Anais XVI Encontro Nacional dos Geógrafos Crise, práxis e autonomia: espaços de resistência e de esperanças - Espaço de Socialização de Coletivos – Alex Rodrigues de Oliveira Universidade do Estado do Rio de Janeiro [email protected] Dinâmicas territoriais da Imperial Irmandade de Nossa Senhora da Glória do Outeiro. RESUMO O presente artigo pretende iniciar o estudo, pautado na perspectiva da Geografia Cultural Renovada, das marcas espaciais da Igreja de Nossa Senhora da Glória, através da constatação das práticas territoriais da Imperial Irmandade de Nossa Senhora da Glória do Outeiro, o controle do território religioso e os conflitos internos e externos da mesma. Propõe-se trabalhar a partir da lógica da descoberta e numa perspectiva qualitativa, dando voz aos agentes envolvidos bem como trabalhar com fontes secundárias a fim de criar um novo olhar da organização espacial da cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. INTRODUÇÃO A temática da pesquisa pretende interpretar as marcas espaciais da religião na Igreja de Nossa Senhora da Glória do Outeiro, localizada no bairro da Glória, na zona sul da cidade do Rio de Janeiro; gestada pela Imperial Irmandade de Nossa Senhora da Glória do Outeiro, organização que respondia aos interesses imperiais, e que, atualmente, continua na gestão de pessoas da sociedade civil, que compõem o grupo através de indicação e aprovação de seus membros. A justificativa para o estudo de uma forma espacial simbólica no topo de um outeiro apresenta algumas singularidades que serão interpretadas: a permanência até os tempos presentes de uma sociedade de fundação Imperial em uma conjuntura republicana; a gestão religiosa da Irmandade sob a responsabilidade de uma comunidade de leigos, cujos representantes são “irmãos” atuantes na mesma. Esses itens serão elaborados a seguir em nosso ponto central de estudo. A perspectiva trazida pela Geografia Cultural Renovada, em todo seu escopo conceitual, nos faz perceber a materialidade e imaterialidade da cultura; neste caminho, 1 Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN: 978-85-99907-02-3 Anais XVI Encontro Nacional dos Geógrafos Crise, práxis e autonomia: espaços de resistência e de esperanças - Espaço de Socialização de Coletivos – a Religião insere-se por identificar conceitos e temas ligados à esses dois aspectos da dimensão cultural, ressaltando-nos a área que servirá de base para o projeto, tendo o homem, na prática religiosa, marcando o espaço selecionado. Geografia e Religião sempre apresentaram ligações, por serem duas práticas sociais e, dentre outras coisas, estarem inseridas dentro de uma dimensão espacial; a Geografia analisa o espaço, e a Religião, como fenômeno cultural, que ocorre espacialmente. (ROSENDAHL, 1996). A TERRITORIALIDADE RELIGIOSA DA IMPERIAL IRMANDADE DE NOSSA SENHA DA GLÓRIA DO OUTEIRO Uma das propostas de estudo da Geografia da Religião, é a temática Religião, Território e Territorialidade, a qual será utilizada em nosso projeto. Segundo Rosendahl (2008), territórios religiosos seriam entendidos como “reflexo de espaço vivido no cotidiano da fé, [...] (fortalecendo) as relações e os fluxos que se instauram pouco a pouco no espaço e que dão origem a uma identidade religiosa e a um sentimento de pertencimento ao grupo religioso envolvido” (p. 56-57); com a territorialidade religiosa significando “o conjunto de práticas desenvolvidas por instituições ou grupos religiosos, no sentido de controlar um dado território religioso. É uma ação para manter a existência, legitimar a fé e a sua reprodução ao longo da história” (p.57). Porém, ao analisarmos as definições de espaço sagrado (ROSENDAHL, 1996) e território político (SOUZA, 1995), observamos uma aproximação entre estes conceitos. Segundo Rosendahl (1996), espaço sagrado é “um campo de forças e de valores que eleva o homem religioso acima de si mesmo, [...] o espaço sagrado é o resultado de uma manifestação do sagrado, revelada por uma hierofania espacialmente definida.” (p.81); enquanto que o território político para Souza (1995) seria “um campo de forças, as relações de poder espacialmente delimitadas e operando, destarte, sobre um substrato referencial” (p.97); logo, percebemos que, apesar de um caráter não-religioso deste conceito de território, ele nos demonstra a proximidade dos conceitos. Estamos diante de forças materiais e imateriais. Assim, temos uma base conceitual para o estudo de uma territorialidade religiosa que se manifesta em um espaço sagrado, por meio de uma gestão de leigos. As territorialidades, a constituição de um território religioso por uma 2 Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN: 978-85-99907-02-3 Anais XVI Encontro Nacional dos Geógrafos Crise, práxis e autonomia: espaços de resistência e de esperanças - Espaço de Socialização de Coletivos – comunidade não-religiosa, e as relações com a sociedade externa, religiosa e nãoreligiosa, provenientes deste controle do território, serão assuntos de grande interesse, tal qual, a possível formação de um “território civil-religioso”; ou talvez um “território civil-sacralizado”; ambos serão (re)estudados durante a elaboração da pesquisa, contudo, tais conceitos ainda não foram relatados em estudos da Geografia da Religião. O projeto tem por objetivos: a) Investigar as práticas territoriais da Imperial Irmandade de Nossa Senhora da Glória do Outeiro, utilizadas para legitimar seu poder frente à Igreja de Nossa Senhora da Glória; b) Discutir como ocorre o controle de uma entidade civil sobre um território religioso; c) Verificar a existência de conflitos religiosos referentes Igreja de Nossa Senhora da Glória; d) Analisar as interações da Irmandade com a comunidade externa, com as autoridades estatais e com as autoridades políticas, em três escalas de abrangência. A pesquisa surgiu através da observação de campo feita para outro projeto, na ocasião da festa de Nossa Senhora da Glória. Destarte, é mister pesquisarmos sobre a importância da terceira igreja edificada na cidade do Rio de Janeiro – em 1739, e sobre a comunidade que a controla. O antigo projeto tinha por objetivo verificar a existência da venda de bens simbólicos de diversas religiões em um espaço católico, preocupandose assim em analisar a coexistência pacífica que se instaurava na Igreja, nos dias de festa da santa padroeira. Em nossa observação, já realizada em trabalho de campo para a pesquisa, não encontramos barracas de venda que fossem de outra religião, ou sequer de outra paróquia, no entanto, haviam policiais divididos em todos os postos onde as barracas estariam localizadas. A partir desta observação e uma entrevista informal a um membro da Irmandade, nosso foco desviou-se para como a mesma transformou e organizou um espaço profano, de forma a construir poder a partir do controle exercido 3 Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN: 978-85-99907-02-3 Anais XVI Encontro Nacional dos Geógrafos Crise, práxis e autonomia: espaços de resistência e de esperanças - Espaço de Socialização de Coletivos – sobre esse espaço e as pessoas que por ali transitavam, utilizando os policiais como seu instrumento de coerção (GOMES, 2008). A alteração na pesquisa inicial foi devido a essas observações realizadas durante o trabalho inicial de pesquisa, o que torna inédita nossa futura investigação. A percepção de que a Imperial Irmandade configura um território nos foi elucidada pelo fato destes conservarem “o acesso, o controle e o uso, tanto das realidades visíveis quanto dos poderes invisíveis” (HAESBAERT apud GODELIER, 1984, p.114) que fazem parte da Igreja de Nossa Senhora da Glória do Outeiro. As territorialidades que nos propomos a analisar são as atuais, do início do século XXI, retomando em alguns momentos, como forma de análise, as territorialidades de outrora como a época do Império, a partir da construção da Igreja e instituição da Irmandade – em 10 de outubro de 1739; passando pela outorga do título de “Imperial” por Dom Pedro II – em 27 de dezembro de 1849; e, posteriormente à queda do império e princípio da República no Brasil – em 15 de novembro de 1889. A proposição temática junto ao objeto configura-se em um fenômeno cultural, religioso, e, por conseguinte, social. O projeto exara-se na ciência, de forma relevante, por propiciar a atualização na discussão de conceitos da Geografia da Religião, notadamente, o de território religioso; além de fomentar o debate sobre o referido objeto, a fim de servir como referência às próximas pesquisas que se destinem a estudar a Igreja de Nossa Senhora da Glória do Outeiro, territórios religiosos, ou as Irmandades Imperiais. Estudo bastante rico no espaço-tempo da cidade do Rio de Janeiro. Utilizando-nos da lógica da descoberta, temos como questionamento central à pesquisa “como se configuram o território e a territorialidade religiosa da Imperial Irmandade de Nossa Senhora da Glória do Outeiro, na Igreja de Nossa Senhora da Glória do Outeiro?”, reforçando a busca pela compreensão de todas as matrizes que constituem em território este espaço sagrado; as sub-questões provenientes seriam “como o território religioso vem sendo gestado por uma instituição, civil?”, que nos traz a perspectiva de como o status de imperial ainda constitui forte importância social; “como a Irmandade é reconhecida por fiéis, profissionais religiosos católicos, as autoridades religiosas católicas e as autoridades políticas da cidade?”, fazendo-nos ter o 4 Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN: 978-85-99907-02-3 Anais XVI Encontro Nacional dos Geógrafos Crise, práxis e autonomia: espaços de resistência e de esperanças - Espaço de Socialização de Coletivos – conhecimento da percepção da Imperial Irmandade em diferentes esferas da religião católica, além da perspectiva dos líderes políticos; “que tipos de conflitos religiosos geram as práticas realizadas pela Irmandade?”, verificando neste ponto qual o comportamento das outras religiões em relação às imposições da irmandade; “por que uma festa religiosa integra quatro esferas sociais (civil, religiosa, militar e política)?” e “o espaço profano a Igreja sofre algum tipo de valorização devido a presença da mesma?”, ressaltando a importância histórica e religiosa da Igreja de Nossa Senhora da Glória do Outeiro; encerrando o conjunto de sub-questões pertinentes à pesquisa. A fim de encontrar uma resolução aos questionamentos propostos, definimos nossas fontes de trabalho por levantamento do: a) aporte bibliográfico referente aos temas Geografia da Religião, Território, Territorialidade, Território Religioso, Territorialidade Religiosa, Igreja de Nossa Senhora da Glória do Outeiro, Irmandades Imperiais, Imperial Irmandade de Nossa Senhora da Glória do Outeiro, e similares que atentem para a referida temática, além de b) freqüentadores da Igreja, políticos, profissionais religiosos, moradores do bairro, membros da Irmandade e pessoas pertencentes à outras religiões, que auxiliem na resolução dos questionamentos através de entrevista conduzida. Contamos também c) fontes secundárias obtidas em órgãos governamentais como IBGE, IBGH e acervos como a Biblioteca Nacional e outros; que nos disponibilizariam materiais como mapas, ilustrações, material midiático, dados censitários, gráficos e afins que demonstrem outra realidade da cidade em relação ao objeto, e nos provenham assistência à resposta dos questionamentos propostos. Procederemos com as fontes de maneira à complementar nossa pesquisa, objetivando tentar interpretar, com o olhar geográfico, quaisquer questionamentos surgidos, para isso, nos utilizaremos de entrevistas qualitativas, leitura seletiva do material selecionado, e utilização pertinente dos dados coletados, bem como das ilustrações, mapas e outras fontes adquiridas. A pesquisa teórica e empírica permitirá, com certeza, um novo olhar nos estudos de organização espacial da cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. Religião, o espaço e o homem estarão relacionados em nossa pesquisa. 5 Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN: 978-85-99907-02-3 Anais XVI Encontro Nacional dos Geógrafos Crise, práxis e autonomia: espaços de resistência e de esperanças - Espaço de Socialização de Coletivos – Referências CORRÊA, Roberto Lobato. Os Centros de Gestão do Território: Uma nota. Revista Território, Rio de Janeiro, v. 1, p. 23-30, 1996. ELIADE, M. O Sagrado e o Profano. A Essência das Religiões. Tradução por Rogério Fernandes. Lisboa: Edições Livros do Brasil, 1992. p. 5-58. GOMES, P. C. C. Sobre territórios, escalas e responsabilidade. In: HEIDRICH, A. L. et al. (Orgs.) A Emergência da Multiterritorialidade: a ressignificação da relação do humano com o espaço. Canoas: Ed. ULBRA; Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2008. p. 37-46. HAESBAERT, Rogério. Definindo Território para entender a Desterritorialização. In: HAESBAERT, Rogério. O mito da desterritorialização. 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