eixo da trajetória em direção ao estímulo. A alteração da direção do eixo de natação se dá por meio de alterações na velocidade rotacional (angular) em resposta ao estímulo (BROKAW, 1958; CRENSHAW, 1993b). Em situações onde uma face do organismo sempre aponta para o eixo da hélice, tanto a velocidade translacional quanto a velocidade rotacional sempre apontam para a mesma direção em relação ao corpo 11 do microrganismo ou alteram a direção somente em um plano em relação ao corpo do organismo (CRENSHAW, 1993a). Organismos que nadam em trajetórias helicoidais podem alterar a direção de natação em resposta a estímulos do meio simplesmente variando a velocidade rotacional em função da intensidade do estímulo. Esse tipo de resposta consiste em uma taxia verdadeira: não há componentes randômicos nesse mecanismo de orientação (CRENSHAW, 1993b). Uma peculiaridade da resposta quimiotáctica ou fototáctica de organismos com natação helicoidal é o fato de que a intensidade do estímulo percebido sofre variação em função da espiral descrita pelo microrganismo. Em organismos quimiotácticos com natação helicoidal, a intensidade resultante do estímulo constitui uma função senoidal em relação ao tempo. A taxa na qual o microrganismo gira em relação ao seu eixo anterior-posterior é, por exemplo, proporcional à concentração de uma substância presente no meio. A orientação pode ser a favor ou contra um gradiente químico, dependendo da relação entre a intensidade do estímulo e a velocidade rotacional (CRENSHAW, 1993c). 1.6. Campo geomagnético A terra atua como um grande magneto esférico, sendo envolto por um campo magnético que varia no tempo e no espaço. Considerando-se a terra como um grande dipolo magnético, o eixo desse dipolo encontrase desalinhado com o eixo de rotação da terra em aproximadamente 11º. Isso significa que os pólos norte e sul magnético e os pólos norte e sul geográfico não se sobrepõem. A qualquer momento ou local, o campo geomagnético pode ser caracterizado por uma direção e intensidade mensuráveis. Os principais 12 parâmetros que caracterizam o campo magnético são a declinação (D), a intensidade horizontal (H) e a intensidade vertical (Z). A partir desses três elementos, todos os demais parâmetros do campo geomagnético podem ser calculados (Figura 3). O campo geomagnético varia em diferentes locais da superfície do planeta. Nos pólos geomagnéticos, a agulha de uma bússola tende a permanecer na vertical em relação à superfície da terra: a intensidade horizontal é igual a zero e a bússola não aponta a direção norte-sul (a declinação é indefinida). No pólo norte magnético, a terminação norte da bússola aponta para baixo. No pólo sul magnético, a ponta norte da agulha aponta para cima. No equador magnético, a inclinação da agulha é zero (a agulha permanece paralela ao eixo norte-sul geomagnético). A caracterização completa do campo geomagnético se dá através de sete parâmetros: declinação (D), inclinação (I), intensidade horizontal (H), componente norte (X) e componente leste (Y) da intensidade horizontal, intensidade vertical (Z) e intensidade total (F). Os parâmetros que descrevem a direção do campo magnético são a declinação (D) e a inclinação (I), expressos em graus. A intensidade do campo geomagnético total (F) é descrita pela componente horizontal (H), pela componente vertical (Z) e pelas componentes norte (X) e leste (Y) da intensidade horizontal. Essas componentes podem ser expressas em unidades de Gauss ou, mais comumente, em nano-Tesla (1 Gauss = 105nT). A intensidade do campo geomagnético varia entre 25.000 e 65.000 nT (0,25 e 0,65 Gauss). A declinação magnética é o ângulo entre o norte magnético e o norte geográfico. A declinação é considerada positiva quando o ângulo medido se encontra a leste do norte geográfico e é negativo quando se encontra a oeste. A inclinação magnética é o ângulo entre o plano horizontal e o vetor do campo magnético total, sendo positivo quanto aponta em 13 direção ao chão (latitudes superiores à do equador magnético) e negativo quando aponta para cima (latitudes inferiores à do equador magnético) (National Oceanic and Atmospheric Administration - USA, WWW.noaa.gov.br). (b) (a) Figura 3: (A) Eixo de rotação da terra, o eixo do dipolo geomagnético e orientação das linhas de campo geomagnético ao redor do globo terrestre. (B) Parâmetros do campo geomagnético: campo geomagnético total (F), componente horizontal (H), componente vertical (Z), componente norte (X) e leste (Y) da intensidade horizontal. 1.7. Bactérias magnetotácticas Há pouco mais de trinta anos, um novo tipo de resposta microbiana ao ambiente foi descrito por Richard P. Blakemore, então aluno de graduação em microbiologia na Universidade de Massachusetts. Durante uma tentativa de isolar Spirochaeta plicatilis de sedimentos pantanosos coletados em Woods Hole, no Estado de Massachusetts (EUA), Blakemore observou microrganismos que nadavam persistentemente para um dos lados da gota de água e sedimento observada ao microscópio óptico. Blakemore demonstrou 14 experimentalmente que tais bactérias respondiam ao campo magnético: a direção para a qual esses microrganismos nadavam mudava rapidamente quando um ímã era posicionado próximo à amostra (BLAKEMORE, 1975). A microscopia de transmissão desses microrganismos demonstrou que tais bactérias apresentavam formato aproximadamente esférico, com diâmetro médio de 1µm. Possuíam dois tufos de flagelos, cada qual constituído por aproximadamente sete unidades, além de apresentar duas cadeias citoplasmáticas contendo entre cinco e dez estruturas eletrondensas de aspecto cristalino, cujo elemento predominante era o ferro (fato demonstrado através de microanálises de raios-X). Blakemore cogitou a magnetita (Fe3O4) como mineral constituinte dessas estruturas (BLAKEMORE, 1975), o que foi confirmado poucos anos depois através de espectroscopia de Mössbauer de células cultivadas (FRANKEL, BLAKEMORE & WOLFE, 1978). Richard Blakemore usou pela primeira vez os termos “bactéria magnetotáctica” e “magnetotaxia” em referência a bactérias que respondem ao campo magnético e ao movimento de bactérias em resposta ao campo magnético, respectivamente. Segundo Blakemore, tais inclusões ricas em ferro atuariam como dipolos magnéticos, conferindo momento magnético às células e, consequentemente, orientando-as sob campos magnéticos (BLAKEMORE, 1975; FRANKEL, WILLIAMS & BAZYLINSKI, 2007). Desde então, todos os trabalhos relacionados a bactérias magnetotácticas se referem, de uma maneira ou de outra, às idéias propostas por Blakemore para a magnetotaxia (FRANKEL, WILLIAMS & BAZYLINSKI, 2007). As bactérias magnetotácticas ocorrem na coluna d’água ou em sedimentos alagados com estratificação química vertical, ocorrendo predominantemente na interface de transição óxica-anóxica (zona de transição entre regiões com e sem oxigênio dissolvido), em regiões 15 anóxicas ou em ambas (BAZYLINSKI et al., 1995; BAZYLINSKI & MOSKOWITZ 1997; SIMMONS et al., 2004). Apresentam uma grande diversidade de tipos morfológicos, como espirilos, vibriões, cocos, bacilos e formas multicelulares. A parede celular das bactérias magnetotácticas possui características similares às de bactérias Gramnegativas. Todas são propelidas por flagelos, cujo arranjo varia de acordo com a espécie ou cepa, podendo ser monotríqueos polares (flagelo emergindo em um dos pólos da célula), bipolares (emergindo em dois pólos da célula) ou estar presente na forma lofotríquea (grupo de flagelos emergindo de um pólo da célula) (BAZYLINSKI & FRANKEL 2004). As bactérias magnetotácticas conhecidas até hoje se encontram no domínio Bacteria e são associadas a diferentes subgrupos de Proteobacteria e com o filo Nitrospira (SPRING & BAZYLINSKI, 2000; SIMMONS et al., 2004). Todas possuem magnetossomos, estruturas intracelulares contendo cristais magnéticos compostos pelo óxido de ferro magnetita (Fe3O4) e / ou pelo sulfeto de ferro greigita (Fe3S4), envoltos por uma membrana biológica (GORBY, BEVERIDGE & BLAKEMORE, 1988; BAZYLINSKI & FRANKEL, 2004; ABREU et al., 2008). As bactérias produtoras de magnetita são encontradas tanto em ambientes marinhos quanto em ambientes de água doce. Já as bactérias magnéticas produtoras de greigita são encontradas somente em ambientes com alguma influência marinha. Em ambientes marinhos estratificados onde ambos os tipos de bactérias coexistem, as bactérias produtoras de magnetita são encontradas no topo da quimioclina, enquanto as produtoras de greigita ocorrem na base ou abaixo da quimioclina (BAZYLINSKI et al., 1995; SIMMONS et al., 2004). Os cristais biomineralizados pelas bactérias magnetotácticas possuem comprimento da ordem de 35 a 220 nm (BAZYLINSKI & FRANKEL, 2004; McCARTNEY et al., 2001), e se encontram organizados 16 em cadeias paralelas de comprimentos diversos, algumas vezes formando feixes (HANZLIK et al., 1996) ou grupos planares (SILVA et al., 2007). Quando observadas ao microscópio óptico, bactérias magnetotácticas mortas, por exemplo, por fixação com vapor de tetróxido de ósmio, não apresentam migração, embora as células não aderidas à lâmina se alinhem passivamente a campo magnético aplicado quando a direção deste é alterada. Isso demonstra que a natação da bactéria de deve à rotação ativa dos flagelos (BLAKEMORE, 1975). Devido à presença dos magnetossomos, as bactérias magnéticas são alinhadas passivamente, enquanto se deslocam de maneira ativa devido à rotação dos seus flagelos (BLAKEMORE, 1975). As velocidades de natação reportadas na literatura para microrganismos dessa natureza variam de 40 a 1000 µm/s (BLAKEMORE, 1975; MARATEA & BLAKEMORE, 1981; MOENCH, 1988; COX et al., 2002). De maneira geral, os espirilos magnéticos apresentam as menores velocidades de natação (<100µm/s) (MARATEA & BLAKEMORE, 1981) e os cocos magnéticos apresentam as maiores velocidades (>100µm/s) (BLAKEMORE, 1975; MOENCH, 1988; COX et al., 2002). As bactérias magnetotácticas são de difícil isolamento e cultivo, existindo atualmente poucas culturas puras desses microrganismos. A maior dificuldade na obtenção de culturas puras de bactérias magnetotácticas reside no fato destas serem microaerófilas obrigatórias ou anaeróbias (BAZYLINSKI & FRANKEL 2004). Apesar disso, as bactérias magnetotácticas são facilmente detectadas em amostras coletadas do ambiente por meio de isolamento magnético (LINS et al., 2003). As espécies reconhecidas atualmente incluem Magnetospirillum magnetotacticum MS-1 (MARATEA & BLAKEMORE, 1981; BLAKEMORE, MARATEA & WOLFE, 1979; SCHLEIFER et al., 1991), Magnetospirillum 17 gryphiswaldense (SCHLEIFER et al., 1991), Magnetospirillum magneticum AMB-1 (MATSUNAGA, SAKAGUCHI & TADOKORO, 1991) e Desulfovibrio magneticus (SAKAGUCHI, ARAKAKI & MATSUNAGA, 2002). Existem ainda espécies cultivadas, mas parcialmente caracterizadas, como vibriões marinhos MV-1 e MV-2 (BAZYLINSKI, FRANKEL & JANNASCH, 1988; MELDRUM et al., 1993a), cocos MC-1 (MELDRUM et al., 1993b) e espirilos MMS-1 (anteriormente MV-4) (BAZYLINSKI & FRANKEL, 2000; MELDRUM et al., 1993b). 1.8. Magnetossomos e Magnetotaxia As dimensões dos nanocristais magnéticos de magnetita (Fe3O4) e/ou greigita (Fe3S4) biomineralizados pelas bactérias magnéticas, da ordem de 35-120nm, caracteriza-os magneticamente como cristais de domínio simples. Isso significa que eles atuam como dipolos permanentes, alinhando-se a linhas de campos magnéticos de forma semelhante à agulha de uma bússola. Os cristais de magnetita ou greigita de domínio simples são uniformemente magnetizados, possuindo máximo momento de dipolo magnético por unidade de volume (FRANKEL, WILLIAMS & BAZYLINSKI, 2007). Os magnetossomos encontram-se intimamente associados a filamentos de citoesqueleto (KOMEILI et al., 2006; SCHEFFEL et. al, 2006). O torque exercido pela interação entre o dipolo magnético dos magnetossomos e campos magnéticos externos causa o alinhamento passivo da célula às linhas de campo, enquanto as células nadam devido à propulsão gerada pela rotação dos seus flagelos (FRANKEL, WILLIAMS & BAZYLINSKI, 2007). 18 Quando observadas ao microscópio óptico sob condições ambientais de [O2] e sob a influência de campo magnético gerado por um ímã ou por um par de bobinas eletromagnéticas, as bactérias magnetotácticas nadam alinhadas ao campo magnético aplicado, em trajetórias retilíneas ou helicoidais. Quando a direção do campo magnético aplicado é alterada em 180º, as bactérias se reorientam, realizando um “U-turn” ou “volta em U” (a bactéria altera a sua direção de natação em 180°, passando a nadar no sentido oposto ao observado antes da reversão do campo). A organização dos magnetossomos em cadeias faz com que a interação magnetostática entre os cristais resulte em um momento magnético permanente para a cadeia como um todo (FRANKEL, 1984). A direção da natação da bactéria seria resultado do torque exercido pela interação do campo magnético externo com o momento magnético da célula. Por outro lado, a energia térmica do meio atua como um fator de perturbação do alinhamento da bactéria durante a natação. O alinhamento médio da bactéria enquanto nada alinhada a um campo magnético é dado pela razão entre a energia magnética e a energia térmica do meio (FRANKEL, 1984). 1.9. Magneto-aerotaxia O modelo originalmente proposto para a magnetotaxia baseava-se em dois pressupostos: que todas as bactérias magnetotácticas possuiriam polaridade fixa em relação à direção de natação, e que todas seriam microaerófilas (com crescimento apenas em concentrações de oxigênio reduzidas em comparação às concentrações atmosféricas) (BLAKEMORE 1975; BLAKEMORE & FRANKEL 1981). No hemisfério norte, o vetor do campo magnético total é inclinado para baixo: as 19 linhas de campo apontam em direção à superfície da terra. No hemisfério sul, o campo magnético aponta para o sentido inverso, para cima. Isso significa que, para nadar para o fundo do sedimento, em direção a menores [O2], bactérias no hemisfério norte nadam de forma paralela ao campo magnético. No hemisfério sul, nadar em direção ao sedimento significa nadar de forma antiparalela ao campo geomagnético (FRANKEL, WILLIAMS & BAZYLINSKI, 2006). As bactérias que nadam persistentemente em direção ao norte magnético são denominadas NS (do inglês “North-seeking” - que nada para o pólo norte magnético) enquanto as que nadam com orientação antiparalela são demoninadas SS (“South-seeking” - que nada em direção ao pólo sul magnético) (FRANKEL, WILLIAMS & BAZYLINSKI, 2006). Segundo o modelo original proposto para a magnetotaxia, a inclinação do campo magnético poderia guiar as bactérias verticalmente no sedimento para regiões com concentrações de oxigênio reduzidas. Uma vez alcançada tal região, presumia-se que as bactérias cessassem a migração, aderindo-se ao sedimento até que houvesse alguma alteração na concentração de oxigênio. Esta teoria se apóia no fato de haver predominância no hemisfério norte de bactérias magnetotácticas polares NS, e predominância de bactérias magnetotácticas polares SS no hemisfério sul observadas sob condições aeróbias (BLAKEMORE 1975; BLAKEMORE, FRANKEL & KALMIJN, 1980; NOGUEIRA & LINS DE BARROS, 1995). Contudo, a descoberta de grandes populações de bactérias magnetotácticas na coluna d’água em regiões de quimioclina de habitats marinhos, a obtenção de culturas puras de bactérias microaerófilas obrigatórias e a descoberta de populações de bactérias SS no hemisfério norte não poderiam ser explicadas pelo modelo original proposto para a magnetotaxia. 20 O modelo original proposto para a magnetotaxia não explicava como bactérias na zona anóxica da coluna d’água se beneficiavam da magnetotaxia e não explicava como cocos magnetotácticos polares como MC-1 formavam bandas microaerófilas horizontais quando em meio semi-sólido com gradiente de oxigênio, ao invés de se acumular e crescer no fundo do tubo (FRANKEL et al., 1997; SIMMONS, BAZYLINSKI & EDWARDS, 2006). Culturas puras de cocos magnetotácticos marinhos denominados MC-1 formam bandas microaerófilas em capilar de vidro achatado com gradiente de oxigênio e campo magnético aplicado. Estas bactérias são capazes de migrar em ambas as direções do campo magnético, usando tanto a resposta magnetotáctica quanto a resposta aerotáctica para se posicionar em regiões onde a concentração de oxigênio é mais adequada (FRANKEL et al., 1997). Sob observada condições ao homogêneas microscópio de oxigênio óptico), células (uma de gota MC-1 d’água nadam persistentemente na mesma direção de sentido do campo magnético aplicado, ou seja, apresentam comportamento NS. Quando o campo magnético é revertido, as células realizam uma volta em U (u-turn) e continuam a nadar paralelas ao campo aplicado. Quando inseridas em um capilar de vidro com gradiente de oxigênio, as células MC-1 formam bandas microaerófilas, nadando tanto de forma paralela quanto de forma antiparalela ao campo aplicado, revertendo o sentido de natação quando ultrapassam o limite da banda (Figura 4c). Se o campo magnético for invertido, as células nadando em cada direção realizam um u-turn, permanecendo na mesma direção relativa ao campo antes da reversão, o que tende a desfazer a banda em dois grupos de células que se afastam em sentidos opostos da posição da banda original. Quando o campo é novamente revertido para a orientação original, a banda microaerófila se refaz. Isso demonstra 21 que os cocos MC-1 podem nadar a favor ou contra o sentido do campo magnético aplicado, mantendo seus dipolos magnéticos alinhados de forma paralela ao campo em ambos os casos (FRANKEL et al., 1997). Os mesmos experimentos de resposta ao gradiente de oxigênio e à inversão do campo magnético foram realizados com Magnetospirillum magnetotacticum, com resultados diferentes. Quando observados ao microscópio óptico sob condições homogêneas de oxigênio e campo magnético aplicado, M. magnetotacticum nada em ambas as direções do campo aplicado, mesmo após a reversão do campo magnético. Quando em capilares com gradiente de [O2], M. magnetotacticum formam bandas microaerófilas, assim como o observado em MC-1. A reversão do campo aplicado faz com que as células girem 180º. Entretanto, ao contrário do observado em MC-1, a banda não se desfaz (Figura 4b) (FRANKEL et al., 1997). A formação de bandas microaerófilas observada em M. magnetotacticum é consistente com o mecanismo temporal-sensorial (SEGALL et al., 1986; FRANKEL et al., 1997), onde a concentração de oxigênio determina o sentido de rotação do flagelo. Para essa bactéria, o campo magnético determina apenas o eixo do movimento, enquanto a direção de natação é dada em função da resposta aerotáctica. Esse comportamento foi denominado magneto-aerotaxia axial. O comportamento observado em MC-1 não pode ser explicado por uma resposta sensorial-temporal à concentração de oxigênio do meio, uma vez que a banda se desfaz quando o sentido do campo magnético é invertido. Assim como MC-1, a maioria das bactérias magnetotácticas possui magnetotaxia polar (Figura 5). Isso significa que, sob condições aeróbias, as bactérias NS nadam persistentemente de forma paralela ao campo magnético, enquanto bactérias SS nadam persistentemente de forma antiparalela (FRANKEL et al., 1997). 22 O modelo de “dois estados” proposto para as bactérias que apresentam magneto-aerotaxia polar (Figura 6) sugere que, sob concentrações de oxigênio acima da ideal, as células NS nadam de forma paralela ao campo magnético devido à rotação dos flagelos no sentido anti-horário (“estado oxidado”). Quando a célula presencia concentrações de oxigênio inferiores à concentração ótima, a célula reverte a rotação dos flagelos para o sentido horário, passando a nadar com orientação antiparalela ao campo magnético (“estado reduzido”). Os sentidos de rotação dos flagelos assumidos para a natação paralela (anti-horário) e antiparalela (horário) ao campo magnético são arbitrários, porém consistentes com o sentido de rotação observado para outras bactérias em que a rotação dos flagelos no sentido antihorário é observada na direção predominante de natação (FRANKEL et al., 1997). 23 Figura 4: Distinção entre magneto-aerotaxia polar e axial. (a) Representação esquemática de um fino capilar onde células crescidas em meio reduzido são inseridas, resultando em um menisco (M) em ambas as extremidades. Um campo magnético (B) da ordem de poucos Gauss é aplicado orientado de forma paralela ao capilar. O oxigênio se difunde a partir das extremidades dos capilares, gerando gradiente de [O2] que aumenta do centro do capilar em direção às extremidades. (b) A formação de banda pela bactéria magnetoaerotáctica axial Magnetospirillum magnetotacticum ocorre em ambas as extremidades. A rotação do campo em 180º após a formação da banda faz com que as células girem 180º, contudo, sem desfazer as bandas. (C) A formação de banda pela bactéria magnetoaerotáctica polar MC-1 ocorre somente na extremidade do capilar onde o campo magnético e a [O2] possuem orientação oposta entre si. A reversão do campo em 180º faz com que as células girem 180º e continuem nadando com a mesma orientação observada antes da reversão do campo, o que desfaz a banda (BAZYLINSKI & FRANKEL, 2004). 24 Figura 5: Representação da polaridade das bactérias magnetotácticas do tipo NS e SS. Ambas as bactérias possuem dipolo magnético intrínseco orientado de forma paralela ao campo magnético. Sob condições ambientais de [O2], a rotação do flagelo no sentido anti-horário faz com que as bactérias NS nadem com orientação paralela ao campo magnético, enquanto o mesmo sentido de rotação de flagelo nas bactérias SS produz natação com orientação antiparalela ao campo magnético. Sob condições de baixa [O2] o flagelo passaria a girar em sentido horário, invertendo o sentido de natação em ambos os casos (Adaptado de FRANKEL, WILLIAMS & BAZYLINSKI 2006). 25 Figura 6: Esquema demonstrando como a magneto-aerotaxia polar manteria a bactéria em ambientes microaeróbios, na zona de transição óxica-anóxica em colunas d’água com estratificação química vertical. Tanto no hemisfério norte quanto no hemisfério sul, bactérias submetidas a concentrações de oxigênio acima da ideal apresentam natação avante em consequência da rotação do flagelo no sentido antihorário (“estado oxidado”). Isso faz com que as bactérias NS e SS nadem em direção ao sedimento até concentrações de oxigênio abaixo da ideal (“estado reduzido”), o que causa a reversão do sentido de rotação do flagelo para o sentido horário e, consequentemente, faz com que as bactérias passem a nadar na direção oposta (em direção à superfície) (Adaptado de FRANKEL, WILLIAMS & BAZYLINSKI 2006). 26 1.10. Procariotos magnetotácticos multicelulares Microrganismos magnetotácticos de natureza multicelular são reportados na literatura desde a década de 80 (FARINA et al., 1983). Ao longo dos anos, diferentes denominações foram atribuídas a tais microrganismos. “Magnetotactic Farina e Multicellular colaboradores Aggregates atribuíram (MMAs)” o para termo designar microrganismos magnetotácticos compostos por várias células envoltas por membranas duplas coletados na Lagoa Rodrigo de Freitas, Rio de Janeiro, Brasil (FARINA et al., 1983; LINS DE BARROS, ESQUIVEL & FARINA, 1990; KEIM et al., 2007). Em 1990, Rodgers et al. adotaram o termo “Many-celled Magnetotactic Prokaryotes (MMPs)” para denominar um microrganismo similar encontrado no Estado da Nova Inglaterra, Estados Unidos (RODGERS et al., 1990). Uma terceira designação, “Magnetotactic Multicellular Organisms (MMOs)”, foi adotada por Keim et al. para um microrganismo multicelular magnetotáctico encontrado na Lagoa de Araruama, Estado do Rio de Janeiro, Brasil (KEIM et al., 2004a). As bactérias magnetotácticas multicelulares são microrganismos compostos por 10-40 células Gram-negativas organizadas em um arranjo esférico que se move como uma unidade sob campos magnéticos (FARINA, ESQUIVEL & LINS DE BARROS, 1990; RODGERS et al., 1990; KEIM et al., 2007; LINS et al., 2007; ABREU et al., 2007; WENTER et al., in press). Possuem diâmetro variando entre 2,2-12,5µm (LINS & FARINA, 1999; RODGERS et al., 1990; KEIM et al., 2007; WENTER et al., in press), velocidade de natação entre 30 e 175µm/s (FARINA et al., 1983; RODGERS et al., 1990; KEIM et al., 2007) e cristais magnéticos constituídos por óxido ou sulfeto de ferro (PÓSFAI et al., 1998b; KEIM et al., 2007; LINS et al., 2007; WENTER et al., in press). Cada célula apresenta uma face voltada para um compartimento 27 interno acelular e outra face voltada para o ambiente apresentando múltiplos flagelos (KEIM et al., 2004a, 2007). Sob situação de estresse, o microrganismo se desagrega em células individuais, que nunca apresentam motilidade, apesar de se orientarem passivamente a campos magnéticos aplicados (FARINA, ESQUIVEL & LINS DE BARROS, 1990; LINS & FARINA 1999; KEIM et al., 2004a, 2007; ABREU et al., 2006). Até o presente momento não existem culturas puras de bactérias magnetotácticas multicelulares, sendo todos os trabalhos publicados até então realizados a partir de amostras coletadas do ambiente. Filogeneticamente, os procariotos multicelulares magnetotácticos pertencem ao grupo das δ-Proteobacteria, sendo agrupados dentro de um grupo de bactérias redutoras de sulfato, onde formam um ramo coeso (DeLONG et al., 1993; ABREU et al., 2007; SIMMONS & EDWARDS, 2007; WENTER et al., in press). Recentemente, foi descrito um novo microrganismo dentro deste grupo, denominado ‘Candidatus Magnetomorum litorale’. Os genes dsrAB e aprA, marcadores de bactérias redutoras de sulfato, foram detectados em DNA isolados de amostras de ‘Candidatus Magnetomorum litorale’. Este microrganismo apresentou resposta quimiotáctica positiva a acetato e propionato, substâncias comumente utilizadas como fontes de energia e carbono por bactérias redutoras de sulfato (WENTER et al., in press). 1.11. Características gerais da bactéria magnetotáctica multicelular ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ A existência de bactérias multicelulares magnetotácticas no sedimento da Lagoa de Araruama foi relatada por Keim et. al (2004a). As características de organização celular, ciclo de vida, propriedades magnéticas, coordenação de movimento e habitat dessa bactéria multicelular magnetotáctica, somada à análise do rRNA 16S, 28 possibilitaram que a esse organismo fosse dado um nome na categoria Candidatus (ABREU et al., 2007). Indivíduos de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ possuem 18 ± 4 células gram-negativas, dispostas em um arranjo esférico (KEIM et al., 2004a) onde cada célula apresenta uma face exibindo flagelos (em média 30 por célula) voltados para o meio externo (SILVA et al., 2007). Possuem faces laterais planas em contato íntimo com as células adjacentes e uma face voltada para um compartimento interno acelular (KEIM et al., 2004a). Sob condições de mudança de pressão osmótica ou quando expostos à observação prolongada no microscópio óptico, o ‘Ca. M. multicellularis’ se desagrega em células individuais (Figura 7), que não apresentam mobilidade (ABREU et al., 2006). Figura 7 – Microscopia óptica interferencial de Nomarski de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’. (a) Organismo intacto. (b) organismo desagregado. Barra = 5 µm (retirado de SILVA et al., 2007). 29 O ciclo de vida proposto para o ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ (Figura 8) sugere que o organismo como um todo inicialmente aumenta o seu volume por meio do aumento do volume de suas células. Posteriormente, há uma divisão sincronizada das células, duplicando o número de células do agregado. Em seguida, as células alteram sua disposição fazendo com que o agregado adquira uma forma alongada. Uma constrição é formada na região intermediária dessa estrutura, levando em seguida à divisão do organismo inicial em dois novos indivíduos (KEIM et al., 2004b). Figura 8: Seqüência de micrografias de microscopia eletrônica de varredura ilustrando o ciclo de vida proposto para ‘Candidatus Magnetoglobus Multicellularis’. (a) microrganismo no início do ciclo, apresentando número reduzido de células. (b) aumento do volume das células. (c) divisão celular. (d) alongamento do microrganismo. (e) constrição do microrganismo na região mediana. (f) divisão em dois microrganismos (retirado de KEIM et al., 2004b). As células que constituem o ‘Candidatus Magnetoglobus Multicellularis’ apresentam magnetossomos contendo greigita (Fe3S4) como mineral magnético (KEIM et al., 2004a), envoltos por membranas do tipo bicamada lipídica no interior do citoplasma (ABREU et al., 2008). 30 ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ possuem flagelos peritríqueos quando se considera o agregado com um todo. Porém, cada célula individualmente apresenta flagelos apenas na face voltada para o ambiente (KEIM et al., 2004a; SILVA et al., 2007). Microrganismos com morfologia, ultraestrutura e comportamento semelhante foram descritos em diversas partes do mundo (FARINA et al., 1983; FARINA, ESQUIVEL & LINS DE BARROS, 1990; RODGERS et al., 1990; MANN et al., 1990; PÓSFAI et al., 1998a, 1998b; LINS & FARINA, 1999; GREENBERG et al., 2005; SIMMONS et al., 2004; SIMMONS, BAZYLINSKI & EDWARDS, 2006; LINS et al., 2007; SIMMONS & EDWARDS, 2007; WENTER et al., in press). Quando sob campo magnético aplicado, ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ se desloca como uma unidade em trajetórias retas ou helicoidais (KEIM et al., 2004a), com o eixo de simetria alinhado à direção do campo magnético (Vídeo 1), com sentido antiparalelo, exibindo velocidade de (9 ± 2)x10 µm/s (SILVA et al., 2007). As trajetórias helicoidais apresentam sentido anti-horário, acompanhada de rotação do microrganismo ao longo do seu próprio eixo, também no sentido anti-horário (com o microrganismo se afastando do observador), sendo que, a cada passo da hélice, a célula gira 2πrad em torno do seu próprio eixo (KEIM et al., 2007). A reversão do campo magnético durante a natação causa a reorientação do organismo em 180º (u-turn). Se não há restrições para o movimento, ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ e os outros procariotos multicelulares nadam para frente ao longo das linhas do campo magnético local segundo trajetórias helicoidais ou aproximadamente retilíneas (free motion). Quando os ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ atingem o limite de uma gota d’água, passam a exibir rotação ao longo do seu próprio eixo (rotation) (Vídeo 2) (ABREU et al., 2007; KEIM et al., 31 2007), com eventuais e curtas excursões paralelas ao campo magnético acompanhadas de desaceleração até cessar o movimento, voltando então a nadar com aceleração crescente em sentido antiparalelo ao campo (Vídeo 3) (GREENBERG et al., 2005; ABREU et al., 2007; KEIM et al., 2007). Tais excursões, referidas como trajetórias “ping-pong” ou “escape motility”, são observadas com maior frequência sob campos magnéticos elevados em relação ao campo magnético terrestre (GREENBERG et al., 2005). O movimento de escape (escape motility) também é observado quando estes microrganismos nadam livremente, ou seja, sem a existência de uma interface água / ar (GREENBERG et al., 2005). Em campos magnéticos menores (da ordem do campo geomagnético), estes microrganismos passam a exibir um padrão de movimento chamado “walking”, que consiste em uma trajetória complexa de “looping”, não alinhada ao campo magnético, realizada próxima à borda da gota (GREENBERG et al., 2005; ABREU et al., 2007; KEIM et al., 2007). 32 2. OBJETIVOS 2.1. OBJETIVO GERAL Estudar o comportamento e motilidade da bactéria magnetotáctica ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ sob campo magnético aplicado superiores ao campo geomagnético. 2.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS - Desenvolver uma metodologia que permita quantificar os parâmetros das trajetórias helicoidais descritas por microrganismos magnetotácticos (raio, passo da hélice, período, frequência, velocidade média, velocidade instantânea e velocidade angular) através do uso de vídeo-microscopia e análise de imagens. - Quantificar os parâmetros das trajetórias descritas pela bactéria magnetotáctica ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ sob campo magnético superior ao campo geomagnético. - Avaliar a resposta de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ a pulsos de laser ultravioleta e a luz ultravioleta. 33 3. MATERIAIS E MÉTODOS 3.1. Coleta e concentração magnética de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ Amostras de água e sedimento na proporção aproximada de 1:1 foram coletadas na Praia da Baleia, localizada no Município de São Pedro da Aldeia, Estado do Rio de Janeiro, Brasil (Latitude 22º 52’ 10,82” Sul e Longitude 42º 06’ 40,42” Oeste). A coleta foi realizada com o uso de recipientes plásticos de 1000 ml e as amostras foram armazenadas no laboratório à temperatura ambiente e sob iluminação indireta. Os experimentos de vídeo-microscopia e de resposta ao laser e à luz ultravioleta foram realizados até duas semanas após a coleta das amostras. Indivíduos de ‘Ca. Magnetoglobus multicellularis’ foram concentrados magneticamente seguindo o protocolo descrito por Lins et al. (2003). frasco de Água e sedimento da lagoa foram introduzidos em um vidro especialmente construído para concentrar microrganismos magnetotácticos, que possui uma abertura superior por onde a água e o sedimento são introduzidos; e um capilar lateral, por onde o concentrado de ‘Ca. Magnetoglobus multicellularis’ é retirado (Figura 9a). O vidro concentrador abastecido de água e sedimento da Lagoa de Araruama foi inserido em uma bobina confeccionada manualmente com o uso de cano de poli-cloreto de vinila (PVC) de 150 mm de diâmetro e fio de cobre esmaltado de 0.33mm de diâmetro (Figura 9b). Esta bobina, quando conectada a uma fonte de corrente contínua, produz um campo magnético homogêneo no seu interior, com direção paralela ao seu eixo longitudinal. O capilar lateral do vidro concentrador foi 34 orientado de forma antiparalela ao campo magnético gerado pela bobina. Com isso, ‘Ca. Magnetoglobus multicellularis’ presentes na amostra nadaram em direção ao capilar lateral, permanecendo ali concentrados. Foi utilizada a fonte de corrente contínua de 0,5 Ampère. Com o uso de uma micropipeta, 20µL de concentrado de ‘Ca. Magnetoglobus multicellularis’ foram recolhidos do capilar lateral do vidro concentrador e depositados sobre lâmina e lamínula espaçados por um o-ring de 500µm de espessura (Figura 9c). O tempo de concentração magnética foi de cinco minutos. Para os experimentos no laboratório de pinças ópticas, o mesmo volume foi depositado em uma placa de petri perfurada, com uma lamínula colada no fundo (Figura 9d). 35 Figura 9: Ilustrações dos materiais utilizados para concentrar e observar os ‘Ca. Magnetoglobus multicellularis’. (a) Frasco de vidro utilizado para concentrar microrganismos magnetotácticos preenchido com água e sedimento da lagoa. A amostra é inserida na abertura superior e após a exposição a um campo magnético devidamente orientado, ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ concentrados são recolhidos pelo capilar lateral. (b) Bobina e fonte utilizadas para concentrar ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’. (c) Amostra concentrada de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ entre lâmina e lamínula separadas por um o-ring de 500µm de espessura para os experimentos de análise das trajetórias helicoidais sob campo magnético aplicado. (d) Placa de Petri perfurada com lamínula aderida ao fundo usada nos experimentos de resposta ao laser UV. 3.2. Produção de campo magnético aplicado para experimentos de vídeo-microscopia. Campos magnéticos uniformes e de intensidade controlada para os experimentos de vídeo-microscopia das trajetórias de ‘Ca. Magnetoglobus multicellularis’, foram obtidos com o uso de pares de bobinas eletromagnéticas (Figura 10). 36 Figura 10: Representação esquemática das bobinas eletromagnéticas A estimativa do campo produzido por um par de bobinas eletromagnéticas leva em conta o número de espiras (N), o raio interno (Ri), o raio externo (Re), a espessura (L), a corrente (i) e a distância entre as bobinas (d), conforme ilustrado na figura 10. Foram montados dois sistemas distintos de bobinas para a geração de campos magnéticos de 3,9 e 20,0 Gauss. O primeiro, uma bobina de Helmholtz, foi acoplado a um microscópio Zeiss universal e o segundo em um microscópio Zeiss Axioplan 2 (Figura 11a). Cada par de bobinas foi alimentado por uma fonte de corrente contínua Instrutherm FA-3005, com tensão de saída variável de zero a trinta Volts e corrente de saída variável de zero a cinco ampères. As correntes aplicadas para a geração dos campos magnéticos de 3,9 Gauss e 20,0 Gauss foram, respectivamente, 5 e 0,15 ampères. No sistema acoplado ao microscópio Zeiss foi adaptada uma peça de acrílico para a movimentação da lâmina a fim de evitar a influência de campo magnético gerado pela platina do microscópio, que se encontrava imantado (Figura 11b). Para facilitar os experimentos, uma chave para reversão de corrente foi conectada entre a fonte e as bobinas, permitindo assim a rápida reversão do campo magnético (Figura 11c). O primeiro sistema de bobinas para a aplicação de campo magnético (20,0 Gauss) utilizado neste trabalho foi construído fora das 37 condições de bobina de Helmholtz. Entretanto, na região correspondente ao campo de observação das trajetórias (~1000µm2), as linhas de campo encontram-se distribuídas de forma uniforme, paralelas à superfície da lamínula. Para a aplicação de um campo magnético com intensidade de 3,9 Gauss, um segundo par de bobinas foi construído sob condições próximas às de uma bobina de Helmholtz, ou seja, Re~Ri e d~Re,. Isso assegurou a uniformidade do campo aplicado sobre as amostras. Uma descrição detalhada dos sistemas de bobinas pode ser obtida em http://omnis.if.ufrj.br/~lpo/Bobina.pdf. Figura 11: Sistema utilizado para produção de campo magnético aplicado de 3,9 Gauss utilizado para vídeo-microscopia das trajetórias percorridas por ‘Ca. Magnetoglobus multicellularis’. (a) Sistema de vídeo-microscopia com a bobina de Helmholtz acoplada ao microscópio óptico Zeiss Axioplan 2. (b) Peça de acrílico adaptada à platina do microscópio (c) Chave para a reversão de corrente da bobina. 38 3.3. Vídeo-microscopia das trajetórias de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ sob campo magnético aplicado As trajetórias do ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ sob campo magnético aplicado foram filmadas com o uso de uma câmera CCD JVC TK-1270 conectada a um computador equipado com uma placa de captura de vídeo Pixel View PlayTV. As amostras concentradas magneticamente foram colocadas entre lâmina e lamínula separadas por um espaçador de 500µm de diâmetro e observadas por um tempo não superior a 20 minutos. As análises das trajetórias para cada um dos valores de campo magnético aplicado foram realizadas a partir de amostras de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ provenientes de coletas distintas. As trajetórias foram filmadas em campo claro, com objetiva de 40x. Os vídeos foram capturados com o uso do software Pinnacle Studio 8, com uma resolução de 320 x 240 pixels, a 30 fps, no formato AVI. Os vídeos gerados foram processados e analisados utilizando o aplicativo ImageJ (NIH). Os filmes foram submetidos a um filtro de background e binarizados. Com o uso da ferramenta Mtrack2, foram obtidas planilhas com as coordenadas XZ de cada uma das trajetórias (com o eixo Y paralelo ao eixo óptico do microscópio). As trajetórias senoidais 2D obtidas foram assumidas como projeções de trajetórias helicoidais cilíndricas em 3D, possuindo eixo de simetria paralelo ao campo magnético gerado pelas bobinas acopladas ao microscópio. Os parâmetros usados para a caracterização das trajetórias foram escolhidos em concordância com equações que descrevem a posição do centro de massa do “Ca. M. multicellularis” em função do tempo em trajetórias helicoidais: 39 ⎛ 2πt ⎞ X = A cos⎜ +ϕ ⎟ ⎝ T ⎠ (2) Z = Z 0 + V0t (3) ⎛ 2πt ⎞ +ϕ⎟ Y = A sin⎜ ⎝ T ⎠ (4) onde A = raio da hélice cilíndrica (amplitude), t = tempo; T = período; ϕ = fase arbitrária; Z 0 = posição inicial arbitrária no plano Z. A velocidade de natação (V0) foi obtida a partir da regressão linear do gráfico Z versus t. O raio (A) e o período (T) foram obtidos por meio de regressão não linear da posição X versus t. A velocidade ao longo do traço da trajetória, a qual denominamos velocidade tangencial (Vt), é dada por: Vt = (2πA) 2 + λ2 T2 (5) onde λ = V0 ⋅ T (5) define o passo da hélice. Os dados obtidos permitiram a projeção tridimensional das trajetórias e a verificação da existência de correlações entre os parâmetros das trajetórias. 3.4. Avaliação da resposta de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ a pulsos de laser ultravioleta e a luz ultravioleta. Um sistema de pinças ópticas (Figura 12 a-c) consiste em um microscópio óptico invertido montado sobre uma mesa pneumática antivibração. Sobre a mesma mesa podem ser montados diferentes tipos de lasers, lentes, espelhos e diafragmas, de modo a permitir que o feixe gerado pelos lasers penetre de forma controlada no eixo óptico do 40 microscópio, através da abertura de epi-iluminação do sistema de fluorescência. Sobre um sistema de pinças ópticas utilizando um laser infravermelho Nd-YAG de comprimento de onda de 1064nm, foi acoplado um laser UV (Figura 12c) com comprimento de onda igual a 337,1 nm que gera pulsos de duração inferior a 3.5 ns, com energia de 170µJ por pulso. Este tipo de laser atua como um bisturi óptico. Assim como o laser infravermelho usado para pinçar objetos, o laser UV foi posicionado de forma incidir seguindo o eixo óptico do microscópio através da abertura da epi-iluminação do sistema de fluorescência. Para os experimentos de resposta ao laser UV, ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ foram concentrados magneticamente por vinte minutos e depositados sobre uma placa de petri adaptada (Figura 9d). As amostras foram observadas em um microscópio óptico invertido Nikon Eclipse TE300 acoplado ao sistema de pinça óptica, na modalidade campo claro, com o uso de uma objetiva Plan Fluar 100x com abertura numérica de 1.4. As imagens foram obtidas por uma câmera CCD Hamamatsu C2400 e digitalizadas por uma placa de captura de imagens SCION (Figura 7d). Com o uso de um ímã, ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ foram direcionados para a borda da gota, onde pulsos de laser UV foram aplicados sobre a amostra. Sob as mesmas condições dos experimentos de pulsos de laser UV, a disponibilidade de uma platina motorizada possibilitou o registro em grande aumento da natação de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ alinhada ao campo magnético gerado por um ímã posicionado próximo à amostra. Para a avaliação da resposta à iluminação UV, ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ foram depositados sobre lâmina e 41 lamínula separados por um o-ring e observados ao microscópio Axioplan 2, na modalidade DIC, sob epi-iluminação com lâmpada de mercúrio com 50W de potência associada a um filtro para selecionar luz UV. Figura 12 (a-d): Sistema de pinça óptica do Laboratório de Pinças Ópticas da COPEAUFRJ, situado no Instituto de Ciências Biomédicas / Centro de Ciências da Saúde-UFRJ. (a) Visão geral do sistema de pinça óptica onde pode ser visualizado o microscópio óptico Nikon Eclipse TE 300 sobre uma mesa pneumática anti-vibração Newport. (b) Laser de Neodymium-YAG infravermelho (1064nm). (c) Laser ultravioleta (337,1nm). (d) Sistema de captura e processamento de imagem. 42 4. RESULTADOS 4.1. Trajetórias helicoidais de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ sob campo magnético aplicado As trajetórias de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ sob campo magnético aplicado foram filmadas a partir de amostras concentradas magneticamente com o uso de sistema de vídeomicroscopia equipado com um par de bobinas eletromagnéticas. As coordenadas xz do centro de massa ao longo das trajetórias de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ foram obtidas quadro a quadro, totalizando duzentas trajetórias sob campo magnético aplicado de 3,9 Gauss e duzentas trajetórias sob campo magnético aplicado de 20,0 Gauss. Os parâmetros vx (velocidade no eixo x), vz (velocidade no eixo z), raio (А) e período (Τ) das trajetórias helicoidais foram obtidos a partir de regressões lineares e não lineares dos gráficos gerados a partir das coordenadas X(t) e Z(t). Uma das trajetórias analisadas pode ser observada na figura 13. Os parâmetros velocidade média (ν), velocidade angular (ω), comprimento de onda (λ), velocidade instantânea (υ) e ângulo entre velocidade angular e velocidade instantânea (θ) foram determinados a partir da trajetória. No total, foram analisadas 180 trajetórias sob campo magnético aplicado de 3,9 Gauss e 184 trajetórias sob campo magnético aplicado de 20 Gauss. As médias são apresentadas na tabela 1. 43 Tabela 1: Valores médios e erros­ padrão dos parâmetros das trajetórias de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ sob campo magnético aplicado (В) Campo magnético (Gauss) (А) Raio (μm) (ν) Velocidade Média (μm/s) (Τ) Período (S) (υ) (ω) (λ) Velocidade Velocidade Passo da Instantânea Angular Hélice (μm/s) (rad/s) (μm) (θ) N Theta (Graus) 3,9 5,0 ± 0,1 (9 ± 1,6)x10 1,1 ± 0,02 (9 ± 1,6)x10 6,0 ± 0,1 (9 ± 3)x10 18,0 ± 0,8 180 20 4,0 ± 0,1 (11 ± 1,9)x10 0,80 ± 0,02 (12 ± 1,8)x10 8,0 ± 0,2 (9 ± 2)x10 16,0 ± 0,5 184 Testes-t (ou probabilidade-t) para dados não-pareados com variância desigual foram aplicados para verificar a existência de diferença estatística significativa entre os valores médios obtidos para cada parâmetro sob os diferentes campos magnéticos aplicados. Os histogramas do raio das trajetórias sob campos de 3,9 Gauss (Figura 14a) e 20,0 Gauss (Figura 14b) mostram que no campo magnético aplicado de maior valor a distribuição do raio se deslocou para valores menores. O valor obtido no teste-t, 0,00015, (Figura 14c), indica que as médias são estatisticamente diferentes (o critério usado foi p<0,05). Os histogramas para a velocidade média (Figura 15a-b) mostram que a distribuição foi deslocada para valores maiores quando aplicado o campo magnético de 20 Gauss. A probabilidade-t para este grupo de dados (Figura 15c) foi inferior a 0,0001, indicando que a velocidade média é estatisticamente distinta para cada valor de campo magnético aplicado. As figuras 16a e 16b mostram os histogramas de período sob campo magnético de 3,9 e 20,0 Gauss, respectivamente. As médias são estatisticamente distintas, com valor de probabilidade-t inferior a 0,0001 (Figura 16c). Os resultados indicam que o período das trajetórias diminuiu quando foi aplicado o campo magnético de maior intensidade. 44 Assim como a velocidade média (ν), o valor médio obtido para a velocidade instantânea (υ) foi maior sob campo de 20,0 Gauss. As distribuições da velocidade instantânea das trajetórias sob 3,9 e 20,0 Gauss são mostradas nas Figuras 17a e 17b. O resultado do teste-t é apresentado na Figura 17c. O valor de probabilidade-t (<0,0001) demonstra que as médias são estatisticamente distintas para cada valor de campo aplicado. As figuras 18a e 18b apresentam os histogramas da velocidade angular sob os diferentes campos magnéticos. O resultado do teste-t (<0,0001) é apresentado na figura 18c. Os resultados indicam que o valor médio da velocidade angular foi maior sob o campo aplicado de 20,0 Gauss. O passo da hélice (λ) observado em ambos os campos magnéticos aplicados apresentou valores médios próximos. O valor da probabilidade-t <0,7132 indica que as médias não são estatisticamente distintas. Os histogramas de comprimento de onda e o resultado do teste-t são apresentados nas figuras 19a-c. O ângulo médio entre a velocidade angular (ω) e a velocidade instantânea (υ) também foi distinto para cada valor de campo magnético aplicado. Os histogramas de θ para os campos aplicados são apresentados nas figuras 20a e 20b. O resultado do teste-t é apresentado na figura 20c. O valor da probabilidade-t (0,0001) indica que as médias obtidas sob os diferentes campos magnéticos são estatisticamente distintas. 4.2. Resposta de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ a pulsos de laser ultravioleta Os experimentos de resposta a pulsos de laser ultravioleta foram realizados em um sistema de pinças ópticas conectado a um sistema de aquisição de imagem. 45 Amostras de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ concentrados magneticamente foram depositadas sobre uma lamínula e observadas no microscópio em campo claro. Com o uso de um ímã, ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ foram direcionados para uma das extremidades da gota d’água, acumulando-se em múltiplas fileiras. Exatamente no plano focal da interface ar-água, foi observada somente uma fileira de microrganismos. Poucos micrômetros a partir da interface ar-água, ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ foram observados em mais de um plano focal. Nessas condições, ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ apresentaram rotação em torno do seu próprio eixo com diferentes sentidos e observados velocidades. Eventos entre microrganismos os de escape motility acumulados não foram na região imediatamente adjacente à interface ar-água, dentro do campo de aquisição de imagem (Vídeo 4, frames 1-359). Um pulso de laser ultravioleta com duração inferior a 3,5ns foi aplicado sobre a amostra. O efeito da interação do pulso de laser com um dos indivíduos de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ pode ser visualizado durante 0,16s (Figura 21; Vídeo 4, frames 360-364). Imediatamente após esse intervalo de tempo foi observada uma resposta coletiva em que os microrganismos não atingidos diretamente pelo laser nadaram no sentido oposto, afastando-se da borda da gota. Após 2,5s, apenas dois indivíduos permaneciam no campo de visão, sem apresentar motilidade (Figura 22; Vídeo 4, frame 437). Aproximadamente 10 segundos após a aplicação do pulso de laser UV, ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ voltaram a se acumular na interface ar-água e, após 20s, a densidade de microrganismos na borda da gota encontrava-se comparável com a observada antes do pulso (Vídeo 4, frame 1137). 46 Os danos causados aos ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ diretamente alvejados pelo pulso de laser UV podem ser observados na figura 23 e no Vídeo 4 (frames 700-1235). Um pequeno grupo de células foi destacado do arranjo esférico, permanecendo aderidas ao microrganismo, possivelmente expondo o compartimento interno acelular para o meio externo (Figura 23). Um segundo pulso de laser UV foi aplicado sobre a amostra (vídeo 4, frames 1242-1248). O efeito coletivo novamente foi observado. Contudo, dois indivíduos atingidos pelo laser permaneceram no campo de observação apresentando rotação em torno do seu próprio eixo com velocidade muito superior à observada quando ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ se encontram na interface ar-água. (Vídeo 4, frames 1297- 1663). Várias células encontravam-se destacadas do arranjo esférico, porém, ainda conectadas ao agregado. Após aproximadamente 12 segundos não foi mais observada motilidade nesses indivíduos. Um terceiro pulso de laser (Vídeo 4, frame 1940) foi aplicado sobre a amostra, atingindo um indivíduo já desagregado pelos pulsos de laser anteriores. A resposta coletiva dos demais indivíduos foi menos intensa que a observada nos dois primeiros pulsos (Vídeo 4, frames 1940-2691). ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis expostos a iluminação com lâmpada HBO demonstraram resposta fóbica à luz UV, porém, de forma menos intensa à observada na aplicação de pulsos de laser UV (Vídeo 5). Quando iluminados com lâmpada de tungstênio, apresentam alteração de motilidade (rotation) quando um filtro verde é posicionado entre a fonte de luz e a amostra (Vídeo 6). A natação ao longo do campo magnético aplicado em grande aumento é mostrada nos vídeos 7 e 8. 47 PRANCHA 1 48 Figura 13: Trajetória helicoidal de um indivíduo de ‘Candidatus Magnetoglobus multlicellularis’ sob campo magnético aplicado de 20,0 Gauss. (a) Ajuste linear da posição x(t) de uma trajetória helicoidal à função y = Ax + B , onde B corresponde à velocidade no eixo X. (b) Ajuste não linear da posição z(t) da mesma trajetória em função de ⎞ ⎛ 2πx y = P1 + P2 x + P3 cos⎜⎜ + P5 ⎟⎟ . ⎠ ⎝ P4 Os parâmetros P2, P3 e P4 correspondem, respectivamente, à velocidade no eixo Z, ao raio e ao 2 2 período da trajetória. A velocidade de natação é dada por v = v x + v z . 49 50 PRANCHA 2 51 Figura 14: Raio das trajetórias (А) de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ sob campo magnético aplicado. (a) Histograma do raio das trajetórias helicoidais sob campo magnético aplicado de 3,9 Gauss. (b) Histograma do raio das trajetórias helicoidais sob campo magnético aplicado de 20,0 Gauss. (c) Resultado do teste-t entre o raio das trajetórias de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ sob campo magnético aplicado de 3,9 Gauss e 20,0 Gauss. 52 53 PRANCHA 3 54 Figura 15: Velocidade média (ν) das trajetórias helicoidais de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ sob campo magnético aplicado. (a) Histograma da velocidade média sob campo magnético aplicado de 3,9 Gauss. (b) Histograma da velocidade média sob campo magnético aplicado de 20,0 Gauss. (c) Resultado do teste-t entre a velocidade média das trajetórias de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ sob campo magnético aplicado de 3,9 Gauss e 20,0 Gauss. 55 56 PRANCHA 4 57 Figura 16: Período (Τ) das trajetórias helicoidais de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ sob campo magnético aplicado (a) Histograma do período das trajetórias helicoidais sob campo magnético aplicado de 3,9 Gauss. (b) Histograma do período das trajetórias helicoidais sob campo magnético aplicado de 20,0 Gauss. (c) Resultado do teste-t entre o período das trajetórias de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ sob campo magnético aplicado de 3,9 Gauss e 20,0 Gauss. 58 59 PRANCHA 5 60 Figura 17: Velocidade instantânea (υ) das trajetórias helicoidais de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ sob campo magnético aplicado. (a) Histograma da velocidade instantânea das trajetórias das trajetórias helicoidais sob campo magnético aplicado de 3,9 Gauss. (b) Histograma da velocidade instantânea helicoidais sob campo magnético aplicado de 20,0 Gauss. (c) Resultado do teste-t entre a velocidade instantânea das trajetórias de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ sob campo magnético aplicado de 3,9 Gauss e 20,0 Gauss. 61 62 PRANCHA 6 63 Figura 18: Velocidade angular (ω) das trajetórias helicoidais de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ sob campo magnético aplicado. (a) Histograma da velocidade angular das trajetórias sob campo magnético aplicado de 3,9 Gauss. (b) Histograma da velocidade angular das trajetórias sob campo magnético aplicado de 20,0 Gauss. (c) Resultado do teste-t entre a velocidade angular das trajetórias de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ sob campo magnético aplicado de 3,9 Gauss e 20,0 Gauss. 64 65 PRANCHA 7 66 Figura 19: Passo da hélice (λ) das trajetórias helicoidais de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ sob campo magnético aplicado. (a) Histograma do passo da hélice das trajetórias helicoidais sob campo magnético aplicado de 3,9 Gauss. (b) Histograma do passo da hélice das trajetórias helicoidais sob campo magnético aplicado de 20,0 Gauss. (c) Resultado do teste-t entre o passo da hélice das trajetórias de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ sob campo magnético aplicado de 3,9 Gauss e 20,0 Gauss. 67 68 PRANCHA 8 69 Figura 20: Ângulo entre a velocidade angular e a velocidade instantânea (θ) das trajetórias helicoidais de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ sob campo magnético aplicado. (a) Histograma do ângulo entre a velocidade angular e a velocidade instantânea das trajetórias sob campo magnético aplicado de 3,9 Gauss. (b) Histograma do ângulo entre a velocidade angular e a velocidade instantânea das trajetórias sob campo magnético aplicado de 20,0 Gauss. (c) Resultado do teste-t do ângulo entre a velocidade angular e a velocidade instantânea das trajetórias sob campo magnético aplicado de 3,9 Gauss e 20,0 Gauss. 70 71 PRANCHA 9 72 Figura 21: Série de imagens de vídeo-microscopia demonstrando o efeito da aplicação do pulso de laser ultravioleta sobre um ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’. As setas indicam uma alteração morfológica na região de incidência do laser sobre o microrganismo. Barra de escala=6,6µm. 73 74 PRANCHA 10 75 Figura 22: Série de imagens de vídeo-microscopia mostrando os 2,7 segundos subsequentes à aplicação do pulso de laser ultravioleta sobre a amostra de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’. Observase que apenas dois microrganismos permanecem imóveis na região observada. Barra de escala=30µm. 76 77 PRANCHA 11 78 Figura 23: ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ diretamente atingido pelo pulso de laser ultravioleta. Um grupo de células se encontra destacado do arranjo. Barra de escala=3,3µm. 79 80 5. DISCUSSÃO Dados das trajetórias de bactérias, tais como comprimento de onda, diâmetro da hélice, período da trajetória helicoidal e período da rotação do microrganismo sobre seu próprio eixo, são muito difíceis de obter em bactérias de tamanho regular (~1 µm), por causa do limite de resolução do microscópio ótico (~ 0,2 µm). Por outro lado, procariotos flagelados de tamanho grande (> 5 µm), cujas trajetórias são mais facilmente observadas ao microscópio ótico, não são cultivados até o momento. Algumas vezes, estes microrganismos ocorrem em grandes números na interface entre a água e o sedimento de ambientes marinhos, de onde podem ser coletados e estudados (ver, por exemplo, FENCHEL, 1994 e FENCHEL & THAR, 2004). Dadas as dificuldades e o pequeno número de microrganismos estudados, o estudo do movimento de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ vem, portanto, contribuir para o entendimento do movimento dos procariotos flagelados. Os parâmetros que descrevem a natação em trajetórias helicoidais (free motion) da bactéria magnetotáctica multicelular ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ sob dois campos magnéticos aplicados (3,9 e 20 Gauss), ambos superiores ao campo geomagnético local (~0,2 Gauss), foram quantificados. A metodologia aplicada permitiu a análise eficiente de um grande número de trajetórias através de vídeomicroscopia e processamento de imagem, tendo atingido o objetivo de gerar dados dos parâmetros das trajetórias. 5.1. Vantagens e desvantagens da nova metodologia desenvolvida para o estudo do movimento de microrganismos As técnicas de microscopia desenvolvidas no último século permitiram a obtenção de uma grande quantidade de informações em relação ao movimento dos microrganismos. O baixo contraste observado 81 em imagens obtidas por microscopia de campo claro, que limitava a observação de microrganismos vivos, foi suplantado pelo desenvolvimento de técnicas como o contraste de fase, campo escuro e contraste por interferência diferencial (DIC). Além da óptica dos microscópios em si, os sistemas de registro, armazenamento e análise de imagens evoluíram muito. A micrografia de longo tempo de exposição e a cine-fotomicrografia deram lugar a câmeras de vídeo, detectores CCD, dispositivos digitais de captura, armazenamento e processamento de imagem. O grande desenvolvimento tecnológico da vídeo-microscopia se reflete nos elevados custos dos sistemas oferecidos pelas empresas de microscopia e de equipamentos científicos. Contudo, a adaptação de equipamentos não necessariamente desenvolvidos para o uso específico em vídeo-microscopia pode proporcionar bons resultados para aplicações que não careçam de sistemas de alto desempenho. A metodologia aplicada no presente trabalho é um exemplo de como dispositivos de vídeo desenvolvidos para uso doméstico e encontrados no mercado a preços acessíveis podem ser empregados na vídeo-microscopia. Câmeras fotográficas digitais podem ser adaptadas a um microscópio com relativa facilidade. A atual resolução e freqüência de captura dessas câmeras (em torno de 720x480 pixels e 30 fps) possibilitam a sua aplicação com finalidades que vão desde um mero registro qualitativo até a obtenção de dados quantitativos do espécime, como os obtidos no presente trabalho. Placas profissionais de captura digital de imagem e computadores com elementos de hardware e software específicos para a aplicação em vídeo-microscopia analítica podem também ser substituídos por placas e programas domiciliares para captura e conversão de vídeos a partir de dispositivos analógicos, como gravadores de videocassete. Somado a 82 isso, o desenvolvimento e distribuição on line de softwares freeware como o ImageJ (NIH) proporcionaram uma alternativa de custo zero em relação aos onerosos aplicativos de análise de imagens disponíveis no mercado. A metodologia aplicada para o estudo das trajetórias helicoidais de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ constitui uma alternativa eficiente e de baixo custo aos protocolos comumente utilizados no estudo do movimento de microrganismos, como micrografia com longo tempo de exposição e reprodução da natação quadro a quadro diretamente de um monitor com o uso de filmes plásticos transparentes. Uma das maiores dificuldades encontradas no estudo do movimento de microrganismos reside no fato de que suas dimensões pequenas requererem o uso de objetivas de grande aumento. Sob tais condições, a reduzida profundidade de campo faz com que seja difícil manter um microrganismo em foco enquanto nada. Por outro lado, reduzir o espaço disponível para a natação no eixo Y (paralelo ao eixo óptico do sistema) pode influenciar a motilidade devido ao aumento do arrasto hidrodinâmico e, até mesmo, causar a adesão dos microrganismos à lâmina ou lamínula. Sistemas de vídeo-microscopia capazes de manter em foco bactérias com dimensões compatíveis às de E.coli são relatados na literatura (BERG, 1971; THAR, NICHOLAS & KÜHL, 2000). Contudo, tratam-se de aparatos complexos não disponíveis comercialmente. A vídeo-microscopia de bactérias magnetotácticas sob campo magnético aplicado demonstra-se mais simples devido ao fato do campo magnético fazer com que as trajetórias fiquem alinhadas de forma aproximadamente paralela ao plano da superfície da lamínula. Isso faz com que a possibilitando posição o uso do microrganismo de objetivas varie de pouco maior no eixo aumento Y, e, 83 conseqüentemente, proporcionando a aquisição de dados com maior resolução espacial. O acompanhamento das trajetórias de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ sob campo magnético aplicado em grande aumento (objetiva de 100x) pôde ser obtido com o uso de uma platina motorizada (Vídeos 7 e 8). O resultado preliminar demonstrou-se promissor para o estudo mais detalhado das peculiaridades da natação desse microrganismo, como o sentido de rotação do microrganismo em torno do seu próprio eixo. Outra ferramenta que pode fornecer informações relevantes em relação à coordenação da rotação dos flagelos é a microscopia de fluorescência. TUNER, RYU & BERG (2000) e BERG et al. (2007) obtiveram importantes resultados em relação à dinâmica da rotação do flagelo de E. coli. utilizando essa técnica. A provável dificuldade desse tipo de ensaio em ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ é o reduzido comprimento e a alta densidade de flagelos em comparação à E. coli. ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ possui em média 30 flagelos por célula, com comprimento variando entre 0,9 e 3,8µm e diâmetro entre 12 e 20nm (SILVA et al., 2007). E.coli possui 3±2 filamentos por célula com comprimento de 6±3µm (TUNER, RYU & BERG, 2000). Além disso, os filamentos flagelares de ‘Ca. Magnetoglobus multicellularis’ nunca completam um comprimento de onda, diferentemente dos vários comprimentos de onda observados nos flagelos de E.coli. 84 5.2. Quantificação dos parâmetros das trajetórias helicoidais de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ nos dois diferentes campos magnéticos aplicados, e suas implicações para o movimento A literatura existente até o momento pertinente ao estudo do movimento da bactéria magnetotáctica ‘Candidatus Magnetoglobus Multicellularis’ caracteriza os tipos de movimentos realizados por este microrganismo em quatro categorias: movimento livre (free motion), rotação (rotation), motilidade de escape (escape motility) e caminhada (walking) (KEIM et al. 2006). Em relação à natação alinhada a linhas de campo magnético aplicado (free motion), Keim et al. (2004a) relatou que este tipo de movimento poderia se dar em trajetórias retilíneas ou helicoidais. A metodologia adotada por Keim et al. (2004a) para o estudo das trajetórias utilizou microscopia de campo escuro em baixo aumento e micrografia com longo tempo de exposição. No presente trabalho não foram observadas trajetórias retilíneas. Um dos critérios adotados durante a análise das trajetórias helicoidais foi o registro de pelo menos um passo de hélice no campo de visão do microscópio, que mede 155x116 µm. Trajetórias com comprimento igual ou inferior a ¼ de comprimento de onda foram observadas, porém, não analisadas. Os valores médios obtidos para o passo da hélice das trajetórias foram muito superiores aos valores médios de raio; e as médias de velocidade de natação e velocidade instantânea foram próximas entre si sob ambos os campos. O elevado valor de passo da hélice em comparação com o valor do raio das trajetórias poderia fazer com que trajetórias com raio próximo ao limite inferior da distribuição para este parâmetro (~1,0µm) fossem registradas como trajetórias retilíneas 85 quando registradas em micrografias obtidas em campo escuro com longo tempo de exposição. Nesse caso, as trajetórias retilíneas relatadas por Keim et al. (2004a) poderiam ser trajetórias helicoidais com raio pequeno e/ou passo da hélice muito grande. Os valores encontrados para passo da hélice e raio da trajetória demonstram que as trajetórias helicoidais em ambos os campos são alongadas. Isso indica grande eficiência na coordenação da rotação dos flagelos para a natação avante nesses microrganismos. Assim como os resultados obtidos por Winklhofer et al. (2007), que demonstram um elevado grau de otimização magnética em ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ (~80%), nossos resultados demonstram um elevado grau de otimização do movimento avante. Também do mesmo modo que a otimização magnética (WINKLHOFER et al., 2007), a otimização do movimento avante implica em um nível elevado de organização entre as células que compõem os indivíduos de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’. Sob o campo magnético de 20,0 Gauss, as trajetórias apresentaram médias superiores tanto para a velocidade média quanto para a velocidade instantânea. As médias para o raio e para o ângulo θ sob 20,0 Gauss, inferiores aos obtidos sob 3,9 Gauss, indicam que a hélice descrita sob esse valor de campo magnético aplicado é mais estreita quando comparada com as trajetórias descritas sob 3,9 Gauss. O passo da hélice não variou de forma significativa com o aumento do campo magnético aplicado. Como o raio sob 20,0 Gauss foi menor, a distância percorrida durante cada passo de hélice foi inferior sob esta intensidade de campo aplicado. Tais dados indicam que a natação avante se torna ainda mais eficiente com o aumento do campo magnético aplicado, visto que a bactéria nada menos no plano perpendicular ao eixo de simetria da hélice e percorre uma distância menor ao longo da trajetória helicoidal, para uma mesma velocidade 86 média. O período necessário para cada passo da hélice sob 20,0 Gauss também foi menor. A figura 24 apresenta um resumo da variação dos parâmetros para os diferentes campos magnéticos aplicados. Figura 24: Comparação da variação dos parâmetros das trajetórias helicoidais de ‘Candidatus Magnetoglobus Multicellularis’ sob 3,9 e 20,0 Gauss. O ligeiro aumento da eficiência da natação avante sob campo de 20,0 Gauss poderia ser resultado de um maior alinhamento passivo do microrganismo às linhas de campo magnético ou de alguma influência sobre a rotação dos flagelos causada pela intensidade do campo magnético. Apesar das diferenças entre os valores médios encontrados para raio da hélice, velocidades média e instantânea, período, velocidade angular e ângulo θ, a forma dos histogramas de distribuição dos parâmetros das trajetórias de ‘Candidatus Magnetoglobus Multicellularis’ não sofreram grandes alterações entre os diferentes campos magnéticos aplicados. Houve apenas um deslocamento das médias para mais ou para menos dependendo do parâmetro, o que indica que as diferenças 87 encontradas entre os dados obtidos sob dois campos magnéticos distintos são reais, e não artefatos metodológicos. Greenberg et al. (2005) demonstraram que o escape motility em um procarioto magnetotáctico multicelular é influenciado pela intensidade do campo magnético aplicado. O escape motility raramente ocorre sob campos magnéticos baixos, sendo que a probabilidade de tal evento ocorrer aumenta com o módulo do campo magnético aplicado. A variação na aceleração observada durante esse movimento não pode ser explicada pelo modelo de torque passivo, o que sugeriu que este microrganismo apresenta algum tipo de magnetorrecepção. A alteração dos parâmetros que descrevem a trajetória helicoidal de ‘Candidatus Magnetoglobus Multicellularis’ não pode ser explicada apenas por um maior alinhamento passivo do microrganismo em relação ao campo, pois nesse caso, os valores médios do passo da hélice seriam diferentes para cada valor de campo magnético aplicado. Lins de Barros, Farina & Esquivel (1990) demonstraram que a velocidade de natação de bactérias magnetotácticas aumenta até certo ponto com o aumento do campo magnético aplicado. As médias de velocidade obtidas para cada valor de campo se sobrepõem a uma curva ajustada a partir da Função de Langevin. Tal modelo parte do pressuposto de que uma população de bactérias magnéticas pode ser comparada a uma distribuição de dipolos magnéticos submetidas a interações térmicas. Uma vez que uma célula encontra-se suficientemente distante da outra, o modelo físico será idêntico ao adotado para descrever materiais paramagnéticos. Os dados do presente trabalho sugerem que a intensidade do campo magnético aplicado influencia a natação de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ de alguma forma além da orientação passiva, o que é evidenciado pelas diferenças encontradas nos parâmetros das trajetórias. 88 O fato de que as medidas sob os diferentes campos magnéticos foram obtidas a partir de amostras distintas oriundas de diferentes coletas não pode ser desconsiderado. As condições ambientais no momento das coletas microrganismos e, podem ter influenciado consequentemente, a alterado motilidade dos formato das o trajetórias. Nesse caso, seria esperado que, entre as amostras, um ou mais parâmetros apresentasse diferença significativa na sua distribuição. Mesmo entre diferentes amostras de uma mesma coleta poderia haver variações, pois o microambiente onde vivem os microrganismos pode variar em distâncias da ordem de micrômetros. Para a comprovação magnetorrecepção da sensível hipótese ao de módulo um do mecanismo campo aplicado de em ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’, experimentos realizados a partir de uma mesma amostra serão necessários. A análise das trajetórias sob um número maior de campos magnéticos com intensidades distintas pode fornecer informações indicando a partir de que intensidade de campo magnético os parâmetros na natação são alterados. No sedimento de ambientes aquáticos, onde os ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ e outros procariotos magnéticos multicelulares são encontrados, existem muitos obstáculos físicos à natação unidirecional: os grãos de sedimento. Dessa forma, estes microrganismos devem ter mecanismos para desviar desses obstáculos. ‘Candidatus comprimento Magnetoglobus médio de Multicellularis’ 2,4±0,5µm. Sob possui flagelos a influência do com campo magnético terrestre, os flagelos curtos causam desalinhamento da trajetória, fazendo com que a bactéria altere a sua direção de natação quando, por exemplo, se choca com um obstáculo no meio (NOGUEIRA E LINS DE BARROS, 1995; FRANKEL et al., 1997). Isso é evidenciado no vídeo 8, onde microrganismos que se chocam com obstáculos enquanto 89 nadam alinhados a um campo magnético gerado por um ímã conseguem facilmente contornar o obstáculo e seguir nadando avante. As velocidades observadas sob condições aeróbias e sob campo magnético aplicado superior ao campo geomagnético utilizados neste trabalho não correspondem necessariamente às observadas no ambiente. O campo geomagnético no local da coleta é muito inferior aos campos utilizados no presente estudo. O fato dos experimentos terem sido realizados sob condições aeróbias também pode ter influenciado os valores obtidos para os parâmetros de natação helicoidal. 5.3. Comparação do movimento de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ com o de outras bactérias A maioria das bactérias encontradas em ambientes marinhos com gradiente vertical de oxigênio apresenta elevada velocidade de natação, o que pode ser considerado uma adaptação comum a este tipo de ambiente (FENCHEL & THAR, 2004). São exemplos Ovobacter propellens e Thiovulum majus, ambas as bactérias flageladas e de tamanho grande relativamente à maioria dos procariotos (FENCHEL, 1994; FENCHEL & THAR, 2004). ‘Candidatus Magnetoglobus Multicellularis’ também se encontra em ambiente com estratificação vertical de oxigênio e apresenta alta velocidade de natação. O tamanho relativamente grande do indivíduo multicelular permitiu o estudo das trajetórias deste microrganismo utilizando microscopia ótica de campo claro, mesmo sendo as células individuais de tamanho normal (~1µm de diâmetro). A natação em trajetórias helicoidais é um fenômeno comumente observado em microrganismos com dimensões entre 5 e 500µm (CRENSHAW, 1999a). Purcell (1977) sugere que microrganismos propelidos por estruturas cilíndricas como cílios e flagelos sob regime de 90 baixo número de Reynolds tendem a nadar em trajetórias helicoidais, pois qualquer falta de uniformidade no corpo do microrganismo pode gerar uma componente rotacional no movimento. A razão pela qual as bactérias com dimensões da ordem de 1µm não nadam em trajetórias helicoidais se dá pelo fato de que a componente rotacional é mais afetada pelo movimento browniano (BERG, 1983; FENCHEL, 1994; FENCHEL & THAR, 2004). Como tal efeito é inversamente proporcional ao cubo do diâmetro celular, microrganismos apresentando diâmetros maiores são menos afetadas pela energia térmica do meio (FENCHEL, 1994). ‘Candidatus Magnetoglobus Multicellularis’, Ovobacter propellens e Thiovulum majus possuem dimensões grandes o suficiente para que a componente rotacional de suas trajetórias seja pouco afetada pelo movimento browniano. A bactéria Ovobacter propellens possui diâmetro entre 4 e 5µm, formato ovóide, parede celular Gram-negativa, e um proeminente tufo de flagelos. Essas bactérias comumente nadam com velocidades entre 0,6 e 0,7mm/s, sendo observados indivíduos que nadam a 1mm/s. A trajetória da natação consiste em uma hélice com sentido anti-horário (com o microrganismo se afastando do observador). O momento angular dos motores dos flagelos faz com que a célula gire no sentido horário. As trajetórias possuem raio entre 2 e 3µm, com passo da hélice entre 5 e 10µm e período entre 0,1 e 0,2s. As células podem alterar a direção de natação de forma abrupta, mas sem realizar tumble. Isso ocorre através da alteração da razão entre a velocidade de natação e a velocidade instantânea. Tipicamente, as células realizam curvas de 180°, mas são observadas alterações da direção de natação com ângulos entre 110° e 270° (FENCHEL, 1994; FENCHEL & THAR, 2004). A bactéria Thiovulum majus possui diâmetro entre 5 e 25µm, apresenta flagelos peritríqueos e, assim como ‘Candidatus 91 Magnetoglobus multicellularis’ e Ovobacter propellens, nada em trajetórias helicoidais. Tanto a trajetória quanto a célula giram no sentido anti-horário (com a bactéria de afastando do observador). O raio das trajetórias varia entre 5 e 40µm, com passo da hélice entre 40 e 250µm. O período varia entre 0,2 e 1s. A velocidade tangencial varia entre 150 e 600µm/s, com velocidades máximas obtidas sob condições de O2 que excedem a concentração ótima. Em experimentos sob condições de gradiente de oxigênio, as células que nadam para fora da banda realizam um u-turn de 150-200µm, o que faz com que retornem para a banda (FENCHEL, 1994). A tabela 2 apresenta os valores de alguns dos parâmetros das trajetórias helicoidais de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’, Ovobacter propellens e Thiovulum majus e os dados disponíveis para E. coli, para comparação. Tabela 2: Parâmetros da natação helicoidal de bactérias de ambiente marinho com estratificação vertical de oxigênio. Dados de E. coli estão na tabela para comparação. Bactéria Ovobacter propellens Thiovulum majus Raio da Passo da Diâmetro Velocidade Rotação da Rotação do (μm) (μm/s) Trajetória microrganismo 4‐5 600‐700 Anti‐horária Horária 2‐3 5‐10 0,1‐0,2 5‐25 150‐600 Anti‐horária Anti‐horária 5‐40 40‐250 0,1‐1,0 Trajetória (μm/s) Hélice (μm) Período (s) Refs. FENCHEL & THAR, 2004 FENCHEL, 1994 *KEIM et al., 2004b; ‘Candidatus Magnetoglobus 6‐9,5* 30‐170** Anti‐horária* Anti‐horária* 1‐10** 20‐200** 0,8‐1,0** Multicellularis’ *KEIM et al., 2006 **ESTE TRABALHO Escherichia coli 2,5 x 0,9 29 ± 6 Horária DARNTON et al., 2007 92 Os valores médios obtidos para os raios das trajetórias de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ (5 e 4µm sob os campos magnéticos de 3,9 e 20,0 Gauss, respectivamente) são também muito próximos aos valores médios do raio dos microrganismos, entre 3 e 5 µm (KEIM et al., 2004b). De modo similar, os valores de raio do microrganismo e da trajetória são relativamente próximos em Ovobacter propellens e Thiovulum majus. Se a semelhança entre estes valores é mera coincidência ou resultado do mecanismo de propulsão destes microrganismos, permanece uma questão a ser respondida. ‘Candidatus Magnetoglobus Multicellularis’ apresenta a rotação da trajetória helicoidal e do corpo no mesmo sentido. Essa característica, também observada em Thiovulum majus, pode ser consequência do tipo de flagelação. Thiovulum majus apresenta flagelos curtos (comprimento total menor que o comprimento de onda), com distribuição peritríquea (DE BOER, RIVIÈRE & HOUWINK; 1961; SILVA et al., 2007). Se considerarmos o microrganismo como um todo, ‘Candidatus Magnetoglobus Multicellularis’ apresenta esse mesmo tipo de flagelação (SILVA et al., 2007). Ovobacter propellens apresenta rotação da trajetória e da célula em sentidos opostos. Apesar de possuir dimensões próximas às do ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ e Thiovulum majus, Ovobacter propellens apresenta um tipo de flagelação distinta, caracterizada por um proeminente tufo de flagelos emergindo de um dos lados da célula. Para organismos propelidos por flagelos lofotríqueos (tufo de flagelos emergindo de um ponto da célula), como Ovobacter propellens, a frequência de rotação do corpo é proporcional à frequência de rotação do flagelo. Contudo, não se pode afirmar o mesmo para microrganismos com flagelação peritríquea (com flagelos emergindo de diferentes pontos da superfície celular). A comparação entre os parâmetros das trajetórias helicoidais entre ‘Candidatus Magnetoglobus Multicellularis’, Thiovulum majus e 93 Ovobacter propellens sugere que o padrão de distribuição dos flagelos pode ter implicação no passo da hélice das trajetórias. Candidatus e Thiovulum, que possuem flagelos peritríqueos, apresentam valores de passo da hélice bem maiores e bem mais próximos entre si quando comparados com Ovobacter (Tabela 2). A rotação da célula e da trajetória no mesmo sentido parece ser também consequência desse tipo de distribuição de flagelos. Apesar de Thiovulum majus e ‘Candidatus Magnetoglobus Multicellularis’ possuírem o mesmo padrão de movimento, distribuição e tamanho de flagelos (DE BOER, RIVIÈRE & HOUWINK; 1961; SILVA et al., 2007), Thiovulum majus apresenta velocidade de natação bastante superior à observada em ‘Candidatus Magnetoglobus Multicellularis’ (150-600µm/s). Isso pode ser consequência da fisiologia do microrganismo, ou ainda de uma maior eficiência na coordenação dos flagelos em Thiovulum majus, dada a sua natureza unicelular. Por outro lado, a natação em ‘Candidatus Magnetoglobus Multicellularis’ pressupõe um mecanismo mais complexo de controle da rotação dos flagelos, dada a sua natureza multicelular. A coordenação da rotação dos flagelos entre as diferentes células que constituem o ‘Candidatus Magnetoglobus Multicellularis’ seria, nesse caso, menos eficiente que a observada em Thiovulum majus. 5.4. Resposta de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ a pulso de laser e luz ultravioleta. OBERPICHLER et al. (2008) classifica a resposta de bactérias à luz em três tipos: escotofóbica, fotocinética e fototáctica (HÄDER, 1987; RAGATZ et al., 1994; 1995; GEST, 1995). A resposta escotofóbica é caracterizada por uma ‘fobia ao escuro’: bactérias que nadam para 94 regiões onde a intensidade da luz é reduzida realizam tumble, cessam o movimento ou revertem a direção de natação. A fotocinese é descrita como uma alteração na taxa de motilidade, ou seja, na velocidade do movimento causada por diferenças na intensidade da luz. A resposta fototáctica, por sua vez, consiste na orientação do movimento da bactéria em resposta a uma fonte de luz. ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’, quando concentrados magneticamente na borda de uma gota d’água, apresentam resposta claramente fotocinética quando realiza movimento do tipo Rotation: as células passam a girar mais lentamente em torno do seu próprio eixo quando um filtro verde é posicionado entre a fonte de luz e a amostra (Vídeo 6). Contudo, as respostas observadas em ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ quando expostos a pulsos de laser e à luz ultravioleta não se enquadram perfeitamente em nenhuma das respostas de microrganismos à luz descritas acima. No caso do laser ultravioleta, houve a morte do indivíduo atingido diretamente (como esperado) e um efeito coletivo dos microrganismos próximos, que nadaram na direção oposta, retornando após vários segundos. Como houve a morte do indivíduo diretamente atingido pelo laser, há a possibilidade de que alguma substância liberada pela lise celular tenha induzido a resposta fóbica. Contudo, mesmo atingindo novamente o mesmo microrganismo já morto, a resposta ocorre, mas após algumas repetições o efeito diminui. O fato de que uma resposta similar foi observada com luz UV, que não induziu a morte de nenhum indivíduo durante a observação, sugere que um mecanismo de adaptação, similar ao utilizado em quimiotaxia, está presente. A adaptação em quimiotaxia ocorre quando a sensibilidade do receptor diminui, fazendo com que uma concentração maior do ligante seja necessária para produzir a mesma resposta. A adaptação permite às bactérias quimiotácticas seguir um gradiente de concentração 95 utilizando um mesmo receptor, desde a menor até a maior concentração, pois o receptor vai se “adaptando” às concentrações crescentes do ligante (perdendo sensibilidade) pelo caminho (MADIGAN & MARTINKO, 2006). ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ é encontrado predominantemente no sedimento, onde a incidência de luz é pequena ou inexistente. Quando observado ao microscópio óptico, a exposição à luz parece ter um efeito deletério: amostras observadas durante longo tempo perdem progressivamente a motilidade. É provável que a luz, sobretudo a UV, constitua um fator de estresse para estes microrganismos. As diferenças observadas entre a resposta da aplicação da luz e do laser UV provavelmente se dão em função da densidade de energia luminosa aplicada sobre a amostra. Alterações na motilidade de bactérias em função da exposição à luz UV são relatadas na literatura. Cianobactérias, por exemplo, são extremamente sensíveis à luz ultravioleta, mesmo sob níveis ambientais de UV-B. Sob condições de luz solar, tanto a motilidade quanto a fotoorientação são afetadas. Halobacterium ssp., uma bactéria heterotrófica de ambientes hipersalinos, reverte a direção de movimento quando sai de regiões iluminadas com luz verde ou quando penetra em regiões iluminadas com luz ultravioleta ou azul. Similarmente ao observado em nossos resultados, a iluminação UV causa a dispersão dos indivíduos do campo de observação (HÄDER, 1987). A similaridade da resposta de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ ao laser e à luz ultravioleta com o “escape motility” é muito grande: ambas envolvem movimento no sentido oposto, seguido de “free motion”. Apesar do nome, até o momento não há qualquer evidência de que o “escape motility” seja uma resposta a estímulos negativos ou prejudiciais. A resposta ao ultravioleta seria a primeira evidência neste sentido. 96 6. CONCLUSÕES • Os parâmetros que descrevem a natação em trajetórias helicoidais (free motion) da bactéria magnetotáctica multicelular ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ sob dois campos magnéticos aplicados (3,9 e 20 Gauss) foram quantificados. • Foi desenvolvida uma metodologia que permite a análise eficiente de um grande número de trajetórias de bactérias magnetotácticas através de vídeo-microscopia e processamento de imagem. • Os valores de passo da hélice e raio das trajetórias obtidos no presente trabalho sugerem que as trajetórias retilíneas de ‘Candidatus Magnetoglobus Multicellularis’ previamente relatadas na literatura podem ser trajetórias helicoidais com raio pequeno e/ou passo da hélice muito grande. • As trajetórias helicoidais em ambos os campos magnéticos aplicados são alongadas, indicando grande eficiência na coordenação da rotação dos flagelos para a natação avante nesses microrganismos. • Assim como o elevado grau de otimização magnética em ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’, a otimização do movimento avante implica em um nível elevado de organização entre as células que compõem os indivíduos. • A natação avante de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ aparentemente se torna mais eficiente com o aumento do campo magnético aplicado. 97 • A intensidade do campo magnético aplicado influencia a natação de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ de alguma forma além da orientação passiva. Experimentos realizados a partir de uma mesma amostra e sob um número maior de campos magnéticos com intensidades distintas serão necessários para a comprovação da hipótese da existência de mecanismo de magnetorrecepção sensível ao campo magnético aplicado. • As velocidades de natação observadas em ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ corroboram a hipótese de que elevadas velocidades de natação constituem uma adaptação comum a bactérias encontradas em ambientes marinhos com gradiente vertical de oxigênio. • A comparação entre os parâmetros das trajetórias helicoidais de ‘Candidatus Magnetoglobus Multicellularis’ com os de outras bactérias sugere que o padrão de distribuição dos flagelos pode ter implicação no passo da hélice das trajetórias. A rotação da célula e da trajetória no mesmo sentido parece ser também consequência do tipo de distribuição de flagelos. • A menor velocidade de natação de ‘Candidatus Magnetoglobus Multicellularis’ quando comparada com a observada em Thiovulum majus pode ser consequência da fisiologia do microrganismo, ou ainda de uma maior eficiência na coordenação dos flagelos na bactéria unicelular. • ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ apresenta resposta fotocinética quando realiza movimento do tipo Rotation: as células passam a girar mais lentamente em torno do seu próprio eixo quando um filtro verde é posicionado entre a fonte de luz e a amostra. 98 • As respostas observadas em ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ quando expostos a pulsos de laser e à luz ultravioleta não se enquadram perfeitamente em nenhuma das respostas de microrganismos à luz descritas até o momento na literatura. • A redução da resposta coletiva observada após sucessivos pulsos de laser UV e o fato de que uma resposta similar ter sido observada com luz UV sugere que um mecanismo de adaptação, similar ao utilizado em quimiotaxia, está presente em ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’. • A similaridade da resposta de ‘Candidatus Magnetoglobus multicellularis’ ao laser e à luz ultravioleta com o “escape motility” constitui a primeira evidência de que este padrão de movimento seja uma resposta a estímulos negativos ou prejudiciais. 99 7. 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